Acórdão nº 3248/13.4TBVIS-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Março de 2014
Magistrado Responsável | CATARINA GONÇALVES |
Data da Resolução | 25 de Março de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
A...
, residente na Rua (...), Viseu, requereu a sua declaração de insolvência, bem como a exoneração do passivo restante.
No que respeita à exoneração do passivo alegou, em suma, que: reúne todos os requisitos para beneficiar da exoneração do passivo; aufere um rendimento mensal de 698,35€; paga uma renda mensal de 263,40€; gasta em luz, gás e água as quantias médias mensais de 47,00€, 25,00€ e 15,00€, respectivamente; gasta em telefone e televisão uma quantia mensal de 50,00€; gasta com transportes a quantia mensal de 50,00€ e com seguros a quantia média de 60,00€, despendendo com a alimentação o valor médio mensal de 190,00€. Declarada a insolvência, a Srª Administradora apresentou o seu relatório onde declara nada ter a opor à exoneração do passivo.
Por decisão proferida em 23/12/2013, foi deferido o pedido de exoneração do passivo restante, nos termos do disposto no art. 235º do CIRE, determinando-se que, durante os cinco anos subsequentes ao encerramento do processo de insolvência, se considera cedido ao fiduciário o rendimento disponível que a devedora venha a auferir, mais se acrescentando que integram esse rendimento disponível todos os rendimentos que lhe advenham a qualquer título, com exclusão dos créditos a que se refere o art. 115º do CIRE, cedidos a terceiro, pelo período em que a cessão se mantenha eficaz e com exclusão do que seja razoavelmente necessário para o sustento minimamente digno da devedora e do seu agregado familiar, não excedendo esse rendimento o correspondente a uma vez o salário mínimo nacional.
Discordando dessa decisão, a Insolvente veio interpor o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões: 1º - O despacho ora recorrido violou as disposições conjugadas dos artigos 239.º, n.º 3, alínea b) do CIRE e artigo 1.º da Constituição da Republica Portuguesa.
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- O valor fixado pelo tribunal “a quo” para garantir o sustento mínimo da devedora e do seu agregado familiar é nitidamente diminuto, tendo em consideração a composição do agregado familiar da devedora, as despesas a que a mesmo tem de fazer face.
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- O agregado familiar da devedora é composto por 2 pessoas: 1 filha menor e a ora aqui Apelante, conforme ficou demonstrado nos autos.
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- Determina o artigo 239.º, n.º 3, alínea b) do CIRE, que deverão integrar o rendimento disponível para cessão, todos os rendimentos que advenham a qualquer título ao devedor, com excepção daqueles que sejam razoavelmente necessários para o sustento digno do devedor e do seu agregado familiar, bem como os necessários para o exercício da sua actividade profissional.
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- Resulta do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18/03, que aprovou o CIRE, que o mesmo diploma: «(…) conjuga o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica».
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- A doutrina e a jurisprudência têm vindo a entender esmagadoramente que o mínimo considerado necessário para que uma pessoa possa obter um sustento condigno se traduz na atribuição ao insolvente de um montante corresponde ao salário mínimo nacional.
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- O despacho ora posto em crise coarcta a possibilidade de o devedor se reabilitar economicamente, pondo inclusivamente em causa o seu sustento e do seu agregado familiar.
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- A fixação do valor excluído do rendimento objecto de cessão nos moldes em que foi decretado, sem ter em conta a base de vida familiar e profissional da devedora, é passível de violar o direito dos mesmos a uma subsistência condigna, bem como a proverem à sua reabilitação económica.
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- No caso sub judice, o valor excluído do rendimento objecto de cessão é manifestamente diminuto, consubstanciando uma medida inconstitucional, por grave violação do Principio da Dignidade da Pessoa Humana, consagrado no artigo 1.º da Constituição da República Portuguesa.
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- Efectivamente, o Tribunal a quo ao fixar o sustento minimamente digno da devedora e do seu agregado familiar a uma vez o salário mínimo nacional, ou seja, em 485,00€, bem sabendo que a devedora só a título de renda da casa paga a quantia de 263,40, impõe que a devedora (e a sua filha) sobreviva de forma indigna com a quantia mensal de 221,60€.
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- A atribuição de um montante inferior ao ora propugnado (725,50€) faria com que a economia da Recorrente se tornasse insustentável, e poderia colocar a Recorrente a sua filha abaixo de um padrão mínimo de dignidade social.
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