Acórdão nº 401/12.1TBAGN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Maio de 2014

Data27 Maio 2014
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I- Relatório No Tribunal Judicial da comarca de Arganil, A... e mulher, B..., casados sob o regime de comunhão geral de bens, residentes na (...), Amadora, e também em (...), Arganil, instauraram contra C... e mulher, D..., a residir em (...), Arganil, acção declarativa de condenação, a seguir a forma sumária do processo comum, pedindo a final seja declarado que são titulares de um direito de servidão de passagem de pé sobre o lado sul do terreno dos réus, desde a estrada até ao prédio dos demandantes, com as características que descrevem, e que os actos dos réus, impeditivos do exercício desse direito, são ilegais, insubsistentes e de má fé. Mais pedem a condenação dos demandados no reconhecimento desse direito de servidão de passagem a favor do prédio dos autores, a reporem a entrada e todo o leito da servidão no estado anterior às obras que lá fizeram, nomeadamente retirando o portão ou concedendo uma chave aos demandantes, e aterrando o leito da servidão até ao nível anterior, de forma a permitir acesso fácil ao terreno daqueles; a absterem-se de perturbar ou impedir o exercício desse direito de servidão; e a pagarem uma indemnização de valor não inferior a €500,00.

Subsidiariamente, pedem seja reconhecido que o prédio deles, autores, não tem ligação suficiente com a via pública através de uma passagem de pé, nem possibilidade de a estabelecer sem grande prejuízo económico; que a passagem de pé é absolutamente necessária e permite o aproveitamento mais fácil e rentável do prédio, devendo o trajecto da servidão ser concedido nos termos que requerem. Com tais fundamentos pedem a condenação dos RR a consentirem na utilização do caminho de servidão de pé, com a largura e extensão referidas, recebendo aqueles a indemnização que for arbitrada e realizando-se as obras necessárias à utilização da servidão.

Em fundamento alegaram, em síntese útil, que são os donos, por o terem adquirido por usucapião, que expressamente invocam, do prédio rústico inscrito na matriz rústica sob o art.º 222 da freguesia de x(...), o qual se desenvolve em declive, entre a estrada municipal que lhe passa a sul e um caminho de terra batida, com o qual confina do lado norte. Mais alegaram que desde tempos imemoriais o acesso ao identificado prédio é feito, a partir da estrada, por um caminho que, iniciando-se no prédio de um terceiro, flecte depois para a esquerda, atravessando o prédio dos RR numa extensão de cerca de 25 mt. O uso continuado de tal serventia e as suas características conduziram à aquisição, pela via da usucapião, de uma servidão legal de passagem onerando o prédio dos demandados, cujo reconhecimento pretendem.

Sucede, porém, que os RR procederam à aplicação de um portão em ferro no prédio do terceiro, junto à estrada, no início do caminho, o qual mantêm fechado, assim impedindo os demandantes de acederem ao seu prédio, causando-lhes prejuízos que avaliam em pelo menos € 500,00 e cujo ressarcimento reclamam.

Em via subsidiária, e para o caso de não se considerar constituída a servidão por usucapião, tal como invocaram, pedem seja reconhecido que o prédio de que são donos tem insuficiente ligação com a via pública, não sendo possível estabelecê-la sem grande dispêndio, devendo a constituição da servidão ser deferida mediante expropriação por utilidade particular da parcela necessária do prédio dos RR, nos termos previstos no art.º 1550.º do Código Civil, disposição legal a que fazem apelo.

* Citados os RR, contestaram nos termos da peça de fls. 26 e seguintes, na qual impugnaram de forma especificada a factualidade alegada pelos AA, concluindo pela sua absolvição dos pedidos formulados.

* Dispensada a realização da audiência preliminar e, bem assim, a selecção dos factos assentes e organização da base instrutória, prosseguiram os autos para a fase do julgamento.

Teve lugar audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo que da acta consta e, tendo-se o Tribunal deslocado ao local da questão na realização de diligência de inspecção judicial, observou quanto fez constar do respectivo auto.

De seguida foi proferida sentença que, dando provimento ao pedido formulado em via subsidiária, no reconhecimento de que o prédio dos AA não tem ligação suficiente com a via pública através de uma passagem a pé nem possibilidade de a estabelecer sem grande prejuízo económico, sendo tal passagem absolutamente necessária para um aproveitamento do prédio mais fácil e rentável, condenou os RR “a consentirem que os autores utilizem o caminho de servidão de pé, com as características (largura e extensão) constantes dos factos provados xiii, xiv, xv, xvi, xviii e xxii[1], recebendo a indemnização que for arbitrada e realizando-se as obras necessárias à utilização da servidão”.

Inconformados, apelaram os RR da sentença e, tendo apresentado as suas alegações, remataram-nas com as seguintes necessárias conclusões: “a) Entendeu o Tribunal “a quo” na sentença de que ora se apela, condenar os RR num dos dois pedidos formulados pelos AA; b) Com efeito, entendeu o Tribunal recorrido que “In casu”, afigura-se-nos que estamos perante uma servidão de legal de passagem, no sentido de que os autores como donos do prédio dominante poderiam sempre e de forma coerciva impô-la aos réus, como donos do prédio serviente.” c) Tomando em consideração o dispositivo legal (art.º 1550.º n.º 1 do CC) refere o Meritíssimo juiz que “(…) o prédio dos autores, embora tendo contacto com a via pública, tem-no de forma insuficiente atentas as suas necessidades normais, nomeadamente não podendo a ele aceder a pé que não seja pelo caminho ou faixa de terreno em apreço, em virtude da estreiteza e irregularidade dos degraus, da irregularidade topográfica do solo – bastante declivosa e perigosa, em nosso entender – enfim do carácter exclusivamente pedonal (em socalcos ou degraus) do acesso à via pública. Pelo que, se pode concluir que o prédio dos autores se encontra numa situação de encravamento relativamente à via pública, já que não poderão os autores sem acréscimo de despesa e de incómodo aceder a ela pelos modos referidos, a não ser pela referida faixa de terreno que integra a prédio dos réus. Pela constituição da servidão de passagem será devida indemnização correspondente ao prejuízo sofrido – cfr. Art.º 1554.º do Código Civil.” d) Assim, entendeu o Meritíssimo Juiz do Tribunal recorrido condenar os RR “a consentirem que os autores utilizem o caminho de servidão de pé, com largura e extensão referidas em 1., recebendo os mesmos réus a indemnização que for arbitrada e realizando-se as obras necessárias à utilização da servidão.” e) Entendem o RR que a fundamentação de facto que motivou a condenação, ela própria aponta para a solução contrária.

  1. O prédio objecto dos presentes autos confina com a estrada municipal que lhe passa a sul.

  2. Relativamente a este prédio, e sendo o mesmo constituído por duas partes, a segunda é de natureza declivosa.

  3. A ligação da estrada para o terreno dos autores é agora feita por um muro com 1,30 m de altura, com cinco degraus, com larguras que vão de 28 cm a 33 cm.

  4. Com base nos elementos de localização do prédio pode-se ver que, desde o portão – localizado em terreno que não pertence aos RR - até ao início do terreno dos RR, medeia a distância de 5,30 mais 6,30, portanto 12 metros.

  5. A decisão afecta o prédio de um terceiro, estranho à demanda entre os sujeitos processuais, activo e passivo.

  6. O espaço a ocupar, no prédio dos RR, pela dita servidão de passagem onerando o prédio dos AA, será então de 22,80 m, no caso de resultar das contas feitas com base nas partes apresentadas ou de 31 metros, deduzindo os 5,30 mais 6,30 aos 43 metros referidos em XVIII.

  7. Como foi aceite pelo tribunal recorrido, não ficou provado ter havido, em tempo algum, qualquer...

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