Acórdão nº 322-C/2002.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2012
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 24 de Abril de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório A...
e esposa B...
, residentes na Rua ..., ..., Pombal – por apenso à execução em que é exequente C...
, residente na Rua ..., ..., ..., ..., Ourém, e em que é executado D...
, residente em ..., ..., Pombal – instauraram os presentes embargos de terceiro, alegando, em síntese, que tiveram conhecimento que no processo principal se procedeu a penhora de dois prédios urbanos (os descritos na CRP de Pombal sob os n.° x ... e a y ...) que pertencem ao embargante marido, por lhe haverem sido doados pelo executado D ... (com a obrigação dos embargantes cuidarem do doador até ao fim dos seus dias) em 12/08/2004.
Recebidos os embargos e determinada a suspensão da execução quanto a tais prédios urbanos, apenas o exequente/embargado C ... contestou.
Alegou, em resumo, que o executado, em conluio com o embargante, pretendeu apenas com a escritura de doação retirar ficticiamente os bens da esfera patrimonial do executado a fim de impedir que os mesmos respondessem por um crédito anterior do exequente[1].
Acrescentou que o executado sempre se manteve na posse dos prédios, continuando a cultivá-los, a benfeitorizá-los e a viver neles.
E concluiu que o negócio foi simulado e, como tal, nulo; e que “deve ser considerada ineficaz a doação em relação ao embargado”.
Os embargantes responderam, mantendo o alegado na petição inicial; e negando qualquer, conluio, simulação e/ou conhecimento das dívidas do executado/doador.
Foi proferido despacho saneador – que declarou a instância totalmente regular, estado em que se mantém – organizada a matéria factual com interesse para a decisão da causa, instruído o processo e realizada a audiência, após o que a Exma. Juíza proferiu sentença, julgando procedentes os presentes embargos de terceiro, com o consequente levantamento da penhora sobre os dois prédios urbanos em causa.
Inconformado com tal decisão, interpôs o exequente/embargado C ... recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por outra que – declarando ineficaz o negócio de doação em relação ao credor/embargado – julgue os embargos totalmente improcedentes.
Terminou a sua alegação com as seguintes conclusões: “ (…) 1. Foi alegado (artº. 4º da contestação) e está provado (al. J dos Factos Assentes) que o Recorrente é credor do doador, tendo este sido aliás condenado por douta sentença, conforme resulta dos autos principais (acção 322/2002 – Tribunal Judicial de Pombal), na quantia de 14.963,94 €, acrescida de juros legais a partir da citação nessa acção, cuja ocorreu como se pode ver dos autos principais, antes da apresentação da contestação dos aí RR., que deu entrada em juízo em 13/5/2002.
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Isto é, à data da doação, o crédito do recorrente já existia – era, pois, anterior ao acto (artº. 610, nº 1 do C.C.).
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Resultou do acto a impossibilidade para o credor de obter a satisfação integral do seu crédito, como se encontra provado pela resposta dada ao quesito 13 da B.I.: “A doação não só diminuiu como subtraiu a garantia patrimonial do crédito do embargado” (artº. 610, nº 2, do C.C.).
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Aliás, no seu depoimento de parte – reduzido a escrito – o doador refere, relativamente ao quesito 13, que não tem quaisquer bens em seu nome.
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Conforme dispõe o nº 1 do artº. 612 do C.C., se o acto fôr gratuito (como é o caso – veja-se a declaração negocial do doador e a aceitação do donatário constante da escritura junta aos autos), a impugnação procede, ainda que um e outro (devedor e terceiro) tenham agido de boa-fé.
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Não restam dúvidas, pois, que se encontram verificados todos os factos necessários à procedência do segundo pedido do R.: “Ser considerada ineficaz a doação em relação ao embargado (ora recorrente).
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Ao não se pronunciar sobre tal pedido, verifica-se omissão de pronúncia.
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O que é caso de nulidade da sentença – artº. 668, nº 1, al. d) do C.P.C..
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Porém, como dos autos consta toda a factualidade necessária para a decisão de mérito, o douto Tribunal ad quem deve, anulando a douta sentença, proferir decisão de mérito declarando o acto (doação) ineficaz em relação ao credor, ora recorrente.
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A douta sentença violou, entre outras, as seguintes disposições legais (art. 610 e 612 do C.C. e 668, nº 1, al. d) do C.P.C.). (…)” Os embargantes responderam, sustentando, em síntese, a sentença recorrida não violou quaisquer normas adjectivas ou substantivas, pelo que deve ser mantida nos seus precisos termos.
Terminaram a sua alegação com as seguintes conclusões.
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A matéria de facto dada como provada não permitiria outro desfecho que não fosse a procedência dos embargos de terceiro deduzidos pelos ora recorridos; C) De todo o modo e sem prescindir, à data da apresentação da contestação aos embargos, já havia decorrido prazo muito superior a cinco anos; D) Tendo, assim, a essa data, já caducado o direito de impugnação pauliana da doação efectuada aos ora recorridos; Dispensados os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.
* II – Fundamentação de Facto Resultaram provados os factos seguintes: 1) No dia 12 de Agosto de 2004, no Cartório Notarial de Ansião, foi outorgada escritura pública de doação, lavrada de folhas 47 a folhas 48 verso do Livro 262–D, tendo sido doador o ora requerido, D ..., à altura já viúvo, e donatário o ora requerente, A ..., no estado de casado com a requerente B ... (Al. A); 2) Nessa escritura de doação, o identificado D ... declarou doar ao A ..., entre outros, os seguintes bens imóveis urbanos, ambos situados na freguesia de ..., concelho de Pombal; “A” – Casa de habitação com trinta metros quadrados, dependência e logradouro com trinta e seis metros quadrados, a confrontar do norte e do nascente com caminho, do sul com ... e do poente com ..., sita nos ..., inscrita na matriz predial urbana respectiva sob o artigo nº w ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Pombal sob o nº y .../freguesia de ..., aí inscrito a favor do doador e sua falecida mulher pela inscrição G2.
“B” – Casa de habitação, com a superfície coberta de cento e dezassete metros quadrados, uma dependência com a superfície coberta de dezasseis metros quadrados e logradouro com a superfície descoberta de setenta metros quadrados, a confrontar do norte com caminho, do sul e do nascente com o próprio e do poente com ..., sita nos ..., inscrita na matriz predial urbana respectiva sob o artigo nº z ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Pombal sob o nº x .../freguesia de ... e aí inscrito a favor do doador e da sua falecida mulher pela inscrição G2 (Al. B); 3) O doador declarou fazer essa doação por conta da quota disponível (Al. C); 4) O ora requerente, embargante, aceitou a doação (Al. D); 5) À data da doação o doador, D ..., era viúvo e não tinha filhos (Al. E); 6) O doador, D ..., e sua mulher – a falecida E...
– por si e antepossiodores (F...
e marido G...
, a quem os havia adquirido por compra), durante mais de 30, 40, 50 e mais anos...
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