Acórdão nº 4857/07.6TBVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ANTUNES
Data da Resolução24 de Abril de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.

Relatório. S… propôs, no 4º Juízo Cível da Comarca de Viseu, contra A… – Companhia de Seguros SA, acção declarativa de condenação, com processo comum, ordinário pelo valor, pedindo a condenação da última a pagar-lhe a quantia de € 70.100,00 e juros de mora, à taxa legal, desde a citação até pagamento.

Fundamentou a sua pretensão no dano não patrimonial e patrimonial – designadamente a incapacidade permanente para o trabalho, por motivos psiquiátricos, de 19% - que suportou em consequência da colisão ocorrida no dia 18 de Março de 2003 no Parque Industrial de Coimbrões, em Viseu, entre o seu veículo automóvel ligeiro de passageiros …-FI e o veículo ligeiro de mercadorias …-EX, conduzido por E…, que transferiu para a ré a sua responsabilidade civil, imputável a este último, que, por conduzir de forma desatenta e distraída, não respeitou a o sinal de vertical de cedência de prioridade.

A ré defendeu-se, por excepção, alegando a sua ilegitimidade ad causam e a incompetência absoluta, em razão da matéria, do tribunal, e por impugnação, afirmando ignorar parte dos factos relativos à dinâmica do acidente e aos danos invocados pela autora, e concluiu, para o caso da improcedência das excepções dilatórias que arguiu, pela parcial procedência da acção e pela sua condenação na quantia que vier a liquidar-se para ressarcimento dos danos patrimoniais que lhe advieram em razão do IPP.

Seleccionada a matéria de facto – selecção que a ré impugnou, por reclamação, mas a que não foi dado provimento – procedeu-se, sob requerimento de ambas as partes, à perícia de avaliação do dano corporal em direito civil, na pessoa da autora, realizada pelo Gabinete Médico-Legal de Viseu, do Instituto Nacional de Medicina Legal.

Notificada às partes a junção do relatório da perícia – que concluiu pela afectação da autora por uma incapacidade permanente geral fixável em 6%, compatível com o exercício da sua actividade habitual – a autora requereu a realização de segunda perícia, para correcção da inexactidão dos resultados da primeira, mormente da I. Permanente Geral.

A autora fundamentou este requerimento no facto de o perito não se ter baseado em toda a informação que estava ao seu alcance, referindo nomeadamente que da informação da ARS Centro (ACES Dão Lafões) consta que a autora não se encontra inscrita no Centro de Saúde de Viseu, o que não é verdade, tendo sido acompanhada, nesse Centro, pela médica de família, tendo tido, até 7 de Setembro de 2009, oito consultas, de aquela médica lhe ter passado vários certificados de incapacidade temporária para o trabalho por estado de doença (problemas psiquiátricos), de o perito não ter aceitado a junção aos dados documentais do relatório clínico que juntou com a petição inicial, no qual lhe é atribuída, por motivos psiquiátricos, uma incapacidade 19%, nem ter atentado no relatório pericial da Dra … que lhe fixa uma incapacidade permanente de 15.52%, a que acresce, a título de dano futuro mais 5%, e de não ter sido submetida a qualquer exame pelo perito.

A demandada opôs-se ao requerimento, entre outras razões, pelo facto de a autora não ter alegado fundamentadamente as razões da sua discordância.

Após vicissitudes várias, por despacho de 26 de Outubro de 2009 – com fundamento em que a autora não apresenta razões concludentes de discordância das razões periciais, limitando-se a apelar para a ponderação de outros elementos, que para além de a prova pericial ser apreciada livremente pelo tribunal, outros documentos são igualmente meios de prova atendíveis, e que, por isso, entendia que não foram alegadas razões de discordância do relatório pericial – o requerimento de realização da segunda perícia foi indeferido.

A autora logo impugnou por recurso ordinário de agravo este despacho – no qual pede a sua revogação e substituição por outro que ordene a realização da segunda perícia – admitido para subir com o primeiro recurso que, depois dele interposto, subisse imediatamente, com efeito meramente devolutivo.

Realizada a audiência de discussão e julgamento – com registo sonoro dos actos de prova levados a cabo oralmente – e decidida, sem reclamação, a matéria de facto, foi proferida sentença que, designadamente, arbitrou à autora, pelo dano da incapacidade permanente parcial de 6%, a indemnização de € 7.500,00.

A autora impugnou também esta sentença por recurso ordinário de apelação, no qual, depois de afirmar o seu interesse na apreciação prévia do seu recurso de agravo, pede a sua revogação e substituição por outra que fixe a indemnização pelo dano não patrimonial na quantia de € 35.000,00.

Com o propósito de mostrar o mal fundado da decisão que lhe indeferiu o requerimento de realização de segunda perícia, a autora extraiu da sua alegação estas conclusões: … Relativamente ao recurso de apelação, a recorrente condensou os fundamentos da impugnação, nestas conclusões: … A demandada concluiu, na resposta a ambos os recursos, pela improcedência deles.

  1. Factos relevantes para o conhecimento do objecto dos recursos.

2.1.

Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso de agravo: Os factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso de agravo são os relativos ao requerimento de realização da segunda perícia e aos fundamentos do seu indeferimento pelo tribunal de 1ª instância documentados no relatório.

2.2.

Factos relevantes para o conhecimento do objecto do recurso de apelação: 2.2.1. Foi seleccionado para a base instrutória, entre outros, este enunciado de facto: 37º Em consequência directa e necessária do acidente de viação, a autora ficou com a incapacidade permanente parcial para o trabalho (IPP) de 19%, por motivos psiquiátricos? 2.2.1. O tribunal da audiência decidiu o ponto de facto referido em 2.2.1, nestes exactos termos: Provado que em consequência do acidente de viação, a autora ficou a padecer de uma incapacidade permanente geral fixável em 6%.

2.2.2. O tribunal da audiência adiantou, para justificar o julgamento referido em 2.2.1, designadamente, esta motivação: Como já se deixou transparecer, o tribunal mais considerou o teor do relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito cível de fls. 285/289, bem como os vários elementos e/ou relatórios clínicos, designadamente os que foram juntos a fls. 41144, 65/70, 135/136, 150/178, 182/206,244/255,262/263 e 264.

Ainda sobre o estado psíquico da autora, insistiu a ré na ideia de que a mesma tinha já dificuldade em lidar com a contrariedade e frustração, com tendência para a interiorização dos problemas, a que o relatório médico elaborado por … reporta (ver fls. 42); neste particular, dir-se-á que o tribunal pode até admitir a existência de alguns problemas psicológicos anteriores ao acidente, não ignorando que as pessoas são diferentes, pelo que lidam igualmente de diferentes maneiras com os problemas que se lhes deparam ao longo da vida; todavia, é para todos por demais evidente todo um estado de debilidade física e psíquico inequivocamente causado pelo acidente de viação.

Se dúvidas ainda subsistissem, o perito médico … esclareceu que o exame complementar psiquiátrico realizado em 3 de Agosto de 2009 foi feito a seu pedido, deixando consignado na página 3 do relatório as respectivas conclusões; quando pede a avaliação de psiquiatria forense reporta-se a este acidente; é claro que todos os acidentes posteriores podem causar algum quadro de agravação, mas tem por certo que o colega fez a necessária ponderação e avaliou a examinanda tendo por referência o acidente dos autos, até porque o referido exame assim o deixa transparecer. E de facto, analisado este relatório, que ficou junto aos autos na última sessão do julgamento, rapidamente se percebe que o acidente ocorrido em Janeiro de 2006, provocado pela queda da varanda (ou seja, quase três anos depois do...

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