Acórdão nº 1577/10.8TBPBL-F.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução17 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra (2.ª secção cível): * Recorrente………………….Instituto de Solidariedade e Segurança Social.

Recorridos……………….….J (…), S. A., e Outros, devidamente identificados nos autos.

* I. Relatório.

  1. O presente recurso respeita à decisão tomada na sentença que homologou o plano de insolvência relativo à sociedade J (…), S. A.», no sentido de ter admitido o perdão previsto no plano quanto aos juros de mora, no montante de €12 214,83 euros, reclamados e devidos à Segurança Social.

    O Instituto de Solidariedade e Segurança Social discorda por entender que o plano não podia ter previsto tal perdão.

    Baseia esta posição no teor da norma constante do n.º 3 do artigo 30.º da Lei Geral Tributária, na redacção introduzida pelo artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, norma esta que previu mesmo a aplicação imediata aos processos de insolvência que se encontrassem pendentes e ainda não tivessem sido objecto de homologação.

    Esta norma não permite a disponibilidade dos créditos públicos, sendo certo que tal perdão não se mostra imprescindível para a viabilização da empresa insolvente, nem há garantias que acautelem o plano prestacional proposto no plano.

    Daí que se pretenda a revogação da sentença.

  2. A insolvente contra-alegou sustentando, em síntese, que o artigo 196.º, n.º1, al. a) e c) do Código da Insolvência e da Recuperação da Empresas (doravante designado apenas por CIRE) confere ao plano de insolvência o poder de perdoar ou reduzir todos os créditos privilegiados e comuns, incluindo os do Estado, prevalecendo esta norma sobre as normas de natureza fiscal.

    Cita jurisprudência neste sentido, que considera que as normas indicadas pelo recorrente apenas se aplicam no domínio das relações tributárias, isto é, nas relações entre a administração tributária e os contribuintes e já não no âmbito do concurso de credores desencadeado nos processos de insolvência em que existindo incapacidade para pagar todos os créditos e vigorando o princípio de igualdade entre os credores, o Estado não pode obter um tratamento privilegiado em relação aos demais credores do insolvente e recair sobre estes todo o esforço de recuperação da entidade insolvente.

    Sustenta ainda que a alteração introduzida através do aditamento do n.º 3 ao artigo 30.º da Lei Geral Tributária, pelo artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, enferma de inconstitucionalidade, por violação do n.º 2 do artigo 112.º da Constituição da República Portuguesa, por existir igualdade em termos de valor vinculativo entre as leis e os decretos-lei, não podendo esta lei impor-se ao CIRE no âmbito dos próprios processos judiciais de insolvência.

    Acrescenta que a Lei Geral Tributária é uma lei especial que disciplina apenas o ordenamento tributário e não é liquida a intenção do legislador, pois se tivesse pretendido a solução preconizada pelo recorrente teria alterado também os artigos 97.º e 196.º do CIRE que extinguem os privilégios creditórios do Estado e da Segurança Social e permitem a redução e modificação de créditos.

    Assim, as normas da Lei Geral Tributária, bem como do Código do Processo e Procedimento Tributário e do Decreto-Lei n.º 411/91 de 17 de Outubro, apenas se aplicam às relações tributárias propriamente ditas, mas não aos processos de insolvência.

    Concluiu, pela improcedência do recurso.

    1. Objecto do recurso.

      O objecto do recurso consiste, por conseguinte, em saber se a norma constante do n.º 3 do artigo 30.º da Lei Geral Tributária, resultante da redacção introduzida pelo n.º 3 do artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, impede que nos processos de insolvência o plano de insolvência preveja a redução ou perdão de juros de mora reclamados e devidos à Segurança Social.

      Sendo a resposta afirmativa, cumpre em segundo lugar verificar se esta norma enferma de inconstitucionalidade, por violação do n.º 2 do artigo 112.º da Constituição da República Portuguesa.

    2. Fundamentação.

  3. Matéria de facto.

    1 – No plano se insolvência exarou-se o seguinte: «4.1.4 – Créditos Privilegiados Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social.

    Plano de Regularização: Pagamento do crédito reclamado e reconhecido, em 36 prestações mensais, iguais e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia do mês seguinte àquele em que se verifique a sentença de homologação do plano de insolvência, com perdão da totalidade dos juros vencidos e vincendos.

    4.2 – Créditos Comuns 4.2.1 – Fornecedores e outros credores.

    Plano de regularização: Pagamento de 40% do capital em dívida, perdão dos restantes 60%, em 32 prestações trimestrais, crescentes e sucessivas, vencendo-se a primeira no último dia útil do trimestre seguinte àquele em que se verifique a aprovação do plano de insolvência na assembleia respectiva, com perdão de 60% do capital e da totalidade dos juros vencidos e vincendos».

    2 – Este Plano foi homologado por sentença proferida em 4 de Julho de 2011.

  4. Apreciação das questões objecto do recurso.

    1- Antes de prosseguir cumpre verificar se as dívidas por contribuições à segurança social assumem a natureza de dívidas tributárias às quais se aplica a Lei Geral Tributária.

    No seguimento do disposto no n.º 1 do artigo 63.º da Constituição da República, onde se proclama que «Todos têm direito à segurança social» e se acrescenta, no seu n.º 2, que «Incumbe ao Estado organizar e subsidiar…» este sistema, a Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro (Bases Gerais do Sistema de Segurança Social), estabelece, nas alíneas a) e b) do seu artigo 92.º, que constituem fontes de financiamento do sistema: «a) As quotizações dos trabalhadores; b) As contribuições das entidades empregadoras;…».

    Por outro lado, no n.º 1 desta lei determina-se que «O orçamento da segurança social é apresentado pelo Governo e aprovado pela Assembleia da República como parte integrante do Orçamento do Estado».

    O mesmo vem referido na al. b) do artigo 1.º da Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, que estabelece as normas relativas ao enquadramento orçamental do Estado (A Lei n.º 52/2011, de 13 de Outubro, constitui a sexta e mais recente alteração a esta lei, a qual procedeu à respectiva republicação), na qual se refere que a presente lei estabelece «b) As regras e os procedimentos relativos à organização, elaboração, apresentação, discussão, votação, alteração e execução do Orçamento do Estado, incluindo o da segurança social, e a correspondente fiscalização e responsabilidade orçamental».

    Verifica-se, por conseguinte, que as contas da Segurança Social estão integradas no Orçamento de Estado e que uma das formas...

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