Acórdão nº 434/11.5TJCBR-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução09 de Janeiro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

J (…)apresentou-se à insolvência e peticionou a exoneração do passivo restante.

  1. No seguimento do processo foi proferido despacho inicial no qual se concluiu e decidiu que: «Não se vislumbrando nenhuma das circunstâncias previstas no artº 238º para o indeferimento liminar da pretensão, declaro que a exoneração será concedida uma vez observadas pelo devedor as condições previstas no artº 239º durante os cinco anos posteriores ao encerramento do processo de insolvência.» 3.

    Inconformado com tal despacho dele recorreu o credor Banco (…), SA.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1. Salvo o devido respeito, a douta decisão em apreço não fez correcta interpretação dos factos e adequada aplicação do Direito, devendo ser revogada e substituída por outra que indefira liminarmente o pedido de exoneração do passivo restante do Insolvente, ora Recorrido.

  2. Em 8 Fevereiro de 2011, J (…), ora Recorrido, apresentou-se à insolvência requerendo, desde logo, a exoneração do passivo restante.

  3. O Banco é Credor reclamante do Insolvente J (…), do montante global de Eur.9.165,97 (nove mil, cento e sessenta e cinco euros e sessenta e sete cêntimos).

  4. O valor global das dívidas da Insolvente é avultado – Eur.3.862.362,65 (três milhões, oitocentos e sessenta e dois mil, trezentos e sessenta e dois euros e sessenta e cinco cêntimos) - sobretudo, se ponderarmos que dizem respeito a uma pessoa singular.

  5. De entre os requisitos do nº1, do art. 238º, do CIRE, e no que ao caso interessa, dispõe a al. d) que deve ser indeferido o pedido se "o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou não estando obrigado a se apresentar, se tiver abstido dessa apresentação nos seis meses seguintes à verificação da situação de insolvência, com prejuízo em qualquer dos casos para os credores, e sabendo, ou não podendo ignorar sem culpa grave, não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica".

  6. O ora Recorrido, não se apresentou à Insolvência no momento legalmente devido, isto é, dentro do período de 6 meses a contar do momento da verificação da situação de impossibilidade de cumprimento das obrigações vencidas.

  7. De facto, uma vez que os montantes reclamados se encontram vencidos desde, sensivelmente, 2004 e 2005, e que o Insolvente responde por esses valores pessoal e solidariamente, não poderia este ignorar que se encontrava em indubitável situação de insolvência.

  8. Aquando da sua apresentação à insolvência o Insolvente J (…)já havia sido demandada no processo n.º 3685/05.8TBBRG, a correr termos na Vara de Competência Mista do Tribunal Judicial de Braga, no processo nº 709-B/2000, a correr termos no 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos, no processo n.º 2852/05.9TBCBR, a correr termos na 2ª Secção da Vara Competência Mista do Tribunal Judicial de Coimbra, no processo nº 3630/06.3YYPRT, a correr termos na 2ª Secção do 2º Juízo de Execução do Tribunal Judicial do Porto e no processo n.º 156/05.6TBESP-B, a correr termos no 2º Juízo do Tribunal Judicial de Espinho.

  9. Ora, o Insolvente, atento o elevado passivo de que era (e é) devedor - cerca de Eur.4.000.000,00 - não podia ignorar a inexistência de qualquer perspectiva séria de melhorar a sua situação económica de tal forma que lhe permitisse amortizar, ainda que lenta e fraccionadamente, as dívidas reclamadas.

  10. É forçosa, portanto, a conclusão de que o devedor não se apresentou à insolvência no momento devido, nem o fez nos seis meses posteriores à consciencialização da sua calamitosa situação financeira.

  11. Ao se abster de se apresentar à insolvência, recusando todas as evidências quanto ao seu colapso financeiro, o Insolvente conseguiu apenas protelar as suas dívidas, provocando um acréscimo do seu passivo, e, ainda, um maior prejuízo aos seus Credores, decorrentes dos encargos atinentes às acções executivas intentadas para recuperação dos seus créditos e que poderiam ser evitadas com a atempada apresentação à insolvência.

  12. Despesas que seriam perfeitamente evitáveis e dispensáveis se o Insolvente tivesse tomado a iniciativa de se apresentar a insolvência perante a universalidade dos credores.

  13. Acresce que os respectivos créditos se foram avolumando, face ao vencimento de juros e pelo, consequente avolumar do passivo global do Insolvente, assim como aumentaram os custos das diligências tendentes à recuperação dos mesmos, com a desvalorização acentuada dos bens que compunham o seu activo.

  14. Acresce que, o Reclamante, como instituição bancária, está obrigado a provisionar o incumprimento, junto do Banco de Portugal (cfr. Aviso do Banco de Portugal n.º 3/95, de 30 de Junho), sendo que, mantendo-se a situação de incumprimento, não é possível libertar as provisões, com manifesto prejuízo para o desenvolvimento na sua actividade creditícia.

  15. Neste sentido, urge considerar o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Porto, de 15.12.2010, in www.dgsi.pt: 16.

    “I - Resulta da experiência comum que a falta de apresentação tempestiva à insolvência provoca o avolumar dos juros, com o consequente aumento do passivo. Acresce a necessidade de os Bancos credores provisionarem o incumprimento junto do Banco de Portugal. Com isso, ficam cativas verbas que, se não fosse esse aprovisionamento, os Bancos credores poderiam utilizar na sua actividade. Todas essas situações acarretam prejuízo para esses Bancos.

    II - Inexistindo património, quanto maior o passivo, maior a dificuldade de os credores verem os seus créditos satisfeitos e maior o seu prejuízo destes.” 17.

    Conforme refere o Sr. Administrador de Insolvência no relatório junto aos autos, o Insolvente exercia a actividade de topógrafo.

  16. O Insolvente não procurou exercer outras actividades que lhe proporcionassem mais rendimentos, não existindo, assim, qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica.

  17. Atente-se que, «Ao falar em “perspectiva séria” o legislador aponta para um juízo de verosimilhança sobre a melhoria económica do insolvente, alicerçada naturalmente em indícios consistentes e não em fantasiosas construções ou optimismo compulsivo» (vide Ac. RG, de 4 de Outubro de 2007) 20.

    Ora, atentos os factos acima descritos, desde, pelo menos, 2005 que o Insolvente tem plena consciência que o seu passivo é muito superior ao seu activo, assim como, não tem, nem nunca teve, perspectivas sérias de aumentar os seus rendimentos, de forma a permitir-lhe pagar a totalidade das dívidas vencidas, ainda que faseadamente.

  18. Tal como refere a decisão do Acordão da Relação de Lisboa de 26 de Novembro de 2006 (CJ, IV/06, pág. 97) “O pedido de exoneração deve ser indeferido liminarmente, se o devedor tiver incumprido o dever de apresentação à insolvência ou, não estando obrigado a apresentar-se, se tiver abstido dessa apresentação nos 6 meses seguintes à verificação da situação de insolvência com prejuízo, em qualquer dos casos, para os credores e sabendo (ou não podendo ignorar sem culpa) não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua situação económica. Deve presumir-se o prejuízo dos credores do facto de o requerente da exoneração não se ter apresentado à insolvência, quando seja manifesto que ele, desde há vários anos, não tinha bens penhoráveis susceptíveis de satisfazer os créditos dos seus credores.” 22.

    O Insolvente incumpriu, assim, o dever de não se abster de se apresentar à insolvência, com prejuízo para os seus Credores, e sabendo não existir qualquer perspectiva séria de melhoria da sua condição económica, pelo que a decisão “a quo” violou a previsão da alínea d) do nº 1 do artigo 238º do CIRE, legitimando desse modo a apelação, ora deduzida.

    Contra alegou o impetrante pugnando pela manutenção do decidido.

  19. Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 685º-A do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, a questão essencial decidenda é a seguinte: (I)legalidade da decisão de recusa da...

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