Acórdão nº 197/11.4JAAVR-A.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ NOGUEIRA
Data da Resolução07 de Março de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

14 I. Relatório 1. No âmbito do inquérito n.º 197/11.4JAAVR a correr termos na Comarca do Baixo Vouga – Serviços do Ministério Público de Aveiro – DIAP -, por requerimento de 30.09.2011, o Ministério Público solicitou ao Juiz de Instrução a declaração de excepcional complexidade do procedimento.

  1. Exercido o contraditório, manifestou-se o arguido A..., melhor identificado nos autos, contra a declaração de excepcional complexidade, conforme resulta de fls. 98 a 111, cujo teor se dá por reproduzido.

  2. Por despacho judicial de 08.11.2011, foi declarada a excepcional complexidade do procedimento.

  3. Inconformado, com o assim decidido, recorreu o arguido, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões: A. O despacho de que se recorre é nulo, por omissão de pronúncia, na medida em que o juiz a quo não tomou posição acerca do requerimento de prova apresentado pelo arguido; B. O despacho de que se recorre é, ainda, nulo, por padecer do vício de falta de fundamentação, nos termos do artigo 97º, n.º 5 do CPP.

    1. Na verdade, o Tribunal a quo não justifica o porquê de declarar a excepcional complexidade do processo, limitando-se a referir que “o elevado número de ofendidos” justifica tal complexidade.

    2. Uma tal afirmação, desacompanhada da ponderação de todos os elementos concretos do presente caso, nomeadamente a não quantificação do número real dos ofendidos, a total omissão quanto às diligências de obtenção de prova, representa uma violação do dever de fundamentação a que o juiz está adstrito.

    3. Sem conceder, ainda que se entenda que o despacho recorrido não é nulo, sempre se dirá que inexistem no caso dos autos fundamentos para a declaração de excepcional complexidade do processo.

    4. Na verdade, os processos só podem ser considerados de excepcional complexidade quando tal qualidade resulte, entre outros factores, do número de arguidos, do número de ofendidos ou ainda do carácter altamente organizado do crime.

    5. Acontece porém que, no caso dos presentes autos apenas há um arguido constituído, razão pela qual o despacho recorrido carece de qualquer fundamento, devendo, em consequência, ser alterado.

    6. A isto acresce que o arguido não está indiciado pela prática de nenhum dos crimes presentes no catálogo de criminalidade altamente organizada, e que se encontra previsto no art. 1.º, al. m) do CPP.

      I. Nem tão pouco se pode sustentar que o arguido estava ligado a um grupo organizado ou ainda que nas datas invocadas pelo MPº obteve dados dos cartões multibanco, na medida em que o arguido nem sequer se encontrava em Portugal.

    7. Razão pela qual, seja porque os crimes pelos quais o arguido está indiciado não preenchem o catálogo da criminalidade considerada altamente organizada, seja porque, como se demonstrou, ele não se encontra ligado a qualquer tipo de organização ou associação criminosa, também não se verifica o preenchimento deste último critério do art. 215.º, n.º 3 do CPP, pelo que deverá ser alterado o despacho que declarou os presentes autos como sendo de excepcional complexidade.

    8. O tribunal recorrido alicerçou o seu entendimento num único elemento: a existência de um elevado número de ofendidos.

      L. Contudo, no presente caso, não pode ser considerado que exista um elevado número de ofendidos porquanto esse alegado número de ofendidos encontra-se directamente relacionado com as apensações que têm ocorrido nos presentes autos.

    9. Sendo que os factos que resultam dos processos apensos nada têm que ver com o arguido e não lhe podem ser imputados, porquanto foram praticados no período em que o arguido já se encontrava detido preventivamente.

    10. A isto acresce ainda que, os direitos, liberdades e garantias do arguido não podem ficar prejudicados devido a uma não criteriosa apensação de processo, porquanto são mais valiosos e encontram-se consagrados constitucionalmente.

    11. Nestes termos, não pode ser considerado que exista um elevado número de ofendidos, porquanto o alegado elevado número decorre exclusivamente dos processos que foram incorrectamente apensados, por factos que o arguido não praticou nem poderia ter praticado porquanto não se encontrava em território nacional, e que, portanto, não lhe podem ser imputados.

    12. Mais acresce que da listagem de fls. 429 – T resulta que as clonagens dos cartões terão ocorrido todos no mês de Maio, em períodos compreendidos entre os dias 20 e 28 desse mês.

    13. Pelo que, e atendendo a que o arguido durante esse período não se encontrava em Portugal não podem de modo algum ser-lhe imputados tais factos.

    14. Acresce que o arguido foi detido tendo na sua posse um cartão régua n.º …, instalado no ATM sito na Rua … , em Ílhavo, sendo que relativamente a este cartão régua, que alegadamente servia para clonar bandas magnéticas, não existem nos autos quaisquer provas de que tal cartão régua tenha servido para clonar cartões e efectuar os posteriores levantamentos em dinheiro.

    15. E tal nem poderia acontecer, visto que os elementos digitais que alegadamente estiveram registados no cartão régua nunca chegaram a ser transferidos para cartões falsos, de modo a possibilitar os posteriores levantamentos.

    16. Razão pela qual também aqui não se pode aceitar o entendimento do tribunal a quo quando declara os presentes autos de excepcional complexidade, na medida em que não se verifica a existência de qualquer ofendido.

    17. Sem conceder, e ainda que se entenda que existe efectivamente um elevado número de ofendidos, a verdade é que tal requisito é desacompanhado de qualquer outro que fundamente devidamente a declaração de excepcional complexidade.

      V. De facto, a declaração de excepcional complexidade, por representar uma limitação aos direitos do arguido na medida em que lhe aumenta os prazos máximos da prisão preventiva, deve obedecer a critérios objectivos, devidamente fundamentados e que sustentem esse alargamento dos prazos processuais, neste caso, do inquérito.

    18. Pelo que, ainda que se entenda que existe um elevado número de ofendidos no presente processo, esse factor deve ser...

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