Acórdão nº 95/05.0TBFCR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução15 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A.....e B....., residentes em Benespera-Guarda, intentaram a presente acção declarativa de condenação, inicialmente sob a forma de processo sumário contra C....., e “D.....” com sede na Avenida de Ceuta, lote 7, loja 2 pedindo: - a condenação das rés a reconhecerem que os autores são donos e legítimos proprietários do prédio que identificam na petição inicial; - a condenação das rés a reconhecerem que o local onde efectuaram as construções do prédio urbano e do muro delimitador com a área de 3 000 m2 faz parte integrante do prédio dos autores, não dispondo as rés de qualquer título aquisitivo que lhes permitisse a ocupação daquela parcela de terreno, dado que os autores não alienaram a favor da primeira ré.

- que seja declarado nulo e sem nenhum efeito o eventual acto translativo do direito da primeira a favor da segunda ré sobre a parcela de terreno onde esta efectuou a construção do prédio urbano com o artigo matricial nº 518 da freguesia de Castelo Rodrigo e respectivo logradouro, dado que aquela nenhum direito tinha sobre tal parcela.

- a condenação solidária das rés a demolirem, à sua custa, as construções que fizeram sobre a parcela de terreno dos ora autores e a reporem o prédio no estado em que se encontrava antes das construções e indemnizarem os autores pelos prejuízos sofridos com a ocupação, o que relegam para liquidação em execução de sentença.

- a condenação da primeira ré a indemnizar os autores pela ocupação e apropriação de parte do seu prédio na estrema nascente, com área superior a 3400 m2 para abertura de uma rua e respectivos passeios, bem como para alargamento da Estrada Nacional 221.

Alegam, para tanto, que os autores são donos e legítimos possuidores do prédio que identificam, o qual se encontra inscrito na Conservatória do Registo Predial de Figueira de Castelo Rodrigo a seu favor, tendo-o adquirido por escritura pública de compra e venda, sendo que há mais de vinte, trinta, cinquenta anos, por si e antepossuidores, vêm tratando o prédio, colhendo os frutos e praticando todos estes actos à vista de toda a gente e sem oposição de ninguém, na convicção de serem seus legítimos proprietários, encontrando-se o prédio inscrito a seu favor.

Os alienantes deste prédio, no entanto, aquando da celebração da escritura de compra e venda, declararam que o prédio estava omisso na conservatória, quando assim não acontecia, pelo que tem actualmente duas inscrições, dado que os autores abriram uma nova inscrição.

Ora, os autores vieram a ter conhecimento de que os alienantes haviam vendido à C.....3 400 m2 do prédio que haviam vendido aos autores, tendo omitido a estes tal facto, tendo os autores, posteriormente, vindo a ter conhecimento da escritura pública que havia sido outorgada, na qual não se encontravam especificados quais os 3 400 m2 que vendiam à Câmara, nem sequer constava a sua localização.

Por outro lado, a Câmara não participou tal compra às Finanças nem registou a seu favor, dado que na descrição nº 3886 não consta que foram desanexados 3400 m2.

Assim, os autores adquiriram a totalidade do prédio, sendo que quando tiveram conhecimento da aquisição pela Câmara, sentiram-se enganados, mas nada fizeram, sendo certo que também a Câmara não interpelou os autores para, por acordo, definirem a área que teria adquirido, mas antes localizou a parcela de terreno onde entendeu, apesar de saber que o prédio era dos autores.

Acrescentam que apenas tiveram conhecimento de que o seu prédio tinha sido amputado a nascente numa deslocação que fizeram a Portugal, onde a Câmara procedeu à abertura de uma rua e alargamento de uma estrada, que transformou numa avenida, tendo, para tanto, e sem qualquer processo expropriativo, feito sua uma área superior aos 3400 m2.

Alegam ainda que a primeira ré alienou uma nova área de 3 000m2 à segunda ré, a qual não poderia ignorar que aquela não dispunha de qualquer título válido, pelo que nem sequer fizeram a compra e venda por escritura pública, sendo, por isso, tal alienação nula.

Nessa parcela adquirida pela segunda ré, efectuou uma construção sem qualquer licença, o que a primeira ré aceitou.

Concluem que a primeira e segunda rés fizeram, assim, construções em terreno que sabiam não lhes pertencer, pretendendo a demolição de tais construções.

Por outro lado, referem ainda que ao fazer sua a parte mais valiosa do prédio, a primeira ré causou prejuízo aos autores, constituindo-se na obrigação de indemnizar, sendo que, não podendo quantificar os prejuízos, relegam para execução de sentença tal quantificação.

*** O réu C....., veio apresentar contestação e reconvenção, impugnando o alegado pelos autores e sustentando que desde há mais de 25 anos que levou a cabo obras e sempre conservou e tratou a área de 3400m2 que adquiriu em 1981, sem qualquer oposição, sendo que desde essa data, ficou dono em exclusivo dessa área de terreno que, então, com os legítimos proprietários, logo definiram e ficou localizada, até porque se encontrava já definida qual era a área de acordo com o traçado do plano urbanístico do Loteamento da Cerca.

Acrescenta que logo em 1981 fez várias obras e procedeu à abertura de uma rua, sem qualquer tipo de oposição, sendo certo que, quando os autores celebraram a escritura pública de compra e venda, já as obras se tinham iniciado, sendo incompreensível que estes só uma década depois é que se tenham dado conta da estrada, a pretexto de que se encontravam em França.

O réu sempre esteve, pois, de boa fé, tendo feito naquela parcela, que foi a que adquiriu aos vendedores e logo definida de acordo com o projecto já efectuado, todas as obras necessárias à prossecução do interesse público, utilizando-a há mais de 25 anos, sem oposição de ninguém.

Mais alega que em 01/10/1990 o executivo do réu deliberou negociar dois lotes que faziam parte dessa parcela de terreno com os serviços da Telecom para instalação de uma central digital, tendo outorgado um contrato promessa de venda dos lotes, com a área de 1.004 m2, sendo, pois, o dono e legítimo proprietário dessa parcela de terreno que prometeu ceder à segunda ré.

Conclui que adquiriu a propriedade do terreno em causa por usucapião ou mesmo por acessão imobiliária.

De todo o modo, sustenta ainda que sempre os autores estariam a agir em manifesto abuso de direito.

Em reconvenção, requer que seja reconhecido que a parcela de terreno que comprou tem a área de 3.400m2 e se situava na estrema nascente do prédio dos vendedores, fazendo actualmente parte do loteamento da cerca e da estrada que liga Figueira a Pinhel e a Almeida ou, se assim não se entender, que seja reconhecido que a dita parcela teria sido adquirida através do instituto da acessão imobiliária ou pelo decurso do tempo através da usucapião.

*** A ré P.T.-Comunicações, S.A. contesta e deduz pedido reconvencional.

Alega que a C.....adquiriu, por compra aos seus legítimos proprietários, a área de 3400m2, sendo, pois, falso o alegado pelos autores relativamente à propriedade de 18.489m2, já que não adquiriram a totalidade do prédio nem a área que reivindicam na presente acção.

Ora, a Câmara, nessa área que adquiriu, a partir de 1981, levou a cabo obras de loteamento, dividindo o terreno em lotes, sendo que em 19 de Dezembro de 1990, os CTT-EP celebraram com a Câmara um contrato-promessa de compra e venda da área de 1004 m2, que constitui a dimensão dos lotes 108 e 109 e desde aí entraram na posse dessa parcela de terreno, nessa mesma data, sendo que a 1ª ré, já desde 1981, a ocupava de forma pública, pacífica e de boa-fé, até porque sempre esteve convencida de que o terreno pertencia à autarquia, por a ter adquirido por compra aos seus legítimos proprietários.

Mais alega que não foi celebrada a escritura pública, apenas por a autarquia ainda não estar munida de toda a documentação necessária, nomeadamente por não estar concluído o plano de pormenor da zona, mas sempre foram autorizados a fazer todos os trabalhos necessários à implantação das infra-estruturas de telecomunicações e a construir os edifícios a elas afectos.

Sustentam, pois, que sempre teriam adquirido o terreno por usucapião, alegando os actos de posse praticados após a celebração do contra-promessa, bem como aqueles que foram praticados pela C.....desde 1981, considerando ser lícita a junção das posses para o cômputo do prazo para a usucapião.

Por outro lado, mesmo a entender-se não se verificar a usucapião, sempre se verificam os pressupostos da acessão imobiliária, atendendo ao valor da construção por si efectuada no terreno. Mais alegam ainda o abuso de direito por parte dos autores.

Em virtude do alegado, e em reconvenção, pretende que seja reconhecido o seu direito de propriedade sobre a parcela de terreno que constitui os lotes 108º e 109º, com a área de 1004 m2, por a ter adquirido por usucapião.

A não se entender assim, e na hipótese de improcedência do anterior pedido, requer que seja reconhecido ser proprietária do mesmo terreno, mediante o pagamento aos autores do equivalente a 1.004.0000$00, por o ter adquirido por acessão imobiliária.

*** Os autores vêm apresentar réplica, respondendo às contestações apresentadas pelas rés e contestando os pedidos reconvencionais.

Concluem pela improcedência das excepções, bem como dos pedidos reconvencionais, mantendo, no essencial, o já alegado na petição inicial.

Com dispensa de audiência preliminar, foi proferida decisão a admitir as reconvenções deduzidas e despacho saneador, em que se relegou para final o conhecimento das excepções arguidas e seleccionaram-se os factos assentes e elaborou-se base instrutória, quanto aos factos controvertidos, de que não houve reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tal como consta de fl.s 575 a 594, sem que lhe tenha sido formulada qualquer reclamação.

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