Acórdão nº 651/20.7T8LMG-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | TERESA ALBUQUERQUE |
Data da Resolução | 26 de Abril de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I - AA, por apenso aos autos de divórcio sem consentimento, que resultaram de reconvenção sua em acção de separação judicial de pessoas e bens intentada contra ela pelo então seu marido, BB, veio, ao abrigo do disposto nos arts 1793º CC e 990º CPC, requerer a atribuição da casa de morada de família, pedindo que, após o decretamento do divórcio, lhe seja atribuído o direito à utilização da mesma.
Alegou, em síntese, que tem 73 anos de idade, a casa de morada de família foi construída após o matrimónio em terreno que constitui bem próprio dela, e por razões de saúde dela, porque é doente oncológica, e da neta, a quem dá apoio, e que sofre de distrofia muscular congénita e perturbação de desenvolvimento intelectual, deve a mesma ser-lhe atribuída, referindo que o Requerido já viveu noutra casa no período em que esteve sujeito a vigilância electrónica em processo de violência doméstica contra a sua pessoa, referindo ainda sofrer de depressão com ataques de pânico e viver aterrorizada por partilhar a mesma casa com o Requerido, sendo as respectivas situações económicas equivalentes.
Estando pendente, como resulta do atrás referido, acção de divórcio sem consentimento, a Exma Juíza a quo designou a mesma data, nuns e nos outros autos, para tentativa de conciliação.
Nessa data, 7/10/2021, e neste processo, consoante resulta da respectiva acta, as partes solicitaram a colaboração do Tribunal tendo em vista a resolução consensual do litigio, para que o mesmo verificasse se era possível a divisão e utilização independente daquela casa, de forma autónoma, por ambos.
O Tribunal deslocou-se ao local nesse mesmo dia, tendo verificado que atenta a estrutura da habitação e o número de divisões, se mostrava possível efetuar a sua divisão de molde a permitir que ambos usufruíssem da casa de forma independente.
Em função do que, pelas partes e pelos seus Ilustres Mandatários, foi dito terem chegado a acordo nestes autos, nos seguintes termos: 1º -À Requerente AA, será atribuída: - a parte da cozinha, sala de jantar, no 1º andar e as duas entradas, da parte da frente lado sul. - e o último piso onde se situam os quartos e a casa de banho 2º -Ao requerido BB, será atribuída: - a entrada pela garagem no rés-do-chão e garagem, - no 1º andar a casa de banho, dois quartos e uma sala - o anexo a Norte, com cozinha e arrumos.
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-A sala de bilhar será utilizada pelos dois, requerente e requerido, quando os netos vierem para lá brincarem, ficando a chave com a requerente AA.
4º- No prazo máximo de 15 dias requerente e requerido procederão as alterações necessárias dos bens e retiradas dos mesmos.
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-Quantos aos géneros serão divididos em partes iguais.
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-Comprometem-se ainda requerente e requerido a terem acesso ao aquecimento central, água e luz a dividir pelos dois, bem como a chave dos equipamentos.
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- Quanto ao teto da cozinha, situado a Norte, montagem de banca, canalização da água e pintura estabelecem um limite máximo de € 1.500,00 ( mil e quinhentos euros) para as obras a realizar.
8º -As custas serão em partes iguais.
Tendo de seguida sido proferida a seguinte sentença, da qual foram os mesmos logo notificados: «Em face do exposto, atenta a qualidade dos intervenientes homologo por sentença o acordo que antecede nos seus exatos termos, condenando as partes ao seu integral cumprimento.
Custas em partes iguais, conforme acordado.
Fixo o valor da ação em € 30.000,01.
Registe e Notifique».
Por sua vez, e como conta da respectiva acta, nos autos de divórcio, as partes disseram estarem de acordo na convolação dos autos para divórcio por mútuo consentimento, acordando no seguinte: 1º - Não existem filhos menores; 2º -Os cônjuges prescindem reciprocamente de alimentos; 3º -A atribuição da casa de morada de família até à partilha já se encontra decidida no processo apenso; 4º -Indicaram como bens comuns os seguintes: casa de morada de família, sita na ..., nº 17, ...; dois veículos automóveis cuja matrícula indicaram; um tractor; dois prédios rústicos em ... um prédio urbano no ...; benfeitorias em prédios rústicos.
5 º- Animais de estimação, um cão que fica atribuído à cônjuge mulhe .
Tendo de seguida sido proferida sentença que homologou os acordos supra referidos por acautelarem devidamente os interesses dos cônjuges, decretando o divórcio entre eles e dissolvido o respectivo casamento.
No dia 13/10/2021, a Requerente revogou a procuração à advogada que ate então a patrocinava e, através de email de CC, referiu o seguinte: «Devido ao meu estado de nervos e ansiedade, não reflecti sobre o que estava verdadeiramente a acontecer, estando eu agora mais ciente e mais calma, não concordo com o que ali foi dito. Não aceito os termos propostos na diligência de 7/17/2021, que para min não tem qualquer nexo ou sentido», concluindo no sentido de ser dado «sem efeito o ali tratado, prosseguindo o processo os seus ulteriores trâmites até ao final».
Foi proferido despacho, apontando que o requerimento em causa, embora em nome da Requerente AA, não se encontrava por ela assinado nem se mostrava provindo de um e-amial do qual se pudesse concluir ser da mesma, ordenando a sua notificação para apresentar requerimento no processo assinando-o e respeitando o disposto no art 144º CPC.
A Requerente apresentou em 15/10/2021 requerimento do mesmo teor do anterior, sendo por ela assinado.
Nesse mesmo dia outorgou procuração a favor de novo mandatário, a qual se mostra junta aos autos de divórcio.
Foi ordenado o cumprimento do disposto no art 47º CPC, tendo em conta a revogação do mandato, e ordenado que se notificasse o Requerido do acima referido requerimento.
Ainda na 1ª instância foi proferido despacho, em 10/12/2021, nos seguintes termos: «Tal como consta da acta de 07/10/2021, que foi comunicado e explicado às partes, tendo as mesmas logrado obter um acordo quanto à atribuição da casa de morada de família, acordo este que ficou a constar da mesma, foi nesse dia proferida sentença nestes autos.
Não se verificando a existência de qualquer erro material, nulidade ou necessidade de reforma, com a prolação da aludida sentença esgotou-se imediatamente o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, ou seja, não pode o juiz voltar a pronunciar-se sobre a causa.
Assim sendo, nada podemos determinar na sequência do requerido pela Requerente, uma vez que tal versa sobre a matéria da causa e sobre isso já foi proferida sentença, tendo-se esgotado o poder jurisdicional, nos termos do art 613º do CPC».
II – Veio a Requerente interpor recurso – que designou de “Revisão” – cujas alegações concluiu do seguinte modo: 1-Ao abrigo do princípio da economia processual, se dá aqui por reproduzido tudo quanto supra se escreveu, 2-. Atendendo ao estado de incapacidade acidental que a Recorrente se encontrava no momento do acordo quanto à atribuição da casa de morada da família, entendemos que há lugar a nulidade do mesmo. 3. A Recorrente não se encontrava lúcida.
4. Estava sob grande pressão, com ansiedade e medo.
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O que a levou a ouvir a decisão proferida pela sua mandatária sem...
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