Acórdão nº 46/13.9TBCVL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório AA e BB apresentaram-se à insolvência e requereram a exoneração do passivo restante. Por sentença proferida em 16.01.2013, foi declarada a sua insolvência.

Por despacho de 13.02.2014, foi admitida liminarmente a requerida exoneração do passivo restante e fixado para o sustento minimamente digno dos devedores a quantia correspondente a dois ordenados mínimos nacionais.

O processo de insolvência foi encerrado por despacho datado de 17.03.2014.

A cessão de vencimentos apenas se iniciou em abril de 2016, na sequência de pedido de adiamento do início do período de cessão, deduzido pelos devedores em 9.03.2016 e deferido por despacho de 08.06.2016.

Em 17.03.2017 vieram os devedores requerer a alteração do rendimento indisponível com fundamento no acréscimo de despesas de saúde, tendo sido deferido o requerido, por despacho de 09.05.2017, passando o rendimento indisponível a corresponder a dois ordenados mínimos nacionais, acrescidos de 200,00, com efeitos desde março de 2017, data do pedido.

Em 6.06.2017 o Sr. Fiduciário apresentou o relatório relativo ao 1º ano de cessão - abril de 2016 a março de 2017 -, onde fez constar que os devedores cederam à fidúcia a quantia de 14.033,72, mas deveriam ter entregue a quantia de 20.022,18, estando em falta a quantia de 5.988,46.

Em 15.04.2018, veio o Sr. Fiduciário apresentar o relatório relativo ao 2º ano de cessão - abril de 2017 a março de 2018 -, onde fez constar que os devedores cederam o valor de 12.934,46, mas deveriam ter cedido14.611,55, estando em falta 1.677,09.

Em 14.05.2018, o credor B..., SA apresentou requerimento, onde alegou ter tido conhecimento, através do relatório do Sr. AI que entre a entrega de rendimentos pelos insolventes e o valor que deveria ter sido entregue, existia um diferencial de 1.667,09€ e ter sido referido pelo Sr. Fiduciário que os insolventes invocaram ter deduzido diversas despesas extraordinárias, documentando-as, mas sem que tenham pedido a sua exclusão dos valores a entregar nos autos, sendo que desconhece as mesmas e ainda se são necessárias e urgentes. Concluiu, pedindo a notificação dos insolventes para entregar a quantia em falta à massa, dado não terem solicitado a sua exclusão dos valores a ceder, sob pena de cessação antecipada da exoneração do passivo restante.

Em 30.05.2018 os devedores foram notificados para pagar o valor em falta relativo ao 2º ano da cessão - 1.677,09.

E em 11.06.2018 vieram os insolventes pedir o abatimento de despesas extras com a sua saúde ao rendimento disponível, tendo por despacho de 10.09.2018, sido julgada justificada a não entrega da quantia de 1.677,09, quantia em falta relativa ao 2º ano de cessão e os devedores alertados “para a conveniência de apresentar, de futuro (e caso se verifique tal situação novamente), requerimento onde deduzam tal pretensão antes do relatório a apresentar pelo Sr. Fiduciário de molde a evitar incidentes de incumprimento.” Por despacho de 16.06.2019 (conclusão de 12.06.2019 – referência 31239449) foi ordenado, relativamente às despesas elencadas no documento 5, que acompanhava o relatório anual do 2º ano, a notificação dos devedores para apresentarem comprovativos das despesas em causa (visto que apenas apresentaram orçamentos) e ainda indicarem se ocorreu algum reembolso/comparticipação de algum sub-sistema de saúde ou seguro de saúde, no prazo de 10 dias.

Em 10.07.2019 foi proferido despacho concedendo aos devedores o prazo de 10 dias para a junção dos documentos em falta, tendo os devedores sido advertidos de que a dispensa de entrega de rendimento disponível carecia de apreciação judicial - art. 239º, n.º 3, b), iii) do CIRE.

Em 06.08.2019 o Sr. Fiduciário remeteu aos autos o relatório relativo ao 3º ano de cessão- abril de 2018 a março de 2019 -, onde fez constar que os devedores cederam à fidúcia a quantia de11.881,00, mas deveriam ter entregue a quantia de 16.560,28 . Com este relatório juntou pedido dos devedores para não entregar parte do montante disponível, a fim de ser realizada uma cirurgia, ficando por entregar 4.679,28.

Por despacho de 11.09.2019 foi ordenado que se insistisse com os devedores pela junção dos comprovativos das despesas conforme determinado no despacho de fls. 641 (de 12/06/2019 – ref. 31239449), concedendo-se aos mesmos, para o efeito, o prazo de 10 dias e foi decidido, ainda, dispensar da cessão a quantia de 75,00 Euros de despesas de saúde, atendendo à justificação apresentada pelos devedores.

Em 25.09.2019, os devedores vieram informar que não iam juntar os documentos solicitados, relativos a intervenções cirúrgicas, pois que, por ora, estas não iriam ser realizadas.

Em 18.02.2020 os devedores vieram pedir a exclusão do rendimento disponível da quantia de 1.300,00, ao abrigo do artº 239º, nº 3º, alínea b) iii) do CIRE, montante necessário para custear uma cirurgia da devedora.

Em 21.02.2010, o Sr. Fiduciário informou nada ter a opor ao requerido pelos insolventes.

Em 9.03.2020 foi autorizada a exclusão do rendimento disponível da quantia de 1.300,00.

Em 19.06.2020 o Sr. Fiduciário juntou o relatório relativo ao 4º ano de cessão – abril de 2019 a março de 2020 - onde fez constar que os devedores cederam a quantia de 11.409,63, mas deveriam ter cedido a quantia de 17.257,87, tendo o Sr. Fiduciário abatido ao montante não entregue no 4º ano, as despesas autorizadas pelo Tribunal de 1.375,00 (75,00 + 1.300,00), pelo que ficou por entregar a quantia de 4.473,24.

Em 13.05.2021 o Sr. Fiduciário juntou o relatório relativo ao 5º ano de cessão - abril de 2020 a março de 2021 - com o mapa onde constam todos os valores que foram entregues pelos insolventes, ao longo dos 5 anos da fidúcia, e os valores que deveriam ter cedido, considerando os seus rendimentos mensais e o rendimento excluído da cessão, fazendo constar relativamente ao 5º ano de cessão que os devedores tinham cedido a quantia de 14.215,96 e deveriam ter entregue a quantia de 16.755,96 Euros, pelo que ficou por entregar a quantia de 2.540,00.

Em 27.05.2021, o credor I... veio dizer que tinha constatado pela análise do relatório apresentado pelo Sr. Fiduciário que nos anos 1, 3, 4 e 5 da cessão, os insolventes não tinham cedido a totalidade dos rendimentos a que estavam obrigados, pelo que requereu a sua notificação para cederem os valores em falta.

Em 28.05.2021 veio também o credor C..., S.A. requerer que os insolventes fossem notificados para proceder à regularização dos valores em falta.

Em 14.06.2021 os devedores juntaram requerimento com o seguinte teor, pugnando pela concessão da exoneração: 1. Os Requerentes entregaram à fidúcia mais de 66 mil euros o que, considerando o prazo de cessão do rendimento disponível, perfaz uma entrega mensal de cerca de 1.100,00 € (Mil e cem euros.

  1. Reconhecem que os mapas apresentados pelo Sr. Fiduciário correspondem aos valores por si entregues, o que resulta numa quantia em falta por conta da cessão e que ascende a 17,000,00 € (cerca de dezassete mil euros).

  2. E que as mesmas, apesar de em falta, não poderão determinar o indeferimento da exoneração do passivo restante.

  3. Os Requerentes tudo fizeram para entregar as quantias do rendimento disponível, viveram com dois ordenados mínimos nacionais durante parte do período de cessão a que acresceu o valor mensal de 200,00 € a partir de Março de 2017, decisão proferida pelo Tribunal mas que ainda assim ficou aquém do Requerido pelos insolventes.

  4. Sublinhe-se uma vez mais, entregaram mais de 1.100,00 € por cada mês de 5 penosos e longos anos, depois de uma insolvência dura consequência de avais prestados pelo insolvente marido que foi empresário a vida toda, viveu sempre de forma regrada e assumindo o bom cumprimento das suas obrigações mas que no período da crise de 2010, viu o seu negócio ruir tendo sido o mesmo encerrado por declaração de falência.

  5. A verdade é que acreditam e sempre acreditaram que iriam conseguir a exoneração do seu passivo restante sendo que esta insolvência, neste caso, nem se trata de um fresh start (os requerentes são pessoas de alguma idade, vivem agora das suas reformas de uma vida inteira de trabalho) mas sim da única forma de viverem o resto dos seus dias sem a carga emocional de terem responsabilidades em incumprimento e consequentes responsabilidades bancárias e outras entidades por liquidar, vencidas, sem fim à vista.

  6. A sua expectativa foi, nos 5 anos de processo, obter a exoneração do passivo restante, sempre acreditaram nisso e foi por isso que continuaram a fazer entregas avultadas de dinheiro mês após mês.

  7. Desde o primeiro relatório do Sr. Fiduciário que dos Autos resulta que apesar de terem existido entregas avultadas de dinheiro, encontravam-se montantes em falta na fidúcia.

  8. Montantes que os insolventes explicaram, com despesas que muitas das vezes não é possível documentar e um valor de rendimento indisponível nitidamente insuficiente.

  9. O mesmo será dizer que não estão verificados os pressupostos de indeferimento de exoneração do passivo restante, desde logo a existência de comportamento doloso nem tão pouco que esse comportamento tenha prejudicado gravemente os credores, e sobre esta última questão, veja-se os valores entregues os que ficaram por entregar e os valores reclamados e reconhecidos no processo.

    Para além disso sem prescindir, 11. Caso o Tribunal entenda que haverá motivo para indeferimento de exoneração do passivo restante por estarem verificados os pressupostos cumulativos desse indeferimento, importa analisar a lei sobre o momento e oportunidade dessa decisão.

  10. Entendem os devedores que os factos que, segundo os credores nos Requerimentos que antecedem, poderiam inviabilizar a sua exoneração constam do processo desde o 1º relatório do Sr. Fiduciário junto aos Autos não sendo de mais referir novamente que esses relatórios foram submetidos aos credores todos os anos.

  11. Ora, sobre isto debruça-se expressamente o art.º 243 n.º 2 do C.I.R.E no qual...

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