Acórdão nº 242/21.5T8NZR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelEMÍDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 242/21.5T8NZR-A.C1 Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra AA e sua mulher, BB, residentes na Rua ..., ..., requereram contra CC e seu marido, DD, residentes na Estrada ..., ..., ...

, a título de providências cautelares:

  1. Que os requeridos mantivessem livre e desimpedido o caminho de terra batida e betuminoso com cerca de 300 metros de comprimento com 5,40 metros de largura na entrada a nascente, onde se inicia, junto à Estrada ..., ... de largura onde termina, na extrema poente junto ao logradouro do prédio urbano ...3 encontrando-se este caminho implantado no prédio rústico (de que são proprietários os Requeridos), repondo-o, no prazo máximo de 5 dias, em condições de permitir a sua passagem a pé e de carro e dele retirando todos os objectos que impeçam a passagem a pé e de carro; b) Que se abstivessem de edificar qualquer muro ou portão, que impedisse ou dificultasse o acesso ao prédio urbano artigo ...3 e/ou prédio urbano artigo ...1.

    Para o efeito alegaram em síntese: · Que os requeridos são proprietários de um prédio rústico sito em ..., freguesia e concelho ..., inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...38, que está onerado com uma servidão de passagem a pé e de carro favor de dois prédios urbanos dos requerentes, um inscrito na matriz sob o artigo ...3 e outro inscrito na matriz sob o artigo ...1; · Que os requeridos colocaram à entrada da faixa de terreno, por onde se faz a passagem, junto à Estrada ..., umas fitas deixando livre um espaço que permite entrada de pessoas a pé, mas já não a passagem de veículos; · Que os requeridos preparam-se para colocar no mesmo local um portão de ferro de forma a impedir os requerentes de acederem aos seus prédios; · Que os requeridos têm a intenção de construir um muro em toda a extensão do comprimento do caminho junto ao prédio dos requerentes; · Que os requeridos depositaram já no caminho materiais de construção e abriram uma vala em toda a extensão do caminho.

    Os requerentes pediram ainda: 1. A condenação dos requeridos no pagamento da quantia de 100 euros por cada dia de atraso no cumprimento do pedido sob a), a título de sanção pecuniária compulsória; 2. Que os requeridos não fossem ouvidos antes do decretamento da providência, alegando, para o efeito, que caso fossem ouvidos, existia o risco sério de se frustrar o efeito prático que concretamente pretendiam atingir com as providências.

    No despacho liminar, o Meritíssimo juiz do tribunal a quo dispensou a audição dos requeridos.

    Antes da data designada para a produção da prova indicada pelos requerentes, estes vieram alegar que os requeridos haviam colocado um portão na entrada da serventia e construído um muro em toda a extensão do caminho e que o portão impedia o livre acesso ao prédio dos requerentes e o muro não permitia o acesso ao logradouro dos prédios dos requerentes.

    Em consequência pediram a alteração dos pedidos deduzidos inicialmente no seguinte sentido: · Em relação ao deduzido sob a alínea b), pediram que os requeridos fossem condenados a procederem, no prazo máximo de 5 dias, à remoção do portão de ferro que colocaram na entrada do caminho e à remoção do muro que edificaram em toda a extensão do caminho; · Em relação ao pedido de condenação no pagamento da sanção pecuniária compulsória, pediram que que os requeridos fossem condenados no pagamento da quantia de 100€ por cada dia de atraso no cumprimento não apenas do pedido deduzido sob a alínea a), mas também do formulado sob a alínea b).

    Produzida a prova indicada pelos requerentes, foi proferido despacho que decidiu: 1. Decretar a providência requerida, ordenando aos requeridos que mantivesse livre e desimpedido o caminho de terra batida e betuminoso com cerca de com cerca de 300 metros de comprimento com 5,40 metros de largura na entrada a nascente, onde se inicia, junto à Estrada ..., ... m de largura onde termina, na extrema poente junto ao logradouro do prédio urbano artigo ...3 encontrando-se este caminho implantado no prédio rústico (de que são proprietários os Requeridos), repondo-o, no prazo máximo de 10 (dez) dias, em condições de permitir a sua passagem a pé e de carro e dele retirando todos o objectos que impeçam a passagem a pé e de carro; 2. Ordenar aos requeridos que procedessem, no prazo máximo de 5 dias, à remoção do portão de ferro que colocaram na entrada do caminho e à remoção do muro que edificaram em toda a extensão do caminho; 3. Fixar, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de 50,00 € (cinquenta euros) por cada dia de atraso no cumprimento do determinado nos pontos 1 e 2 da decisão.

    Os recorridos, notificados nos termos previstos no n.º 6 do artigo 366.º do CPC, recorreram do despacho que decretou as providências, pedindo se revogasse e se substituísse esse despacho por decisão que julgasse a providência cautelar totalmente improcedente.

    Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões foram os seguintes: 1. A decisão sob recurso foi decretada com dispensa de citação dos requeridos, o que, no entender dos mesmos, constitui uma nulidade, por violação do disposto no nº 1º do artigo 366º do CPC; 2. De acordo com tal preceito o tribunal ouvirá o requerido, excepto quando a audiência puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência; 3. Constata-se, assim, que no procedimento cautelar comum a regra é a audiência do requerido; 4. Importa salientar que a falta de audiência do requerido quando não seja susceptível de colocar em risco o fim da providência cautelar configura uma nulidade processual nos termos do art.º 201º do CPC (vide nesse sentido: Tribuna da Justiça, nº 41/42, pag 16 e segs, ac. do STJ de 15-10-81, BMJ nº 310, pág 244; ac. RC de 28.6.94, BMJ nº 438, pág 567; ac. da RC de 11.10.94, CJ, Ano XIX, Tomo IV, pág 206 a 208) 5. Sucede que, à data da entrada da acção, de facto, havia actos preparatórios de uma determinada acção – construção de muro e colocação de portão – mas que, à data de inquirição de testemunhas – dia 17-12-2021 – e, claro, data de prolação de sentença – 30-12-2021 – o facto estava consumado; 6. Logo, no entender dos requeridos, no momento de audição das testemunhas o M. Juiz a quo teve conhecimento da concretização do “mal” que se pretendia prevenir, portanto, já não se verificava qualquer risco sério para o fim ou a eficácia da providência, na medida em que o acto que se pretendia impedir já tinha sido consumado; 7. Defendem os requeridos que se tivessem tido oportunidade de defesa e demonstração dos seus direitos, a decisão teria sido certamente de julgar o pedido totalmente improcedente; 8. Decidindo como decidiu, o M. Juiz a quo violou o Artigo 366.º, n.º 1 do CPC e o princípio do direito ao contraditório ínsito no artigo 3.º, n.ºs 1 e 3 e artigo 415.º, todos do CPC; 9. Nesta medida, deve ser declara a nulidade da sentença sob recurso; 10. Na sentença é por várias vezes mencionada a dimensão da serventia como sendo caminho de terra batida e betuminoso com cerca de 300 metros de comprimento com 5,40 metros de largura na entrada Nascente, onde se inicia, junto à Estrada ..., ... m de largura onde termina, na estrema poente junto ao logradouro do prédio urbano artigo ...3; 11. Sucede que, nenhuma prova foi produzida quanto ao comprimento de serventia, e a ter sido, só poderia ser prova testemunhal que não tem espelho na prova documental; 12. Olhando para os documentos 19 e 28, facilmente se percepciona, até a olho nu, que a serventia jamais pode ter 300 metros de comprimento, mas sim, de cerca de 100 metros de comprimento; 13. Pese embora a apreciação de uma providência cautelar possa tendencialmente ser injusta, pela própria natureza da acção, acrescendo ao facto de não terem sido citados os requeridos, é manifesto que o M. Juiz a quo errou ao decretar a demolição do muro numa extensão de 300 metros pois desta forma implicaria a demolição de construções dos requeridos no prédio a Poente desta serventia, que não é objecto desta acção; 14. Já quanto às dimensões do portão, mais se dirá que não resulta da sentença qual a prova produzida que levasse à decisão de que “…. encontrando-se as duas partes laterais sem qualquer abertura, forçosamente tal circunstância limita o acesso de passagem a veículos de maiores dimensões, como pesados, ambulâncias ou carros de bombeiros.”; 15. Relembremos que os requeridos também usam a serventia (imposta no seu prédio) para acesso à sua casa de habitação, sendo esta o único acesso à mesma; 16. Cremos que também aqui andou mal o M. Juiz a quo, ao não ter apurado as dimensões exactas do portão, proferiu uma decisão de remoção do mesmo, sem qualquer apreciação fáctica e concretização da largura real do portão e a largura dos mencionados veículos, violando o princípio da equidade; 17. O que importa a nulidade da decisão, por falta de fundamentação; 18. Constituem pressupostos principais da providência cautelar não especificada: que muito provavelmente exista o direito tido por ameaçado – objecto da acção declarativa – ou que venha a emergir de decisão a proferir em acção constitutiva, já proposta ou a propor; que haja fundado receio de que outrem antes de proferida a decisão de mérito cause lesão grave e dificilmente reparável a tal direito; que ao caso não convenha nenhuma das providências tipificadas nos arts. 377.º a 409.º; que a providência requerida seja adequada a remover o periculum in mora concretamente verificado e a assegurar a efectividade do direito ameaçado; que o prejuízo resultante da providência não exceda o dano que com ela se quis evitar; 19. A jurisprudência vem entendendo que não basta um juízo de probabilidade, tornando-se necessário um juízo de realidade ou de certeza ou, pelo menos, um receio fundado, não bastando, por isso, qualquer simples receio, que pode corresponder a um estado de espírito que derivou de uma apreciação ligeira da realidade, um juízo precipitado das circunstâncias; 20. Este fundado receio pressupõe que o titular do direito se encontra perante...

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