Acórdão nº 569/21.6T8PBLA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | CRISTINA NEVES |
Data da Resolução | 05 de Abril de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam os Juízes na 3ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO AA, intentou acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra BB, de nacionalidade espanhola e com residência em ..., nº 4, ..., ..., ..., Espanha, peticionando a sua condenação a: - reconhecer que o demandante tem direito de regresso relativamente às quantias pagas no âmbito das execuções onde ela era executada; - reconhecer que o demandante tem direito de proceder à compensação de créditos; - pagar ao demandante a quantia de €37.372,23 (trinta e sete mil trezentos e setenta e dois euros e vinte e três cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, atualmente 4%, desde a citação até integral pagamento.” Para fundamentar os seus pedidos alega os seguintes factos: “1- O processo de divórcio litigioso número 1640/04.... correu termos pelo ... Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca ..., onde foi requerente a aqui demandada e requerido o aqui demandante.
(…) 4- Após trânsito em julgado da sentença de divórcio, a aqui demandada instaurou processo de inventário para partilha dos bens comuns, o qual correu por apenso ao referido processo de divórcio com o número 1640/04.....
(…) 8- A mandatária forense da interessada BB, no processo de divórcio, e primeira mandatária no inventário, renunciou à procuração e instaurou ação de honorários contra a referida requerida – Processo 1640/04.....
9- Foi proferida sentença condenando a demandada BB no pagamento de €13.329,26, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos desde a citação.
10- A mesma mandatária instaurou também, contra a demandada BB, o procedimento de injunção nº 103574/10...., onde pedia determinada quantia.
11- Foi aposta fórmula executória na referida injunção.
12- Com base na sentença do referido processo 1640/04...., foi instaurada a execução 1640/04.... contra a interessada BB.
13- Com base na fórmula executória, foi instaurada a execução 103574/10.... contra a referida BB.
14- Nas referidas execuções, procedeu-se à penhora da meação da interessada BB.
(…) 34- Na sequência da arguição de nulidade desta conferência e sua procedência (…) realizou-se, no dia 09-12-2015, nova conferência de interessados.
35- Como consta da referida ata, o cabeça de casal, ora demandante, licitou todos os bens.
36- Elaborado o mapa informativo, a folhas 933, nele ficou a constar que a interessada BB tem direito a tornas no valor de €98.428,815 e que, tendo já recebido €90.000,00, falta pagar €8.428,815. Doc 01.
37- Por requerimento de 13-09-2016, (…) advogada credora da demandada BB, requereu o depósito das tornas 38- Por despacho de 07-11-2016, de folhas 939 a 940, com a referência 83464378, foi ordenada a notificação da interessada BB, ora demandada, para restituir a quantia de €90.000,00, que havia recebido como tornas por efeitos da 1ª conferência de interessados e que havia sido julgada nula pelo referido Acórdão do TR..., a fim do ora demandante poder proceder ao depósito de tornas.
(…) 44- A demandada BB não restituiu a referida quantia.
(…) 53- Tendo-se frustrado a restituição da quantia de €90,000,00, em poder da interessada BB, ora demandada, teria o cabeça de casal, ora demandante, de pagar a quantia exequenda para evitar o prosseguimento das execuções e evitar ter de pagar (depositar) outra vez o valor das tornas.
54- Assim, a 12-11-2018, o cabeça de casal, ora demandante, procedeu ao pagamento da quantia de €31.566,05, referente às quantias exequendas, juros, de mora, juros compulsórios e custas, declarando ao agente de execução que o fazia nos termos do disposto nos artigos 767º d CC e 846º do CPC para efeitos do disposto no artigo 592º do CC (sub-rogação).
(…) 56- O agente de execução emitiu documento de quitação da quantia de €31.566,05, referente à liquidação do valor das quantias exequendas nos processos 765/15...., 765/15...., 2595/05.... e 3838/15...., consignando que “o referido valor de 31.566,05€, destina-se ao pagamento das quantias exequentes, bem como, a todos os custos que lhe estão associados (uros de mora, juros compulsórios, honorários e despesas do agente de execução”.
(…) 58- Mais consta do referido documento o seguinte: “Declara-se, ainda para efeitos de sub-rogação, que tal pagamento na referida quantia de 31.566,05 €, foi realizado por terceiro (Sr" AA), nos termos do disposto nos artigos 592º e 767º ambos do Código Cível e 846º do Código do Processo Civil, pelo que serão de imediato cessadas as execuções, sendo as mesmas levadas à liquidação/conta, para posterior extinção.” (…) 65- Por requerimento de 16-05-2019, de folhas 1041 a 1042, com a referência 32441624, a advogada credora da interessada BB, ora demandada, comunicou ao processo que as quantias exequendas haviam sido pagas.
(…) 67- Por despacho de 12-09-2019, de folhas 1044, com a referência 91843377, foi declarado que, face ao requerimento da exequente e ao requerimento do cabeça de casal, ora demandante, a interessada BB, ora demandada, prescindiu do depósito das tornas..
68- A 12-10-2019, a secretaria do Tribunal procedeu à elaboração de novo mapa de partilha, como consta do auto de folhas 1046 a 1047, com a referência 92274941.
69- Consta do referido mapa de partilhas que a interessada BB, ora demandada, recebeu tornas do cabeça de casal AA, ora demandante, no valor de €98.428,815.
70- Por sentença de 02-12-2019, de folhas 1049, com a referência 92629127, a partilha foi homologada.
71- A sentença homologatória da partilha transitou em julgado, como consta da certidão que se junta.
(…) 73- Por requerimento junto ao processo nº 1640/04.... a 18-03- 2021, a aqui demandada reclamou custas de parte ao aqui demandante no valor de €765,00.
(…) 75- Por cartas registadas remetidas a 08-04-2021, uma para a ora demandada e outra dirigida para o seu mandatário forense, o ora demandante invocou o direito de compensação, dizendo o seguinte:“No seguimento da Vossa carta datada de 18-03-2021, onde reclamava o pagamento de custas de parte à Vossa cliente no valor de €765,00, informo que invoco a compensação de créditos, uma vez que tenho um crédito sobre a Vossa cliente no valor de €23.137,23, referente a parte do valor que paguei por ela nas execuções por penhora de tornas conforme foi explicado no requerimento que juntei oportunamente ao processo de inventário.
(…) 77- Por outro lado, foi relacionado, sob a verba nº 50 da relação de bens do referido inventário nº 1640/04...., o seguinte bem: “veículo automóvel, marca ..., modelo ... ..., com a matrícula ..-..-JL, com o valor de 15.000 euros.
78- Era a demandada quem usava e detinha a referida viatura automóvel no decurso do referido inventário.
79- Porém, alienou a referida viatura, recusando pagar ao demandante o valor atribuído no inventário (€15.000,00).
80- Consequentemente, a demandada deve indemnizar o demandante no referido valor de €15.000,00 (artigo 483º do Código Civil).
81- Valor que foi considerado no referido inventário, no valor dos bens adjudicados ao demandante e no valor das tornas devidas à demandada.
82- Valor de que o demandante está privado e a demandada enriquecida.” * Citada veio a R. apresentar contestação suscitando, no que ao caso importa, a incompetência internacional do presente Tribunal para apreciação da presente acção, sendo competentes os Tribunais Espanhóis alegando que ao caso é aplicável o Regulamento (UE) n° 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, que estabelece, no seu artigo 4 nº 1, que as pessoas domiciliadas num Estado-Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado-Membro.
* Notificado, veio o Autor responder à excepção, alegando que “De acordo com o disposto no artigo 6º, nºs 2 e 3 do Regulamento (EU) nº 1215/2012 de 12 de dezembro, os tribunais portugueses são internacionalmente competentes.” * Após, pelo tribunal recorrido, designada audiência prévia, foi proferida decisão que julgou “improcedente a excepção dilatória de incompetência absoluta deste Tribunal, por infracção das regras de competência internacional, invocada na contestação pela Ré BB.” * Não se conformando com esta decisão, dela apelou a R. ora recorrente, formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões, que se reproduzem: “III – CONCLUSÕES: III.I – Do Princípio da Segurança Jurídica 1. O ordenamento jurídico da União Europeia inspira-se, entre outros, no Princípio de Segurança Jurídica.
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Isto é, o Princípio de Segurança Jurídica pretende outorgar um alto grau de previsibilidade aos destinatários das normas sobre o conteúdo e as consequências das mesmas, exigindo para tal efeito que as regras jurídicas emanadas das instituições da União Europeia respeitem uma série de critérios, entre eles, os de uma formulação clara e inequívoca.
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Assim sendo, resulta necessário e imprescindível que os tribunais dos Estados-Membros, na aplicação do direito da União Europeia, garantam a efectividade do Princípio de Segurança Jurídica mediante a observância da jurisprudência do Tribunal de Justiça.
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O Autor já não havia recentemente sido alertado para esse efeito, pois, por recente decisão de 22.11.2020, proferida no âmbito do Processo nº1640/04...., que correu termos no Juízo de Família e Menores ..., e na qual este requereu que viesse a ser “declarada a cessação do dever do requerente AA prestar alimentos à requerida BB, e que se ordene ainda a comunicação à caixa “...”, com sede em BP 10, 33278 ..., França, da cessação de tal dever, a fim de cessarem os descontos na pensão de reforma do requerente”, foi julgada verificada “a exceção dilatória de incompetência absoluta – internacional” deste Tribunal – sublinhado nosso. E assim se decidiu igualmente por a aqui Ré e ali Requerida, ter em “Espanha o centro social e efetivo onde se desenvolve” a sua vida – sublinhado nosso.
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Não obstante, continuou o Autor, agora por...
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