Acórdão nº 2136/18.2TBACB-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução05 de Abril de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I - Na Execução que o B..., S.A., movia a AA e a BB, para deles haver a quantia de € 37 850,96, tendo sido habilitada na posição daquele executado, entretanto falecido, CC, veio esta embargar de executado deduzindo, à cabeça, incidente de intervenção principal provocada, requerendo a intervenção na causa, ao lado do Banco embargado, da C... SA, devendo a mesma ser citada para os termos do incidente, seguindo-se os demais termos até final, com a extinção da execução.

Alegou, em síntese, ter sucedido na herança do pai, mutuário junto da exequente de financiamento para a aquisição de habitação própria e permanente, e que a execução visa a cobrança do valor remanescente e acréscimos legais do capital, juros e despesas respeitantes aquele mútuo, sendo que, para segurança dos capitais mutuados e demais quantias referenciadas nas escrituras publicas e nos documentos complementares que, respectivamente, as integram, foram constituídas hipotecas voluntárias sobre o imóvel e, por exigência do Banco mutuante, foi subscrita pelos mutuários e a seu favor uma apólice de seguro de vida, onde se previa, designadamente, a cobertura do evento morte de qualquer dos mutuários. Entende que havendo um terceiro garante do cumprimento das prestações devidas pelos mutuários na sequência do mútuo era a esse terceiro que, em primeira linha, o Banco se devia ter dirigido, a fim de obter dele a quantia em falta, por se ter verificado o sinistro coberto pela apólice contratada, o que era do seu conhecimento. A esta oposição cumulou embargos à execução, invocando os factos já referidos, concluindo que, sendo o Banco embargado conhecedor de que em primeira linha podia obter da seguradora a restituição do capital mutuado, agiu com ofensa do principio da boa fé dos contratos previsto no art 762º /2 do CC, incorrendo em abuso de direito, ao executar os mutuários e agora também a embargante.

O Banco embargado apresentou oposição mas a mesma não foi admitida.

Foi proferida decisão em que se indeferiu a pretendida intervenção principal provocada da “C...”, essencialmente, por se entender «não ser possível enxertar na oposição à execução uma espécie de acção declarativa contra o terceiro, por tal não se adequar ao objecto da oposição (ou da execução)», tendo-se entendido também não estar «configurada e/ou peticionada uma intervenção (que seria acessória e para auxiliar a requerente) para hipótese de eventual acção de regresso contra o terceiro (tal acção seria o fundamento do chamamento e, portanto, entende-se que deveria ser invocada, enquanto causa de pedir)».

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II – É do assim decidido que a embargante apela, tendo concluído as respectivas alegações, do seguinte modo: 1ª – Apesar de os incidentes declarativos estarem mais vocacionados para o processo declarativo, não se pode afastar a aplicação dos mesmos ao processo executivo, como decorre do previsto no art. 551º, nº 1, do CPC; 2ª – Pelo que, tendo os mutuários feito transferir a sua responsabilidade pelo bom pagamento do mútuo ao mutuante, para seguradora por ele expressamente considerada como idónea; 3ª – Tendo esta assumido a posição de garante da obrigação, o que, aliás, decorre do próprio título executivo, era esta que deveria ter sido demandada pelo mutuante e não a apelante; 4ª – Daí que, bem andou esta em fazer intervir, através do incidente que deduziu, a seguradora, para ali assumir a posição de garante da obrigação que aceitou cobrir em vez dos mutuários seus segurados; 5ª – Pelo que, esta é uma das formas de fazer intervir na ação executiva terceiro garante que, em vez dos devedores, é chamado a cumprir; 6ª – Tal não obsta a tal incidente despoletado pela apelante, nem objeta o pedido por esta formulado, a saber o convencimento da seguradora; 7ª – O qual foi erradamente entendido pelo Mmo. Juiz “a quo” como insuscetível de ser compreendido no âmbito da ação executiva, ao arrepio do que a jurisprudência dos nossos tribunais superiores tem vindo a entender como aplicável nos casos como o dos presentes autos; 8ª – Na verdade, especialmente, no que tange aos mútuos concedidos para aquisição de habitação própria e permanente, com garantia real, dada a eminência do direito de habitação, constitucionalmente consagrado, tem sido aceite a intervenção de seguradora que assumiu a cobertura do risco vida; 9ª – O que sucede no caso em apreço, já que está em causa o incumprimento de um mútuo dessa natureza e a suscitar uma proteção acrescida por parte do sistema jurídico; 10ª – Outrossim, caso o entendesse, o Mmo. Juiz “a quo” sempre poderia convolar em outro incidente que julgasse mais apropriado, designadamente o de intervenção acessória, pois, no alegado sempre encontraria suporte para tal e não refugiar-se em suposta carência de petitório para tal efeito.

Tudo ponderado, o incidente deduzido pela apelante é o aplicável ao caso em apreço, à míngua de norma legal ou princípio jurídico que o afaste, pelo que o Mmo. Juiz “a quo” fez interpretação equivocada do disposto no art. 316º e ss., do CPC, ao não julgar aplicável à ação executiva o regime jurídico dos incidentes da instância, sendo que, o art. 551º/1 do CPC, manda aplicar, subsidiariamente as normas do processo declarativo ao processo executivo.

Não foram proferidas contra-alegações.

III – Consta do titulo dado à execução: 1- Por escritura pública de 14 de Agosto de 2003, outorgada no Cartório Notarial ..., lavrada de fls. 7 a fls. 9v do livro de notas para escrituras diversas n.º 171-B e documento complementar anexo, os executados celebraram com B..., S.A., o contrato de mútuo, concedido no montante de € 60.603,94- Cfr. Documento n.º 1 que ora se junta.

2- A quantia mutuada foi creditada na conta de depósitos à ordem n.º ...46, aberta em nome dos mutuários junto do Banco - Cfr. Cláusula 1.ª do documento complementar já junto sob o n.º 1.

3- O empréstimo foi concedido pelo prazo de 19 anos, a ser amortizado em 228 prestações mensais e sucessivas de capital e de juros - Cfr. Cláusula 2.ª do documento complementar já junto sob o n.º 1.

4- Para garantia do pontual pagamento da quantia mutuada, bem como dos juros à taxa anual efetiva de 5,46%, acrescida da sobretaxa até 4%, devida a título de cláusula penal, em caso de mora, e das despesas judiciais e extrajudiciais fixadas para efeitos de registo em € 2.424,16, os executados constituíram hipoteca voluntária a favor do B..., S.A., sobre a seguinte fração: - Fração autónoma designada pela letra "Z" do prédio urbano sito na Rua ..., ..., corpos A e B, freguesia e concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...93 e inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...33, da referida freguesia.

5-Tal hipoteca encontra-se devidamente registada a favor do Banco, ora Exequente - Cfr. Documento n.º 2 que ora se junta.

6- Sucede que, em 25 de Março de 2018, os executados não liquidaram a prestação que se venceu nessa data, nem as posteriormente vencidas.

7- Pelo que, conforme disposto no artigo 781.º do Código...

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