Acórdão nº 5965/18.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelMÁRIO RODRIGUES DA SILVA
Data da Resolução09 de Novembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra RELATÓRIO ASSEMBLEIA DOS COMPARTES DA FREGUESIA DO C...

intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra P..., S.A.

, (..., P..., S.A.) e I..., S.A.

, (..., I..., S.A.), pedindo que se reconheça os direitos de propriedade da autora sobre os terrenos baldos do C..., e, em virtude da violação desses direitos: i) Condenar-se as rés no pagamento de uma indemnização, sob a forma de renda, calculada com base na produção de energia e na proporção da área afetada pela ocupação ilícita, de montante a determinar em sede de liquidação de sentença; ii) Condenar-se as rés no pagamento de indemnização calculada com base na produção de energia e na proporção da área afetada pela ocupação ilícita, de montante a apurar em sede de liquidação de sentença, respeitante ao período compreendido desde o segundo semestre de 2016 (inclusive) até ao trânsito em julgado da decisão final de liquidação de sentença.

Ademais, em virtude da inviabilização do contrato prometido de 17/06/2003, deverão as rés ser condenadas: a) no pagamento de indemnização, sob a forma de renda anual, em montante nunca inferior a €65.860 (dada a redução de pedido operada, já não €83.824,00, a vencer a 31 de janeiro de cada ano; e b) e no pagamento de indemnização de montante nunca inferior a €102.023,45 (e dada a redução operada, já não €129.845,42, acrescidos dos juros moratórios vencidos e vincendos, até ao trânsito em julgado da sentença, respeitante ao período não compensado desde o segundo semestre de 2016 até ao final do ano de 2017.

Alegou para tanto e em síntese: -A autora é uma comunidade local.

-A 1ª ré é uma sociedade anónima que se dedica à produção de eletricidade de energia eólica, geotérmica, solar e de origem, explorando atualmente o Parque Eólico da P....

-A 2ª ré é uma sociedade anónima que se dedica à atividade comercial de desenvolvimento, avaliação e realização de estudos e projetos de energias renováveis, sem prejuízo das demais atividades económicas que compõem o seu objeto social, e que está em relação de grupo com a 1ª ré.

-A 6 de julho de 1999, a Junta de Freguesia do C... e a PES.., LDA. celebraram um contrato-promessa de cessão de exploração de terrenos baldios pertencentes aos compartes daquela freguesia, a fim de ali instalar e explorar aerogeradores para produção de energia eólica e sistema de ligação à rede elétrica nacional.

-Em cumprimento daquele contrato-promessa, aquela junta e a PES.., LDA. celebraram o prometido contrato de cessão de exploração de terrenos baldios em 17 de junho de 2003.

-A posição contratual da PES.., LDA., enquanto outorgante exploradora dos terrenos, acabou por ser transmitida à sociedade E... ENERGIAS RENOVÁVEIS, LDA., a qual, por sua vez, foi incorporada, mediante fusão, na sociedade 2.ª ré em 2009, permanecendo, assim, esta vinculada aos contratos até aos dias de hoje.

-Nunca chegaram a ser instalados aerogeradores nos Baldios do C... porque outros aerogeradores construídos pela 1ª ré, foram instalados nos terrenos baldios do concelho da P... que confrontam diretamente com os terrenos baldios da freguesia do C... (concelho de G...), inviabilizando a implementação de um parque eólico nos Baldios do C....

-Esses aerogeradores foram construídos ao abrigo de um “Acordo de Cooperação e Arrendamento” com a Câmara Municipal da P... (doravante, CM...) e iniciaram a sua laboração durante o ano de 2006.

-Pelo menos, 6 dos 14 aerogeradores instalados nos terrenos baldios do concelho da P... ocupam espaço aéreo dos Baldios do C..., sendo que o próprio estradão construído para dar acesso àquele parque invade território dos Baldios do C....

-Na sequência de um «protocolo de divisão da energia eólica» datado de 22 de agosto de 2006, celebrado entre o Município da P... e o Município de G..., este último celebrou em 26 de janeiro de 2007, um protocolo com a freguesia do C..., ao abrigo do qual transferia para esta, semestralmente, um montante correspondente a 0,625% da verba entregue pelo Município da P... ao Município de G... ao abrigo do protocolo de 2006. recebida da CM... proveniente desse acordo e enquanto este.

-Em 2017, o Município da P... rescindiu unilateralmente o protocolo celebrado em 2006 com o Município de G...

, o que terá levado a que a freguesia do C... deixasse de receber, desde o segundo trimestre de 2016, a compensação acima referida.

-Sofreu os seguintes danos: 1) a compressão/diminuição do direito de propriedade dos compartes da autora (com a concomitante restrição dos direitos de uso e desvalorização dos terrenos) e 2) a compensação que teria recebido (e não recebeu) com a construção, nos terrenos dos compartes, do inviabilizado parque eólico no âmbito da execução do contrato existente entre a 2ª ré e a autora.

-Tem direito a ser indemnizada nos termos do artigo 1347º, nºs 2 e 3, do CC.

-Subsidiariamente se assim não se entender, sempre terá a autora direito a ser indemnizada nos termos gerais da responsabilidade civil extracontratual.

As rés P..., S.A. e I..., S.A., coligadas, contestaram, em síntese: -A segunda ré excecionou preterição de tribunal arbitral, assim como a sua ilegitimidade ad substantiam.

-Ambas as rés defenderam-se por impugnação, considerando que não se verificam as alegadas responsabilidade por instalações prejudiciais e responsabilidade civil extracontratual.

A autora respondeu à exceção dilatória deduzida, sustentando a sua improcedência.

Por despacho de 4-1-2019, foi julgada parcialmente procedente exceção de incompetência do tribunal em razão de preterição de tribunal arbitral voluntário, relativamente à 2ª ré, e no respeitante aos pedidos fundados na inviabilização do contrato prometido de 17/06/2003 (supra II), e assim estes Juízos Cíveis da Instância Central incompetentes para preparar e julgar estes autos, nesse particular, sendo competente para o efeito o Tribunal arbitral voluntário e nessa decorrência, com parcial absolvição da instância da 2ª ré (circunscrita a tal pretensão), prosseguindo no mais.

Em sede de despacho subsequente, procedeu-se à fixação do valor à causa, após prévio convite de indicação de valor aos subpedidos ilíquidos, e homologou-se redução de subpedidos entretanto apresentada; operou-se o demais saneamento e enunciou-se o objeto de litígio; indicaram-se factos assentes e houve formulação dos temas de prova.

Realizou-se audiência final.

Foi proferida sentença que condenou as rés no pedido de reconhecimento dos direitos de propriedade da autora sobre os Terrenos Baldios do C..., no mais se absolvendo do pedido.

Inconformada com o decidido, a autora ASSEMBLEIA DOS COMPARTES DA FREGUESIA DO C... interpôs recurso, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões (que se reproduzem): “I) A sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia, porque o douto tribunal a quo não apreciou as questões [suscitadas na PI] de saber se, em virtude da violação do direito de propriedade da Autora, se verifica uma desvalorização dos seus terrenos e de saber em que medida esses terrenos contribuem para a produção energética do parque eólico da 1.ª Ré; II) e, mesmo que se entenda que ficaram prejudicadas com a solução dada a outras questões, o aresto recorrido não o explicita e também não o conseguimos vislumbrar, havendo então aqui um erro de julgamento.

iii) A sentença padece também de nulidade por excesso de pronúncia e violou o caso julgado do despacho de 04-01-2019, pois absolveu a 2.ª Ré de todos os pedidos indemnizatórios quando já a havia absolvido da instância em relação aos pedidos a) e b) da PI.

iv) A sentença incorreu ainda num conjunto de erros de julgamento na apreciação da matéria de facto e da matéria de direito, particularmente na aquilatação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual das rés. Pois vejamos: v) Perante os factos provados Q), T) in fine45, V), W) e X), resulta demonstrado que foram excedidos, de forma ilícita, os limites materiais da propriedade da Autora –pressuposto do facto ilícito voluntário.

vi) Perante os factos provados D), E), F), G), I), P), BB), CC), QQ) in initio46 e UU), resulta que, entre outras coisas, a Autora, desde a data da celebração do contrato-promessa de 06-07-1999 (Contestação) ou Doc. n.º 1/da celebração do contrato prometido de 17-06-2003 (Doc. n.º Contestação), tinha uma expectativa jurídica de vir a ser explorado o 2/ potencial eólico dos terrenos da faixa sul sub judice e de vir a receber a correspetiva contrapartida contratual, expectativa esta que foi reforçada com a assunção da posição contratual pela 2.ª Ré em 2009 e com a celebração do aditamento de 09-05-2013 /Contestação (Doc. n.º 4).

vii) E impugnam-se expressamente as alíneas de facto OO), PP), QQ) in fine47, RR) e SS), devendo ser totalmente revogadas da matéria de facto, por estarem em contradição com os factos provados acabados de indicar (os da conclusão VI) e, bem assim, por resultarem de uma (os da conclusão apreciação errada dos contratos sub judice, da real vontade das partes a eles subjacente e do articulado das rés, em particular da cl. 3.ª do contrato-promessa /Contestação), da cl. 3.ª do contrato prometido (Doc. n.º 1 (/Contestação) e do art.º 154.º da Contestação, nos quais é Doc. n.º 2 identificada uma “fase imediata” (meramente transitória, instrumental e acessória) de medições ou estudos e um “fim” contratual que consiste na efetiva exploração eólica dos terrenos da Autora. Além disso, viii) dos contratos podemos concluir que a 2.ª Ré tinha uma obrigação de Meios (de adotar todas as diligências possíveis para alcançar o licenciamento e construção do almejado parque eólico) e que o “fim” contratual estava sujeito a condição suspensiva (a obtenção dos licenciamentos necessários).

ix) A supramencionada expectativa jurídica corresponde a um interesse da Autora em impedir atos de terceiro que ultrapassem os limites materiais das suas propriedades, o qual é concreto (ou prático), legítimo, materializável (ou...

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