Acórdão nº 2104/18.4T8CLD-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução09 de Novembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: Fonte Ramos Adjuntos: Alberto Ruço Vítor Amaral Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 08.11.20221, AA deduziu o presente incidente de incumprimento de responsabilidades parentais contra BB, seu pai, pedindo que seja: declarado verificado o incumprimento e o Requerido condenado a pagar todas as despesas tidas pela Requerente com a sua formação académica, já vencidas, e as que se vierem a vencer no futuro durante todo o percurso académico (1.); fixada a pensão de alimentos no montante de € 375 mensais, em cumprimento do disposto na alínea f) do Acordo de Responsabilidades Parentais homologado por sentença, e por ser este o montante que melhor conseguirá satisfazer as novas e reais necessidades da Requerente (2.); o Requerido condenado no cumprimento do estipulado quanto à comparticipação do pagamento de metade das despesas escolares, nomeadamente as referentes a propina, alojamento e despesas escolares, com livros e outros materiais de estudo (3.), bem como da quantia de € 1 460,64, já vencida, valor já calculado na proporção a cargo do Requerido, acrescido de juros desde a citação até integral pagamento (4.).

Alegou, em síntese: ingressou no ensino superior em setembro de 2021; o Requerido não cumpre o acordo de regulação das responsabilidades parentais; através da progenitora, assumiu os encargos de candidatura à universidade, alojamento, deslocações e transporte, e aquisição de mobiliário; impõe-se aumentar a pensão alimentícia face às suas atuais necessidades e encargos.

O Requerido, por requerimento de 02.12.2021, invocou a exceção de erro na forma do processo e, por impugnação, nomeadamente, que foi a Requerente quem incumpriu o acordo de regulação das responsabilidades parentais para efeitos da exigência da compartição nas despesas escolares da Faculdade e o Requerido não dispõe de condições financeiras para proceder ao aumento da pensão de alimentos. Concluiu pela procedência da exceção e a improcedência do pedido.

Inviabilizada a conciliação das partes e tendo a requerente apresentado alegações, foi proferido despacho a indeferir a matéria de exceção.

Realizada a audiência de julgamento, o tribunal a quo, por sentença de 23.5.2022, declarou o incumprimento pelo requerido do acordo celebrado a 21.10.2020 quanto aos encargos com as necessidades educativas da requerente após a maioridade, condenando-o ao pagamento da quantia de € 2 420,75, referente ao período de setembro de 2021 a abril de 2022 e às despesas descritas nos pontos 17) a 19) dos factos provados; e julgou improcedente o demais peticionado, inclusive, sobre a alteração da pensão de alimentos a suportar pelo Requerido.

Inconformado, o Requerido apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - A decisão recorrida está ferida de nulidade por ambiguidade - o Tribunal a quo decidiu, por um lado, que existiu incumprimento do acordo quanto às necessidades educativas da Requerente após a maioridade (cf. ponto a) do dispositivo), mas por outro lado julgou improcedente o pedido de alteração da pensão de alimentos (cf. ponto c) do dispositivo).

2ª - Não se alcança assim, como é que tendo sido julgado improcedente o pedido de alteração da pensão de alimentos, pode o tribunal a quo, em simultâneo, declarar que existiu incumprimento desse acordo, quando o fundamento desse incumprimento é precisamente a alteração da pensão de alimentos que o Tribunal julgou improcedente.

3ª - Se o Tribunal a quo julga improcedente o pedido de alteração da pensão de alimentos, não pode ao mesmo tempo, sob pena de contradição, declarar que existiu incumprimento desse acordo, quando o fundamento desse incumprimento é precisamente a alteração da pensão de alimentos, contemplando novas despesas manifestamente superiores.

4ª - A sentença, nas ditas alíneas do seu dispositivo, contém ambiguidade e obscuridade que tornam ininteligível a decisão quanto à pensão de alimentos a suportar no futuro pelo Recorrente.

5ª - A sentença do Tribunal a quo por conter ambiguidade e obscuridade que tornam ininteligível a decisão, é nula nos termos do disposto no art.º 615º-1 alínea c), 2ª parte do CPC, nulidade que aqui expressamente se invoca.

6ª - O Tribunal a quo julgou incorretamente a matéria de facto relativa à candidatura da Requerente ao ensino superior público, constante do ponto 6) da matéria de facto provada, uma vez que não teve em consideração os meios de prova constantes do processo, que impunham decisão diversa da recorrida, quanto a este ponto.

7ª - Sobre esta matéria depuseram a Requerente e a testemunha CC e, face aos elementos referenciados, crê o Recorrente estar demonstrado que deve ter-se por não provado que “a Requerente candidatou-se no regime público de candidaturas ao ensino superior, e não conseguiu ser admitida em nenhuma Universidade pública”, devendo consequentemente esta matéria ser eliminada do referido ponto 6.

8ª - O Recorrente, nas alegações que apresentou nestes autos, requereu a notificação da mãe da Requerente para juntar aos autos a sua declaração de IRS, pedido deferido pelo Tribunal a quo, determinado a notificação da progenitora da Requerente para juntar aos autos a declaração de IRS relativa aos anos de 2018, 2019 e 2020.

9ª - Por requerimento de 17.5.2022, a Requerente juntou aos autos a declaração de IRS de 2019 e 2020 da sua progenitora.

10ª - Da declaração de IRS de 2019 da mãe da Requerente, consta que esta no ano de 2019, obteve um rendimento global líquido de 3 455,82 €.

11ª - Da declaração de IRS de 2020 da mãe da Requerente, consta que esta no ano de 2020, não obteve qualquer rendimento, apresentando inclusivamente perdas a reportar, no valor de 16 530,20 €.

12ª - Não obstante a junção destes documentos, o Tribunal a quo não os levou em consideração na decisão que proferiu, nem fez constar da matéria de facto assente - ao contrário do que sucedeu quanto aos rendimentos auferidos pelo Recorrente (cf. pontos 22 e 23 da fundamentação de facto) - os factos que estes documentos evidenciam, i. é, os rendimentos auferidos pela progenitora da Requerente nos anos de 2019 e 2020.

13ª - Considerando que a alteração do acordo de regulação das responsabilidades parentais, pretendida pela Requerente, na medida em que implica que as despesas de educação em causa, sejam suportadas em partes iguais por ambos os progenitores, obriga também e necessariamente a aferir os rendimentos da mãe da Requerente, igualmente obrigada a prestar alimentos à sua filha, crê-se que o Tribunal a quo deveria ter considerado os documentos em questão.

14ª - Face a tais elementos de prova e no contexto aludido, crê o Recorrente que se encontram provados os seguintes factos, que devem como tal ser aditados, como pontos 28 e 29) à matéria de facto tida como provada e considerados na decisão da ação: “28. A mãe da Requerente, no ano de 2019, obteve um rendimento global líquido de € 3 455,82 29. A mãe da Requerente, no ano de 2020, não obteve qualquer rendimento, apresentando perdas a reportar no valor de € 16 530,20.” 15ª - O Tribunal a quo considerou existir incumprimento pelo Recorrente do acordo de responsabilidades parentais celebrado a 21.10.2020.

16ª - A decisão do Tribunal a quo assenta nas seguintes premissas i) considera que não obstante o regime de alimentos fixado pelos progenitores da Requerente, e a cláusula de revisão constante do artigo 3º/ e) desse acordo, o direito a alimentos quanto a necessidades educativas da Requerente, após a maioridade, não tem de obter a concordância do Recorrente nessa revisão, e ii) considera que a obrigação de suportar os encargos com as necessidades educativas da Requerente se manteve após a maioridade desta e que na falta de revisão consensual, cabe ao Recorrente suportar metade das despesas escolares, entendidas como metade dos encargos conexos com a admissão e frequência, e que correspondem a metade das despesas descritas nos pontos 17) a 19) dos factos provados.

17ª - A questão que importa analisar é a de determinar, se face ao regime de alimentos fixado em 21.10.2020, maxime face ao teor cláusula de revisão constante do art.º 3º/ e) desse acordo, o direito a alimentos quanto a necessidades educativas da Requerente, após a maioridade, carece ou não de obter a concordância do Recorrente nessa revisão. O Tribunal a quo entende que não, mas crê o Recorrente que sem razão.

18ª - No acordo de regulação das responsabilidades celebrado em 21.10.2020 e ainda vigente, ficou estipulado que o Recorrido: i) pagaria à Requerente a título de pensão alimentar, a quantia mensal de € 225 (cf. alínea c) do no 3 do Acordo) e ii) custearia, na proporção de metade, as despesas escolares, médicas e medicamentosas da Requerente (cf. alínea d)).

19ª - Ficou também estipulado que, relativamente ao ano letivo de 2021/2022, caso, a Requerente, já então maior, entrasse na faculdade, a quantia relativa à pensão alimentar seria “revista, entre ela e o progenitor em função das novas necessidades da mesma, no que respeita nomeadamente à necessidade de aposento e de alimentação fora de casa” (cf. alínea e)).

20ª - Tal como resultou provado, o Recorrente, sempre cumpriu com o pagamento da pensão de alimentos devida à Requerente, pagando mensalmente a pensão alimentar, bem como a sua comparticipação nas despesas escolares e médicas. Daqui resultando que o Recorrente não se encontra em qualquer situação de incumprimento, nada devendo à sua filha no que respeita ao cumprimento dos valores estipulados nos termos do acordo ainda em vigor.

21ª - O cerne da questão reside assim, tão só, na revisão do valor da pensão de alimentos que a Requerente reclama, decorrente da sua entrada na Faculdade.

22ª - E quanto a este aspeto, importa desde logo evidenciar - aquilo que de resto nos parece ser inequívoco e que resulta expressamente da alínea e) do no 3) do Acordo - que a revisão do valor da pensão de alimentos vigente, no caso em apreço, dependeria, de entre outros, da existência de acordo entre a Requerente e o Requerido...

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