Acórdão nº 1936/18.8T8GRD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelFALCÃO DE MAGALHÃES
Data da Resolução28 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:1 I - A) – 2«[…] AA e BB, residentes no Lugar ..., ..., ..., intentaram a presente acção declarativa de simples apreciação contra CC e DD, residentes na Rua ..., ..., ..., peticionando a declaração de ineficácia da escritura pública de justificação outorgada no dia 13 de Dezembro de 2004, no Cartório Notarial ..., lavrada a fls. 72 a 73 verso do livro de notas para escrituras diversas n.º 64-D, bem como o consequente cancelamento do registo realizado com base nessa escritura.

Para fundamentarem a sua pretensão alegaram os autores, em síntese, que são donos e legítimos proprietários de um terreno de cultura de regadio, cultura de sequeiro, mata de carvalhas e dois castanheiros sito em ..., freguesia ..., concelho ..., com a área matricial de 4.150 m2, a confrontar do norte com EE, outro, do sul com FF (Herd.) e outro, do nascente com GG e outros e do poente com HH, inscrito na respectiva matriz rústica sob o artigo ...09, o qual adquiriram a 2 de Novembro de 1992, em virtude de adjudicação no inventário facultativo, por óbito de II e mulher JJ, com o n.º 56/1990, o qual correu termos no Tribunal Judicial da Comarca ..., prédio rústico que tratam como sendo coisa sua, fruindo de todas as suas utilidades, o que sempre ocorreu de forma pacífica e à vista de toda a gente.

Mais invocaram os autores que os réus outorgaram em 13 de Dezembro de 2004 no Cartório Notarial ... uma escritura pública de justificação, lavrada a fls. 72 a 73 verso do livro de notas para escrituras diversas n.º 64-D, onde ambos declararam que possuem o aludido prédio, em nome próprio, convictos de que lhes pertence, há mais de vinte anos por o terem adquirido pelo ano de mil novecentos e oitenta por compra verbal a II, tendo tais declarações sido confirmadas por três testemunhas.

Por fim, referiram os autores que os factos relatados nessa escritura de justificação não correspondem à verdade, facto que é do conhecimento dos réus e das aludidas três testemunhas, pelo que pugnam pela sua declaração de ineficácia e subsequente cancelamento do registo de propriedade realizado com base nessa escritura.

*Regularmente citados, os réus apresentaram contestação, defendendo-se por impugnação e por excepção, tendo começado por arguir a nulidade da partilha realizada no âmbito do inventário facultativo n.º 56/1990, por óbito de II e mulher JJ, por terem sido partilhados bens que não faziam parte do inventário aberto por óbito de II e mulher JJ, em violação do disposto no artigo 1729.º do Código Civil, devendo, em consequência, ser os autores considerados parte ilegítima, por não serem os verdadeiros titulares do direito de propriedade sobre o prédio em causa nestes autos.

Referem ainda os réus que os autores nunca exerceram qualquer acto de posse sobre o referido prédio, designadamente desde 2 de Novembro de 1992, porquanto o réu comprou-o a II em 1980, sendo os réus, e após o falecimento da ré DD apenas o réu CC, quem cultivava o prédio, recolhendo os seus frutos, lavrando-o, regando-o, plantando nele árvores de fruto, recolhendo a lenha produzida, conservando os seus muros e vedações, à vista de todos, sem oposição de ninguém de forma ostensiva e ininterrupta, na convicção do exercício do direito de propriedade correspondente, sendo pois uma posse pública, pacifica, contínua e de boa fé, que vem sendo exercida desde o ano 1980 e até à presente data.

*Foi oficiosamente determinada a realização de um arbitramento ao prédio rústico, com vista à fixação do seu valor venal, encontrando-se o relatório junto a fls. 49 a 59.

Os autores exerceram o contraditório quanto à matéria de excepção invocada pelos réus (cfr. fls. 43).

*Foi deduzido incidente de habilitação dos herdeiros da ré falecida DD, tendo sido declarados habilitados como herdeiros de DD, para prosseguir a presente acção no seu lugar, o seu cônjuge sobrevivo CC, e os seus filhos CC, CC e KK (cfr. fls. 72 a 73v).

Regularmente citados, os réus habilitados vieram aderir à contestação apresentada pelo réu CC (cfr. fls. 78).

*Foi fixado o valor à causa, dispensada a elaboração de despacho saneador, a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova, tendo-se relegado para sentença o conhecimento da excepção de nulidade da partilha […]»;*B) - Realizada que foi a audiência final, veio a ser proferida, pelo Juízo Local Cível ..., a sentença de 9 de Dezembro de 2021, que, julgando a acção improcedente, absolveu os réus dos pedidos.

*C) - Inconformados com tal sentença, dela Apelaram os Autores, que, a finalizar a sua alegação de recurso, apresentaram as seguintes “conclusões”: «1. Salvo o devido respeito que nos merecem a opinião e a ciência jurídica da Mm.ª Juíza a quo, afigura-se aos ora Recorrentes que a douta sentença em crise não poderá manter-se, que vêm submetê-la à reapreciação deste Tribunal da Relação.

  1. Os recorrentes consideram incorretamente julgados os pontos 5 e 6, a decisão proferida quanto à matéria do ponto do facto provados, devendo ser dados como não provados, o que consta da listagem da fundamentação de facto da sentença ora recorrida, por força do caso julgado 3. Ao ser dado como provado à matéria do ponto do facto 4, que consta da listagem da fundamentação de facto da sentença ora recorrida, a acção terá que ser dada como procedente, por força da caso julgado.

  2. A VERIFICAÇÃO DA EXCEPÇÃO DE CASO JULGADO É DE COHECIMENTO OFICIOSO E ACESSÍVEL AO TRIBUNAL DE RECURSO, MESMO QUE NÃO TENHA SIDO TAL MATÉRIA INVOCADA NO PROCESSO, ANTERIORMENTE À DECISÃO RECORRIDA.

  3. A INVOCAÇÃO E O FUNCIONAMENTO DA AUTORIDADE DO CASO JULGADO DISPENSAM A IDENTIDADE DE PEDIDO E DE CAUSA DE PEDIR .

  4. O tribunal a quo proferiu Despacho de 10-12-2020, Refª citius 1640670, ONDE RELEGA PARA O INÍCIO DA AUDIÊNCIA FINAL A APRECIAÇÃO QUANTO À UTILIDADE E PERTINÊNCIA DA DILIGÊNCIA REQUERIDA PELOS AA.

  5. PESE EMBORA TAL DESPACHO NO INÍCIO DA AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO NÃO HOUVE APRECIAÇÃO DESSE REQUERIMENTO, EM CLARA VIOLAÇÃO DA LEI POR OMISSÃO DE PRONUNCIA.

  6. Os RR, a coberto da sua preocupação (legitima e com total pertinência) sobre a possível verificação de caso julgado, vieram arguir a nulidade da partilha realizada no âmbito do inventário facultativo n.º 56/1990, por óbito de II e mulher JJ, excepção perante a qual deveria o Tribunal deveria ter remetido as partes para os meios comuns como é de elementar justiça.

  7. Pasme-se, pois são os RR quem alerta para a violação do princípio de caso julgado, tendo o tribunal feito tábua rasa do caso julgado da decisão do processo de inventário transitado em julgado a 31-11-1994 e sem mais.

  8. CONSTA DA CERTIDÃO JUNTA AOS AUTOS COM A P.I. E NÃO IMPUGNADA, POR SENTENÇA NO PROCESSO DE INVENTÁRIO PROFERIDA A 31- 10- 1994, E TRANSITADA EM JULGADO em 31-11-1994, que o prédio identificado a 1 da p.i. veio à posse e propriedade dos AA, por adjudicação no Inventário facultativo, por óbito de II e mulher JJ, com o n.º 56/1990 o qual correu termos pela única secção do Tribunal Judicial da Comarca ....

  9. Facto dado como provado pelo Tribunal a quo, no ponto 4 dos factos provados, o que por si só é causa da procedência da acção, por prova que as declarações realizadas na escritura quanto à data da aquisição e factos de posse – ano 1980, são falsas.

  10. Não pode este mesmo tribunal por força da violação do transito em julgado concluir que nenhum reparo havendo a fazer ao teor da escritura de justificação notarial outorgada no dia 13 de Dezembro de 2004 no Cartório Notarial ... e exarada a fls. 72 a 73 verso do Livro de Notas para Escrituras Diversas n.º 64-D daquele Cartório Notarial, nem, consequentemente, ao registo efectuado com base na aludida escritura.

  11. E não o pode pois que por força do caso julgado na sentença do processo de inventário, pois que pelo menos até 31-11-1994, quem esteve na posse o prédio foram os AA.

  12. Tem que se respeitar o decidido no inventário n.º 56/1990 o qual correu termos pela única secção do Tribunal Judicial da Comarca ... (SENTENÇA NO PROCESSO DE INVENTÁRIO PROFERIDA A 31- 10- 1994, E TRANSITADA EM JULGADO) decisão que se impõe nestes autos, não podendo os RR virem invocar ou fazer constar de escritura de justificação que exerciam a propriedade do prédio antes da data de 31-11-1994 por forma a obterem os efeitos da aquisição por usucapião previsto nos artigos 1287º e seguintes do Código Civil quando nesse processo foi decidido que esse bem fazia parte da herança indivisa deixada por II...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT