Acórdão nº 2714/19.2T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução28 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] * 1 – RELATÓRIO AA, residente na Rua ..., ... ..., intentou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum contra “L....

” [ora L...”], que tem a sua sede social na Avenida ..., ..., ... ..., pedindo a condenação desta: «

  1. Proceder ao reembolso/pagamento/ressarcimento à A. do capital de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), acrescidos dos juros moratórios vencidos e vincendos desde 25.10.2014 à taxa legal dos juros comerciais em vigor, condenando-se ainda o R. a pagar ao A. a quantia de 2.500,00 € (dois mil e quinhentos euros) por danos morais por esta sofridos, igualmente acrescidos de juros moratórios à taxa legal desde a citação até ao efetivo pagamento; Subsidiariamente, por cautela de patrocínio, caso assim não se entenda: b) Deverá ser declarado [nulo] o contrato/negócio jurídico por força do qual o banco R. vendeu ao aqui A. a “Obrigação Subordinada Rendimento Mais S... 2004”, com todas as legais consequências, e indemnizada a A. pelos danos sofridos, danos estes a liquidar em execução de sentença, e que quantitativamente corresponderão, no mínimo, ao custo de imobilização do capital desde a data da subscrição do produto até ao momento da restituição deste, montantes este ao qual haverá que descontar o rendimento, entretanto percebido pela A. (…)».

    Para alicerçar as suas pretensões, a autora alegou, em síntese: - que sendo clientes, ela e o marido, do extinto B.... (B..., instituição bancária então tida como sólida e bem administrada, na qual depositavam toda a confiança, nomeadamente no seu gestor de conta, Sr. BB, este contatou o seu marido em data não superior a uma semana antes de 25.10.2004, no sentido de aplicarem o seu dinheiro num produto financeiro novo muito bom, com boa taxa de rentabilidade, superior à dos depósitos a prazo (“uma espécie de depósito a prazo, mas de maior rentabilidade”), com «rentabilidade assegurada, com o capital 100% assegurado quanto ao seu reembolso, e sem risco de perda deste», tendo sido por estas condições terem sido garantidas que ela A. anuiu aplicar a quantia de € 50.000 que detinha em DP nesta aplicação, mas sem que então lhe tivessem sido explicadas a natureza e características da proposta aplicação financeira, nomeadamente o que eram “Obrigações” (e concretamente as ditas “Obrigações S... Rendimento Mais 2004”), nem o que eram “Obrigações Subordinadas”, acrescendo que não lhe foi entregue nem explicada (antes do ato de subscrição) qualquer Prospeto Informativo ou Ficha Técnica que não fosse o “Boletim de Adesão”, nem lhe foi prestada qualquer informação sobre quem era a entidade emissora das mesmas (a “S...”, doravante “S...”), sendo certo que o dito “Boletim de Adesão” é composto por uma série de “cláusulas de adesão integral”; - que ela A. e o seu marido jamais teriam aceitado investir as suas poupanças de uma vida na aquisição desta “Obrigação” se tivesse sido devidamente informados, tanto mais que eram aforradores sem qualquer cultura financeira ou bancária e sem conhecimentos específicos sobre o mercado de capitais, nunca tendo pretendido investir todas suas poupanças numa aplicação financeira de risco; - que também não lhes foi explicado que o banco não passava de um mero intermediário financeira da S..., e que a responsabilidade última pelo pagamento dos juros e do reembolso do capital na maturidade do produto era apenas desta S... e não do próprio B...; - que, na sequência, o pagamento dos juros decorrentes da aplicação ocorreu até Outubro de 2014, o que sempre foi contribuindo e reforçando a convicção da A. de que o seu capital investido sempre iria acabar por lhe ser entregue, estando a A. igualmente convicta de que a entidade que desembolsava o dinheiro para pagamento dos juros era o próprio B... ( e mais tarde o L... ) e não a S... (mais tarde G...), convicção que manteve durante anos; - que a atual instituição de crédito aqui R. (L...”) resultou da fusão ocorrida em 7 de Dezembro de 2012, por incorporação do “L....” no “B....”, assumindo a designação social do primeiro e a personalidade jurídica do segundo; - que em 10.03.2017 a A. interpelou o L... para proceder ao depósito na sua conta dos € 50.000 investidos, reembolso que lhe foi negado por resposta datada de 25.10.2017; Em sede de fundamentação de direito, muito em síntese, referiu que a operação bancária efetuada entre a autora e a ré corresponde a uma atividade de intermediação financeira e chamou à colação as normas do Código dos Valores Mobiliários, para defender a responsabilidade contratual da ré, por violação do dever de informação a que estava obrigada, acrescendo que o contrato é nulo por violação do regime das Cláusulas Contratuais Gerais, donde lhe assistir o direito à devolução/pagamento a título indemnizatório do dito montante de € 50.000, bem como nos juros moratórios vencidos e vincendos desde a data em que o capital deveria ter sido pago (Outubro de 2014), bem como na indemnização por danos morais de montante não inferior a € 2.500, e subsidiariamente, que tem o direito de ver decretada a nulidade do negócio jurídico, com as legais consequências.

    * A ré foi regularmente citada e apresentou contestação.

    Começou por arguir a exceção perentória da prescrição, por terem decorrido mais de dois anos a contar do conhecimento, pela autora, da subscrição do produto em apreço, e bem assim de que se verifica uma situação de venire contra factum proprium por parte da A., na medida em que ao longo de 5 anos esta sempre se comportou de forma a aceitar a subscrição por si efetuada, auferindo as correspondentes vantagens (maxime os juros “principescos”), pelo que violou as expetativas geradas só agora vindo exigir responsabilidades.

    Em sede de defesa por impugnação motivada, alegou, em síntese, que: - As Obrigações S... 2004 foram emitidas, como o próprio nome indica, pela S...., sociedade que era titular de 100% do capital social do B..., participação que deteve de forma permanente até novembro de 2008.

    - Qualquer obrigação é tendencialmente um produto conservador, com um risco normalmente reduzido, indexado à solidez financeira da sociedade emitente, com garantia de capital, no sentido de que o seu valor de reembolso não sofre variações de natureza especulativa ou sequer que resultem de qualquer tipo de negociação – ao contrário da grande maioria dos restantes instrumentos financeiros -, e cujo único risco é o risco geral do incumprimento, existente em todos os contratos.

    - A esta segurança acrescia, no caso concreto, o facto de a entidade emitente ser “mãe” do Banco, sendo este necessariamente, um garante da solvabilidade daquela, por ser o principal ativo do seu património.

    - Assim, dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro ou conservador como a subscrição daquelas obrigações; o risco de um DP seria, por isso e apenas nessa medida, semelhante a uma tal subscrição por o risco da S... ser indexado ao risco do próprio Banco, sendo o produto dado à subscrição da autora” efetivamente seguro”, acabando o seu incumprimento por ser determinado por circunstâncias completamente imprevisíveis e anormais, como uma nacionalização e a forma como essa nacionalização foi determinada, separando o Banco do restante grupo de empresas.

    -À data de subscrição, mesmo uma situação de insolvência da S... implicaria necessariamente uma prévia insolvência do próprio Banco por ser um seu ativo, pelo que também por aqui o risco da aplicação era efetivamente semelhante ao de um DP no próprio banco.

    Concluiu que nunca foi transmitida qualquer informação falsa à autora, nem omitida informação essencial quanto a natureza do produto, que se “encaixava na perfeição no seu perfil de investidor - conservador”.

    Defendeu, seguida e motivadamente, que não foi violado qualquer dever legal de informação.

    Pugnou, a ré, a final, pela improcedência da ação.

    * A autora exerceu o contraditório acerca da matéria de defesa por exceção, tendo pugnado pela respetiva improcedência.

    * Seguidamente, foi dispensada a audiência prévia e proferido despacho saneador, onde se afirmaram todos os pressupostos de validade e de regularidade da instância.

    Nele foi relegada para final a apreciação da exceção perentória da prescrição e do abuso do direito, e, no demais, foi consignado o objeto do litígio e foram elencados os temas da prova, dos quais não houve reclamações.

    * Prosseguindo os autos, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, com observância do legal formalismo, como se alcança das respetivas Atas.

    * Na sentença, desde logo se assentou que tendo o Banco Réu atuado como intermediário financeiro, tal não invalida que a responsabilidade civil assacada ao intermediário financeiro pressupõe a prova da ilicitude resultante do incumprimento de deveres legais ou contratuais, numa relação de causalidade adequada com o sinistro financeiro verificado, sucedendo que, face aos factos provados in casu, se entendia que o Réu prestou à Autora (ou seu representante), as informações relativas às características essenciais do produto financeiro e que correspondiam à verdade (montante do capital, prazo, taxa de juro e possibilidade de reembolso antecipado), pelo que não praticou quaisquer factos ilícitos, de acordo com os princípios da adequação e proporcionalidade, tendo em conta o concreto produto financeiro (“obrigações”) e as características da Autora enquanto investidora, sempre ao abrigo do princípio geral da boa-fé, por isso, não se verificavam os necessários pressupostos da responsabilidade civil contratual, pré-contratual, ou extracontratual, impondo-se a absolvição do Réu do pedido formulado pela Autora, face ao que se encontrava prejudicada a apreciação da invocada prescrição e do invocado abuso do direito, termos em que se formulou o seguinte concreto “dispositivo”: «III. DISPOSITIVO Nos termos e fundamentos expostos, 1. Julgo a acção totalmente improcedente e, em consequência, 2. Absolvo o Réu L...., de todos os pedidos formulados pela...

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