Acórdão nº 1696/20.2T8CTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 28 de Junho de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.
Em 26.4.2021, na execução instaurada pela Banco 1..., S. A. (Banco 1..., S. A) contra A..., L.da., AA e BB e mulher CC, a executada CC veio opor-se por embargos, aduzindo, apenas, o seguinte: «1º - A 23 de Março foi a Executada, ora Embargante, citada da presente execução.
2º - Sucede que, a Exequente não interpelou previamente a avalista do incumprimento, desconhecendo a mesma o montante exato e data em que se vencia a garantia avalizada, e ainda, as condições de preenchimento da mesma.
3º - A livrança em branco subscrita pela Embargante foi preenchida abusivamente pela Exequente já que aquela não deu o seu acordo ao seu preenchimento, tendo a mesma decidido unilateralmente todas as condições constantes da mesma.
4º - Na verdade, a Embargante não autorizou o preenchimento da livrança sem previamente ser notificada do incumprimento por parte do avalizado, o que leva necessariamente à nulidade do título executivo.
5º - A Embargada sempre teve a noção de que a livrança só seria preenchida caso fosse previamente interpelada e/ou comunicado a mora ou o incumprimento da relação subjacente.
(...) requer-se (...) se digne a julgar procedentes os presentes embargos e em consequência absolver a Executada da instância executiva.» A exequente contestou pugnando pela improcedência dos embargos, dizendo, em resumo: por carta datada de 08.9.2020 e recebida no dia 22.9.2020, interpelou a executada “da dívida existente e do preenchimento das livranças, decorrente de prévia interpelação em 14.11.2019”; ainda que se considere que tal interpelação não foi validamente efetuada, a mesma só seria necessária caso tivesse sido prevista no pacto de preenchimento, o que não sucedeu; as livranças dadas à execução foram por si preenchidas de acordo com o que foi estipulado pelas partes nos correspondentes pactos de preenchimento e pelos valores que se encontravam em dívida a título de capital, juros e impostos devidos.
Foi proferido despacho saneador-sentença, a 07.01.2022, que julgou a oposição à execução improcedente, ordenando o prosseguimento dos autos de execução com vista ao pagamento coercivo da quantia exequenda indicada no requerimento executivo.
Dizendo-se inconformada, a executada/embargante apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - Foi julgada improcedente a oposição à execução, considerando o tribunal “a quo” que “No caso em apreço, tendo a exequente sido expressamente autorizada a preencher as livranças dadas à execução em caso de incumprimento do contrato, quer no que se refere à data de vencimento, quer no que se refere ao local de pagamento e aos valores em dívida, competiria à executada CC alegar e demonstrar ou a inexistência de qualquer incumprimento que legitimasse o preenchimento da livrança, ou a desconformidade entre o preenchimento efetuado e o acordado pelas partes, nomeadamente por não ser devida a exata quantia aposta nas livranças em causa. Porém, não resulta da alegação efetuada pela executada CC que as obrigações emergentes dos contratos cuja celebração fundamentou a subscrição das livranças dadas à execução não tenham sido incumpridas, nem que as quantias tituladas pelas referidas livranças não sejam devidas à exequente.
Em consequência, não poderá também deixar de ser julgada improcedente a excepção peremptória invocada pela executada a propósito do preenchimento abusivo das livranças dadas à execução.” 2ª - A executada é avalista da dívida dada em execução.
Sucede que, a Exequente não interpelou previamente a avalista do incumprimento, desconhecendo a mesma o montante exato e data em que se vencia a garantia avalizada, e ainda, as condições de preenchimento da mesma.
A livrança em branco (apresentada em execução cumulada requerida em 29.5.2021) subscrita pela Embargante foi preenchida abusivamente pela Exequente, já que aquela não deu o seu acordo ao seu preenchimento (livrança) sem previamente ser notificada do incumprimento por parte do avalizado, o que leva necessariamente à nulidade do título executivo.
3ª - A Embargada sempre teve a noção de que a livrança só seria preenchida caso fosse previamente interpelada e/ou comunicado a mora ou o incumprimento da relação subjacente.
4ª - Dos factos provados do n.º 16 da sentença recorrida consta que a executada não foi notificada, “Mediante carta datada de 08.9.2020, remetida aos executados BB e CC e dirigida para a Avenida ..., ..., cujo aviso de receção foi assinado pelo executado BB no dia 22.9.2020, a exequente Banco 1..., S. A., comunicou o seguinte: “Assunto: Interpelação para pagamento – Preenchimento de livranças Titular: A..., L.da” 5ª - Considerou o tribunal “a quo” que a exequente comunicou à executada a dívida e o preenchimento da livrança dizendo, “…Quer isto dizer que a prova documental produzida no âmbito dos presentes autos infirmou a alegação efetuada pela executada CC quanto à omissão de qualquer comunicação através da qual lhe tivesse sido dado conhecimento do incumprimento das obrigações que determinaram a emissão das livranças dadas à execução.
Na verdade, decorre do teor das comunicações a que se aludiu que a exequente comunicou à executada CC não só o incumprimento das obrigações que vinculavam a mutuária A..., L.da., como também o próprio preenchimento das livranças dadas à execução e os valores que nas mesmas foram apostos. Como resulta do disposto no art.º 224º, n.º 1, do Código Civil, “a declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada…” 6ª - O tribunal “a quo” fez errada interpretação dos factos provados e do citado artigo, pois quem rececionou a carta não foi a executada foi o outro executado, independentemente de ser o marido ou não, pois não é caso raro e incomum algum dos familiares ocultar do outro tais documentos um do outro por forma a o poupar de situações desagradáveis.
Conforme preceituado no art.º 224º do Código Civil (CC), a declaração negocial recipienda ou receptícia torna-se eficaz logo que chega ao poder do destinatário ou é dele conhecida, mas é também eficaz quando só por sua culpa exclusiva não foi oportunamente recebida.
7ª - A exequente deveria ter remetido duas cartas registada, uma a cada um dos executados e não colocar tudo, em grupo, na mesma notificação postal, pelo que, a culpa a não receção pela embargante decorre da exequente.
8ª - Face à omissão de tal requisito prévio, não tendo a avalista sido interpelada é inexequível a livrança e, logo inexigível.
Não houve resposta.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa apreciar e decidir se a exequente omitiu a interpelação da executada e as consequências dessa eventual omissão (v. g.
, se poderá sustentar o alegado “preenchimento abusivo das livranças” dadas à execução).
* II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: 1) A exequente instaurou, contra os executados A..., L.da., AA, BB e CC, a ação executiva de que este incidente constitui apenso, tendo em vista o pagamento coercivo da quantia global de € 24 600,99, correspondente à soma das seguintes parcelas: capital em dívida no valor de € 24 364,95, juros de mora vencidos desde 08.9.2020 até 02.12.2020 no valor de € 226,96 e Imposto do Selo sobre juros no valor de € 9,08.
2) O 1º título executivo dado à execução de que este incidente de oposição à execução constitui apenso é a livrança, no valor de € 1 808,62, da qual constam, no espaço destinado à indicação do local e data de emissão, as menções “...” e “2015-03-25”, no espaço destinado à indicação da data de vencimento, a data “2020-09-08” e, no espaço destinado à indicação do valor, a menção “Op. PT00350222015695891”, tendo sido apostos, no espaço destinado à assinatura dos subscritores, duas assinaturas e o carimbo referente à executada A..., L.da., e indicando-se, no espaço destinado ao nome e morada dos subscritores, as menções “A..., L.da.” e “..., 30 ... ... ...”.
3) O 2º título executivo dado à execução é a livrança, no valor de € 7 611,97, da qual constam, no espaço destinado à indicação do local e data de emissão, as menções “...” e “2015-04-24”, no espaço destinado à indicação da data de vencimento, a data “2020-09-08” e, no espaço destinado à indicação do valor, a menção “Op. PT00350222016197891”, tendo sido aposta, no espaço destinado à assinatura dos subscritores, a expressão “A..., L.da., A Gerência”, seguida de uma assinatura, e indicando-se, no espaço destinado ao nome e morada dos subscritores, as menções “A..., L.da.” e “..., 30 ... ... ...”.
4) O 3º título executivo dado à execução é a livrança, no valor de € 1 301,51, da qual constam, no espaço destinado à indicação do local e data de emissão, as menções “...” e “2016-02-17”, no espaço destinado à indicação da data de vencimento, a data “2020-09-08” e, no espaço destinado à indicação do valor, a menção “Op. PT00...91”, tendo sido aposta, no espaço destinado à assinatura dos subscritores, a expressão “A..., L.da, A Gerência”, seguida de uma assinatura, e indicando-se, no espaço destinado ao nome e morada dos subscritores, as menções “A..., L.da.” e “..., 32 ... ...”.
5) O 4º título executivo dado à execução é a livrança, no valor de € 13 642,85, da qual constam, no espaço destinado à indicação do local e data de emissão, as menções “...” e “2016-08-22”, no espaço destinado à indicação da data de vencimento, a data “2020-09-08” e, no espaço destinado à indicação do valor, a menção “Op. PT00350222016024691”, tendo sido apostos, no espaço destinado à assinatura dos subscritores, uma assinatura e o carimbo referente à executada A..., L.da., e indicando-se, no espaço destinado ao nome e morada dos subscritores, as menções “A..., L.da.” e “..., 32 ... ...”.
6) No verso das livranças a que se alude em 2) a 5) foram apostas as menções “bom para aval ao subscritor”, seguidas das assinaturas dos executados BB, AA e CC...
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