Acórdão nº 1598/17.0T8CTB-A.C3 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelEMÍDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução14 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 1598/17.0T8CTB-A.C3 Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra Banco 1...

, com sede na Avenida ..., ... ..., instaurou processo de execução sumária para pagamento da quantia de 57 624,20 euros contra AA, residente na Rua ..., ..., ....

A quantia exequenda corresponde segundo a alegação da exequente: 1. Ao capital em dívida, à data de 28/09/2017, de dois contratos de mútuo celebrados em 11 de Maio de 2017, um no montante de € 37 000,00 e outro no de € 28 000,00, nos quais a exequente figura como mutuante e a executada como mutuária; 2. A juros; 3. A comissões.

Segundo a exequente, a partir de 11-05-2015, a executada deixou de pagar as prestações acordadas para o reembolso dos mútuos, o que determinou o vencimento imediato de toda a dívida.

A executada opôs-se à execução por meio de embargos. Os fundamentos da oposição foram em síntese os seguintes: · Que a dívida não era exigível uma vez que não houve incumprimento definitivo dos contratos de mútuo; · Que, caso assim se não entendesse, a exequente deixou de lhe prestar informações a ela, executada, desde pelo menos meados de 2015, pelo que, ela, embargante, por não saber o que liquidar, deixou de efectuar pagamentos à exequente; · Que a embargante, após 11 de Maio de 2015 e até Janeiro de 2017, pagou pelo menos 1550,00, devendo em, consequência, ser reduzido o valor da dívida em pelo menos € 1 550,00.

A exequente contestou os embargos, pedindo se julgasse totalmente improcedente a oposição à execução. Para o efeito alegou em síntese: · Que não era verdade que ela, exequente, tenha deixado de comunicar, a partir de meados de 2015, o valor das prestações em dívida nos contratos de mútuo, bem como o respectivo saldo bancário; · Que reconhece terem sido efectuados os depósitos indicados no artigo 37.º dos embargos e que todos eles foram aplicados em ambos os empréstimos, com excepção de € 260 do depósito de 9/11/2015 e de € 200,00 do depósito de 12/10/2016; · Que a exequente procedeu à interpelação da embargante para pagar as prestações em dívida e mostrou a intenção e cobrar a totalidade da dívida.

O processo prosseguiu os seus termos e, após a realização da audiência final, foi proferida sentença que julgou procedentes os embargos e que, em consequência, determinou a extinção da execução.

P...

, habilitada na posição da Banco 1.... não se conformou com a decisão e interpôs o presente recurso de apelação, pedindo se revogasse e se substituísse a sentença por decisão a determinar o prosseguimento da acção executiva.

Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões foram os seguintes: 1. Fundamenta a decisão recorrida que a ora recorrente não logrou demonstrar que a exequente tenha procedido à interpelação da embargante para pagamento da totalidade da dívida, exigível por via do disposto no art.º. 781.º do Código Civil, concluindo que não pode considerar-se suprida tal omissão com a citação por via judicial para a acção executiva, uma vez que não manifestou a vontade, em sede de requerimento executivo, de a interpelação para o pagamento da totalidade da obrigação ocorrer com a citação judicial, concluindo como tal que a quantia exequenda não é exigível.

  1. Certo é que a Banco 1.... procedeu à junção aos presentes autos de duas cartas de interpelação da recorrida, uma datada de 21 de Maio de 2015 e outra de 4 de Setembro de 2017, a primeira dando conhecimento da falta de regularização da dívida e solicitando o seu pagamento com urgência e esta última dando conhecimento que o processo seguiria para tribunal para cobrança coerciva da totalidade da dívida.

  2. Entendeu o tribunal a quo não serem suficientes as cópias juntas aos autos para comprovar o envio das referidas missivas, não se encontrando demonstrado o envio e recepção das mesmas, seja por via documental seja através de prova testemunhal.

  3. Sucede que os contratos de mútuo dados à execução não exigiam o envio das comunicações à recorrida por carta registada e ou aviso de recepção, o que significa que as cartas podiam, como foram, ser remetidas por via postal simples. Ora, como se sabe, nas cartas enviadas por via postal simples, em particular as do Banco Exequente, emitidas automaticamente pelo sistema e centralmente, tal como ficou demonstrado por meio de prova testemunhal, conforme refere a douta sentença, não há qualquer registo do respectivo envio e recepção.

  4. Não obstante, perante o entendimento exarado na sentença proferida, sempre se dirá que a perda do benefício do prazo se encontra expressamente contemplada nos artigos 780.º e 781.º do Código Civil, sendo que, neste último artigo, encontra-se previsto o respectivo regime jurídico para a divida liquidável em prestações.

  5. No caso em apreço estamos perante uma dívida liquidável em prestações, uma vez que, nos contratos de mútuo dados à execução foi acordado um prazo para a amortização dos empréstimos em prestações mensais constantes e sucessivas, sendo que nos termos do disposto no artigo 781.º do Código Civil, se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas.

  6. O regime constante do artigo 781.º do Código Civil é meramente supletivo, podendo as partes acordar no vencimento antecipado da dívida pelo incumprimento de uma prestação mensal, independentemente da prévia interpelação dos devedores, sendo que nos termos dos contratos de mútuo peticionados nos autos, a Banco 1.... tem o direito de “considerar antecipadamente vencida toda a dívida e exigir o seu imediato pagamento” no caso de “incumprimento pela parte devedora ou por qualquer dos restantes contratantes de qualquer obrigação decorrente deste contrato” – cfr. alínea a) das Cláusulas 14 e 13 do documento complementar dos contratos de mútuo dados à execução.

  7. Extraindo-se dos contratos que o Banco reservou para si o direito de considerar o crédito imediatamente vencido, em caso de falta de cumprimento de quaisquer obrigações assumidas no âmbito do referido contrato pelos mutuários.

  8. As partes contratuais aceitaram o vencimento antecipado dos empréstimos, independentemente de interpelação, no caso de incumprimento de uma obrigação contratual, como seja a do pagamento das prestações mensais, pelo que, tendo o artigo 781.º do Código Civil uma natureza supletiva, o mesmo foi expressamente afastado pelas partes, daqui decorrendo que o Banco não teria qualquer obrigação de proceder à interpelação dos devedores.

  9. Veja-se, desde logo, a expressão utilizada nas referidas cláusulas contratuais quanto à possibilidade de ser exigido “de imediato” o pagamento da totalidade da dívida, o que pressupõe a não obrigatoriedade de quaisquer outras diligências tendentes ao vencimento antecipado da dívida. Sem prescindir, sempre se dirá que, 11. Caso se entenda que as referidas disposições contratuais não permitem afastar a aplicação do disposto no artigo 781.º do CC e a subjacente interpelação ao pagamento considerando o vencimento da totalidade da dívida - por via da qual o credor exerce o direito ou benefício que a lei lhe concede - importa ter presente que tem-se também entendido que a interpelação pode não ser apenas efectivada via extrajudicial como, outrossim, através da via judicial, pela citação, em conformidade com o disposto no art.º 805.º do Código Civil, determinando, nesse caso, a efectiva citação nos autos, contrariamente ao que decidiu o tribunal a quo, que a Exequente apenas poderá exigir os juros de mora a partir da citação dos executados para a acção executiva, já que a interpelação (judicial ou extrajudicial) do devedor pelo credor releva, assim e apenas, para efeitos de contagem dos juros moratórios.

  10. Refira-se, a este respeito, o que refere o acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido no âmbito do processo n.º 1511/19.0TSTB-A.E1, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido no processo n.º 6195/06.2TVLSB.C1 em 1-04-2009 e ainda o acórdão do STJ proferido no processo n.º 602/18.9T8PTG.E1.S1.

  11. Entendeu, no entanto, o tribunal a quo que o Exequente tinha expressamente de declarar a sua vontade em ver concretizada a interpelação através da citação judicial, do seguinte modo: “Nas hipóteses em que a interpelação seja efectuada através do próprio acto de citação na acção executiva, deve o próprio requerimento executivo incluir o conteúdo da interpelação exigível, ou seja a alegação da falta de pagamento de uma ou mais prestações e a vontade do exequente em considerar vencida toda a dívida, sendo aplicável, por identidade de razão, a imposição da forma de processo executivo ordinária, nos termos do art.º 550.º, n.º 3, a), do C. P. Civil, apenas podendo ser peticionados juros de mora desde a data da citação, momento em que ocorre a interpelação para o pagamento da totalidade da dívida (cfr. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA DE 14-09-2020, relatado por SÍLVIA PIRES) transcrito na sentença (sublinhado e negrito nossos).

  12. Ora, referiu expressamente o Banco, no requerimento executivo intentado: IV –...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT