Acórdão nº 970/17.0T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA ALBUQUERQUE
Data da Resolução11 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – “BC..., SA”, instaurou a presente ação de processo comum, contra “Cima – Centro de Inspeção Mecânica em Automóveis, SA”, pedindo a sua condenação a pagar-lhe uma indemnização de € 311.187,63, referente ao valor dos prejuízos causados nas suas instalações, bem como ao seu valor locativo e ainda às despesas de eletricidade, acrescendo o IVA e os juros vencidos desde a citação, bem como o valor locativo referente ao período em que ela, A., se mantiver privada das instalações em causa, a liquidar posteriormente.

Alegou ser titular do direito de superfície sobre um lote de terreno onde construiu um edifício destinado a oficina de reparação de automóveis, estação de serviço, armazéns e escritórios, sendo que, tendo transferido a sua atividade para outro local, entrou em negociações com a R., com vista à cedência do referido espaço, onde esta pretendia instalar um centro de inspeção de veículos. O texto final do acordo então celebrado, tendo merecido a concordância de ambas as partes, nunca chegou a ser assinado. Certo é que a A. permitiu à R. que entrasse na posse do prédio em Fevereiro de 2012 e aí iniciasse obras de adaptação, tendo ambas acordado que a renda de € 5.000,00 começaria a ser paga em Agosto daquele mesmo ano. Porém, tais obras de adaptação prolongaram-se e vieram, mais tarde, a ser interrompidas, sem que a R. tivesse, para o efeito, oferecido qualquer justificação, além de que se manteve sem assinar o contrato de arrendamento já negociado entre as partes, o que levou a que a A. a considerá-lo resolvido. Com as obras ali executadas, a R. provocou danos elevados no edifício, deixando-o impróprio para qualquer fim, além de que não liquidou qualquer contrapartida pela posse do edifício, tendo ainda consumido eletricidade que a A. pagou.

A R. contestou, tendo impugnado a matéria alegada pela A., considerando que cumpriu integralmente o que fora ajustado entre as partes até lhe ter sido vedado o acesso ao prédio em Novembro de 2012 pelo gerente daquela. Mais alegou que o prédio lhe foi entregue em avançado estado de degradação. Por outro lado, nos termos do acordo celebrado, a renda apenas seria devida a partir do momento em que fosse emitida a licença de construção. Defendendo-se por exceção, considerou que a A. litiga em contradição com a posição que assumiu perante si em Novembro de 2012, com abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

A A. respondeu referindo ter entregue à R. as instalações em perfeito estado de funcionamento, e que esta abandonou as obras quando deixou de estar interessada no arrendamento.

Realizou-se audiência prévia, no decurso da qual, foi proferido despacho saneador, tendo sido enunciados o objeto do litígio e os temas de prova.

Procedeu-se à realização do julgamento, em cujo decurso a R . interpôs recurso de despacho que não admitiu a junção de prova documental por si requerida no decurso do mesma.

Julgado procedente tal recurso, foi determinada a junção da prova documental em questão, relativamente à qual ambas as partes foram admitidas a exercer contraditório, tendo sido, para o efeito, reaberta a audiência.

Foi, então, proferida sentença que julgou parcialmente procedente a acção, condenando a R. a pagar à A. a a quantia global de € 77.770,87 (setenta e sete mil, setecentos e setenta euros e oitenta e sete cêntimos), acrescida de juros de mora desde a sua citação, até efetivo e integral pagamento, à taxa de juros aplicável às empresas comerciais, de harmonia com a Portaria nº 597/2005, de 19/7, e sucessivos avisos publicados pela Direção Geral do Tesouro, absolvendo a R. do demais peticionado.

II - Do assim decidido apelaram a A. e a R. A- A A. concluiu as respectivas alegações do seguinte modo: 1ª- Existe erro grosseiro na apreciação da matéria de facto, concretamente no que se refere aos seguintes pontos da mesma e para nos referirmos apenas aos que podem ter relevância: Factos não provados com referência à petição inicial: - 7º, parcialmente ( no segmento “boas”) - 8º, parcialmente (no segmento “facilmente, sem avarias”). - 9º, parcialmente (no segmento “perfeito estado” e “bom funcionamento”). - 10º, parcialmente (no segmento que tenha sido a ré que entrou em contacto com a autora). - 29º, parcialmente (que tenha retirado os portões, com excepção de dois, e os tenha levado para parte incerta). - 34º, parcialmente (a zona do elevador e a fossa tenha sido totalmente destruída, como o pavimento circundante). - 38, parcialmente (que a ré tenha deixado o prédio à mercê de quem quer que fosse, sem portões e que, por isso, tenha suportado a despesa aí mencionada). - 39º, parcialmente (que tenha provocado danos elevadíssimos ao imóvel deixando -o no estado que documentam as fotografias) - 40º - 42º, parcialmente (que tenha sido retirada a instalação eléctrica, havendo buracos em vários sítios). -46º a 86.

Pelo que devem os factos alegados nos artigos referidos considerar-se integralmente provados, dando-os aqui por reproduzidos, para não tornar as presentes conclusões mais extensas. Por outro lado, 2ª- O facto dado como provado em 5.45 (2ª parte) da Fundamentação de Facto, (“cedência essa que ocorreu em data não apurada, mas posterior a 20 de Janeiro de 2016 e anterior à apresentação do relatório pericial junto aos autos, em 24 de Abril de 2018 (facto que em parte resulta do alegado no art. 96º da petição inicial e da instrução da causa nos termos do art. 5º, nº 2, a) do C.P.C”.) além de não ser instrumental está incorrectamente julgado, sendo a sua inclusão, na modesta opinião da autora, objectivamente artificiosa, não tendo relação com o facto com que se pretende relacionar.

  1. - A matéria dos arts. 7º, 10º, 17º, 33º e 34º da petição inicial foi expressamente confessada pela ré no art. 6º da contestação, pelo que os pontos da Fundamentação de Facto da douta sentença que a eles se referem e que são, respectivamente, 5.7, 5.10, 5.17, 5.28 e 5.29 deviam, pura e simplesmente, no essencial, ter reproduzido o que se alega naqueles artigos da p. i. dando estes como provados.

  2. - Nos arts. 46º a 88º da petição inicial a autora alegou pormenorizadamente em quanto importava a reposição do imóvel na situação anterior àquela em que se encontrava antes da intervenção da ré, tendo junto os respectivos orçamentos, que são os documentos juntos sob os n.os 67, 68, 69, 70 e 71, nos quais vêm discriminadas as espécies, quantidades preços unitários e totais.

  3. - Estes foram considerados adequados por unanimidade pela perícia colegial.

  4. - As testemunhas que a seguir se vão referir responderam no mesmo sentido, ou seja, da comprovação da matéria de facto referida na conclusão 1ª. Assim: 7ª- A testemunha AA, foi o engenheiro que efectuou a reparação referente à electricidade, através da sua empresa, a AL..., L.da, conhecia as instalações desde há muitos anos, quando a A. ainda as utilizava, por ali prestar habitualmente serviços de manutenção, confirmou que as mesmas se encontravam em perfeitas condições de funcionamento quando a ré tomou conta das mesmas e descreveu a situação em que se encontravam quando esta as deixou, com o chão destruído, a instalação eléctrica alterada, tudo por concluir, as janelas tinham desaparecido, não tinha portas, não tinha sanitários, não tinha louças sanitárias, nem torneiras, tendo andado a empresa SC..., L.da a colocar portões para proteger o imóvel de estranhos, confirmando que as fotografias juntas com a p.i. como documentos n.os 8 a 66, traduziam a realidade do imóvel tal como foi deixado pela ré, como resulta das seguintes passagens do seu depoimento, prestado na audiência de julgamento de 23 de Setembro de 2020, gravado no sistema em uso no Tribunal: 06’:00’’ a13’:10’’; e de 18’:20’’ a 21’:30’’.

  5. - A testemunha BB também declarou o mesmo da testemunha anterior, confirmou as fotografias (documentos 8 a 66) juntos com a p. i. como traduzindo a situação do imóvel quando foi deixado pela ré, que quando esta entrou nas mesmas, estas encontravam-se em boas condições, as janelas funcionavam perfeitamente, não tinham, por isso, avarias, o piso estava em bom estado, liso, sem buracos, as paredes revestidas e pintadas, a instalação eléctrica e a rede de água funcionavam bem e que quando a ré deixou as instalações faltavam portões, tendo a autora que andar a vedar as mesmas, para impedir o acesso a estranhos, colocando portões e tapumes, tudo conforme resulta das seguintes passagens do seu depoimento, prestado na audiência de julgamento de 23 de Setembro de 2020, gravado no sistema em uso no Tribunal: de 00’:15’’ a 07’:20’’; de 07’:20’’a 12’:29’’; de 13’: 17’’ a 20’:55’’ e de 20’:55’’ a 24’:04’’.

  6. - A testemunha CC referiu que as instalações, quando a ré iniciou obras de adaptação, estavam em perfeitas condições, com os escritórios e as oficinas, e que quando foram retomadas pela autora estavam em estado lastimoso, degradado, tudo esburacado, esventrado, com o chão que antes era “lisinho” todo cheio de fossas e buracos, as casas de banho não existiam, as janelas e as portas tinham sido retiradas e na altura a autora teve inclusivamente que por tapumes nas janelas e mandar colocar portões para impedir o acesso de estranhos; esta testemunha também confirmou qua as fotografias juntas com a petição inicial – docs. 8 a 66 – traduzem a realidade do imóvel após ter sido deixado pela ré, tendo também confirmado as partes que a ré demoliu, conforme as seguintes passagens do seu depoimento, prestado na audiência de 23 de Setembro de 2020 e gravado no sistema em uso no Tribunal: de 02’:00’’ a 08’:03’’; de 08’:50’’ a 11’:34’’; de 12’:40’’ a 16’:00’’.

  7. - A testemunha DD declarou que conhece as instalações há muitos anos e nomeadamente quando a autora mudou para as instalações novas, e como se encontravam quando a ré tomou conta do imóvel para fazer as obras de adaptação para o centro de inspecções de veículos automóveis: estavam em bom estado, em perfeitas condições de...

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