Acórdão nº 3078/21.0T8LRA-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução11 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: Arlindo Oliveira Adjuntos: Emídio Francisco Santos Catarina Gonçalves Processo n.º 3078/21.0T8LRA-B.C1 – Apelação Comarca de Leiria, Leiria, Juízo de Comércio Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Por sentença datada de 02.09.2021, já transitada em julgado, foi declarada a insolvência de “M..., Unipessoal, L.da.”.

*** Pelo credor “IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P.” foi apresentado requerimento requerendo a abertura do incidente de qualificação da insolvência, pugnando que seja declarada como culposa a insolvência de M..., Unipessoal, L.da., identificando o gerente, AA como a pessoa que deve ser afetada pela qualificação da insolvência.

Com o fundamento em que o insolvente celebrou consigo um contrato de concessão de incentivos financeiros, tendo recebido a quantia de 372.263,97 €, destinada à aquisição de bens e equipamentos, que não podiam ser onerados ou vendidos sem a sua autorização.

Contudo, quando foi declarada a insolvência da requerida, os bens em causa não faziam parte dos activos da sociedade insolvente, tendo sido alienados, sem o seu conhecimento e/ou autorização, a uma outra sociedade, cujo único sócio e gerente é irmão do gerente da insolvente, o que potenciou a situação de insolvência em que caiu a requerida.

* Em consequência, pelo despacho proferido a 30.11.2021 foi declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência e ordenou-se o cumprimento do disposto no artigo 188.º, n. º3, do CIRE.

*** A Exma. Administradora da Insolvência, emitiu o parecer a que alude o artigo 188.º, n.º 2, do CIRE, propondo a qualificação da insolvência como culposa, e identificou o gerente, AA como a pessoa que deve ser afetada pela qualificação da insolvência.

Pugnou pela qualificação da insolvência por força do disposto no artigo 186.º, n. º 2, alíneas f) e g) e n.º 3, alínea a), do CIRE, resumidamente, com base na factualidade alegada pelo IAPMEI.

Complementando o seu Parecer (cf. fl.s 168 e v.º), com o facto de já em 2019, a insolvente apresentar prejuízos no montante de 1.032,86 € e, em finais de 2020, de 407.472,98 €, só vindo o seu gerente a requerer a insolvência em 30 de Agosto de 2021.

* Também o Digno Magistrado do Ministério Público, em sede de parecer, pugnou pela qualificação da insolvência nos termos das disposições conjugadas dos artigos 186.º, n.ºs 1 e 2 a), d) e f), do CIRE.

Aduz, para tal, que a insolvente vendeu os seus equipamentos para outra sociedade, que desenvolvia idêntica actividade, com quem partilhava o mesmo espaço e cujo sócio e gerente era irmão do gerente da insolvente, por preços inferiores aos de mercado e colocando-se numa situação que a impossibilitou de levar a cabo a sua actividade, caindo em situação de insolvência e sem que o produto da venda tinha servido os interesses da insolvente.

Notificada a insolvente e citado pessoalmente o seu gerente, para, querendo e no prazo de 15 dias, deduzirem oposição, conforme disposto no artigo 188.º, nº 5, do CIRE, pelo Requerido AA foi deduzida oposição, pugnando pela declaração de insolvência como fortuita.

Alegou para tal, em resumo, que teve de vender os equipamentos em causa, dada a queda abrupta de encomendas, no ano de 2020, dado o surgimento da epidemia de Covid-19, para satisfazer compromissos da insolvente e que ambas as empresas (insolvente e a gerida pelo irmão) sempre mantiveram relações comerciais entre si.

Que vendeu tal equipamento pelo melhor preço que lhe foi oferecido.

Com dispensa de audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar e despacho de identificação do objecto do litígio e de enunciação dos temas da prova (cf. fl.s 373/374 v.º).

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 396 a 408 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final, se decidiu o seguinte: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, e em face do disposto no art.º 186º, nº 2, al. f), do CIRE qualifico a presente insolvência de “M..., Unipessoal, L.da. como culposa e, nessa conformidade, decido: 1) - Declarar AA como afetado com a declaração da insolvência como culposa; 2) - Declará-lo inibido para a administração de patrimónios de terceiros e para o exercício do comércio, por um período de três anos, bem como para ocupar qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa, pelo mesmo período; 3) –Condená-lo a indemnizar os credores da insolvente no correspondente ao valor dos prejuízos causados à insolvente pela venda dos equipamentos (à data da declaração de insolvência), e até ao limite dos créditos não satisfeitos pelo produto da massa insolvente, tudo sem prejuízo do limite associado ao património pessoal do responsável, a quantificar em incidente de liquidação, nos termos da parte final do nº 4 do art.º 189º do CIRE.

*** Nos termos do disposto no artigo 303º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a atividade processual relativa ao incidente de qualificação da insolvência, quando as custas devam ficar a cargo da massa, não é objeto de tributação autónoma.”.

Inconformado com a sentença proferida, dela interpôs recurso o requerido AA, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo – (cf. despacho de fl.s 466), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1. O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo Juiz 1, do Juízo de Comércio de Leiria, Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, que decidiu qualificar como culposa a insolvência da empresa M..., Unipessoal, L.da., afetando pela qualificação a AA .

2. O Recorrente não se conforma com tal decisão, pelo que, recorre da matéria de facto e de direito.

3. Existe erro notório na sentença ora recorrida, na parte da Decisão (página 25), que refere: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, e em face do disposto no art.º 186º, n.º 2, al. f), do CIRE qualifico a presente insolvência de “M..., Unipessoal, L.da.” como culposa…”, o que desde já se impugna, pois a insolvência foi qualificada culposa nos termos do art.º 186.º, n.º 2, al. a) do CIRE, conforme referido na sentença, na parte da fundamentação de Direito / Da qualificação da Insolvência (nas páginas nºs 12, 13, 14, 15 e16); 4. Não resultaram provados factos que permitissem preencher os requisitos da al. f), do n.º 2, do art.º 186.º do CIRE, (conforme referido na sentença, na página 19), requerendo-se assim a correção deste erro.

5. A sentença que ora se recorre, relativamente, a qualificação da insolvência como culposa, peca, por excesso, perante os factos dados como provados na fundamentação da sentença, concatenados com os factos que não foram dados como provados, isto tendo em conta toda a prova documental junta aos autos, conjuntamente com a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento.

6. Não se encontram preenchidos os requisitos da al. a), do n.º 2, do art.º 186.º do CIRE, pois na situação concreta, não existe culpa do Recorrente, nem nexo de causalidade entre a atuação do Recorrente enquanto gerente da Insolvente e a criação e/ou agravamento do estado de Insolvência da M..., Unipessoal, L.da.; 7. A situação de insolvência não foi criada nem agravada pelo gerente/Recorrente, pois a culpa da insolvência foi do surgimento da pandemia de SARS-COV-2, que afetou gravemente a situação económica da Insolvente.

8. Atentos os factos dados como provados em confronto com os não provados, a Insolvência deveria ter sido julgada fortuita e não culposa.

9. Existe erro na apreciação do facto dado como provado no ponto 9., que refere: “No Balancete Geral, à data de 31-8-2021, a insolvente apresentava, de ativos fixos tangíveis o valor de € 119.722,27”, pois não foi tido em atenção pelo Tribunal a quo, ao analisar o documento – balancete analítico – junto aos autos a fls. 132 a 133, que, os ativos fixos tangíveis não só eram compostos pelos bens apreendidos (indicados no facto provado n.º 10), como também neles estavam compreendidos as instalações elétricas e de rede, assim como, as instalações da sapata e instalações de escada do pavilhão, sito na anterior sede da Insolvente; 10. Ativos fixos tangíveis estes que, quando a Insolvente mudou de instalações, não os pode retirar do imóvel, pois faziam parte dele, e o imóvel não era propriedade da Insolvente; 11. Deve proceder-se a alteração do facto dado como provado no n.º 9, o qual deverá ser alterado para a seguinte redação: - No Balancete Geral, à data de 31-8-2021, a insolvente apresentava, de ativos fixos tangíveis o valor de € 119.722,27, sendo que, parte desses ativos faziam parte do pavilhão da anterior sede da Insolvente, por se tratarem de obras no prédio, razão pela qual, o valor de ativos fixos tangíveis era inferior.

12. O Tribunal a quo, julgou incorretamente o facto dado como provado no ponto n.º 10, que refere: “No seguimento das diligências de apreensão efetuadas, a Sra. Administradora da Insolvência logrou apreender os seguintes bens para a massa insolvente: - Uma máquina de moldes, marca ..., modelo ..., no estado de sucata, à qual atribuiu o valor de € 600,00 – verba n.º 1 do auto de apreensão.

- uma máquina de moldes marca ..., modelo ..., em estado de sucata, à qual atribuiu o valor de € 200,00 – verba n.º 2 do auto de apreensão.

- três PC´s cpm CPU, marca ... e teclados, ao qual atribuiu o valor de € 90,00 – verba n.º 3 do auto de apreensão.

- setecentas acções nominativas, representativas do capital social da “N..., SA”, no valor individual de € 1,00.”; 13. Este facto está parcialmente incorreto, na parte que refere que as máquinas e PC´s/teclados apreendidos eram sucata, pois o termo “sucata” foi atribuído pela Administradora de Insolvência, sem que, aos supra referidos bens lhes tenha sido...

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