Acórdão nº 3106/20.6T8VIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Março de 2022
Magistrado Responsável | VÍTOR AMARAL |
Data da Resolução | 17 de Março de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – Relatório A “A...
”, com os sinais dos autos, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra “AP..., Companhia de Seguros S. A.
”, também com os sinais dos autos, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe o montante indemnizatório de € 12.500,00, acrescido de juros de mora contabilizados desde a citação e até integral pagamento.
Para tanto, alegou, em síntese: - a existência de um acidente de viação, ocorrido em 06/09/2015, em que foram intervenientes um veículo especial ambulância, pertença da A., que seguia em marcha de urgência assinalada, por transportar um utente em maca com destino ao hospital, e um veículo ligeiro de mercadorias, seguro na R.; - tendo o acidente ocorrido por responsabilidade exclusiva do condutor do veículo seguro, dele resultaram diversos danos, no valor peticionado, cuja indemnização cabe à R. suportar, por força da transferência de responsabilidade civil decorrente do dito seguro (seguro obrigatório automóvel); - por força do acidente em causa, o condutor do veículo seguro/sinistrante foi acusado e condenado pela prática de um crime de ofensa à integridade física e por um crime de condução sem habilitação legal, no âmbito de processo comum singular com o n.º 169/15...., do Juízo Local Criminal ..., razão pela qual, nos termos do disposto no art.º 498.º, n.º 3, do CCiv., o prazo prescricional é de cinco anos, não estando o peticionado direito indemnizatório prescrito.
A R. contestou, defendendo-se por impugnação e pugnando pela sua absolvição, para o que, ademais, excecionou a prescrição daquele direito indemnizatório, por entender que o prazo prescricional aplicável é o de três anos (não o de cinco anos), previsto no n.º 1 do aludido art.º 498.º.
Deduziu ainda, ao abrigo do art.º 321.º e segs. do NCPCiv., incidente de intervenção acessória de AA (menor, condutor do veículo seguro) e de BB e mulher, CC (pais daquele condutor menor), o que veio a ser deferido, sem que tenham os Chamados apresentado oposição ou tomado qualquer posição.
A A., no exercício do contraditório, veio pugnar pela improcedência da exceção da prescrição ([1]).
Dispensada a audiência prévia, foi proferido saneador-sentença, conhecendo da matéria da invocada prescrição, pelo qual esta exceção foi julgada procedente, por provada, com a consequente absolvição da R. do pedido.
Desta decisão absolutória vem a A., inconformada, interpor o presente recurso, apresentando alegação respetiva e as seguintes Conclusões ([2]): «1. Nos presentes autos está em causa um acidente de viação ocorrido em 06/09/2015, que deu origem a um processo comum conforme decorre da sentença junta aos autos; 2. Do ilícito levado a cabo pelo condutor do veículo segurado pela ré resultaram danos à integridade física do doente transportado no veículo (ambulância) da autora e bem assim danos ao veículo da autora; 3. A autora é assim, perante o ilícito praticado pelo condutor do veículo seguro pela ré, lesada e nessa qualidade beneficia do prazo mais longo de prescrição previsto no n.º 3 do artigo 498º do Código Civil; 4. A presente ação deu entrada em 20/08/2020 e a ré foi citada em, 26/08/2020, pelo que à data da instauração da ação ainda não havia decorrido o prazo mais longo referido; Sem prescindir, 5. A acusação que deu origem à sentença já junta aos autos, foi deduzida apenas em 14/05/2018 (conforme cópia junta aos autos), sendo que só após tal data é que começa a correr o prazo de prescrição, na medida em que antes de tal prazo a autora, lesada, não estava em condições de exercer o seu direito.
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Pelo que, também por tal fundamento legal, previsto no artigo 306º do Código Civil não se verifica a exceção de prescrição.
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A sentença recorrida viola o disposto no n.º 3 do artigo 498º e bem assim o disposto no artigo 306º ambos do Código Civil.
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Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a decisão proferida e julgando a exceção de prescrição não provada e improcedente, ordenando-se o prosseguimento dos autos.
Assim fazendo V.ªs Ex.ªs a acostumada JUSTIÇA!».
Contra-alegou a parte recorrida, pugnando pela manutenção da decisão sob recurso.
* O recurso foi admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, tendo então sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foram mantidos tais regime e efeito fixados.
Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.
* II – Âmbito do recurso Sendo o objeto dos recursos delimitado pelas respetivas conclusões, pressuposto o objeto do processo delimitado nos articulados das partes, está em causa na presente apelação saber se ocorre, ou não, a prescrição do direito indemnizatório invocado na ação.
* III – Fundamentação A) Quanto à matéria de facto Na 1.ª instância foi considerada a seguinte factualidade como assente: «1. A autora é dona e legítima possuidora do veículo especial, ambulância, ... 313CDI, com a matrícula ...-...-ZJ.
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No dia 06-09-2015, pelas 17h e 30m, AA, à data com 16 anos de idade, conduzia, sem habilitação legal para o efeito, o veículo automóvel ligeiro de mercadorias, de marca ..., modelo ..., de cor ..., com a matrícula ...-...-NU, na Estrada ..., em ..., ..., no sentido ... - ....
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Seguia no mesmo sentido, a ambulância da autora com a matrícula ...-...-ZJ, em marcha de urgência, devidamente assinalada.
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No decurso de uma manobra de ultrapassagem pela ambulância da autora com a matrícula ...-...-ZJ, veio esta a ser embatida na sua parte dianteira pela viatura automóvel com a matrícula ...-...-NU.
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Em consequência do embate, DD, que na altura seguia de ambulância na célula sanitária, deitado na maca, sofreu dores traumatismo cervical e ferimentos ao nível da coluna.
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Na sequência do sinistro referido em 4 e 5, veio o veículo especial, ambulância, ... 313CDI, com a matrícula ...-...-ZJ, a precisar de reparação cujo custo ascendeu a 4.617,35€ (quatro mil, seiscentos e dezassete euros e trinta e cinco cêntimos).
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Ao tempo do sinistro referido em 4 e 5., responsabilidade civil pelos danos decorrentes da circulação do veículo automóvel com a matrícula ...-...-NU, encontrava-se transferida para a ré através do contrato de seguro titulado pela apólice n.º ...70...
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Por carta datada de 05-05-2016, que deu entrada na sede da autora, pelo menos em 19-05-2016, a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões –...
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