Acórdão nº 90/18.0T8OFR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelSÍLVIA PIRES
Data da Resolução15 de Fevereiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra O Autor intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de acção declarativa comum, pedindo a condenação das Rés a pagarem-lhe a quantia de €13.000,00, acrescida dos juros de mora vencidos e vincendos desde a data de citação até efectivo e integral pagamento.

Para fundamentar a sua pretensão alegou em síntese que sofreu um acidente de viação, do qual resultaram lhe danos.

Imputa à Ré a culpa exclusiva na ocorrência do acidente que alega ter ocorrido por culpa exclusiva da Ré, porquanto como concessionária da auto-estrada ..., por onde circulava não impediu que um javali nela se introduzisse e provocasse o aludido acidente.

A Ré A..., S.A. requereu a Intervenção Principal Provocada da Seguradora B... – Sucursal de Portugal, incidente que foi admitido e, contestando a acção impugnou, por desconhecimento as circunstâncias em que ocorreu o acidente e os danos invocados, alegando que cumpriu todas as obrigações que sobre si impendiam.

Concluiu pela improcedência da acção.

A Ré B... – Sucursal em Portugal contestou, alegando a existência, no contrato de seguro que a une à Ré A..., S.A., de uma franquia de € 5.000.00 e, impugnando por desconhecimento as circunstâncias em que ocorreu o acidente e os danos invocados, alegando que a co-Ré cumpriu todas as obrigações que sobre si impendiam.

Concluiu pela improcedência da acção.

Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos: Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condeno as Rés A..., S.A. e B... Sucursal em Portugal a pagarem, solidariamente, ao Autor a quantia de €9.352,48 (nove mil, trezentos e cinquenta e dois euros e quarenta e oito cêntimos), a título de danos patrimoniais.

E mais condeno as Rés A..., S.A. e B... Sucursal em Portugal a pagarem, solidariamente, ao Autor, o montante de €2.000,00 (dois mil euros) a título de danos não patrimoniais. Sendo que, a condenação da Ré A..., S.A. e Alta – Auto-Estradas da Beira Litoral e Alta, SA é sem prejuízo do contrato de seguro celebrado com a interveniente e da respectiva franquia prevista.

Às sobreditas quantias acrescem juros moratórios, à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

* A Ré A..., S.A. interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: I.

A sentença é nula, nulidade que expressamente se invoca de harmonia com o disposto no artigo 615º nº 1 alínea c) do C. P. C., porquanto é claro que os fundamentos (de facto, principalmente) estão em oposição (porque inexistem em alguns casos) com a decisão, além de que a sentença é ininteligível por ser ambígua e obscura; II.

Efectivamente, e desde logo, foi considerado na decisão que o alegado valor venal do veículo à data do sinistro devia ser deduzido do putativo valor do salvado deste na importância de € 1.100,00, quando é absolutamente evidente que esse putativo valor do salvado não decorre, por pouco que seja, do elenco dos factos provados, o que significa que a sentença “utilizou” factos que ali não figuram; III.

Depois, também parece que inexiste o mínimo suporte factual (cfr. ponto 27 dos factos provados) que permitisse à sentença concluir, como concluiu e decidiu em conformidade, que o A. pagou, a título de aluguer de veículo, o que quer que fosse e designadamente as quantias de € 61,50 e € 1.630,24; IV.

Acresce ainda referir, mais uma vez sem a menor base de facto que lhe permitisse avançar por aí (ainda que, refira-se, tenha depois decidido - e bem nesta parte - não “conceder” essa parcela de indemnização ao A.), que, ao contrário do que resulta do “corpo” da fundamentação de direito (e apenas aí), não está no rol dos factos provados que o A. pagou o que quer que tenha sido (€ 3.302,55 ou outra qualquer quantia) “pelo aparcamento da viatura enquanto aguardava o desfecho do litígio” (e isto já nem sequer tomando em linha de conta que o eventual agravamento dos danos – a ser real – ser-lhe-ia, em tal hipótese, totalmente imputável, já que a R. – cfr. facto provado nº 16 – tomou posição sobre a pretensão do A., tendo então declinado a responsabilidade); V.

Reitera-se, por isso, que a sentença é nula, com as legais consequências, arguindo-se expressamente nestas linhas essa nulidade na medida em que é absolutamente indiscutível que a sua fundamentação e respectiva decisão teve por base e lançou mão de “factos” pura e simplesmente inexistentes.

Isto posto, VI.

Independentemente do que antecede a respeito do ponto 27 dos factos provados, a R., como questão prévia, não se conforma por pouco que seja com a decisão que versou sobre os pontos 17, 22 e 23, bem como o já referido ponto 27 e ainda o ponto 31, todos dos factos provados, quer porque é nítido que essa matéria de facto teve como “base” documentos impugnados e não confirmados, quer porque se apoiou nas declarações de parte do A. (e este, convenhamos, não deixa de ser interessado num desfecho favorável da acção, tal como decorre p. ex. do ac. do T. R. Porto de 20.06.2016, tirado no âmbito do proc. nº 2050/14.0T8PRT.P1 e consultável em www.dgsi.pt ); VII.

De todo o modo, e sem prescindir do antes referido, é obrigatório desde já concluir (apenas com a prova “disponível” nesta altura, portanto) que não é possível que a resposta ao ponto 27 dos factos provados fique tal como está, devendo esta, e apenas em tal caso, ficar limitada à seguinte resposta: - provado que o Autor alugou um veículo por período de tempo que não foi possível apurar e por um valor que também não foi possível apurar; VIII.

E, da mesma maneira, por razões idênticas (e apenas para o caso de se entender que a matéria a que se refere o ponto 17. dos factos provados não deve integrar, como parece mais lógico, a resposta àquele facto nº 27, já que, em bom rigor, até por redundante, talvez devesse ser considerado não provado), a resposta ao referido facto nº 17 não deverá exceder a seguinte: - provado que o Autor promoveu o aluguer de viatura de substituição, pagando diariamente valor não apurado.

Segue-se que IX.

Entende a R./apelante, que o tribunal a quo não analisou correctamente a prova produzida pelas partes (longe disso, aliás), desde logo porque replica de uma forma absolutamente acrítica a tese do A., a prova do A. e até argumentos do A., ma também porque é nítido que incorre em claro erro de apreciação da prova e também de julgamento no que se refere desde logo ao ponto 13 dos factos provados e às alíneas a), b) e c) dos factos não provados; X.

Na verdade, atendendo ao conjunto da prova produzida (sim, porque a R. também produziu alguma prova, embora não contraprova), concluímos, em primeiro lugar, que a prova do A. relativa ao ponto 13 dos factos provados colide necessariamente com aquela produzida pela R. a tal respeito e a propósito ainda da alínea c) dos factos não provados, além de que é evidente que estas são nitidamente incompatíveis entre si; XI.

Na verdade, “ouvindo” o depoimento transcrito de BB, depoimento esse que não se vê como possa ter sido vago ou sequer hesitante (cfr. 4m38s), mas igualmente aquele de CC que, ademais, o confirmou (cfr. 9m18s), não resta a mínima dúvida que este confirma, tal como a R. alegou, que na noite do acidente as vedações da auto-estrada (e não há dúvida que foi o único – nem sequer a B. T. da G. N. R. o fez, como facilmente se percebe - a ter verificado as vedações nessa noite) naquele local encontravam-se levantadas ou “em pé”, ao contrário, portanto, daquilo que um ou dias depois (nem isso se sabe) o A. e duas testemunhas terão visto (e falta também saber se vedações derrubadas ou inexistentes, dado a nítida contradição entre a resposta ao ponto 13 dos factos provados, ou seja, inexistência de vedações, e a fundamentação de direito da sentença, i. e.

, vedações derrubadas); XII.

Por isso, e porque o ponto 13 dos factos provados não corresponde à verdade e à prova produzida nos autos, deve esta matéria ser relegada para o rol dos factos não provados; XIII.

Por seu turno, e exactamente porque foi feita prova nesse sentido, diversamente do que considerou a sentença, a alínea c) dos factos não provadas deve fazer o trajecto inverso, ou seja, ser aquela matéria incluída, tal como está redigida, no elenco dos factos provados e, obviamente, considerada na decisão final; XIV.

Aliás, não deixa de ser curioso verificar, não obstante esta opção que nos parece manifestamente errada da sentença, que, ainda assim, isso não impediu a sentença de considerar provado, de forma visivelmente contraditória, de resto, o que resulta do ponto 38 dos factos provados, ou seja, que a R. nunca deixou de continuar a reposicionar provisoriamente as vedações afectadas por esses grandes incêndios sempre que isso se justificava e que era detectado, enquanto não aconteceu a substituição total destas; XV.

Está também em causa um nítido erro de apreciação da prova e inevitável erro de julgamento no que toca às alíneas a) e b) dos factos não provados, seja porque os depoimentos de CC e de DD supra transcritos nestas linhas assim o mostram muito facilmente, seja porque o documento junto pela R. (a tal “subsequente resposta da R.” à apreciação do assunto das vedações junto da AR) confirma de forma totalmente inequívoca esses depoimentos (isto sem esquecer que uma parte da factualidade constante daquelas alíneas até corresponde – parece-nos – a factos públicos e notórios); XVI.

Por isso, e tal como sucedeu com a alínea c) dos factos não provados, estas alíneas a) e b) de idêntico “local” na sentença devem transitar, exactamente com a mesma redacção, para o acervo dos factos provados e que devem ser atendidos e ponderados na decisão final; XVII.

Igualmente errada, salvo o devido respeito, é a decisão da matéria de facto respeitante aos pontos 1, 22 e 23 dos factos provados, ainda que por razões diferentes; XVIII.

Com efeito, e quanto ao facto provado nº 1, não deixa de ser curioso que seja apelidado de “notório”, quando, na realidade, a...

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