Acórdão nº 2281/20.4T8LRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | TERESA ALBUQUERQUE |
Data da Resolução | 01 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra I – A., veio, em 16/7/2020, interpor acção declarativa de condenação com processo comum contra B., SA, pedindo a sua condenação, a: 1. Reconhecer a existência dos defeitos da garagem da A., descritos nos arts 29º, 32º a 36º 67º a 82º da p i; 2. Reconhecer a existência dos defeitos da rampa de acesso, descritos nos arts 37º a 57º da p i; 3- A proceder à eliminação dos defeitos descritos em 1 e 2 no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão. No que se refere à rampa deverá proceder à execução das obras previstas no art 65º da p i; 4 -Caso a R. não proceda à realização das obras no mencionado prazo, ser condenada no pagamento das obras a realizar pela A., custeando todos os projectos e licenças necessárias; 5 – A pagar à A. uma indemnização por danos morais, em valor nunca inferior a € 2.500,00, acrescida de juros vencidos, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento; 6 – A pagar à A. uma indemnização no valor de € 30.000,00 referente à desvalorização da fracção e ao facto de não poder utilizar a garagem, acrescida de juros vencidos, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento.
Alegou, para tanto, e em síntese: Em meados de 2017, visitou o prédio em que veio a adquirir a fracção designada pela letra G, prédio esse que estava em fase de acabamentos, dispondo tal fracção de garagem privativa no piso menos dois, tendo-lhe sido referido pela vendedora ser apta para o estacionamento de duas viaturas, condição de que a mesma não abdicava para a sua aquisição. A essa garagem acedia-se através de rampa situada na fachada principal do edifício. O preço da fracção foi fixado em 150.000,00 €. Nas visitas que efectuou à mesma, a A., apesar de o ter solicitado, nunca pôde aceder à garagem, por motivos vários sucessivamente expostos pela R., que se dedica a actividade de construção civil, bem como à compra e venda de imóveis. Só após a aquisição da fracção, que teve lugar em 6/12/2017, é que a R. lhe entregou as plantas dos pisos menos 1 e menos 2, confirmando as mesmas que a garagem afecta à fracção G tinha lugar para duas viaturas. A A. instalou-se na fracção dois meses depois da respectiva aquisição e constatou – bem como os demais condóminos do prédio - que a rampa de acesso às garagens tem inclinação e configuração inadequada para a circulação de viaturas e o piso da mesma não é apto para o fim a que se destina, defeitos estes que impedem/dificultam a sua utilização, tendo constatado igualmente que era praticamente impossível estacionar duas viaturas no interior da garagem, podendo, eventualmente, caber nela duas viaturas mas de pequena dimensão.
De todo o modo, o estacionamento nessa garagem – seja a viatura grande ou pequena – só é possível se o estacionamento ao lado estiver sem nenhum carro estacionado. Quando se estacionem no lugar em causa duas pequenas viaturas a que tiver entrado em primeiro lugar só pode sair quando tiver saído a estacionada depois, acrescendo que só é possível a entrada de uma viatura na garagem se se fizerem pelo menos seis manobras, não existindo qualquer área que permita o cruzamento ou passagem de dois veículos que se encontrem em acções contrárias - um a sair da garagem outro a entrar.
Em função do exposto, a A. não utiliza a garagem que comprou, deixando as viaturas estacionadas na via publica, com o que tem sofrido transtornos e incómodos, devendo ser ressarcida em montante não inferior a 2.500.00 €.
Acresce que se quiser vender a fracção, tem que ter em conta que a mesma não tem estacionamento, o que a desvaloriza em 30.000,00 €.
Nas assembleias de condóminos de 6/2/2018 e 15/1/2019, os condóminos manifestaram-se quanto ao facto de não conseguirem aceder às garagens por força dos problemas da rampa, tendo sido deliberada a notificação por escrito da R. para corrigir ou eliminar os defeitos.
Em 5/2/2019, a R. foi notificada para proceder à correcção rápida e eficiente da rampa e a mesma tentou fazê-lo, tendo reduzido o pé direito para a entrada das garagens para 2,03 m. A geometria actual da rampa decorre de alterações e correcções que foram executadas pela R. em data posterior à conclusão do imóvel, e em momentos distintos, mas, de todo o modo, a rampa – cujo piso foi também já objecto de reparações - não obedece às exigências técnicas para a construção de rampas, tanto mais que as alterações realizadas implicaram a redução da altura livre de passagem do portão o que inviabiliza o acesso aos pisos de estacionamento relativamente a alguns tipos de veículos com maior dimensão.
Em 10/2/2020 os condóminos em assembleia deliberaram contratar um técnico para analisar os problemas existentes na rampa e apresentar solução técnica para a sua resolução, tendo esse técnico apresentado relatório que a A. juntou com a p i.
A A. interpelou a R. diversas vezes para reparar os defeitos da rampa e da garagem que impedem/dificultam muito a sua utilização para o fim a que se destinam, mas a mesma, apesar de os reconhecer, até hoje nada fez, tendo a A. junto, a titulo demonstrativo, a comunicação que lhe fez de 22/11/2019.
A R. contestou, invocando a ineptidão da petição inicial em função da incongruência dos diversos pedidos na respectiva articulação, e invocou a ilegitimidade da A,, invocando, a este respeito, que os pedidos referentes às rampas de acesso tinham que ser feitos por todos os titulares do direito ou por representante devidamente mandatado para o efeito, invocando o disposto nos arts 1436º e 1437º CC. De todo o modo, impugnou a factualidade invocada, referindo que foi a A. quem deliberadamente escolheu a fracção G por ter um preço mais baixo, porque, prescindindo à partida de garagem, e uma vez que todas as fracções dela dispunham, acabou por escolher a mais barata. A A. visitou a garagem a pé, recebeu as plantas dos pisos menos 1 e 2 antes da aquisição da fracção, sendo que desde o 1º dia em que entrou na garagem estava apta a ter conhecimento efectivo dos defeitos que invoca na garagem e/ou na rampa de acesso, o que sucede pelo menos desde o dia da aquisição - 6/12/2017 - sendo que só os denunciou em 25/11/2019, mais de um ano depois de os conhecer, o que implica a caducidade dos alegados direitos da mesma. Mesmo que se aceitasse por absurdo que apenas dois meses depois da aquisição a A. se instalou no imóvel, ainda assim se verificaria a referida caducidade. No demais impugnou a existência dos alegados defeitos, referindo que a garagem em causa é apta e idónea a receber veículos automóveis, está conforme os projectos camarários, plantas e licenças e é aquilo que a A. viu e decidiu comprar . Amite ter alterado a inclinação da rampa, alteração a que procedeu com vista a facilitar a entrada e saída da garagem, porque alguns proprietários haviam questionado se tal seria possível, sem no entanto terem apresentado qualquer reclamação ou alegado que a rampa estava construída de forma defeituosa, não tendo havido da sua parte qualquer assunção ou reconhecimento de defeitos.
A A. respondeu às excepções deduzidas, referindo, em síntese, relativamente à ilegitimidade activa, que a R. não pode negar ter recebido a comunicação que lhe foi enviada em 5/2/2019 pelos condóminos, e que, de todo o modo, o acesso aos Tribunais não pode ficar na dependência da prévia deliberação da maioria dos condóminos, pois que assim corria-se o risco da caducidade dos direitos Entende, pois, que dispõe de legitimidade para peticionar a eliminação dos defeitos nas partes comuns do prédio, até porque os mesmos a impedem do uso da sua fracção na plenitude. Quanto à excepção de caducidade, lembra que o consumidor tem o prazo de 5 anos para denunciar defeitos e exigir a sua reparação, acrescendo que denunciou inúmeras vezes os defeitos a que alude na petição, verbalmente e por escrito, tendo a R. assumido os defeitos e o compromisso de os reparar, tendo realizado duas intervenções na rampa de acesso em 2018 e 2019, sem que aqueles desaparecessem.
Dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no âmbito do qual se julgou improcedente a nulidade da ineptidão da petição inicial, procedente a excepção de ilegitimidade activa arguida pela R, julgando-se a A. parte ilegítima para os pedidos formulados em 3 e 4, absolvendo-se a R. da instância nessa parte, e se julgou procedente a excepção de caducidade, nos termos dos arts 298º CC e 577º/3 do CPC, absolvendo-se a R. dos pedidos formulados em 1 e em parte dos formulados em 3 e 4, fazendo-se prosseguir a...
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