Acórdão nº 489/20.1T8LSA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução24 de Maio de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

G..., Lda.

intentou contra A..., Lda. e E..., S.A. a presente ação declarativa, de condenação, com processo comum.

Pediu a condenação: - da 1.ª Ré no pagamento de € 80 pagos a título de urgência na compra da viatura; - das Rés no pagamento solidário do valor de € 14 568,38, a título de danos patrimoniais, e do valor de € 431,62, a título de danos morais.

Alegou, em síntese: Em 24-07-2019 comprou à 1.ª Ré uma carrinha usada, tendo, além do preço acordado, pago € 80 como taxa de urgência para se proceder de imediato à transferência da propriedade do veículo.

Contudo só depois de cerca de um mês é que foram enviados os documentos necessários à legalização da viatura, o que lhe causou prejuízos, pois até então não pôde usar a viatura na atividade que desenvolve.

As Rés prestaram uma garantia voluntária com o prazo de 12 meses, sendo que a viatura veio a apresentar diversas avarias, sendo que, em relação à última, ocorrida a 05-02-2020 (portanto dentro do prazo da garantia alegadamente prestada), as Rés declinaram a responsabilidade pela respetiva reparação, referindo a 2.ª Ré que o prazo de garantia era de apenas 6 meses.

Estes factos causaram-lhe diversos prejuízos, os quais pretende ver ressarcidos.

Contestou apenas a 1ª ré.

Disse: O pagamento do valor de € 80 deveu-se ao custo normal de um processo de colocação da viatura no nome do adquirente.

Apesar de inicialmente a garantia voluntária ter sido celebrada pelo prazo de 1 ano (estando em vigor entre 01-08-2019 e 31-07-2020), posteriormente, teve conhecimento de que a Autora lhe ocultou intencionalmente que a viatura se destinava a uso profissional e intensivo de transporte de mercadorias, pelo que o contrato foi celebrado em erro.

Em 04-12-2012, deu conhecimento à Autora de que, perante a utilização dada ao veículo, a garantia era de 6 meses.

Não são devidos os valores peticionados e que, em relação aos prejuízos alegadamente decorrentes da última avaria do veículo, mesmo que o fossem seriam da responsabilidade da 2.ª Ré. Pediu: a improcedência da ação.

2.

Prosseguiu o processo os seus termos tendo, a final, sido proferida sentença na qual foi decidido: «julga-se a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, decide-se condenar as Rés A..., Lda. e E..., S.A. no pagamento solidário à Autora G..., Lda. do valor de € 2 619,76 (dois mil seiscentos e dezanove euros e setenta e seis cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal, contabilizados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Condenam-se as Rés no pagamento de 17 % das custas do processo e a Autora nas demais.» 3.

Inconformadas recorreram a autora e, subordinadamente, as rés.

3.1.

Conclusões da autora.

  1. O presente recurso visa não apenas pôr em causa a decisão de direito, mas também, ao abrigo do disposto no artº 662º do CPC, impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto.

  2. Deve corrigir-se o ponto 21 dos factos provados, já que onde se lê 19, o Tribunal certamente queria escrever 18 “Nessa sequência, a Autora ordenou a reparação da viatura de acordo com o orçamento referido em 18”, pois é no ponto 18 dos factos provados que se faz menção ao orçamento.

  3. Da prova produzida em audiência de discussão e julgamento resulta claro que os factos d) e e) dos Factos não provados deviam ser dados como provados e, nesse sentido, deveriam ter sido condenadas as Ré no pagamento em causa.

  4. Cremos que dos documentos nº 9 e 9.1. juntos com a petição inicial, conjugados com prova feita em audiência, designadamente as declarações de parte dos gerentes da Autora, e ainda do depoimento da testemunha AA (BB , faixa 20210521105159_2920585_2870756, 8:27 a 9:26; CC, faixa 20210521115635_2920585_2870756, 7:09 a 7:39 e 8:35 a 9:00; e AA, faixa 20210521141123_2920585_2870756 de 4:05 a 5:06), se provou que a 27- 12-2019 ocorreu segunda fuga dos gases do escape, que custou à autora o valor de €302,32.

  5. Entende a Apelante que deveria o Tribunal dar ainda como provados a) o Artigo 26 da PI (o que se retira dos documentos 15 a 18 juntos com a PI, que provam cabalmente que através das cartas que a A. enviou, solicitou às rés a reparação da avaria do motor); b) e o art 27 da PI ( o que de retira dos documentos 19 e 20 juntos com a PI) VI) Entende ainda a Apelante que deveria o Tribunal dar ainda como provado o art. 31 da PI (como resulta das declarações do Gerente BB , faixa 20210521105159_2920585_2870756, 29:07 a 29:34), e nesta senda condenar ainda as Ré no pagamento à A. dos danos morais (€430,00) VII) Cremos que o Tribunal Recorrido fez ainda errada aplicação do direito, pois atendendo à factualidade dada como provada, nomeadamente nos artigos 14,15,18 e 21 (e ainda dos artigos 26 e 27 da Pi que aqui se pugnam como provados), deveria ter decidido igualmente pela condenação das Rés no pagamentos à A. no valor que teve a mesma de despender com a reparação do motor (€10 896,43), por este ser também ele um prejuízo como os demais que se condenaram as Rés a pagar à Recorrente.

  1. No caso, a A não só alegou como provou a existência de um contrato de compra e venda; a celebração de um contrato de garantia acordado pelo período de 12 meses, a garantia de bom funcionamento prestada, os problemas tidos pela viatura alegados na PI, o mau funcionamento da viatura comprada e todos os danos causados por tais problemas onse se inclui o valor pago pela Reparação do motor (€10 896,43) c) Provou-se ainda que a A. antes de avançar com a acção em causa, solicitou junto da 1ª Ré a reparação do motor (avariado em 05/02/20220) -Reparação que foi declinada.

  2. Com efeito, além dos direitos de reparação e substituição, ao comprador assiste o direito a ser indemnizado pelos danos decorrentes do mau funcionamento, ou seja, «pelos prejuízos derivados do cumprimento inexacto da prestação garantida (prometida) ou, se se preferir, do atraso com que o comprador recebeu a coisa em perfeito funcionamento» - Calvão da Silva apud acórdão do 08-10-2009, processo n.° 3359/07.5TBVD.L1-8.

  3. Ora, é injusto e absolutamente irrazoável que dentro destes danos se entendam como prejuízos só os que a Autora sofreu pela privação do uso da viatura (em cujos montantes as rés foram condenada a pagar), e não se incluam todos os demais danos causados pelo mau funcionamento, onde se insere o valor pago pela A. pela Reparação da avaria do motor em 05/2/2020- já que, como já referido, a reparação do bem que a lei prevê foi efectivamente solicitada e só não se verificou atenta a recusa pelas Rés nesta reparação.

  4. Tratando-se, para além do mais, de uma obrigação assumida no contrato. deve a A. ser condenada nos pagamentos dos demais danos alegados, pelo interesse contratual positivo no âmbito do 552 a 566 do CC, que visa colocar o credor/lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido.

  5. Quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação e a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão.

    Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas, deve o presente Recurso ser julgado procedente e em consequência serem as Rés condenadas (além dos valores que foram efectivamente condenadas em 1º instância) no pagamento de: a) 302,32 referente à reparação da 2º fuga de gases b) €430,00 a título de danos morais; e c) €10 896,43 referente à reparação do motor 3.2.

    Conclusões do recurso subordinado da ré A..., Lda.

    1) A Apelante não pode concordar com a douta decisão do Tribunal a quo, na parte em que condenou as Rés no pagamento solidário à Autora do valor de 2.619,76 € (dois mil, seiscentos e dezanove euros e setenta e seis cêntimos), consequentemente, o presente recurso abrange a decisão proferida sobre a matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, com todas as consequências indicadas a final.

    2) A partir do depoimento das testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento e dos documentos que se encontram juntos aos autos entende, com o devido respeito, que se impõe decisão diversa.

    3) Resultaram, ainda, da audiência de julgamento, outros factos instrumentais que deveriam ter sido dados como provados, nos termos do disposto no art.º 5.º do CPC.

    4) Quanto aos factos relativos à garantia prestada pelas Rés, foi dado como não provado que a Autora ocultou intencionalmente da 1ª Ré que desenvolve a actividade de transporte de mercadorias e que a viatura que comprou se destinava a fazer o transporte de mercadorias entre ... e ..., e que a 1ª Ré não soubesse daquela actividade e que 4 de Dezembro de 2019, a 1ª Ré transmitiu à Autora que devido à utilização profissional e intensiva da viatura a garantia era de 6 meses.

    5) Foi dado como provado que a garantia iniciou a 1 de Agosto de 2019 e tinha a duração de 12 meses.

    6) Deverá, porém, ser considerado o seguinte: no dia 24 Julho de 2019, a 1ª Ré vendeu à Autora, um veículo ligeiro de mercadorias de ..., modelo ....

    7) Na data de venda da viatura a 1ª Ré prestou à Autora uma garantia voluntária por si contratada com a E..., S.A, a qual teria que respeitar as limitações e exclusões legais e contratuais, tendo estas sido explicadas à Autora, momento em que a Autora ocultou o fim a que a viatura se destinava e a utilização que iria ter.

    8) Portanto, nesse momento, nada fazendo crer que a viatura se destinava a uso profissional intensivo, a 1ª Ré disse à Autora que lhe seria fornecida uma garantia de 12 meses, conforme protocolo que tem com a 2ª Ré, alargando assim a garantia legal de 6 meses.

    9) A autora, profissional do ramo dos transportes está bem informada do tipo de viatura que pretende para o desenvolvimento da sua atividade, bem sabendo também quais as condições e limitações legais e contratuais constantes das garantias para o tipo de viaturas em causa, nomeadamente quando se tratam de viaturas...

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