Acórdão nº 87/20.0T8FCR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CATARINA GONÇALVES
Data da Resolução13 de Dezembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação nº 87/20.0T8FCR.C1 Tribunal recorrido: Comarca da Guarda - F.C.Rodrigo - Juízo C. Genérica Des. Relatora: Maria Catarina Gonçalves Des. Adjuntos: Maria João Areias Paulo Correia Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

AA e BB, residentes na Rua ..., ..., em ..., no concelho ..., vieram instaurar acção, sob a forma de processo comum, contra CC e DD, residentes na Rua ..., na freguesia ..., no concelho ..., pedindo que os Réus sejam condenados: a) a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores sobre a totalidade do prédio rústico, sito em ..., na freguesia ... no concelho ..., terra de centeio e pastagem, com a área de 45.124m2, descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o número ...96, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo ...14; b) a reconhecerem como limite da sua propriedade o muro em toda a volta na extremidade do prédio dos Autores; c) a absterem-se de ocupar a parcela de terreno que vai para além do limite definido pelos respectivos marcos.

Alegam, para fundamentar essa pretensão: - Que são donos do prédio referido, tendo adquirido a sua propriedade através de compra realizada em 27/04/2015; - Que os Réus são donos de um prédio rústico que confronta do lado sul com o prédio dos Autores; - Que os referidos prédios sempre estiveram delimitados, do lado sul, por um muro em pedra, sendo que o prédio dos Autores se encontra murado a toda a volta; - Que os Réus ocupam, ilegitimamente e sem qualquer título, uma área de cerca de 1,25 ha do prédio dos Autores, lavrando essa parcela de terreno onde semeia a aveia e plantou meia dúzia de árvores; - Que os Réus marcaram tal parcela, junto do IFAP, para poder auferir de subsídios agrícolas, ilegitimamente, alegando, ao tempo, que pastoreavam tal terreno e recusando proceder à sua desmarcação; - Que, apesar de tal lhes ter sido solicitado por várias vezes, os Réus não procederam à entrega da referida parcela.

Os Réus contestaram e deduziram reconvenção, alegando, em resumo: - Que a referida área de 1,25 ha faz parte do seu prédio e não do prédio dos Autores, sendo certo que estão na posse dela há mais de 30 anos e adquiririam o direito de propriedade por usucapião; - Que, além do mais, beneficiam da presunção de titularidade do direito de propriedade por via do registo efectuado a seu favor.

Com estes fundamentos concluem pela improcedência da acção e pedem, em reconvenção: a) que se declare serem os RR. donos e legítimos proprietários do prédio identificado no artigo 4º da petição inicial; b) que se declare serem os RR. donos e legítimos proprietários da parcela de terreno com a área de 1,25 ha, referida nos artigos 7º a 12º da petição inicial; c) que os Autores sejam condenados a reconhecerem o direito de propriedade dos RR sobre os prédios mencionados em a) e b) supra.

Os Autores replicaram, reafirmando os factos alegados na petição inicial e concluindo pela improcedência da reconvenção.

Admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador e foi fixado o objecto do litigio.

Os temas da prova foram delimitados e enunciados nos seguintes termos: a. Área e delimitação do prédio dos autores referido em 1.º da petição inicial e do prédio dos réus referido em 3.º da petição e inicial (art.º 2.º da contestação) b. sua configuração designadamente quanto aos muros que demarcavam os limites dos prédios identificados em 1.º da petição inicial (art.5.º a 10.º da petição inicial); c. saber se integra o prédio dos AA. identificado em 1.º da petição inicial o trato de terreno com a área de 1,25 há identificado no artigo 12.º da petição inicial; d. saber se integra o prédio dos RR. identificado em 3.º da petição inicial o trato de terreno com a área de 1,25 ha identificado no artigo 12.º da petição inicial; e. actos de posse exercidos pelos autores e seus ante possuidores no prédio identificado no art.º 1.º da petição inicial e no trato de terreno de 1,25ha referido em 12.º da petição inicial, duração da posse, caracteres da posse.

  1. actos de posse exercidos pelos réus e seus ante possuidores no prédio identificado no art.º 3.º da petição inicial e no trato de terreno de 1,25ha em 12.º da petição inicial, duração da posse, caracteres da posse.

    Posteriormente e na sequência de reclamação apresentada pelos Réus, foi eliminado o tema constante da alínea e) por corresponder a matéria não alegada pelos Autores.

    Observados os demais trâmites legais e realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença onde se decidiu nos seguintes termos: “1. Condenam-se os réus CC e DD a reconhecerem que os autores BB e AA são donos e legítimos proprietários do prédio identificado em 1.º dos factos provados e que dele faz parte integrante a parcela de terreno descrita em 11.º dos factos provados e consequentemente a absterem-se de ocupar a referida parcela de terreno.

    1. Julga-se parcialmente procedente o pedido reconvencional deduzido pelos Réus CC e DD e, em consequência, declara-se que os réus são donos e legítimos proprietários do prédio identificado em 3.º dos factos provados, condenando-se os autores BB e AA no seu reconhecimento, absolvendo-se os autores do demais peticionado”.

    Inconformados com essa decisão, os Réus, CC e DD, vieram interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: A) – A sentença é nula, nos termos previstos no art. 615º, nº 1, al. d), in fine, porquanto considera provados os factos dos pontos 9º, 10º e 14º que as partes não alegaram.

    1. – Tendo-se pronunciado sobre questões que não podia tomar conhecimento.

    2. – Considerando a causa de pedir e pedidos dos presentes autos, conclui-se que a factualidade que vertida nos referidos pontos 9º, 10º e 14º da sentença não se integra em nenhuma das excepções previstas no citado artigo 5º nº 2, do CPC.

    3. – Porquanto não estamos perante factos instrumentais, nem complementares que resultem da instrução da causa, sendo evidente também que não estamos perante factos notórios.

    4. – Sem conceder, ainda que se entendesse que estamos perante factos concretizadores, o que não se aceita, a verdade é que não foi dada às partes a possibilidade de sobre eles se pronunciar.

    5. – Os pontos 5º, 10º e 11º encerram somente matéria conclusiva e de direito em tudo o que vali além da menção à área da parcela.

    6. – Na fundamentação da sentença, o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e quais o que julga não provados (cfr. art. 607º, nº 4, do CPC).

    7. – Não encerrando aqueles pontos 5º, 10º e 11º qualquer facto, para além da área da parcela neles referida, devem os mesmos ser eliminados do elenco dos factos da sentença.

    8. – De resto, inexiste qualquer facto (e não meros juízos conclusivos ou de direito) de onde se possa concluir que os AA. são titulares do direito de propriedade sobre a parcela em discussão nos autos.

    9. – Os AA. limitaram-se a alegar a aquisição derivada do referido prédio, o registo do direito de propriedade a seu favor e a dizer conclusivamente que desse prédio faz parte a parcela de terreno em discussão.

    10. – Os AA. nem sequer alegaram e provaram que compraram também a parcela de terreno nos autos.

    11. – A força probatória plena dos documentos autênticos, como seja a escritura pública e certidão registral, não abrange as áreas dos prédios neles mencionados, as suas confrontações ou quaisquer outros elementos ínsitos no documento, isto é, não cobre a veracidade ou a sinceridade do declarado.

    12. – Por isso, a presunção da titularidade do direito estabelecida no art. 7º do...

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