Acórdão nº 231/22.2T8LRA-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelHELENA MELO
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo 231/22.2T8LRA Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I - Relatório AA veio requerer a declaração de insolvência de BB, alegando ser credor da Requerida pelo valor de € 22.944,70, quantia essa que a Requerida e o seu falecido marido foram solidariamente condenados a pagar-lhe no âmbito do processo nº ...00, que correu termos no ... juízo do Tribunal Judicial da comarca ... e que não foi paga, não obstante ter sido depois intentado o subsequente processo executivo; que o incumprimento de tal obrigação, pelo seu montante e pelas circunstâncias do seu incumprimento, revela a impossibilidade da requerida satisfazer pontualmente as suas obrigações; que esta não possui meios próprios, nem crédito bastante, que lhe permita reassumir o cumprimento das suas obrigações, para com o ora requerente e outros credores; que o requerente não conseguiu encontrar quaisquer bens imóveis ou móveis livres e desonerados suficientes para o pagamento da dívida em referência que sejam propriedade da requerida, apesar de ter penhorado o prédio urbano descrito na conservatória do registo predial ... sob o nº ...31, da freguesia ....

A Requerida contestou, mormente alegando, em suma e para além do mais, a prescrição do alegado crédito, pelo que, não sendo o requerente credor da requerida, não tem legitimidade para a dedução do presente pedido de insolvência. Mais alegou que não está impossibilitada de cumprir a obrigação vencida e que não se encontra em situação de insolvência.

Sem prescindir ou conceder, requereu a exoneração do passivo restante.

Concluiu pela procedência das exceções invocadas e pela improcedência da presente ação.

O Requerente respondeu à matéria de exceção alegada, concluindo pela respetiva improcedência – cfr. reqº de 10/03/2022.

Por reqº de 17/03/2022, o Requerente, para além do mais, deduziu pedido de litigância de má fé contra a Requerida.

Por reqº de 23/03/2022, a Requerida respondeu a tal pedido, concluindo pela respetiva improcedência, e deduziu pedido de litigância de má fé contra o Requerente, a que este respondeu através do reqº de 07/04/2022.

Após a realização das diligências instrutórias que se consideraram necessárias, realizou-se julgamento e a final foi proferida sentença com o seguinte teor: “

  1. Precludido o direito da Requerida quanto à defesa deduzida por esta no seu requerimento de 15/03/2022.

  2. Improcedente a exceção de prescrição do crédito alegado pelo Requerente, exceção essa deduzida pela Requerida.

  3. Improcedente a outra exceção deduzida pela Requerida, respeitante à invocada ilegitimidade substantiva do Requerente.

  4. Improcedentes os incidentes de litigância de má fé deduzidos reciprocamente pelas partes e, consequentemente, absolvem-se as partes dos referidos pedidos recíprocos de condenação como litigantes de má fé.

  5. A ação procedente, por provada, e, em consequência, declara-se a insolvência de BB, viúva, contribuinte fiscal nº ..., residente na Rua ..., ..., ..., ... ....” A requerida não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: 1- Se o direito da Requerida quanto à defesa deduzida por esta no seu requerimento de 15/03/2022, encontra-se precludido e se influi na boa decisão da causa; I- As partes em sede de contestação e resposta alegaram posições diversas quanto ao enquadramento jurídico do instituto da prescrição, ficou o Tribunal recorrido vinculado a alegação da Requerida quanto ao prazo da prescrição? II- Por força do do nº 3 do art.º 5ª do C.P.C., o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito; mas só pode servir-se dos factos articulados pelas partes, sem prejuízo do disposto no art. 264º.

III- Neste conspecto se o tribunal entender que a solução jurídica do caso, em face dos concretos factos alegados e provados, é diferente da propugnada pelas partes deve, decidir conforme assim entender.

IV- Salvo melhor opinião, nos termos do artigo 342.º, n.º 2, do Código Civil), caberia ao Requerente alegar e provar os factos da contra-exceção, ou seja, e demonstrar que aquele prazo de prescrição foi interrompido pela citação da requerida, o que não fez.

V- À luz do princípio da cooperação, consagrado no art. 7º do C.P.C., achou o aqui signatário, conveniente e pertinente, prestar, desde logo, esclarecimentos quanto à sua posição de direito, face ao alegado pela contraparte.

VI- Nestes termos devem V.ªs, , sempre com o douto mui suprimento, aceitar a defesa deduzida pela requerida no mencionado reqº de 15/03/2022.

* 2- Se o crédito alegado pelo Requerente encontra-se prescrito VII- No que respeita à interrupção da prescrição, determina o n.º 1 do artigo 323.º do mesmo código que a prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente; acrescenta o n.º 2 do citado preceito que se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias.

VIII- Vejamos se estão cumpridos os três requisitos do efeito interruptivo estabelecidos no n.º 2 do art.º 323º: - que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; - que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; - que o retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao Autor.

IX- Quanto aos dois primeiros pressupostos resulta de forma clara que, face aos facto provados 2º e 8º, que o prazo prescricional, ainda se encontrava a decorrer, e os factos provados em 9º e 10º, que efetivamente a citação não foi realizada do prazo dos cinco dias, X- Quanto ao terceiro pressuposto, cumpre dizer que, a expressão legal – “causa não imputável ao requerente” – contida no nº2 deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, ou seja, quando a conduta do requerente em nada tenha contribuído, em termos adjetivos, para que haja um atraso no ato de citação (Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 3.7.2018, Ana Paula Boularot, 1965/13, de 19.6.2019, Alexandre Reis, 3173/17).

(…) XI- Assim, , cumpre aferir, se o Requerente, exequente na ação, não tenha adjetivamente contribuído para que a citação não chegasse à Requerida ali executada, no sobredito prazo de cinco dias; XII - O atraso na citação será, portanto, da responsabilidade do requerente sempre que ele não pratique ou pratique mal os atos processuais que lhe incumbe realizar entre o momento da apresentação do requerimento e o decurso do referido prazo de cinco dias [cfr. Ac STJ 23- 01-2014 (relatado pelo Cons. Fernando Bento)], pois que o ocorrido posteriormente decorre numa altura em que já se encontra interrompido o prazo prescricional.

XIII- Ora, no caso sub judice, a citação/notificação não se efetuou nos cinco dias subsequentes à propositura da execução porque a lei (arts 926 do CPC em vigor à data) só determinava a sua realização após a efetivação da penhora.

XIV- As razões de natureza processual atinentes ao regime da ação executiva, em que a penhora precede a citação, não há que imputar tal demora à exequente (cf. facto 3; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.1.2019, Rosa Tching, 524/13).

XV- Não será pois imputável ao exequente, aqui Recorrido, a não realização da citação no prazo de cinco dias a que se reporta o art. 323º, n.º 2, do C. Civil. sem descurar que a norma substantiva que é, tem de ter primazia sobre as normas processuais executivas.

Neste sentido vide: Acórdão de Lisboa de 19-04-2016, Proc. Nº 8330/05.9TBOER-A.L1- 1, Realtor: João Ramos de Sousa, Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 18-03- 2021, Proc. Nº 259/14.6TBBRG-B.G1, Relator: Alexandra Maria Valente Viana Lopes Ac. TRL 2009.01.31, Rel. Des. Rijo Ferreira; e também o Ac. TRC de 2006.06. (proc. 1471/06).

XVI- Pelo que, deve-se considerar interrompida a prescrição decorridos cinco dias depois da propositura da execução, ou seja em 15-10-2001.

XVII- Quanto aos efeitos da interrupção, dispõe o n.º 1 do artigo 326.º do código civil que a interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte; esclarece o n.º 2 daquele artigo que a nova prescrição está sujeita ao prazo da prescrição primitiva, salvo o disposto no artigo 311.º XVIII- Sob a epígrafe, duração da interrupção, dispõe o artigo 327.º do CC. o seguinte: 1. Se a interrupção resultar de citação, notificação ou ato equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo.

  1. Quando, porém, se verifique a desistência ou a absolvição da instância, ou esta seja considerada deserta, ou fique sem efeito o...

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