Acórdão nº 4832/19.8T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO CORREIA
Data da Resolução28 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Apelação n.º 4832/19.8T8CBR C1 Juízo de Comércio de Coimbra – Juiz 2 _________________________________ Acordam os juízes que integram este coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]: I-Relatório Nos autos de incidente de exoneração do passivo restante relativo aos insolventes AA e BB, por decisão de 27.05.2022, a Sra. Juíza, com os fundamentos que nela constam, na sequência de requerimento apresentado pela credora P... Company, recusou a exoneração do passivo restante e declarou antecipadamente cessado o respetivo procedimento.

* Inconformados, os insolventes interpuseram recurso dessa decisão, fazendo constar nas alegações apresentadas as conclusões que se passam a transcrever:” 1ª A escalpelização hermenêutica do Despacho, ora, recorrido, descortina, salvo o devido respeito que muito é, equívocos continentais ao nível da subsunção e interpretação jurídicas.

  1. O manadeiro fáctico considerado como provado pelo Tribunal 2 a quo” padece de vícios, equívocos e erros, que cumpre sanar.

  2. O facto vertido no ponto 1. está errado.

    Os Recorrentes foram declarados insolventes em 19.09.2019 e não em 19.09.2021.

  3. O facto vertido no ponto 4. está errado.

    O modesto mandatário, ora, signatário não é Patrono dos insolventes, antes, actua, no âmbito do mandato forense que para tanto lhe foi conferido pelos insolventes 5ª O facto vertido no ponto 5. não retrata a integridade da verdade factual.

    Para respeitar a integridade factual, a Sr.ª Juiz de Direito em regime de estágio deveria ter dito, em complemento, que o devedor insolvente, ao longo dos dois anos subsequentes ao encerramento do processo não cedeu ao fiduciário o rendimento disponível que lhe foi fixado, porquanto, a tal não estava vinculado, uma vez, que pendia Recurso sobre o acto de quantificação do rendimento disponível a ceder.

  4. Os pontos 7. e 8. não retratam a integridade da verdade factual, pois, os devedores, bem como o seu modesto mandatário, ora, signatário, refutam a recepção de qualquer notificação datada de 22.02.2022.

  5. Só no âmbito da notificação, com a Ref. 87926469, os devedores/insolventes tomaram conhecimento que haveria, supostamente, um rendimento disponível a ceder à fidúcia no valor de 1.445,84 €, porque até essa data, o Sr. Fiduciário omitiu qualquer notificação nesse sentido, pelo que, a fixação deste quantum de rendimento disponível, escapou assim, completamente, ao crivo do contraditório, como se fosse uma cifra que se impusesse de per si aos devedores/insolventes pela mão férrea do Sr. Fiduciário.

  6. A Sr.ª Juiz de Direito, em regime de estágio, não logrou bordar um único facto que considerasse não provado, pela óbvia razão de não ter permitido a discussão do incidente.

  7. Do manadeiro factual ressalta matéria essencial que escancara as falências da decisão, ora, posta em crise, nomeadamente: a) Em data anterior ao trânsito em julgado da predita decisão, os devedores/insolventes, sponte sua, em 10.02.2022, dão conta aos autos que se conformaram com a decisão que fixou o quantum do rendimento disponível requerendo um plano prestacional para o seu pagamento, que veio a ser doutamente deferido.

    1. Em data anterior ao trânsito em julgado da predita decisão, os devedores/insolventes, sponte sua, em 10.02.2022, dão conta aos autos que se conformaram com a decisão que fixou o quantum do rendimento disponível, requerendo um plano prestacional para o seu pagamento, que veio a ser doutamente deferido.

    2. Os devedores/insolventes, bem como, o seu modesto mandatário nunca lograram ser notificados da fixação e respectivos critérios para tanto, do rendimento disponível reportado ao 2º ano da cessão.

    3. Em data anterior à notificação da decisão, ora, posta em crise, ocorrida em 08.06.2022, que cessou, antecipadamente a exoneração, os devedores/insolventes entregaram à fidúcia, por transferência para conta bancária, previamente, indicada pelo Sr. Fiduciário as seguintes quantias - 200, 00 €, em 29.04.2022; - 200,00€, em 31.05.2022; - 400,00 €, em 01.06.2022 e) O douto despacho que deferiu a entrega prestacional do rendimento disponível reportado ao 1º ano da cessão, não cominou, em passo algum, que a mora, ou falta de pagamento de uma prestação, importava o vencimento imediato das restantes.

    4. A quantia de 1.445,84 €, cuja fixação como rendimento disponível escapou, absolutamente, ao crivo do contraditório, não está, nem, nunca, esteve na disponibilidade dos devedores/insolventes.

    5. Tal quantia corresponderá, segundo estimam os devedores/insolventes, uma vez, que nunca foram notificados de coisa alguma sobre a fixação deste rendimento, supostamente, disponível, a um reembolso em sede de IRS efectuado pela AT, que o transferiu para uma conta bancária domiciliada no Banco 1....

    6. Os devedores/insolventes não estão autorizados de facto a movimentar a predita conta bancária, seja a débito seja a crédito, pelo que, o respectivo saldo se encontra cativo, como o Sr. Fiduciário tem a obrigação de saber.

  8. Atento o alforge factual que emerge dos autos, surge com a clareza do relâmpago, que, jamais, se poderá concluir que os devedores/insolventes rubricaram qualquer inadimplemento, e muito menos, aceitando-se uma guisa de incumprimento ou mora na entrega do rendimento disponível à fidúcia, o que brade-se, não se concede, agiram animados por dolo, ou negligência grosseira na violação de alguma das obrigações que lhes são impostas pelo artigo 239º do CIRE, e com isso, prejudicado a satisfação dos créditos sobre a insolvência, como conditio sine qua non para ancorar a decisão de cessação antecipada da exoneração.

  9. O Tribunal “a quo” bordou uma motivação para respaldar a sua decisão, numa retórica, manifestamente, insuficiente, que não cumpre os mínimos de consagração constitucional, do universal dever de fundamentação.

  10. A cessação antecipada da exoneração, só pode ser ancorada, nos termos legais, em determinado circunstancialismo fáctico, nomeadamente, o hipotizado no artigo 243º, n.º 1, alínea a) do CIR e cumprido o rito processual normativizado nos números seguintes de tal artigo.

    O Tribunal ”a quo” omitiu a bordadura de qualquer matéria factual sobre tal circunstancialismo, rectius, sobre o elemento subjectivo que há-de consubstanciar o dolo ou a negligência grosseira na imputada violação das obrigações que são impostas pelo artigo 239º do CIRE.

  11. O Despacho, ora, posto em crise, padece de Nulidade prevista no artigo 615º, n.º 1, alínea b) do CPC, ex vi, artigo 17º do CIRE, que para os devidos efeitos aqui, expressamente, se invoca, e que é de conhecimento oficioso.

  12. A decisão em crise foi gizada nas costas dos Recorrentes, que para tanto, não foram convocados para, de forma cabal e plena, exercer o contraditório quanto a dois requerimentos que abriram o incidente de cessação antecipada da exoneração, bordados por credores, que entre outras imputações, se arrimam numa putativa violação dolosa e/ou grosseiramente negligente das obrigações que que são impostas aos devedores pelo artigo 239º do CIRE, que, valha a verdade, limitam-se a viajar à boleia pela narrativa do Sr. Fiduciário, que entre outros erros e equívocos, omite por exemplo, os pagamentos efectuados pelos devedores à fidúcia.

  13. O incidente de cessação antecipada da exoneração não pode ser aberto oficiosamente pelo Sr. Juiz, antes, está dependente de requerimento autónomo nesse sentido, lavrado por algum credor da insolvência, pelo administrador de insolvência se estiver em funções, ou pelo Sr. Fiduciário caso esteja habilitado para tal pela Assembleia de Credores para fiscalizar o cumprimento das obrigações do devedor, o que não sucede in casu.

  14. Nos termos cristalinos plasmados no artigo 243º, n.º 3 do CIRE, deveria o Sr. Juiz, antes, de decidir, ouvir o devedor, ou convocá-lo para Audiência, no escopo de prestar os esclarecimentos que se afigurarem pertinentes, o que foi postergado.

  15. O Despacho, recorrido, por consubstanciar uma decisão surpresa, incorre na violação do princípio do contraditório, em desrespeito pelo estatuído no artigo 3º, nº 3, do CPC, ex vi, artigo 17º do CIRE, padecendo de nulidade processual nos termos do artigo 195º, nº 1, do mesmo diploma, que para os devidos efeitos legais, aqui, expressamente se invoca.

  16. A cessação antecipada da exoneração, consubstancia um incidente, como, apodicticamente, se alcança pela letra da norma plasmada no artigo 243º, n.º 5 do CIRE.

    O incidente está sujeito a tributação, nos termos do RCP, não tendo os requerentes liquidado a respectiva taxa de justiça, e por se achar omissa a liquidação prévia da respectiva taxa de justiça devida pelos requerentes do incidente, deveria a Secretaria, ter rejeitado os requerimentos apresentados, devendo o Juiz da Causa, suprir tal falta da Secretaria, o que não fez, consubstanciando nulidade, nos termos dos artigos 195º, n.º1, 196º, 197º e 200º, n.º 3 todos do CPC, e que para os devidos efeitos, aqui, expressamente, se invoca.

  17. a dedução do incidente de cessação antecipada da exoneração está sujeita ao prazo desenhado no artigo 243º, n.º2 do CIRE, que fixa em seis meses, a partir do momento em que o requerente teve ou poderia ter tido conhecimento dos fundamentos invocados. Ora, quer num, quer noutro requerimento, ancora-se a putativa violação dolosa ou grosseiramente negligente das obrigações impostas aos devedores pelo artigo 239º do CIRE em factualidade que repousa no ano de 2020, reportada ao 1º ano de cessão, ou seja, mais de 2 anos em relação à data da entrada em Juízo do requerimento de abertura do incidente.

    O prazo erigido pelo legislador no artigo 243º, n.º 2 do CIRE é, claramente, um prazo de caducidade, pelo que, os requerimentos de abertura do incidente estão, inelutavelmente, cobertos pelo manto da caducidade, que para os devidos efeitos legais aqui, expressamente, se invoca, não obstante, constituir matéria de conhecimento oficioso.

    20ª O requerente do incidente de cessação antecipada da exoneração está vinculado a instruir o respectivo requerimento com a...

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