Acórdão nº 2171/20.0T8CSC.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | HENRIQUE ANTUNES |
Data da Resolução | 28 de Setembro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: 1.
Relatório.
O autor, AA interpôs recurso da sentença do Senhor Juiz de Direito do Juízo Central Cível de Leiria, do Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, que julgando procedente a excepção dilatória do caso julgado oposta pela ré, H..., SA, absolveu a última da instância.
O apelante – que pede, no recurso, a revogação desta decisão e a sua substituição por acórdão que ordene o prosseguimento da instância – rematou a sua alegação com estas conclusões: I. O PRESENTE RECURSO TEM COMO OBJECTO TODA A MATÉRIA DE FACTO E DE DIREITO DA SENTENÇA PROFERIDA NOS PRESENTES AUTOS.
-
A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA PELO DO TRIBUNAL A QUO NO QUE CONCERNE Á AÇÃO PARA DECLARAÇÃO DA NULIDADE DOS ATOS DE REGISTO PRATICADOS PELA RÉ, ORA RECORRIDA, NA CONSERVATÓRIA DE REGISTO PREDIAL DE ... PROPOSTA PELO RECORRENTE, QUE JULGOU O PEDIDO IMPROCEDENTE, INVOCADO A APLICAÇÃO DA EXCEÇÃO DO CASO JULGADO, E ABSOLVEU A RÉ DA INSTÂNCIA, DEVE SER MODIFICADA.
-
DIZ A SENTENÇA ORA EM CRISE QUE ESTAMOS DIANTE DA EXCEPÇÃO (DILATÓRIA) DE CASO JULGADO, FUNDAMENTANDO ESTAREM PREENCHIDOS TODOS OS REQUISITOS DO ARTº 581 DO CPC.
-
PARA TANTO ARGUMENTA QUE HÁ UMA TRÍADE DE IDENTIDADE; V. EFECTIVAMENTE EXISTE IGUALDADE DE SUJEITOS EM AMBAS AS ACÇÕES, EMBORA OS SUJEITOS OCUPEM POSIÇÕES JURÍDICAS ANTAGÓNICAS, FIGURANDO O RECORRENTE ANTES COMO EXECUTADO E AGORA COMO AUTOR E A RECORRIDA ANTECEDENTEMENTE COMO EXEQUENTE E AGORA COMO RÉ.
-
CONTRARIAMENTE AO SENTENCIADO E RELATIVAMENTE À IDENTIDADE DO PEDIDO TEMOS DUAS ACÇÕES DISTINTAS, QUE ASSENTAM EM CAUSAS DE PEDIR TAMBÉM ELAS DIFERENTES.
-
OU SEJA, A QUESTÃO FUNDAMENTAL NÃO É A MESMA NAS DUAS ACÇÕES, COMO NÃO É O MESMO, O EFEITO JURÍDICO PRETENDIDO.
-
TUDO PARA DIZER QUE NÃO REALIZAMOS ONDE É QUE A DECISÃO A PROFERIR NESTA ACÇÃO POSSA COLIDIR COM AS OUTRAS DECISÕES PROFERIDAS POIS A QUESTÃO QUE NELA FOI SUBMETIDA A APRECIAÇÃO, NUNCA FOI OBJECTO DE PRONUNCIAMENTO NA SENTENÇA PROFERIDA NA ACÇÃO EM QUE O AQUI AUTOR FOI PARTE OU MESMO NOUTRAS.
-
FOI A RECORRIDA QUE INTENTOU DIVERSAS ACÇÕES EXECUTIVAS, TAIS COMO OS PROCESSOS Nº 268/2000 E Nº34/2001, Nº147/11.8TBPNI.
-
PROCESSO Nº 268/2000, NO MONTANTE DE 60.773.09 EUROS – CORRESPONDENTE AO VALOR TOTAL DO IMÓVEL, QUE EM 2014 DEU ORIGEM AO PROCESSO 2375/14.5T8ENT, TENDO CULMINADO EM 2016 COM A ADJUDICAÇÃO DA METADE DO IMÓVEL À H..., SA, ORA RECORRIDA., XI. PROCESSO Nº34/2001 QUE PASSOU A TER O Nº 401/14.7TBPNI CUJO OBJECTIVO ERA A PENHORA DA TOTALIDADE DO IMÓVEL, PROCESSO QUE FOI EXTINTO; XII. PROCESSO Nº147/11.8TBPNI, NO QUAL ERAM EXECUTADOS MARIA PILAR E O ORA RECORRENTE.
-
AO LONGO DE MAIS DE 15 ANOS DECORRERAM EM SILMULTÂNEO OU SEGUIDAS UMAS DAS OUTRAS, ACÇÕES SEMPRE SOBRE O MESMO IMÓVEL, A MAIORIA DAS VEZES COM OS MESMOS SUJEITOS PROCESSUAIS, A MESMA CAUSA DE PEDIR E PEDIDO.
-
SEM NUNCA TER SIDO INVOCADA A EXCEPÇÃO DO CASO JULGADO E QUE VIERAM PERMITIR À RECORRIDA REGISTAR A TOTALIDADE DO IMÓVEL.
-
OU SEJA DOIS TÍTULOS (SENTENÇAS) QUE CONFEREM À RECORRIDA EXACTAMENTE O MESMO (1/2 DO IMÓVEL) PERMITIRAM O REGISTO DA TOTALIDADE DA PROPRIEDADE DO PRÉDIO.
-
PELO QUE O QUE ESTÁ EM CAUSA NOS PRESENTES AUTOS É A DUPLICAÇÃO DE DECISÕES QUE PERMITIRAM À RECORRIDA ADQUIRIR OS TÍTULOS E COM ELES REGISTAR TODO O IMÓVEL QUANDO EFECTIVAMENTE E NO ENTENDER DO RECORRENTE AQUELES TÍTULOS SÓ PERMITIRIAM REGISTAR 1/2.
-
PORQUANTO, NO QUE CONCERNE ÀS DUAS ACÇÕES SUB JUDICE, NÃO DESCORTINAMOS, SALVO MELHOR OPINIÃO, ONDE SE ENCONTRA A REPETIÇÃO DA CAUSA.
-
E NÃO DESCORTINAMOS ONDE ESTA ÚLTIMA ACÇÃO POSSA COLIDIR COM A DECISÃO PROFERIDA NO PROCESSO EXECUTIVO SUPRA MENCIONADO, SE A QUESTÃO SUBMETIDA AGORA A APRECIAÇÃO NUNCA FOI OBJECTO DE PRONUNCIAMENTO (NEM PODERIA TER SIDO, POIS O REGISTO É POSTERIOR).
-
NO PROCESSO 147/11.8TBPNI-B O PEDIDO EFETUADO CONSISTIU NA TRANSMISSÃO DA PROPRIEDADE DE ½ DO IMÓVEL ADJUDICADO À RÉ.
-
NA PRESENTE ACÇÃO O AUTOR APENAS VEM REQUERER QUE SEJA DECLARADA A NULIDADE DOS ATOS DE REGISTO PRATICADOS PELA RÉ (RECORRIDA) NA CONSERVATÓRIA DE REGISTO PREDIAL ....
-
EM CONFORMIDADE COM O DECIDIDO PELO AC. DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE 14.12.2016, PROC. Nº 219/14.7TVPRT-C.P1.S1, “NÃO OCORRE A EXCEÇÃO DE CASO JULGADO QUANDO AS PRETENSÕES MATERIAIS FORMULADAS NAS DUAS AÇÕES EM CONFRONTO, PARA ALÉM DE REPRESENTAREM VIAS JURÍDICAS ALTERNATIVAS E ESTRUTURALMENTE DIFERENCIADAS PARA ALCANÇAR A TUTELA JURÍDICA DE DETERMINADO INTERESSE, ASSENTES EM PRESSUPOSTOS LEGAIS PERFEITAMENTE AUTÓNOMOS, IMPLICARAM A FORMULAÇÃO DE PEDIDOS ESTRUTURALMENTE DIFERENTES, ENVOLVENDO A VIA SEGUIDA NA PRIMEIRA AÇÃO, JÁ DEFINITIVAMENTE JULGADA (…), A FORMULAÇÃO DE PEDIDOS DE RECONHECIMENTO E CONDENAÇÃO NUMA OBRIGAÇÃO DE TRANSMITIR OU RESTITUIR DETERMINADOS VALORES PATRIMONIAIS”.
-
ASSIM, NÃO EXISTE CASO JULGADO POR NÃO SE ENCONTRAREM PREENCHIDOS OS REQUISITOS LEGAIS PREVISTOS NO ARTIGO 581 DO CPC.
Não foi oferecida resposta. 2.
Factos provados.
2.1. O Tribunal de que provém o recurso considerou provados os factos seguintes: 1. Na presente acção o Autor formula contra a Ré o seguinte pedido «Declarada a nulidade do registo feito na Conservatória ..., e em consequência deverá o mesmo ser rectificado, devendo ainda a Ré ser condenada reconhecer o direito de propriedade do Autor.» e para o efeito, muito sinteticamente, o Autor alegou que no ano de 2008 adquiriu por escritura pública de compra e venda a fracção autónoma – letra ..., correspondente ao primeiro andar frente do prédio urbano sito em ... ou ..., Avenida ..., Lugar ..., Freguesia ..., Concelho ..., inscrito na matriz predial sob o artº...84, descrito na Conservatória do Registo Predial ... – a BB e mulher CC, que antes disso, a fracção referida havia sido adquirida por BB e esposa, no dia 9 de Setembro de 2005 a DD, e EE, que o autor, sem que nada devesse a ninguém, foi alvo em 2011 de uma acção executiva por parte da H..., SA, Processo nº 147/11...., Tribunal Judicial da Comarca ..., Juízo de Execução ... - Juiz ..., contudo a hipoteca mostra-se extinta.
-
E no processo n.º 147/11.8TBPNI-B que correu termos no Juízo de Execução ... - Juiz ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., onde o Autor foi Executado e a Ré Exequente, o Autor deduziu Embargos de Executado onde pediu a extinção da execução, alegando para o efeito e em síntese que o título executivo não é oponível ao executado, porque por escritura de compra e venda adquiriu a BB e mulher CC a fracção autónoma em causa pelo preço de €63.000,00, e desta consta que sobre a mesma fracção constam duas penhoras e uma hipoteca registadas, cujos cancelamentos se encontram assegurados, pelo que a venda é feita livre de ónus e encargos.
-
No âmbito do aludido processo n.º 147/11.8TBPNI-B foi proferida sentença onde se decidiu indeferir liminarmente a oposição à execução por manifesta improcedência com fundamento essencialmente que o ali oponente (aqui Autor) apesar de não ser o responsável pessoal pela dívida contraída pelos demais executados relativa ao contrato de mútuo celebrado, mas o imóvel que adquiriu continua onerado com hipoteca constituída a favor do exequente e como tal sujeito a execução, as questões relativas às circunstâncias subjacentes ao negócio que celebrou são irrelevantes porque não são oponíveis ao exequente, que o oponente (aqui Autor) estava ciente que existia hipoteca voluntária sobre o imóvel que adquiriu, como não poderia deixar de ser em face da publicidade do registo, que deveria ter celebrado o negócio de compra e venda caso estivesse efectivamente assegurado o cancelamento ou a expurgação da hipoteca o que implicava evidentemente a intervenção da instituição de crédito – como é usual neste tipo de situações o preço devido é entregue directamente à instituição de crédito para liquidação do empréstimo e, em consequência, esta emite o denominado de título de distrate, o que não sucedeu.
-
Resulta do registo predial da fracção em causa a inscrição de hipoteca datada de 1996 e a inscrição da aquisição a favor do Autor datada de 2008.
2.2. Aos factos referidos em 2.1., devem adicionar-se, por virtude da prova documental produzida logo na instância de que provém o recurso e que não se mostra impugnada, os factos seguintes: 1. A aquisição, por compra em processo de execução, de um ½ do direito real de propriedade sobre a fracção referida em 2.1.1. encontra-se inscrita no registo predial a favor da apelada desde 29 de Dezembro de 2016.
-
A aquisição, por adjudicação, na execução referida em 2.1.1., de um ½ do direito real de propriedade sobre a fracção referida em 2.1.1., encontra-se inscrita no registo predial a favor da apelada desde 13 de Julho de 2017.
-
A decisão referida em 2.1.3. transitou em julgado.
-
Fundamentos.
3.1.
Delimitação do âmbito objectivo do recurso.
O âmbito objetivo do recurso é delimitado pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados na instância de que provém, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação (art.º 635.º nºs 2, 1ª parte, e 3.º a 5.º, do CPC).
Maneira que, considerando os parâmetros, assim definidos, da competência decisória desta Relação, é uma só a questão concreta controversa que importa resolver; a de saber se, no caso, se verifica ou não a excepção dilatória do caso julgado.
E a apreciação desse objecto exige, naturalmente, o exame, ainda que leve, deste pressuposto processual negativo, que se resolve numa excepção dilatória própria e, dado que a decisão de improcedência a que se assinala o valor da indiscutibilidade característica do...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO