Acórdão nº 279/16.6T8GRD.C2 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Abril de 2019
Magistrado Responsável | BARATEIRO MARTINS |
Data da Resolução | 30 de Abril de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório T (…), Lda.
, com sede (…), intentou a presente acção sob a forma do processo comum de declaração, contra C (…) e esposa M (…) agricultores, residentes (…), pedindo que sejam estes sejam condenados a: “a) reconhecer que a autora é dona e legítima possuidora do prédio misto identificado no artigo 2º da petição inicial.
b) reconhecer que o seu [dos RR.] prédio misto, inscrito na matriz rústica nº K (...) e na matriz urbana nº (...) , descrito na conservatória do (...) sob o nº K (...) /20041008, está onerado por uma servidão predial de passagem a pé e veículos motorizados, constituída por destinação de pai de família, a favor do prédio da autora que se inicia a partir de um caminho que entronca na estrada nacional nº 332 (sentido Aldeia da Y (...) – X (...) e vice versa), caminho de terra batida, que se revela por sinais visíveis e permanentes através da ausência de ervas ou plantas e dos sulcos provocados pelos rodados dos veículos que ali circulam há mais de 60 anos, com uma extensão de 2098 metros e com uma largura (leito) de 5 a 6 metros que atravessa o prédio dos réus e continua para o prédio da autora, conforme planta de localização que constitui o doc. nº 12 e das três aerofotografias, autenticadas, do Instituto Geográfico do Exército Português, referente à carta militar nº 216, datadas do ano de 1947, 1958 e 1996.
..c) quando assim se não entenda, condenar-se os réus a reconhecer que o seu prédio misto, inscrito na matriz rústica nº (...) e na matriz urbana nº (...) , descrito na conservatória do (...) sob o nº (...) /20041008, está onerado por uma servidão predial voluntária de passagem a pé e veículos motorizados, constituída por usucapião, há mais de 60 anos, a favor do prédio da autora que se inicia a partir de um caminho que entronca na estrada nacional nº 332 (sentido Aldeia da Y (...) – X (...) e vice versa), caminho de terra batida, que se revela por sinais visíveis e permanentes através da ausência de ervas ou plantas e dos sulcos provocados pelos rodados dos veículos, quer de tração animal, quer motorizados, que ali circulam há mais de 60 anos, com uma extensão de 2098 metros e com uma largura (leito) de 5 a 6 metros que atravessa o prédio dos réus e continua para o prédio da autora, conforme planta de localização que constitui o Doc nº 12 e das três aerofotografias, autenticadas, do Instituto Geográfico do Exército Português, referente à carta militar nº 216, datadas do ano de 1947, 1958 e 1996.
d) retirar os portões que colocaram no início do caminho e no limite da parte do caminho que percorre o seu prédio.
e) absterem-se de, por qualquer meio estorvar o uso e fruição da passagem referida em b) e ou c).
f) pagar à autora uma indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, pelos motivos supra alegados, a liquidar em execução de sentença.” Alegou, para tal, em síntese, serem a A. e os RR. donos dos 2 prédios mistos (vizinhos) que identificou, os quais há quase cem anos fizeram parte de um único prédio misto, conhecido e designado por “Quinta das K (...) ”, que se autonomizou em três prédios distintos; prédio aquele – a inicial Quinta das K (...) – cujo acesso sempre se fez por um caminho de terra batida (que descreve) que entronca na EN 332, que atravessa o que é hoje o prédio dos RR. e que liga ao caminho que se encontra no que é hoje o prédio da A., pelo que, com a separação física dos três prédios, o referido caminho continuou a servir os três prédios, assim se constituindo em servidão por destinação de pai de família, ou, a não se entender assim, por usucapião.
Mais alegou a A. que o seu prédio não tem, a não ser por tal caminho, acesso directo à EN 332; e que os outros dois caminhos (que admite que existem) de terra batida que o ligam à via pública são de circulação insuficiente e limitada no tempo (nomeadamente, no período do inverno), razão pela qual necessita do descrito caminho (devido às suas actividades e dimensão).
E alegou ainda que os RR. colocaram, no início do caminho no prédio deles, um cadeado com portão, impedindo a utilização do descrito caminho pela A. e dificultando a exploração do prédio da A., com a consequente diminuição do seu valor.
Os RR. contestaram.
Alegaram, em resumo, que sobre o caminho existente no prédio deles (RR.) não tem a A. qualquer direito de servidão de passagem, dado que, quando os 3 prédios eram um único prédio, havia outros 4 caminhos de acesso ao que é hoje o prédio da A., mantendo, actualmente, o prédio da A. o acesso por tais outros 4 caminhos; e acrescentam que pelo caminho em causa – que só passou a existir a partir dos anos 50 – apenas muito esporadicamente e com autorização deles/RR. se passou para o prédio da A..
Alegaram ainda que o caminho em causa está largo e transitável devido à intervenção que os RR. fizeram no mesmo e que a A. poderá/deverá fazer o mesmo em relação aos referidos 4 caminhos que dão acesso ao seu prédio, inexistindo por isso qualquer encrave, relativo ou absoluto, não se encontrando assim reunidos os requisitos de que a lei faz depender a constituição de uma servidão legal de passagem, não se tendo também esta constituído quer por destinação de pai de família quer por usucapião.
E, acrescentam, a ter-se a mesma por constituída, deverá a mesma ser julgada extinta por desnecessidade, em virtude da existência dos outros caminhos que dão bom (desde que a A. proceda à sua manutenção e limpeza) e directo acesso ao prédio da A.; razão pela qual concluem pela improcedência da acção e deduzem pedido reconvencional, em que pedem que seja “declarada a extinção da servidão de passagem por desnecessidade da mesma, condenando-se a A/Reconvinda a reconhecer tal extinção e a abster-se de praticar actos conducentes à sua passagem pelo prédio dos RR/Reconvintes”.
A A. replicou, mantendo o alegado na PI e assim se opondo ao pedido reconvencional.
Realizou-se audiência prévia, em que foi admitido o pedido reconvencional, proferido despacho saneador – em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém – identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.
Após o que, realizada a audiência, a Exma. Juíza proferiu sentença, em que concluiu o seguinte: “ (…) julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: condenar os réus C (..:) e M (…) a reconhecer que a autora T (…), Lda. é dona e legítima proprietária do prédio misto, sito em Aldeia da Z (...) , denominado “Quinta das K (...) ”, com a área total de 1683299,95 m2, área coberta de 363,35 m2, área descoberta de 1682936,6, inscrito na matriz rústica nº 2978 e na matriz urbana nº (...) .
condenar os RR. C (…) e M (…) a reconhecer que o seu prédio misto, inscrito na matriz rústica nº (...) e na matriz urbana nº (...) , descrito na conservatória do (...) sob o nº (...) /20041008, está onerado por uma servidão predial de passagem a pé e veículos motorizados, constituída por destinação de pai de família, a favor do prédio da autora que se inicia a partir de um caminho que entronca na estrada nacional nº 332 (sentido Aldeia da Y (...) – X (...) e vice versa), caminho de terra batida, com uma extensão de 2098 metros e com uma largura (leito) de 4,5 metros que atravessa o prédio dos réus e continua para o prédio da autora, nos termos constantes da planta de localização que constitui o Doc nº 12 e das aerofotografias do Instituto Geográfico do Exército Português, referente à carta militar nº 216, datadas do ano de 1947, 1958 e 1996, condenar os RR C (…) e M (…) a retirar os portões que colocaram no início do caminho e no limite da parte do caminho que percorre o seu prédio.
condenar os RR. C (…) e M (…) a absterem-se de, por qualquer meio, estorvar o uso e fruição da passagem referida.
absolver os RR. C (…) e M (…)s do pedido de pagamento à autora uma indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais a liquidar em execução de sentença.
julgar improcedente a reconvenção deduzida pelos RR. C (…) e M (…) e em consequência absolver a A. “T (…) Lda.” do pedido reconvencional deduzido pelos Réus.
(…)” Inconformados com tal decisão, interpuseram os RR. recurso de apelação, visando a sua revogação e a sua substituição por decisão que revogue/inverta o decidido e que “(…) decida pela condenação da recorrida a reconhecer a extinção da servidão e a abster-se de praticar actos conducentes à sua passagem pelo prédio dos recorrentes.” A A. respondeu, sustentando a manutenção da sentença recorrida.
Recurso sobre o qual, em 21/02/2018, foi proferida Acórdão, nesta Relação de Coimbra, a “anular a decisão proferida na 1.ª Instância; - revogando-se o que se decidiu nos pontos 12, 19 e 55 dos factos provados, para que, no que se vier a decidir, seja ampliado/esclarecido o que, em termos de acesso à inicial Quinta das K (...) , ocorria antes de 09/09/1921, facto/data esta que deve ser mencionada no que venha a ser considerado provado ou não provado.
- revogando-se o que se decidiu nos pontos 25, 26, 27, 28, 29, 70, 73 e 93 dos factos provados, para que, no que se vier a decidir, seja ampliado/esclarecido/fixado tudo o que se revele relevante para avaliar das condições de utilização dos “outros” 4 caminhos, podendo/devendo acrescentar-se todos os elementos/contributos relevantes que tenham sido omitidos nos factos, sugerindo-se, para que tudo seja apreendido de forma imediata, coerente e lógica, que os factos respeitantes às características e particularidades e às condições de utilização dos “outros” 4 caminhos sejam narrados, na nova sentença a proferir, de forma única, arrumada, coerente e sequencial (podendo, naturalmente, no que se vier a revelar necessário, reapreciar-se outros pontos de facto, já julgados, a fim de evitar contradições, assim como fazer-se uso do art. 5.º/2/b) do CPC, adicionando-se, após o devido contraditório, factos complementares ou concretizadores que venham a resultar)”.
Regressados os autos à 1.ª Instância, entendeu a...
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