Acórdão nº 2065/18.0T8CTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução05 de Novembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1.

M (…), residente na (...) , instaurou acção comum contra J (…) com domicílio profissional em (...) , e contra a seguradora M (…) S.A.

, com sede em (...) , pedindo que os réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia global de 29.231,40 €, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em suma, a celebração de um contrato de serviço doméstico com terceiros, tendo sido depois despedida sem qualquer fundamento. Que mandatou o 1º réu, advogado, através de mandato forense para intentar acção de impugnação do despedimento e que a acção foi proposta mas veio a ser declarada deserta por culpa exclusiva do mandatário que, numa tentativa de remediar a situação, posteriormente, instaurou nova acção a qual veio a ser declarada improcedente com fundamento na prescrição dos créditos peticionados. Que naquela acção peticionava não só os salários não pagos mas também a indemnização pelo despedimento ilícito e pela não inscrição na Segurança Social uma vez que não foram efectuados os descontos e pagamentos mensais das devidas contribuições ou o seguro de trabalho, tudo num total de 20.651,40 €. Que enviou carta ao 1º réu a transmitir o seu desgosto, consternação e depressão por ver os seus direitos não atendidos, tanto mais que pagou 1.800 € de honorários. Que não obstante a participação do sinistro pelo 1º réu à 2ª ré esta informou que não assumia a responsabilidade pela ocorrência.

Só a ré M (…) contestou, alegando, em síntese, que a probabilidade da procedência da acção estaria dependente da prova a produzir em sede de julgamento no tribunal do trabalho, nomeadamente quanto à relação laboral e aos créditos laborais peticionados. Mais defendeu que não são devidos os montantes resultantes da devolução de honorários alegadamente pagos ao 1º réu e que não são indemnizáveis os alegados danos não patrimoniais peticionados. Mais defendeu que os juros de mora a existir condenação são apenas devidos a partir da prolação da sentença.

* A final foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou ambos os RR no pagamento solidário à A.

do montante de 14.574,91 €, sendo 13.574,91 € a título de dano patrimonial por “perda de chance”, acrescido de juros de mora à taxa legal de juros civis desde a citação até integral pagamento e 1.000 € a título de danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora à taxa legal de juros civis, desde a data da decisão até integral pagamento.

* 2. A R M (…) recorreu, concluindo que: (…) 3. Inexistem contra-alegações.

II - Factos Provados 1. No dia 23 de Outubro de 2013 M (…) emitiu mandato forense a favor do advogado J (…) com vista à instauração de acção de impugnação judicial de regularização e licitude do despedimento.

  1. No dia 13 de Novembro de 2013 o 1º Réu deu entrada de petição inicial no tribunal do trabalho de (...) em que era Autora M (…) e Réus A (…) viúvo e A (…), solteiro, maior, que deu origem ao processo n.º 235/13.6TTCTB.

  2. O pedido constante da petição identificada no ponto anterior era: a) Serem os Réus solidariamente condenados a verem reconhecidos e sentenciado o despedimento da A. sem justa causa e sem processo disciplinar, e com declaração da sua nulidade, e consequentemente, b) Serem os Réus condenados a pagarem solidariamente à Autora a peticionada e discriminada quantia em 21º e 22º supra, no valor total à presente data de 20.641,40€; c) Bem como ainda serem solidariamente os Réus condenados a pagarem à Autora todos os seus direitos salariais vincendos, férias, subsídios de férias e de Natal e juros moratórios à taxa de 4% ao ano, desde a presente data e até à sentença condenatória e efectivo e integral pagamento e, d) (…).”.

  3. Alegava a Autora, em síntese, que em princípios de Janeiro de 2012 celebrou com os Réus um contrato verbal de serviço (trabalho) doméstico sem termo que teve início no dia 10 de Janeiro de 2012 e cujo local de trabalho se situava no domicílio dos então Réus e cujo conteúdo se definia pela residência permanente no domicílio dos Réus, dormindo e tomando as suas refeições a expensas da entidade patronal de quem recebia ordens e instruções de trabalho e que estava obrigada a confeccionar as refeições, lavar e tratar das roupas, arrumar e limpar a casa, tratar de uma pequena horta e jardim contíguos à moradia e na execução das tarefas externas correlacionadas com tais como serviços de costura e compras domésticas, mediante a remuneração mensal fixa de € 600,00 e com direito de alojamento e alimentação gratuitos, e que apenas lhe foram pagos os salários de Janeiro, Fevereiro e Março de 2012 e que mais nenhum salário lhe foi pago até ao despedimento verbal ocorrido no dia 5 de Setembro de 2013 pelos Réus sem qualquer fundamento, tendo o Réu A (…) insultado e agredido fisicamente a Autora dizendo-lhe que o contrato estava terminado naquele momento e manhã o que obrigou a Autora a sair de casa e do seu posto de trabalho.

  4. Os valores peticionados na acção identificada em 2. foram os seguintes: “a) Não opta a A. pela sua reintegração no seu posto de trabalho, pelo que lhe é devida em dobro a indemnização legal de um mês + um mês de salário pelo ano de 2012, de trabalho completo e mais a fracção, em dobro, de 9 meses até ao seu despedimento, em 5 de Setembro de 2013 – 600,00€ + 600,00€ (2012) = 1.200,00€ + 180,00€ +180,00€ = 360,00€ = 1.560,00€ (art.ºs 31.º, n.ºs 1 e 2, do D.L. N.º 235/92); b) Salários vencidos e não pagos, à razão de 600,00€ mensais, dos meses de Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro, Novembro e Dezembro de 2012, e de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho, Agosto, Setembro, Outubro e Novembro de 2013 – 12.000,00€; c) Férias e subsídio de férias, do ano de 2012, não gozadas e não pagas e com violação do direito a férias (art.º 16.º; 18.º e 21.º, do D.L. N.º 235/92), 16 dias x 2 + 4 dias = 36 dias x 20€ / dia - 720,00€; d) Férias e subsídio de férias vencidos em 1/01/2013 não gozadas, não pagos, e com violação do direito a férias, 600,00€ x 4 = 2.400,00€ (art.º 21.º, do D.L. n.º 235/92); e) Férias e subsídio de férias, proporcionais, não gozadas e não pagas, e com violação do direito a férias, do ano de 2013, nove meses, 400,00 X 4 = 1.600,00€ (art.º 21.º, do D.L. n.º 235/92); f) Subsídio de Natal, não pago, do ano de 2012 = 300,00€ (Art.º 12.º, do D.L. n.º 235/92); g) Subsídio de Natal, não pago, do ano de 2013 = 400,00€ (Art.º 12.º, do D.L. n.º 235/92); h) Do ano de 2012, dias de feriados obrigatórios não gozados, não pagos e não compensados em tempo livre, 14 dias de feriados obrigatórios - 14X20,00€/dias - 280,00€ (art.º 24.º, n.º 3 do D.L. n.º 235/92); i) Do ano de 2013, dez dias de feriados obrigatórios, não gozados, não pagos e não compensados em tempo livre – 10 dias x 20,00€/dia=200,00€ (n.º 3, Art.º 24.º, do D.L. n.º 235/92); j) Os juros moratórios vencidos até à presente data e à taxa anual de 4% e a contar do mês de Abril/2012 e até à presente data, no montante de 1.151,40€; k) Todos os salários, férias, subsídios de férias e de Natal vincendos, incertos, e tudo até sentença e efectivo e integral pagamento; e, l) Os juros vincendos à taxa anual de 4% ao ano desde a presente data sobre a totalidade dos direitos salariais computados e em dívida, e sobre os vincendos desde a presente data e tudo até efectivo e integral pagamento.” 6. Na acção identificada em 2., a Autora invocava, ainda, a falta de inscrição na segurança social não estando efectuados os descontos e pagamentos mensais das contribuições e a não existência de seguro de trabalho.

  5. Em complemento, alegava a recusa de entrega de documentos enumerados nos artigos 35.º, do D.L. N.º 235/92, e do 341.º, do C.T., por parte dos réus, o que era legalmente devido, pugnando pela aplicação das sanções estabelecidas nos artigos 36.º, do D.L. n.º235/92, de 24 de Outubro e no n.º 3, do Art.º 341.º, do C.T..

  6. O valor do pedido na acção ascendia a € 20.651,40.

  7. Como elementos de prova na acção identificada em 2. foram apresentadas quatro testemunhas: - (…) 10. Na acção identificada em 2., por despacho de 18 de Dezembro de 2013, foi designada audiência de partes que teve lugar no dia 9 de Dezembro de 2013 tendo-se frustrado a tentativa de conciliação das partes e foi designada data para audiência de julgamento para o dia 5 de Março de 2014.

  8. Os Réus A (…) e A (…) contestaram a acção identificada em 2. alegando em síntese que: “(…) Acontece que o 2º Réu, em Janeiro de 2012, amigo da A., sabendo que esta era uma pessoa sozinha e que vivia com algumas dificuldades económicas e tinha problemas de saúde, propôs-lhe que passasse a frequentar a casa dos RR., aí pernoitando e fazendo as refeições, o que a Autora aceitou.

    Desde o início sempre existiu uma grande cumplicidade e uma relação de amizade que foi crescendo entre a Autora e os RR.

    Tomavam as refeições em conjunto, o 2º Réu acompanhava a Autora a consultas médicas, à urgência do hospital, comprava-lhe medicamentos e outras coisas que lhe fizessem falta, como roupa e calçado ortopédico, ia com ela visitar a família, lavrava e limpava um pequeno terreno que esta possui, e esta em agradecimento e por estar grata ajudava o 2º Réu a tomar conta do seu pai.

    A relação da Autora com o Réu sempre foi uma relação de amizade, pautada pela confiança e respeito mútuos e nunca uma relação de trabalho.

    Até porque a Autora nunca pediu qualquer remuneração ao Autor pelo trabalho que desenvolvia com o seu pai, nomeadamente dar-lhe as refeições e a medicação, sendo a A. quem afirmava que não queria nada, tendo em conta tudo o que lhe era disponibilizado e a relação que os unia.

    O Réu via a Autora como alguém da família e esta dizia a toda a gente, pela aldeia de (...) , que se sentia muito bem, que era da família e que estava a ser muito bem tratada em casa dos RR.

    Em meados de Fevereiro de 2012 a Autora passou a dormir em casa do pai Réu, onde tinha um quarto para si, com todas as condições.

    Tudo corria bem até que, a...

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