Acórdão nº 2119/18.2T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução10 de Julho de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório M (…), residente (…) (...) , intentou a presente acção declarativa, com processo comum, contra A (…) residente (…) (...) , e contra M (…) e marido J (…), residentes (…) (...) , formulando os seguintes pedidos: “

  1. Serem os Réus condenados a ver declaradas ilícitas as obras realizadas, nomeadamente as construções no logradouro e a abertura de novas portas; b) Serem os Réus condenados a demolir, a expensas suas, as obras supra descritas, e a reporem o imóvel no mesmo estado em que antes se encontrava, designadamente o encerramento das portas que dão acesso ao logradouro; c) E condenados cada um dos Réus no pagamento de uma indemnização de € 10.500,00, cada, referente aos danos pela privação do uso do prédio, por ocupação ilícita dos Réus.” Alegou, em síntese, que são todos (A. e RR.) condóminos dum mesmo prédio constituído em propriedade horizontal e que os RR., “em contravenção com o título da propriedade horizontal, procederam a aberturas [portas] nas paredes comuns do prédio, na área da cozinha, o que lhes permite o acesso directo ao logradouro por uma porta distinta da porta comum do prédio e sem acederem às partes comuns do edifício”[1]; “construíram duas edificações no logradouro”[2]; “murando e excluindo os demais condóminos do uso daquela área e daquelas edificações”[3]; sendo que “nenhuma das referidas obras foi alvo de aprovação camarária ou discutida em sede de assembleia de condóminos”[4]; com o que “impedem a plena utilização do logradouro pelos demais condóminos, incluindo o A.

”[5].

Os RR. contestaram.

O R. A (…)alegou, inter alia, que “nunca, desde que é proprietário da fracção “A” [22/09/2011], executou na mesma qualquer tipo de obras, nem nas fracções, nem no logradouro comum”[6], razão pela qual, a seu ver, é parte ilegítima.

Os RR. M (…) e marido alegaram, no que aqui interessa, que, “para as relações de condomínio, o A., se desacompanhado dos demais comproprietários carece de legitimidade”[7] e que “mesmo que se entenda poder o A. demandar a solo, então, sempre os autos teriam que ser dirigidos contra todos os demais proprietários, pois que o proprietário que não é demandante nem demandado é parte e peça fundamental para o estabelecimento da maioria a que se refere o art. 1425.º do CC”[8], razões pelas quais “sempre se verificará uma situação de ilegitimidade, seja activa ou passivo, pois que as relações de condomínio, bem como de compropriedade, carecem da intervenção de todos os condóminos/co-proprietários, para que se possa alcançar uma decisão útil e exequível[9].

O A. respondeu a tais invocações de ilegitimidade, pugnando pela total regularidade da instância por si instaurada.

Conclusos os autos, o Exmo. Juiz proferiu decisão em que julgou verificada a excepção dilatória de falta de legitimidade dos RR e em que, em consequência, absolveu os RR. da instância.

Expendeu, para tal, a seguinte argumentação/raciocínio jurídicos: “(…) Movemo-nos no domínio da responsabilidade civil extracontratual: ao proprietário de um imóvel é reconhecido o direito a que todos respeitem a integridade do seu prédio, sendo que quem o danificar fica responsável pela reposição dessa integridade e pela indemnização dos danos causados: cfr. arts. 1305º, 483º, 562º e 566º do Código Civil.

No caso, seguindo de perto o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 08/03/2018 (processo n.º 993/14.0T8BCL.G1, www.dgsi.pt), estamos perante uma propriedade horizontal que comporta a particularidade da coexistência na mesma pessoa de dois tipos de propriedade: dum lado, um direito de propriedade exclusiva de uma ou mais fracções do edifício e, doutro lado, um direito de compropriedade nas partes comuns desse edifício: arts. 1414º e 1415º do CC.

Ou seja, as partes comuns do edifício são compropriedade do universo de condóminos e esse universo dos condóminos, vulgo o Condomínio, é quem é o titular de qualquer relação jurídica relativa às partes comuns do prédio.

São os condóminos, no seu conjunto e na proporção das respectivas quotas, os titulares dos direitos ou das obrigações, dos créditos ou dos débitos emergentes de responsabilidade civil quanto às partes comuns do prédio.

Deste modo, atenta a forma como o Autor configurara a acção, quem tem legitimidade passiva é o Condomínio do prédio enquanto tal.

Com, efeito, é sobre o universo de condóminos/Condomínio que recai a obrigação de manter as partes comuns do prédio em condições de não perturbarem ou danificarem a propriedade alheia (de cada uma das fracções, entenda-se), sob pena de incorrer nas consequências do incumprimento de tal obrigação (reconstituição in natura e/ou indemnização em dinheiro).

Tendo todos os Réus sido aqui demandados em nome próprio, são pois parte ilegítima, sendo irrelevante para esta questão, a inexistência de Administrador do condomínio, caso em que o respectivo condomínio é representado por todos os seus condóminos.

E quando algum terceiro/ou condómino, se vê prejudicado por qualquer ocorrência causada pelas partes comuns de um prédio, a responsabilidade pelo ressarcimento dos prejuízos cabe ao Condomínio, ou seja, ao universo dos condóminos, na proporção das respectivas quotas.

Num caso e noutro, seja do lado activo ou passivo, o Administrador agirá como representante do Condomínio.

Assim sendo, prefigurando a acção nos termos delineados pelo Autor, a titularidade de tal relação jurídica reside apenas no Condomínio (universo de condóminos) pois nele reside a obrigação de conservação/reparação do prédio, bem como a de indemnizar os prejuízos causados.

Nessa medida, sendo o Condomínio o sujeito jurídico do dever, só ele pode vir a ser prejudicado com a procedência da acção e, portanto, só ele tem interesse directo em contradizer.

E conclui o citado Acórdão o seguinte: «I – Numa acção em que um condómino pretende a reparação dos defeitos das partes comuns dum prédio em propriedade horizontal, bem como ser ressarcido dos prejuízos sofridos na sua fracção e causados pela existência desses defeitos, parte legítima é o Condomínio desse prédio.

II – Tendo sido demandados como Réus os proprietários das demais fracções autónomas, enquanto tal, são os mesmos partes ilegítimas na acção, sendo irrelevante para esta questão, a inexistência de Administrador do condomínio.

III – Havendo aqui uma situação de...

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