Acórdão nº 274/18.0YRCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Junho de 2019
Magistrado Responsável | EMÍDIO SANTOS |
Data da Resolução | 11 de Junho de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam na 1.ª Secção Cível do tribunal da Relação de Coimbra T (…) Limited, sociedade de direito indiano, com sede actual em (...) , India, propôs a presente acção especial contra G (…) SA, com sede no (...) , Pombal, pedindo a confirmação das seguintes decisões judiciais: 1. Da sentença do Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli de 26.07.2017, pelo qual foi iniciado o processo de insolvência da autora; 2. Da sentença do Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli de 15.05.2018, pelo qual foi homologado o plano de resolução da ora autora; 3. Do acórdão do Tribunal de Recurso Nacional de Comércio de Nova Deli de 10.08.2018, pelo qual foram julgados totalmente improcedentes os recursos interpostos contra a sentença do Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli que homologou o plano de resolução da autora.
A requerida impugnou o pedido de confirmação das decisões, alegando em síntese: 1. Que as decisões em causa não estão aptas a produzir efeitos extraterritoriais; 2. Que há uma incompletude do documento que titula a sentença de homologação do plano de insolvência, nomeadamente há total ausência do plano de insolvência propriamente dito, o que faz com que falhe o requisito da autenticidade e da própria inteligibilidade de tais decisões; 3. Que há uma irregularidade/ausência de citação da requerida para a acção de insolvência; 4. Que há uma preterição dos seus direitos essenciais de defesa, nomeadamente do princípio do contraditório e da igualdade das partes; 5. Que há uma actuação por parte da requerente em claro abuso de direito por comportamento contraditório, frustrando a própria confiança que a requerida, de boa-fé, nela colocou; 6. Que a conformação das sentenças indianas conduziria a um resultado manifestamente contrário aos princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa.
Na resposta, a autora rebateu os argumentos da requerida, sustentando a verificação dos requisitos necessários para a confirmação das decisões.
Findo os articulados, o ora relator entendeu que não era indispensável, para proferir decisão sobre o pedido de revisão, inquirir as testemunhas arroladas pela requerida e, em consequência, determinou a notificação das partes para querendo, examinarem o processo e alegarem, conforme estava previsto na 2.ª parte do n.º 1 do artigo 982.º do CPC. As partes apresentaram alegações, onde mantiveram as posições afirmadas nos respectivos articulados. Por sua vez, o Ministério apresentou alegações no sentido da confirmação das sentenças.
* Síntese das questões suscitadas: A principal questão que importa solucionar é a de saber se estão reunidos os requisitos para a confirmação das sentenças proferidas pelo Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli e do acórdão proferido pelo Tribunal de Recurso Nacional de Comércio de Nova Deli.
* Os factos relevantes para a decisão são os seguintes: 1. A autora é uma sociedade comercial de direito indiano, que se dedica à produção de aço na Índia.
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A autora, anteriormente denominada B (…), alterou a sua firma para T (…) Limited.
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Por sentença proferida em 26 de Julho de 2017, pelo Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli, foi iniciado o processo de insolvência da autora.
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A referida sentença foi proferida ao abrigo do Código da Insolvência e da Falência Indiano, na sequência do requerimento de declaração de insolvência apresentado pelo S (…), credor do sector financeiro.
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Em 3 de Fevereiro de 2018, a sociedade de direito Indiano T (…) Limited apresentou um plano de resolução da autora, que foi aprovado pela maioria dos credores da autora.
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Em 15.05.2018, o Tribunal Nacional de Comércio de Nova Deli proferiu sentença de homologação do plano de resolução da autora.
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Foram interpostos recursos de tal decisão por (…).
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Os mencionados recursos foram objecto do acórdão do Tribunal de Recurso Nacional de Comércio de Nova Deli, proferido em 10 de Agosto de 2018, que ao julgou improcedentes.
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Os credores da autora foram chamados a apresentar o comprovativo dos seus créditos através de anúncio cuja cópia está junta a fls. 223 (traduzida a fls. 224).
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A requerida é uma sociedade comercial com sede em território português que se dedica à produção, comercialização e transformação de perfis metálicos e acessórios, importação e exportação de perfis e acessórios para construção metálica e civil.
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No âmbito das respectivas actividades, a requerida, em 13 de Janeiro de 2017, encomendou à requerente várias toneladas de HDG – hot deep galvanized (chapa de aço galvanizada).
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As partes acordaram que o material encomendado pela requerida seria pago do seguinte modo: a) pagamento adiantado de 10% do valor estimável, tendo como referência o envio de 1000 toneladas, ou seja, € 72 500,00, o qual foi efectuado pela requerida; b) pagamento do remanescente mediante a emissão de um crédito documentário irrevogável a favor da requerente, com vencimento 120 dias após a data de declaração de embarque.
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No cumprimento do acordado e como garantia do pagamento dos materiais fornecidos pela sociedade indiana, a requerida deu instruções ao Banco (…) S.A. para emitir um crédito documentário (denominado carta de crédito) até ao montante máximo de € 725 000,00, tendo como ordenador/comprador a ora requerida e beneficiário a requerente, sendo que tais fundos seriam transferidos para o S (…) (banco destinatário).
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Esta carta de crédito sofreu uma alteração feita por comum acordo entre as partes, passando a data limite de embarque da mercadoria de 28-02-2017 para 10-03-2017, vencendo-se 120 dias após a data da emissão por parte do armador da declaração de embargue da mercadoria encomendada, documento que foi emitido em 03-03-2017, pelo que a carta de crédito vencer-se—ia no dia 01-07-2017.
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A requerida intentou no tribunal judicial da comarca de Leiria uma providência cautelar não especificada contra o B (…), S.A. e contra a ora requerente na qual pediu se oficiasse ao B (…) para que se abstivesse de efectuar qualquer movimentação/transferência de fundos/valores para o banco receptor (S (…)) ao abrigo da carta de crédito que tem como ordenador a requerente e beneficiário a requerida (carta de crédito n.º 951-01-0064957 datada de 18/01/2017 e com vencimento em 1/07/2017), bem como a não proceder à retenção e ou cativar e ou manter cativos quaisquer valores pertença da requerente, no âmbito da supra referida carta de crédito, até que seja proferida decisão final com trânsito em julgado da acção principal a propor. 16.A providência foi julgada procedente e, em consequência, foi o banco emitente da referida carta de crédito, notificado para se abster de efectuar a movimentação/transferência de fundos/valores para o Banco receptor titulada pela mencionada carta de crédito.
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No dia 25 de Outubro de 2017, a requerida deu entrada à acção declarativa a que corresponde o processo n.º 4252/17.9T8LRA, a correr termos do juízo central do tribunal cível da comarca de Leiria.
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Nesta acção a ora requerida peticionou: a) Se decretasse a resolução do contrato de compra e venda celebrado entre a autora e a ora requerente, por incumprimento definitivo por parte desta; b) Se decretasse a resolução do contrato de abertura de crédito documentário celebrado entre a autora e a segunda ré (carta de crédito n.º 951-01-0064957, datada de 18/01/2017) e que tinha como beneficiária a ora requerente; c) A condenação da ora requerente a retirar das instalações da autora, por sua conta, a mercadoria que lhe forneceu; d) A condenação da ora requerente a pagar à ora requerida uma indemnização pelos prejuízos causados, computados no montante de € 333 703,10 (trezentos e trinta e três mil setecentos e três euros e dez cêntimos). * Os elementos de prova decisivos para a convicção do tribunal foram os seguintes: O documento n.º 2 junto com a petição serviu para estabelecer a prova dos factos relativos à actividade e denominação da autora.
Os documentos juntos à petição sob os números 3, 4, 5, 6, 7 e 8 serviram para estabelecer a prova dos factos relativos à prolação das sentenças.
Os documentos juntos com a petição sob os números 9 e 10 serviram para estabelecer a prova dos factos relativos ao anúncio através do qual os credores foram chamados a apresentar os comprovativos dos seus créditos.
A certidão junta com a contestação sob documento n.º 1 (fls. 253 a 255 do processo físico) serviu para estabelecer os factos relativos à actividade da requerida.
O documento n.º 2 junto com a contestação (fls. 258 e 259. Do processo físico) serviu para estabelecer a prova dos factos relativos à relação estabelecida entre a requerente e a requerida.
O documento junto com a contestação sob o n.º 3 (fls. 259 v.º do processo físico) serviu para estabelecer a prova dos factos relativos à transferência da quantia de € 72 500,00.
Os documentos juntos com a contestação sob os n.ºs 4 e 5 (fls. 260 a 264 do processo físico) serviram para estabelecer os factos relativos á carta de crédito.
O documento junto com a contestação sob o n.º 26 (fls. 318 a 330) constituída por cópia do requerimento inicial da providência cautelar não especificada, serviu para estabelecer os factos relativos à providência cautelar não especificada.
O documento junto com a contestação sob o n.º 27 (fls. 416 a 425 do processo físico), constituído pela acta da audiência de discussão e julgamento e pela decisão proferida na providência cautelar não especificada, serviu para estabelecer os factos relativos á decisão proferida em tal procedimento cautelar.
O documento junto com a contestação sob o n.º 28 (fls. 426 a 438 do processo físico), constituído por cópia da petição inicial relativa à acção proposta no juízo central do tribunal judicial da comarca de Leiria, serviu para estabelecer os factos relativos à acção que corre termos em tal tribunal sob o n.º 4252/17.9T8LRA. * Fundamentação de direito: Como se escreveu acima, a questão essencial que cumpre solucionar é a de saber se estão reunidos os requisitos para a confirmação das duas sentenças proferidas pelo...
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