Acórdão nº 5600/11.0TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução15 de Janeiro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1. V (…), residente em (...), instaurou acção declarativa contra Banco (…) S.A., com sede no (...) e M (…) S.A., com sede em Lisboa, peticionando a condenação das rés a pagar-lhe a quantia global de 7.500 €, acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data de citação até integral pagamento.

Alegou, no essencial, ser titular de uma conta à ordem numa das agências do réu Banco e que no dia 1.6.2011, ao consultar os seus movimentos, constatou que da sua conta à ordem haviam sido efectuadas duas transferências, pelo réu Banco para um terceiro, das quantias de 4.500 € e outra (que entretanto recuperou), as quais não autorizou; mais alegou que a M (…), nesse mesmo dia, havia emitido uma segunda via do cartão “SIM” titulado pelo autor, e que entregou a uma terceira pessoa, possibilitando a realização daquelas transferências que foram fraudulentas. Sofreu danos morais com a situação criada, que devem ser ressarcidos em 3.000 €.

A ré M (…) contestou invocando, além do mais, que a segunda via foi emitida por ter sido apresentado à operadora de loja, presencialmente, o original de documento de identificação do cliente, bem como indicada correctamente a sua morada e n.º de identificação fiscal; que o documento de identificação exibido era credível e não ostentava indícios de falsificação; que, exibido o documento de identificação e indicadas as restantes informações relativas à pessoa do autor, a funcionária da loja não tinha elementos que lhe permitissem colocar em causa a veracidade da documentação que lhe era apresentada; que o autor não demonstra no seu articulado que não foi o mesmo que efectuou ou mandou efectuar a transferência bancária de 4.500 € reclamado a título de indemnização por danos patrimoniais, como também não comprova os danos não patrimoniais que alega ter sofrido; conclui pedindo a sua absolvição do pedido.

O Banco contestou, sustentando, em síntese, que o código de utilizador e o código multicanal, necessários para a utilização do serviço de homebanking, sendo secretos, apenas eram conhecidos do autor, razão por que só pelo autor, ou por pessoa da sua confiança, poderiam esses dados ter sido facultados a terceiros, ou ter sido permitido o conhecimento por terceiros de tais dados, cuja utilização veio a permitir a realização das sobreditas transferências; que é alheio à actuação, quer do autor, quer da ré M (…); que foi o autor a agir com culpa, ao facultar os seus dados pessoais a terceiros, ou ao não se ter dotado dos meios idóneos a impedir o acesso aos seus dados por terceiros; conclui pela improcedência da acção e pela sua absolvição de todos os pedidos. Suscitou ainda a intervenção acessória provocada de J (…), beneficiária da transferência efectuada no valor de 4.500 €, para a eventualidade de decair na presente acção, para poder exercer o seu direito de regresso.

Foi admitida a intervenção acessória provocada de J (…), a qual, citada, não veio interveio nos autos.

* A final foi proferida sentença que julgou procedente, parcialmente, a acção e condenou os RR B (…) e M (…) a pagar ao A. a quantia global de 5.750 €, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% ao ano desde 31.10.2011, sobre o montante de 4.500 €, e, à mesma taxa, desde a presente data, sobre o montante de 1.250 €, e nos vincendos, à mesma taxa (caso esta não sofra alterações), até integral pagamento, absolvendo-os do demais peticionado.

* 2. Só o B (…) apresentou recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) II – Factos Provados 1. A 12.07.1984, o autor, com a qualidade de primeiro titular, abriu uma conta de depósitos à ordem junto do réu Banco, na sua sucursal situada em (...), com o n.º (…), tendo ficado como segundo titular dessa conta M (…) 2. A 01.08.2006, o autor aderiu a um serviço disponibilizado pelo réu Banco, designado “homebanking”, tendo-lhe sido fornecidas as chaves de acesso, pessoais e intransmissíveis, que permitiam a utilização do serviço via internet (código de utilizador e código multicanal);------- 3. Foi entregue ao autor um código de utilizador (“(…)”), que veio a ser alterado por sua iniciativa (passando a ser “(…)”);------- 4. O código multicanal, composto por sete dígitos numéricos, foi entregue ao autor em envelope fechado;------- 5. Foram entregues ao autor as condições de adesão ao serviço de “homebanking”, das quais tomou conhecimento e foram por si assinadas;------- 6. Das sobreditas condições de adesão, mostra-se consignado na al. b) do ponto 2 que “o Código de Acesso Multicanal, o Código de Utilizador e Chave de Confirmação são intransmissíveis, pelo que o Cliente não poderá permitir a sua utilização por terceiros, ainda que seus mandatários”;------- 7. Tal serviço disponibilizado pelo réu Banco permitiu ao autor, através de computador ou telefone com acesso à internet, 24 horas por dia, 365 dias por ano, proceder a um conjunto de operações bancárias “on-line”, relativamente à conta de que era titular, por intermédio de uma página segura do réu, com o endereço “milleniumbcp.pt”;------- 8. O procedimento habitualmente utilizado, tendo em vista garantir a segurança nas operações que o autor efectuava através daquela plataforma informática, era o seguinte: introdução do código de utilizador, introdução de três posições aleatórias do código multicanal, ao que se seguia o envio de um “SMS” (=“Short Message Service”) de confirmação, para o telemóvel associado à conta, com o n.º (…) com a indicação de um código único para a concreta operação visada, a introduzir na plataforma para finalizar a operação;- 9. Desde a data em que aderiu ao serviço de “homebanking”, o autor passou a utilizar a sobredita plataforma informática para realizar pagamentos, consultar o saldo da conta à ordem e realizar transferências bancárias, o que fazia utilizando o seu computador pessoal;-- 10. O autor encontra-se registado como titular de um cartão telefónico móvel da então TMN, com o n.º (…), pelo menos desde 25.11.2005, constando do aludido registo o seu nome completo, o n.º de identificação fiscal () e morada ((…), (...));----- 11. No dia 01.06.2011, cerca das 20,00 horas, o autor recebeu um contacto telefónico efectuado pelos serviços do réu Banco, questionando-o no sentido de conhecer se este havia realizado movimentos a débito na identificada conta bancária, através do serviço de “homebanking”;-- 12. Ao que o mesmo respondeu negativamente;------ 13. De imediato, o réu Banco, por intermédio do funcionário que contactava telefonicamente o autor, informou-o de que haviam sido efectuados movimentos a débito na sua conta bancária, através de transferências das quantias de €4.500,00 e €246,50 na identificada conta para as contas de terceiros;------- 14. Tais movimentações a débito na conta bancária do autor não foram por este autorizadas ou de algum modo consentidas;------- 15. O destinatário das quantias pecuniárias transferidas é desconhecido do autor;------- 16. As transferências foram efectuadas através da utilização dos dados pessoais do autor: código de utilizador (“(…)”) e três posições aleatórias do código multicanal, validadas com código de autorização, enviado por “SMS”, para o telemóvel associado à conta, com o n.(…) 17. O autor contactou a ré M (…), solicitando esclarecimentos, uma vez que não havia dado qualquer autorização de transferência pelo seu telemóvel;------- 18. A ré M (…) informou o autor de que no dia 01.06.2011, pelas 17h02, foi emitida uma segunda via do cartão TMN, na loja (…), (...);------- 19. Solicitada por um terceiro que se fez passar pela pessoa do autor;------ 20. E que fez constar do pedido de emissão de segunda via do cartão telefónico a morada e o n.º de identificação fiscal do autor;------- 21. Tendo ainda na sua posse um documento de autorização de residência, na qual se mostrava inscrito o nome do aqui autor;------- 22. As restantes informações nele inscritas não correspondiam à pessoa do autor (data de nascimento, filiação, estado civil, nacionalidade e morada);------ 23. O autor não solicitou ou de algum modo autorizou o pedido de emissão de uma segunda via do cartão TMN de que à data era detentor;------- 24. Em data não concretamente apurada, o autor acedeu à plataforma informática do réu Banco, através do seu computador, introduzindo o código multicanal, o seu n.º de telemóvel e n.º do seu bilhete de identidade, que vieram a ser utilizados por terceiro para a realização dos movimentos referidos supra no ponto 13;------- 25. Foi possível recuperar a verba de €246,50, uma vez que a mesma não foi autorizada pela (…), entidade para a qual foi efectuada a transferência, tendo aquela quantia sido creditada na conta à ordem titulada pelo autor;------- 26. O mesmo não sucedendo quanto à transferência da quantia de €4.500,00 a qual não foi recuperada;----- 27. A transferência da quantia de €4.500,00 foi efectuada a favor do NIB (…), titulada por J (…);------- 28. Após o sucedido, o autor ficou com o montante de €31,67 na sua conta bancária;------ 29. O que lhe causou revolta e desgosto.------ * Factos não provados: (…) b. que o autor teve acesso às recomendações de segurança feitas pelo réu Banco referentes ao acesso ao seu portal para uso do serviço “homebanking” em momento anterior a 01.06.2011;----- (…) * III - Do Direito 1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 639º, nº 1, e 635º, nº 4, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes.

- Alteração da matéria de facto.

- Obrigação de reembolsar a cargo do R. Banco em face da subtracção da quantia de 4.500 € da conta de depósito à ordem do A.

2. O Banco apelante impugna a decisão da matéria de facto, designadamente o facto provado 24., que deve ter dado apenas como parcialmente provado, o facto não provado b), que deve passar a provado, pretendendo que sejam dados por provados 6 adicionais factos (cfr. conclusões do seu recurso I a III). Vamos...

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