Acórdão nº 87336/17.6YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | FONTE RAMOS |
Data da Resolução | 20 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Em 07.9.2017, M (…), S. A., instaurou procedimento injuntivo[1] contra S (…), S. A., para pagamento do preço da prestação de serviços de contabilidade (nomeadamente, a revisão legal de contas) no valor global de € 9 660,42 (capital) e respectivos juros moratórios vencidos (€ 592,86) e vincendos.
Alegou, em síntese: entre as partes foi celebrado um contrato de prestação de serviços de contabilidade; pelos serviços prestados, referentes aos anos de 2014 e 2015, resultaram duas facturas nos valores de € 4 391,10 e € 5 269,32, entregues à Ré nas datas nelas apostas e desde esse momento que são devidos juros de mora comerciais; a Ré não liquidou o valor em dívida. A Ré deduziu oposição, alegando, em resumo: nada deve à A., pois todos os serviços prestados foram pagos; pelo decurso do prazo de dois anos, prescreveu o direito que a A. se arroga (alínea c) do art.º 317º do Código Civil/CC)); o facto de a Ré ser uma sociedade e não um profissional liberal não releva, na medida em que, atendendo à ratio legis e à época em que foi publicado e entrou em vigor o Código Civil (aprovado pelo DL n.º 47344 de 25.11.1966 e com entrada em vigor no dia 01.6.1967), não existia, ou seria praticamente insignificante, o número de serviços prestados através de sociedades, pelo que o legislador regulou a única realidade social existente e que era, justamente, a da prática individual deste tipo de serviços, não se podendo afirmar que o legislador quis estabelecer prazos diferentes de prescrição para a prestação de serviços desta natureza consoante os mesmos fossem praticados a título individual ou através de uma sociedade, seja ela de natureza comercial ou uma sociedade civil; a cobrança e o pagamento dos serviços prestados pela A. à Ré sempre, desde a sua génese, tiveram carácter mensal, sendo por isso afastada a interpretação de que o prazo de prescrição apenas se iniciaria após a cessação da relação entre credor e devedor; prescreveram todos os pagamentos dos serviços prestados até Setembro/2015, o que deve ser declarado.
A A. respondeu, alegando, nomeadamente, que não exerceu as funções de fiscalização da sociedade Ré na qualidade de profissional liberal, mas como órgão social/fiscal único dessa mesma sociedade e contratada para o efeito; as facturas reclamadas dizem respeito a pagamentos desse trabalho de fiscal único da sociedade Ré, pelo que não o é no exercício de qualquer profissão liberal, mas dentro do exercício de um cargo societário, pelo que lhe não é aplicável o disposto no art.º 317º do CC, mas sim o disposto no art.º 310º, al. g) do mesmo diploma legal relativamente a “quaisquer outras prestações periodicamente renováveis”; mesmo que se entendesse que o art.º 317º é aplicável, não estava decorrido o prazo nele fixado (o trabalho de auditoria às contas de 31.12.2014 foi enviado em 19.8.2015 e o trabalho de auditoria às contas de 31.12.2015 foi enviado em 25.7.2016); só em 19.12.2016 é que a Ré comunicou a cessação de funções de fiscal único; não existe qualquer prescrição, ainda que presuntiva e não foram alegados factos comprovativos de qualquer pagamento, sendo que a Ré não impugnou a existência da dívida reclamada.
A final, a Mm.ª Juíza a quo julgou a acção procedente e, em consequência, condenou a Ré no pagamento à A. da quantia de € 9 660,42 (nove mil, seiscentos e sessenta euros e quarenta e dois cêntimos) de capital em dívida, acrescida de juros vencidos e vincendos, à taxa legal, contados a partir da data de vencimento de cada uma das facturas sobre o montante respectivo até efectivo e integral cumprimento.
Inconformada, a Ré interpôs a presente apelação, formulando as seguintes conclusões: (…) A A. respondeu concluindo pela improcedência do recurso.
Atento o referido acervo conclusivo, delimitativo do objecto do recurso, importa conhecer e/ou reapreciar: a) impugnação da decisão sobre a matéria de facto (erro na apreciação da prova); b) decisão de mérito (nomeadamente, se ocorre, ou não, a prescrição prevista no art.º 317º, c) do CC). * II. 1. A 1ª instância deu como provados os seguintes factos: a) Entre a autora e ré foi celebrado um contrato de prestação de serviços de contabilidade - nomeadamente a revisão legal de contas.
b) A autora foi eleita, em 30.01.2004, como fiscal único da ré para o triénio 2004/2006 - sendo sucessivamente eleita para os triénios seguintes - e aceitou essa designação.
c) Pelo menos nos últimos anos, a ré mandava com atraso à autora os documentos necessários para esta poder cumprir com as suas funções, não cumprindo os prazos e as obrigações legais para com o fiscal único da empresa.
d) Por isso, o trabalho de auditoria às contas de 31.12.2014, da ré, foi enviado em 19.8.2015, tendo sido enviada em anexo a Certificação Legal das Contas e o Relatório e Parecer do Fiscal Único, sendo nesse mês que se realizou a discussão do documento.
e) O trabalho de auditoria às contas de 31.12.2015, da sociedade ré, foi enviado em 25.7.2016, tendo sido enviada em anexo a Certificação Legal das Contas e o Relatório e Parecer do Fiscal Único, sendo nesse mês que se realizou a discussão do documento.
f) Em 19.12.2016 a ré comunicou à autora a cessação de funções de Fiscal Único - tendo, em 23 de Dezembro seguinte, a autora pedido o pagamento das quantias em dívida, que a ré não pagou.
g) A cobrança (e o pagamento) dos serviços prestados pela autora à ré de início era feita mensalmente, mas a dada altura, como a ré já não vinha fazendo o pagamento pontual, os legais representantes de ambas acordaram em que as facturas deixassem de ser emitidas todos os meses.
h) Pelos serviços prestados, referentes aos anos de 2014 e 2015 a autora emitiu e entregou à ré as seguintes facturas: - Factura 1.6.20160626, no valor de € 4 391,10, com data de vencimento a 28.7.2016, relativa aos meses de Março a Dezembro de 2014; - Factura 1.6.20160721 no valor de € 5 269,32, com data de vencimento a 30.8.2016, relativa aos meses de Janeiro a Dezembro de 2015.
i) A ré não pagou as referidas quantias, apesar de diversas vezes instada para tanto.
2. E deu como não provado: a)...
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