Acórdão nº 473/18.5T8CNT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelFONTE RAMOS
Data da Resolução08 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. 1. Em 06.7.2018[1], I (…) instaurou, no Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra (Instância Local Cível de Cantanhede), a presente acção declarativa comum contra L (…), pedindo que seja condenado a pagar-lhe uma indemnização no montante global de € 38 463,32 e respectivos juros moratórios pelos danos patrimoniais e não patrimoniais relativos às repercussões da sua conduta pela falta de pagamento das contribuições da A. à Segurança Social, nos anos de 1997 a 2007.

Alegou, em síntese: a) Foi admitida para trabalhar sob a autoridade, direcção e fiscalização do Réu em 10.4.1997, tendo trabalhado ininterruptamente até 03.11.2015, exercendo a profissão inerente à categoria de cozinheira, embora na realidade as suas funções fossem mais além daquelas; b) À data da cessação do contrato de trabalho auferia a retribuição mensal de cerca de € 550; c) O Réu, deliberadamente e relativamente à A., não cumpriu a sua obrigação contributiva perante a Segurança Social, causando-lhe danos patrimoniais e não patrimoniais, inclusive, no âmbito das prestações sociais a que tem direito (designadamente à pensão de velhice paga pelo regime contributivo) e como melhor se descreve nos art.ºs 30º e seguintes da petição inicial (p. i.).

  1. O Réu contestou, invocando, além do mais, a incompetência absoluta do Juízo Cível, em razão da matéria, para conhecer do litígio, pois o pedido da A. assenta numa relação jurídica havida entre as partes que está sujeita às normas próprias de um vínculo de direito privado, laboral, e tem como objecto uma consequência de natureza previdencial, também regulamentada por normas de direito público; impugnou, entre outros, os factos aludidos em II. 1. a), supra e os documentos juntos com a p. i..

    No exercício do contraditório, a A. pugnou pela improcedência da excepção.

    Por saneador-sentença de 16.12.2018, a Mm.ª Juíza a quo declarou a incompetência absoluta do Juízo Local Cível em razão da matéria por tal competência pertencer aos Juízos do Trabalho e, em consequência, absolveu o Réu da instância.

    Inconformada, a A. apelou formulando as seguintes conclusões: 1ª - Vem o presente recurso de apelação interposto do despacho saneador, na parte em que decidiu pela existência da excepção dilatória de incompetência material do Juízo Local Cível para decidir do peticionado pela A./recorrente.

    1. - Uma vez que actualmente só seria possível a regularização voluntária das contribuições pelo próprio beneficiário junto da Segurança Social, o que a A. não consegue fazer por incapacidade financeira, situação que lesou em muito os interesses da A. pois teve sérias e gravosas repercussões na determinação do montante a auferir a título de pensão de velhice.

    2. - A sentença recorrida não fez uma correcta interpretação do disposto no art.º 126º da Lei de Organização do Sistema Judiciário/LOSJ, ao considerar que é competente para conhecer desta matéria, o Juízo de Trabalho.

    3. - O que se trata nos presentes autos é de um pedido indemnizatório, efectuado ao abrigo do instituto de responsabilidade civil extracontratual pela prática de factos ilícitos, nos termos do art.º 483º do Código Civil (CC), em consequência da conduta ilícita do Réu, no âmbito de um contrato de trabalho que vigorou entre as partes, pelo incumprimento de obrigações para com a Segurança Social.

    4. - O pedido cível formulado pela A. fundamenta-se na existência, em tempos, de um contrato de trabalho subordinado, no entanto, a acção, tal como é configurada, não se relaciona com qualquer incumprimento ou violação desse contrato de trabalho, e nem de uma obrigação acessória do contrato de trabalho, como entendeu a sentença a quo.

    5. - A obrigação de efectuar descontos para a Segurança Social, ao abrigo de uma relação jurídica laboral subordinada, decorre directamente da lei (no caso, da Lei de Bases da Segurança Social) e não no contrato de trabalho (embora tenha aquele como razão de ser).

    6. - A obrigação de contribuição no âmbito de actividade profissional subordinada que cabe às entidades empregadoras constitui um verdadeiro dever de contributo, não se confundindo com a relação laboral já que apenas incide sobre um dos sujeitos da relação laboral - a entidade empregadora.

    7. - A relação jurídica em causa resulta da lei e não do contrato, o que até poderia remeter para a jurisdição administrativa e fiscal, mas, tratando-se de um pedido de indemnização formulado por um sujeito de direito privado contra outra entidade com a mesma natureza jurídica, a competência cabe à jurisdição comum.

    8. - Assim, resultando a pretensão da A. da violação de um dever de tributo resultante da lei e não do contrato de trabalho, a competência caberá, por exclusão de partes, aos Juízos Cíveis, por via do disposto no art.º 130º, n.º 1 da LOSJ.

    9. - A decisão em crise não foi acertada, por não interpretar nem aplicar correctamente os preceitos legais atinentes, nomeadamente os art.ºs 126º da LOSJ, 59º da Lei de Bases da Segurança Social e 483º do CC, devendo, por isso, ser revogada e substituída por outra que julgue por não verificada a excepção de incompetência material para apreciar a pretensão formulada pela recorrente no pedido.

    O Réu respondeu concluindo pela...

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