Acórdão nº 69026/17.1YIPRT.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução28 de Maio de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÂO DE COIMBRA 1.

A (…), S.A. instaurou contra C (…) S.A., requerimento de injunção.

Pediu: A condenação da ré a pagar-lhe a quantia de €65.512,31.

Alegou: Um contrato de fornecimento de bens (amêndoas) à ré, cujo preço esta não lhe satisfez.

A requerida opôs-se.

Alegou, em apertada síntese: Depositou a quantia peticionada em conta que lhe foi indicada, ao menos inicialmente, por emails provenientes do endereço de e-mail habitualmente utilizado pela Requerente, que se encontra registado no domínio “www.(....)” pertencente a uma das empresas do grupo da Requerente.

Após ter efectuado o depósito e se apercebido ter sido objecto de fraude telefonou imediatamente à requerente no sentido de esta contactar com o banco espanhol depositário da verba em causa no sentido suspender qualquer levantamento ou transferência da mesma, o que ainda não tinha acontecido, pois que os burlões antes a tinham contactado para que a verba ficasse na disponibilidade de C (…)S.A.

Desconhecia, à data da troca de e-mails e, consequentemente à data da realização da transferência bancária, que os documentos internos, os servidores ou servidor de email, eram acedidas ilicitamente por terceiros que não a Requerente A dívida foi já liquidado por parte da Requerida, sendo que, em virtude de circunstâncias a que é alheia, a Requerente foi impedida por terceiros de rececionar tal pagamento, o que é, e sempre foi, do conhecimento da Requerente.

Pediu: A improcedência da acção.

A requerente respondeu.

Disse: A ré tudo aceitou para se deixar enganar.

Pois, aceitou como provenientes da autora, comunicações provenientes de endereços de correio electrónico com domínio sito nos Estados Unidos da América como é o caso das comunicações provenientes de: (…), Aceitou mensagens de correio electrónico com erros ortográficos grosseiros no respectivo endereço,considerando a designação social da autora como os e-mails provenientes de: (…).com, apesar de na língua Castelhana, as “amêndoas” na designação social da autora se escrever “almendras” e não “almondras”, Como também aceitou pedidos expressos de transferências bancárias para beneficiários que não correspondiam ao fornecedor e aqui autora.

  1. Realizada a audiência prévia o julgador considerou-se habilitado a decidir e, após comunicação às partes dessa sua intenção, e de operado o contraditório, foi proferida a seguinte sentença: «Julgo a presente acção totalmente procedente e, em consequência, 2. Condeno a Ré C (…), S.A. a pagar à Autora A (…), S.A., a quantia de €65.512,31 (sessenta e cinco mil, quinhentos e doze euros e trinta e um cêntimos), acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal até efectivo pagamento.» 3.

    Inconformada recorreu a requerida.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: I. A Sentença do Tribunal de 1.º Instância é profundamente injusta e violadora do Direito à Prova.

    II. A Sentença do Tribunal de 1.º Instância é também por isso uma sentença nula.

    III. A Sentença do Tribunal de 1.º Instância não se pronunciou sobre os concretos factos que fundamentam a oposição da Ré.

    IV. A norma do ordenamento jurídico espanhol aplicada pelo Tribunal a quo não é a norma aplicável situação sub iudice.

    V. A Ré apresentou, no seu articulado de Oposição, e nos requerimentos posteriores, os seus requerimentos de prova.

    VI. Por Despacho, o Senhor Juiz - afirmou numa análise “meramente perfunctória” (temporária, passageira, transitória?) que estado dos autos lhe permitiria decidir do mérito da causa, dando às partes o contraditório.

    VII. E a Ré, em 16 de abril de 2018 e em 27 de abril de 2018, juntou um relatório complementar efetuado pela entidade (…) que já havia elaborado o primeiro relatório.

    VIII. Em 21 de Setembro de 2018, o Tribunal a quo proferiu sentença, afirmando-se sem necessidade de produzir mais provas, decidir imediatamente todo o mérito da causa.

    IX. O Tribunal a quo coartou todos os meios de defesa da Ré, X. O Tribunal a quo impossibilitou a Ré de produzir qualquer meio de prova constituendo.

    XI. O Tribunal a quo, desde muito cedo, preconcebeu que apenas era necessário apurar se a prestação pecuniária foi ou não efetuada à Autora.

    XII. O Tribunal a quo não teve em conta a complexidade factual alegada pelas partes e, em concreto a alegação por parte da Ré, da necessidade de prova da participação, negligente ou dolosa, da Autora, no sentido de criar um credor aparente à Ré.

    XIII. No domínio da lei materialmente aplicável, o Tribunal a quo impediu a Ré de fazer prova da sua boa-fé, impediu a Ré de fazer prova da culpa da Autora, impediu a Ré de provar quem é que efetivamente recebeu o pagamento, impediu a Ré de exercer um eventual direito de regresso, impediu a Ré de fazer prova da eventual relação entre o recetador e a Autora, impediu a Ré de fazer prova da existência de outros clientes da Autora afetados pelo esquema fraudulento.

    XIV. Para além disso, o Tribunal a quo parte de pressupostos de facto errados, porque erra ao afirmar que todos os emails recebidos pela Ré eram provenientes dos EUA, o que não é verdade e o Tribunal a quo tinha obrigação de o saber.

    XV. Os documentos 2 a 6 juntos com a Oposição, demonstram que o email original e o posterior são provenientes da Autora e não dos EUA.

    XVI. A primeira informação da nova conta bancária que antecedeu todas as que se sucederam num processo lógico foi enviada do correio eletrónico da Autora.

    XVII. Ao contrário do que se afirma na sentença a quo, a transferência efetuada pela Ré através do seu banco ((…)) identifica claramente o beneficiário da transferência como “A (…)”.

    XVIII. A transferência não deveria ter sido aceite pelo banco espanhol ao verificar que o beneficiário indicado (ALMENDRAS M (...) ) não era o mesmo que o titular do IBAN ((…) e por isso o seu chamamento, também ele indeferido.

    XIX. A Ré não indicou na transferência a sociedade C (…), como beneficiária (cfr Doc. 20 da Oposição).

    XX. Não tendo sido fixados quaisquer temas de prova pelo Tribunal a quo, devem ser sujeitos a instrução todos os factos alegados.

    XXI. O Tribunal a quo, foi omisso em qualquer decisão relativa à produção de qualquer prova constituenda: não admitiu, nem rejeitou. Desprezou, afastando-se do apuramento da verdade e da justa composição do litígio.

    XXII. Tendo revelado, desde cedo, repulsa, nomeadamente, por trazer aos autos o banco chamado, afirmando que a citação de pessoa coletiva no estrangeiro e a eventual invocação por esta de questões não alegadas pela Ré poderia perturbar o normal andamento do processo.

    XXIII. O direito à tutela jurisdicional efetiva contido na Constituição implica o direito à prova, que engloba a possibilidade de propô-la e produzi-la.

    XXIV. É contrária à Constituição a proibição absoluta da prova testemunhal, se tal restrição eliminar a possibilidade de prova de factos relevantes para a decisão, como é o caso dos autos.

    XXV. O Tribunal a quo não fundamentou a sentença, como lhe impunha a norma do art. 607.º, n.º 4 do CPC XXVI. Há insuficiência de matéria de facto provada para que o Tribunal condene a Ré.

    XXVII. Foi aplicável norma (civil espanhola) não subsumível à situação sub iudice.

    XXVIII. O Tribunal a quo não cumpriu o disposto no n.º 1 do Artigo 23.º do Código Civil Português XXIX. No domínio da lei aplicável, a presente ação não se resume em saber se a Ré entregou o preço devido à Autora na conta por esta indicada, mas em saber se a eventual entrega...

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