Acórdão nº 2296/17.0T8PBL-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Setembro de 2019

Magistrado ResponsávelBARATEIRO MARTINS
Data da Resolução10 de Setembro de 2019
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório J (…) e A (…)com os sinais dos autos, por apenso à execução para pagamento de quantia certa que lhes moveu G (…) S.A.

, também id. nos autos – para haver deles (e de L (…), Lda.) a quantia de € 34.452,54 e juros vincendos (e respectivo I. Selo) – vieram deduzir embargos à execução, alegando, em síntese, a prescrição dos avales por eles prestados (nas duas livranças dadas à execução, ambas subscritas pela L (…), Lda. e ambas à ordem da exequente/G (…)), por se encontrar ultrapassado o prazo de 3 anos entre a data do vencimentos das livranças e a data da propositura da execução; a inexistência ou inexequibilidade do título executivo (por as livranças prescritas não constituírem título executivo contra os seus avalistas por, em tal hipótese, a atribuição de força executiva pressupor a existência de relação causal e o aval, pela sua natureza, não ter relação subjacente); a ineptidão do requerimento (por não se depreender a causa de pedir na exposição dos factos); e a violação do pacto de preenchimento.

Contestou a exequente, dizendo, em síntese e de mais relevante, que as livranças exequendas valem como quirógrafos e que, nesta veste, constituem, nos termos do art. 703.º/1/c) do CPC, título executivos válidos; que, “pese embora a qualificação como avalistas, os embargantes sempre assumiram a posição de fiadores”[1], “tal significando que, no caso em concreto, a relação causal de aval mais não é do que uma fiança dada à obrigação assumida pela empresa L (…)”[2]; e que alegou e provou “os factos constitutivos essenciais da relação causal que levaram à subscrição de ambas as livranças, de modo a identificar adequadamente essa relação causal subjacente”[3].

Razões por que concluiu, tendo preenchido as livranças de acordo com o pacto, pela total improcedência da oposição.

Conclusos os autos – após a dispensa da audiência prévia – foi proferido despacho em que se julgaram improcedentes a ineptidão do requerimento executivo e a invocada inexistência ou inexequibilidade das livranças dadas à execução, tendo sido declarada a total regularidade da instância, identificado o objecto do litígio e enunciados os temas de prova.

Designado e realizado julgamento, com observância do formalismo legal, a Exma. Juíza proferiu sentença, em que julgou a oposição totalmente improcedente, mandando prosseguir os termos da execução.

Inconformados, interpõem os executados/embargantes o presente recurso de apelação, visando a revogação do despacho saneador e da sentença e “julgada procedente a excepção da inexequibilidade das livranças dadas como títulos executivos”.

Não foi apresentada qualquer resposta.

Obtidos os vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.

* II – Fundamentação de Facto II – A - Factos provados: A.

A Exequente é uma sociedade anónima que se dedica à realização de operações de natureza financeira e a prestação de serviços conexos, que visem a melhoria das condições de financiamento de entidades do sector não financeiro.

B.

No exercício da sua atividade, a Exequente celebrou com a L (…)Lda. dois contratos: a.

Contrato cujos termos constam de fls. 5 v.º a 11 v.º dos autos de execução e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, através da qual o Exequente prestou, em nome e a pedido daquela sociedade, uma garantia autónoma a favor do beneficiário Banco (…) S.A. com o número 2007.00438; b.

Contrato cujos termos constam de fls. 12 a 15 dos autos de execução e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, através da qual o Exequente prestou, em nome e a pedido daquela sociedade, uma garantia autónoma a favor do beneficiário B (…), S.A., com o número 2009.08238.

C.

O contrato referido em B), al. a) foi outorgado pelos Embargantes na qualidade de legais representantes da sociedade L (…) e, também na qualidade de terceiros contraentes –avalistas.

D.

O contrato referido em B), al. b) foi outorgado pela Embargante A (…) na qualidade de legal representante da sociedade L (…) e de ambos os Embargantes na qualidade de avalistas.

E.

Ao outorgarem os contratos referidos em B) os Embargante avalistas pretenderam garantir pessoalmente, na qualidade de avalistas, a dívida da sociedade L (…) F.

Na sequência do incumprimento parcial e total por parte da referida sociedade das obrigações emergentes assumidas com os referidos beneficiários, estes resolveram os contratos declarando vencidas todas as prestações, tendo solicitado à Exequente, o pagamento total correspondente ao valor vivo das garantias na respetiva data em que foram executadas.

G.

A Exequente pagou os montantes solicitados aos respetivos beneficiários.

H.

Com o pagamento destas quantias, a Exequente ficou sub-rogada nos direitos dos beneficiários sobre a sociedade referida e seus avalistas, agora Embargantes.

I.

De acordo com o disposto nas cláusulas dos contratos foram entregues à ora Exequente duas livranças em branco, avalizadas pelos Executados/Embargantes, com pacto de preenchimento de livrança.

J.

A Exequente procedeu ao preenchimento das livranças referidas pelos montante(s) de € 16.984,49 e € 10.841,12, com data de vencimento de 2014-03-31, ora apresentadas como título executivo.

K.

Os Embargantes foram interpelados para procederem ao pagamento da quantia aposta nas livranças.

L.

No requerimento executivo, a aqui embargada alegou no ponto 12: “Atenta a garantia pessoal prestada – aval - o(s) aqui Executado(s) (pessoas singulares) é(são) responsável(is) pelo pagamento do crédito da aqui Exequente quanto o é a também aqui executada L (…), LDA., sua avalizada, porquanto ao subscrever quer os contratos em causa (com reconhecimento presencial de assinaturas) quer as livranças propriamente ditas, pretenderam os avalistas assim garantir pessoalmente a dívida de forma expressa e declarada, manifestando dessa forma a sua vontade de se constituírem verdadeiros fiadores/garantes da dívida.” * II – B Factos não provados: Não se provou que: a) Os embargantes, ao outorgarem os contratos referidos em B), se tenham pretendido constituir como fiadores da dívida da L (…), Lda..

* III – Fundamentação de Direito A exequente, como resulta do relato inicial e dos factos provados, deu à execução duas livranças (na linha em que no requerimento executivo se manda identificar o título executivo, a exequente escreveu “livrança”), que lhe haviam sido entregues em branco, assinadas/avalizadas no verso pelos embargantes.

Tendo ambas as livranças a data de emissão de 31/03/2014 e tendo o requerimento executivo entrado tão só em 13/06/2017, vieram os embargantes invocar o decurso do prazo prescricional de 3 anos (como o dador do aval é responsável, nos termos do art. 32.º da LULL, da mesma maneira que a pessoa afiançada, o prazo da obrigação cambiária do avalista é de 3 anos – cfr. art. 70.º/§ 1.º da LULL).

Muito natural e compreensivelmente, uma vez que se o não tivessem feito – e toda a defesa deve ser deduzida na contestação (art. 573.º do CPC), sendo que a prescrição não é de conhecimento oficioso (art. 303.º do C. Civil) – teríamos por certo a exequente a chamar a atenção para a identificação do título executivo – “livrança” – que fez constar do requerimento executivo.

Sendo assim – tendo os embargantes invocado a prescrição das suas obrigações cambiárias, de avalistas – veio a exequente dizer, na contestação, que as livranças exequendas foram dadas à execução como quirógrafos e que, nesta veste, constituem, nos termos do art. 703.º/1/c) do CPC, títulos executivos válidos.

Passando a ser este o ponto de partida dos autos.

Quanto à prescrição das obrigações cambiárias, de avalistas, era inquestionável a razão dos embargantes, passando assim a situar-se a discussão dos autos no trecho do art. 703.º/1/c) do CPC em que se diz que, como meros quirógrafos, podem os títulos de crédito prescritos valer como títulos executivos, “desde que os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento os sejam alegados no requerimento executivo”[4].

O que nos remete para a questão (relativamente recorrente antes da Reforma Processual de 2013) das letras/livranças/cheques, perdida a sua validade enquanto títulos cambiários, poderem valer, enquanto documentos particulares, como títulos executivos; questão que foi então bastante polémica na jurisprudência, o que impõe que a interpretação do actual art. 703.º/1/c) do CPC seja feita com algum cuidado e “à luz do património jurisprudencial” [5] estabelecido.

Assim: Antes da reforma processual de 2013, discutiu-se se não tendo o cheque/letra/livrança validade enquanto título cambiário – por, como é o caso, a execução haver sido intentada para além do prazo prescricional da obrigação cambiária – podia ainda assim, perdida a acção cambiária, ser considerado título executivo à luz do art. 46º/1/c) do CPC (redacção anterior ao NCPC), agora como simples quirógrafo – enquanto documento particular, assinado pelo devedor.

Questão em que, numa narrativa...

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