Acórdão nº 470/19.3T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelEMÍDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução23 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam a 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra A..., S.A., com sede na Rua ...., Lisboa, propôs a presente acção declarativa com processo comum contra B..., residente na Plaza ...., Madrid, Espanha, pedindo: A) Se proferisse sentença que produzisse os efeitos da declaração negocial da ré, ou seja, vender à autora os três imóveis sitos no lugar de x... , freguesia de y... , concelho de w... , inscritos na matriz predial rústica sob os artigos 4232, 4231 e 4233, e descritos na Conservatória do Registo Predial de w... sob os números 3091, 3089 e 3090, nas condições convencionadas no contrato-promessa de compra e venda celebrado no dia 12 de Abril de 2004; B) Subsidiariamente, se tal não fosse possível, a condenação da ré, nos termos do n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil, no pagamento da quantia pecuniária referente à diferença entre o preço fixado no contrato-promessa e o actual valor do prédio, acrescida da quantia entregue a título de sinal e princípio de pagamento a liquidar em execução de sentença, mas nunca inferior a € 250 000,00; C) Se declarasse que, desde 12 de Abril de 2004, a autora entrou na plena fruição dos três imóveis e ali desenvolve explorações agrícolas (ali edificou muros e vedações, procedeu a desaterros, terraplanagens, abriu poços, instalou sistemas de rega gota-a-gota, plantou vinhas, pomares de macieiras e pereiras, olivais, etc), exercendo, assim, sobre tais imóveis e desde aquela data uma posse pública, pacífica, continuada e de boa fé, na convicção segura de que é a única e exclusiva possuidora desde a data referida e simultaneamente de que sobre os ditos imóveis tem o animus de vir a tornar-se proprietária; D) A condenação da ré a reconhecer que a autora goza do direito de retenção sobre os três identificados imóveis.

Para o efeito alegou em síntese: 1. Que no dia 12 de Abril de 2004, celebrou com C... , entretanto falecida, um contrato-promessa de compra e venda nos termos do qual esta prometeu vender à autora os seguintes imóvis, de sua propriedade, todos eles sitos em x... , freguesia de y... , concelho de w... : a) Pinhal, sito à Cerca, com a área aproximada de 2.300 m2 omisso na matriz, e sem descrição na competente Conservatória do Registo Predial de w... , a confrontar a norte com ribeiro, nascente com ... e outro, sul com ... e outros e poente com....; b) Pinhal, sito ao Olival da Capela, com a área aproximada de 100.000 m2, omisso na matriz, e sem descrição na competente Conservatória do Registo Predial, a confrontar de norte com ribeiro, de nascente com caminho e outros, de sul com ... e outros, e de poente com herdeiros de .... e outros; c) Terreno de cultura e pastagem, sito ao Olival da Capela, com a área aproximada de 97.000 m2, omisso na matriz, e sem descrição na competente Conservatória do Registo Predial, a confrontar de norte com ..... e outros, de nascente com .... e caminho, de sul com ribeiro, e de poente com ... e outros.

  1. Que o preço da prometida venda, € 48 000,00 (quarenta e oito mil euros), foi integralmente pago pela autora; 3. Que a autora entrou de imediato na posse dos prédios onde procedeu a obras e benfeitorias; 4. Que nos termos do contrato-promessa ficou ajustado que cabia à promitente vendedora, ou aos seus legais representantes, proceder à marcação da escritura de compra e venda, devendo avisar a autora da data da mesma, por escrito e com pelo menos 8 dias de antecedência; 5. Que C... prometeu celebrar a respectiva escritura pública «… logo após estar toda a documentação em ordem, o que previa ocorra no prazo de seis meses contar da data de assinatura do presente contrato-promessa.»; 6. Que a ré é herdeira e legatária de C... ; 7. Que a ré herdou os três imóveis a que respeita o contrato-promessa; 8. Que o legal representante da promitente vendedora, na qualidade de procurador da ré B... , requereu junto do Serviço de Finanças de w... a inscrição na matriz dos prédios prometidos vender, aditou tais imóveis à relação de bens do falecido marido da promitente vendedora e procedeu de igual modo junto da Conservatória do Registo Predial de w... ; 9. Que a ré não diligenciou no sentido de marcar a escritura de compra e venda apesar de a autora ter instado inúmeras vezes os sucessivos procuradores da ré nesse sentido.

    A ré contestou a acção. Na sua defesa, além de tomar posição sobre os factos narrados na petição (aceitando uns, impugnando outros e declarando, ainda em relação a outros, que os desconhecia, sem ter a obrigação de os conhecer), alegou que, embora mantivesse interesse no cumprimento do contrato-promessa e o quisesse cumprir, não o podia fazer na presente data porque no início de Janeiro de 2019, assinou por erro, dolo e incapacidade acidental, outros contratos-promessa de compra e venda dos mesmos prédios, tendo pedido a nulidade de tais contratos através de acção intentada contra J... , que corre termos no juiz 2 do juízo central cível da comarca de Coimbra sob o n.º 1515/19.2T8CBR.

    Terminou a contestação pedindo: · A procedência do pedido principal e consequente marcação de escritura definitiva de compra e venda, quando possível e determinado por sentença; · A improcedência total dos restantes pedidos por falta de prova e inutilidade superveniente face ao cumprimento do contrato-promessa quando possível e determinado por sentença.

    No despacho saneador, a Meritíssima juíza do tribunal a quo, conhecendo do mérito da acção, julgou a acção totalmente improcedente e em consequência: 1. Não determinou a execução específica do contrato-promessa celebrado entre a autora e a ré, no dia 12 de Abril de 2004; 2. Não declarou resolvido o contrato-promessa celebrado entre a autora e a ré, no dia 12 de Abril de 2004; 3. Não declarou que, desde 12 de Abril de 2004, a autora tem a posse sobre os prédios rústicos objecto do contrato-promessa; 4. Não declarou o direito de retenção da autora sobre os prédios objecto do contrato-promessa; 5. Absolveu a ré do demais peticionado.

    O recurso (…) * Objecto do recurso Antes de entrarmos na apreciação do recurso, importa precisar o respectivo objecto. Esta precisão impõe-se pelo seguinte. A parte dispositiva da sentença contem várias decisões desfavoráveis à recorrente e uma vez que esta, no requerimento com que interpôs o recurso, não o restringiu a nenhuma delas, o recurso abrangia todas as decisões (n.ºs 2 e 3 do artigo 635.º do CPC).

    Sucede que nas conclusões da alegação, a recorrente insurgiu-se apenas contra a decisão que julgou improcedente o pedido principal (pedido de execução específica do contrato-promessa).

    Considerando este facto e o n.º 4 do artigo 635.º do CPC, é de afirmar que o recurso tem como objecto apenas a decisão que julgou improcedente o pedido principal. Estão, assim, fora do objecto do recurso as decisões que julgaram improcedentes os pedidos subsidiários. Deste modo, na hipótese de este tribunal julgar improcedente o recurso não lhe cabe conhecer da legalidade das restantes decisões.

    * Factos a considerar provados Ainda antes de entramos na apreciação da questão suscitada pelo recurso, importa precisar os factos que devem ser considerados provados.

    Esta precisão impõe-se uma vez que a sentença sob recurso, apesar de entender que o estado do processo lhe permitia conhecer sem necessidade de mais provas, do mérito da causa, não discriminou, de entre os factos alegados pela autora, ora recorrente, quais os que considerava provados. Ao arrepio do que prescreve o n.º 3 do artigo 607.º do CPC, segundo o qual é dever do juiz discriminar os factos que considera provados, a sentença laborou com base nos facos alegados pela autora, “independentemente da sua prova ou não prova”.

    Este tribunal considera admitidos por acordo os seguintes factos alegados pela autora: 1. No dia 12 de Abril de 2004, a Autora outorgou com a C... , entretanto falecida, que também usava e foi conhecida por CC... , escrito particular epigrafado...

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