Acórdão nº 709/21.5T8ACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 23 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelHELENA MARIA MELO
Data da Resolução23 de Novembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I – Relatório[1] A..., intentou o presente procedimento cautelar de suspensão de deliberações sociais contra B..., S.A.

, pedindo que se declare a suspensão de todas as deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral da Requerida de 15 de março de 2021, declarando as deliberações sociais tomadas na referida assembleia nulas/anuláveis.

Alegou, e em síntese, ser acionista da Requerida, sendo titular de 180.000,00 ações.

A assembleia da Requerida, ocorrida a 15 de março de 2021, não foi precedida de qualquer convocatória.

Na referida assembleia apenas esteve presente o acionista C... .

Uma vez que a assembleia não foi precedida de qualquer convocatória, e não se assumindo a mesma como uma assembleia universal (cfr. artigo 54.º, do CSC), são nulas as deliberações tomadas, face ao disposto no artigo 56.º, n. º1, al. c), do CSC.

Mais alegou que na referida assembleia não compareceu o presidente da mesa da assembleia geral. Quem presidiu à referida assembleia geral foi M... , que não pertencia a qualquer órgão estatutário da sociedade e, como tal, carecia de legitimidade para assumir a presidência da mesa da assembleia geral (cfr. artigo 374.º, n. º3, do CSC).

Tal circunstancialismo determina a anulabilidade das deliberações tomadas (cfr. artigo 58.º, n. º1, do CSC).

Quanto ao dano apreciável, invocou que com as deliberações em causa, o Requerente deixa de poder exercer os seus direitos enquanto administrador da sociedade Requerida, ficando afastado da vida da sociedade, com o consequente reforço dos poderes do acionista C... .

Mais acrescentou que o acionista C... apresenta um quadro de perturbação de jogo patológico e de adição de álcool, aproveitando o seu cargo de presidente do conselho de administração para utilizar os recursos da Requerida na sua adição. Acresce que interfere negativamente no processo produtivo da requerida, com elevados prejuízos para a sociedade.

Utilizou ainda a sua posição de Presidente do Conselho de Administração para transmitir know-how a sociedades concorrentes, o que constitui um comportamento desleal causador de graves prejuízos para a sociedade Requerida.

A situação presente prejudica a Requerida que corre o risco de delapidação do respetivo património e de perda de credibilidade no mercado.

Por fim requereu que seja decretada a inversão do contencioso, ao abrigo do disposto nos artigos 369.º e 376.º, n. º4, do C.P.C. e a dispensa de contraditório prévio, nos termos do disposto no artigo 366.º, n. º1, do C.P.C.

Por despacho de 05.05.2021 foi deferida a requerida dispensa de audição prévia da sociedade Requerida e foi designada data para inquirição das testemunhas arroladas pelo Requerente.

Foi proferida decisão a 01.06.2021, concedendo a providência.

A Requerida veio, após notificação, deduzir oposição à providência decretada, alegando, e em síntese: - A presente providência é extemporânea, uma vez que o Requerido teve conhecimento da realização da Assembleia Geral no dia 15 de março de 2021 e não só no dia 26 de março de 2021, como por si alegado em sede de requerimento inicial.

- O Requerente carece de legitimidade para propor a presente providência, uma vez que não é titular de qualquer ação da sociedade Requerida, sendo acionista único da sociedade Requerida C... , uma vez que foi este quem adquiriu a totalidade das ações dos restantes acionistas: D... ; E... ; F... e G... .

- O Requerente negociou com os seus tios E... e G... a aquisição das ações, mas em representação do seu pai que o mandatou para tal; - C... jamais pôs em causa a situação financeira da Requerida; - C... jogava no casino, mas tal situação já não se verificava aquando da propositura do presente procedimento cautelar; e, - Não estão reunidos os respetivos pressupostos legais para que seja decretada a inversão do contencioso.

Procedeu-se à produção de prova indicada na oposição e foi proferida sentença que julgou procedente a exceção de caducidade do procedimento cautelar e declarou extinto o direito cautelar do requerente.

O requerente não se conformou e interpôs o presente recurso de apelação, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo: (…) II – Objeto do recurso Considerando que: . o objeto do recurso está delimitado pelas conclusões contidas nas alegações dos recorrentes, estando vedado a este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso; e, . os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu ato, em princípio delimitado pelo conteúdo do ato recorrido, as questões a decidir, de acordo com as conclusões do apelante, são as seguintes: . se devem ser admitidos os documentos que o apelante juntou com as alegações; . se os factos dados como provados no ponto 28 devem ser dados como não provados, ou se, pelo menos, deve ser dado como provado que o requerente teve conhecimento da Assembleia Geral e das respetivas deliberações em 26.06.2021 e apenas conheceu o teor da ata avulsa em 30.03.2021; . se os factos dados como não provados nas alíneas l) e m) dos factos, devem ser considerados provados, devendo em consequência, ser alterado, em conformidade, o ponto 11 dos factos provados; . se, ainda que a matéria de facto não seja alterada, se deve ser julgada improcedente a exceção de caducidade, porquanto o prazo de caducidade se encontrava suspenso até 6 de abril de 2021, só se iniciando a partir dessa data ( nos termos das disposições conjugadas dos artº 6º-B, nºs 3 e 4 da Lei 1-A/2020, de 9 de março, na redação conferida pela Lei 4-B/2021, de 1 de fevereiro de 2021) pelo que em 5 de abril quando o procedimento cautelar foi instaurado, ainda nem sequer tinha começado a correr o prazo.

E a entender-se que a apelada ampliou o objeto do recurso nas contra-alegações, se os factos considerados provados nos pontos 17 a 26, devem ser considerados não provados.

III – Fundamentação Na primeira instância foram considerados provados e não provados os seguintes factos: .1 Factos indiciariamente provados Da discussão da causa resultaram sumariamente provados os seguintes factos (considerando os elementos documentais juntos aos autos e o teor da prova produzida em sede de julgamento da presente providência, incluindo o julgamento da oposição, desconsiderando as alegações de cunho conclusivo, de direito ou irrelevantes para a boa decisão da causa) (Do requerimento inicial) 1.

A Requerida é uma sociedade anónima, constituída a 15 de abril de 1987, cujo objeto social é a fabricação, comercialização e exportação de artigos de utilidade doméstica e decorativa em olaria, rés-fino, faiança e porcelana, com um capital social de € 1.500.000,00.

2.

Com data de 13 de novembro de 2006 F... e mulher J... e A... subscreveram o escrito particular junto a fls. 104 dos autos, nos termos do qual o primeiro outorgante declarou vender a A... 42.000 ações nominativas, no valor nominal de € 5,00 cada, no capital da Sociedade B... , S.A., correspondentes a 20% do capital social da sociedade, pelo preço de € 25.000,00 a ser pago no prazo de 5 anos.

3.

Mais ficou convencionado que as ações seriam entregues pelo primeiro outorgante a A... após o pagamento da totalidade do preço.

4.

F... procedeu ao endosso (endosso este título de 1000 ações a A... , por lho ter transmitido por venda em 13.11.2006[2]) e entrega dos títulos representativos das ações a favor de A... .

5.

Com data de 23 de maio de 2016 E... e mulher L... e A... subscreveram o escrito particular junto a fls. 103 dos autos, nos termos do qual o primeiro outorgante declarou vender a A... 42.000 ações nominativas, no valor nominal de € 5,00 cada, no capital da Sociedade B... , S.A., correspondentes a 20% do capital social da sociedade, pelo preço de € 160.000,00 a ser pago no prazo de 6 anos.

6.

Mais ficou convencionado que as ações seriam entregues pelo primeiro outorgante a A... após o pagamento da totalidade do preço 7.

E... procedeu ao endosso (endosso este título de 1000 ações a A... , por lho ter transmitido por venda em 23.05.2016) e entrega dos títulos representativos das ações com os números 120.001 a 149.000 a A... .

8.

Com data de 31 de julho de 2017 G... e marido H... e A... subscreveram o escrito particular junto a fls. 105 dos autos, nos termos do qual a primeira outorgante declarou vender a A... 42.000 ações nominativas, no valor nominal de € 5,00 cada, no capital da Sociedade B... , S.A., correspondentes a 20% do capital social da sociedade, pelo preço de € 80.000,00 a ser pago até ao fim do ano de 2019.

9.

Mais ficou convencionado que as ações seriam entregues pela primeira outorgante a A... após o pagamento da totalidade do preço.

10.

G... procedeu ao endosso (endosso este título de 1000 ações a A... , por lho ter transmitido por venda em 13.07.2017) e entrega dos títulos representativos das ações a favor de A... .

11.

Em resultado da outorga dos escritos particulares referidos em 2. e 8. A... é possuidor das ações nominativas na sociedade B... , S.A., com o valor nominal cada de 5,00€, com os números 60.001 a 90.000 e 150.001 a 180.000, cujas cópias se mostram juntas aos autos.

12.

Em 18.06.2020 foi efetuado um aumento de capital da sociedade Requerida, no valor de € 450000.00, por incorporação de reservas livres, passando a sociedade a ter emitidas um total de 300000 ações, no valor nominal de € 5,00 cada.

13.

No dia 15 de março de 2021 teve lugar a Assembleia Geral da ré, presidida por M... , onde se encontrava apenas presente o acionista C... (cfr. ata junta como doc.1 com o requerimento inicial) 14.

Nessa assembleia, com o voto favorável do acionista C... , foi deliberado o seguinte: i.

(Ponto um da ordem de trabalhos): Ficam designados como órgãos sociais para o triénio 2021/2023: Mesa da assembleia geral: Presidente: M... , casado, residente na Rua ...., Nif:.....; Secretária: N... , casada, residente na ....., , Nif ...; Conselho de Administração: Presidente: C... , casado, residente na ..., Nif. ...., que...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT