Acórdão nº 802/20.1T8CLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelLUÍS CRAVO
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1] 1 - RELATÓRIO O Ministério Público instaurou em 03.07.2020 o presente processo judicial com vista à aplicação de medida de promoção e proteção em benefício da menor L...

, nascida em 26.06.2020, natural da freguesia de ..., concelho de ..., filha de G... e de C... (paternidade esta apurada já no decurso dos autos), menor essa que se encontrava então no centro de acolhimento temporário da Santa Casa da Misericórdia de ....

Em benefício da menor foi aplicada, provisoriamente, por despacho de 03.07.2020, a medida de acolhimento residencial, uma vez que se levantavam fundadas suspeitas de que a mãe da criança, que vivia com o seu pai adotivo, teria engravidado deste. Mais se indiciava então que a progenitora padecia de mutismo seletivo e de comportamento obsessivo.

Esse despacho determinou igualmente a realização de exames periciais psicológicos e psiquiátrico à progenitora, a incidir, além do mais, na apreciação das suas patologias ou distúrbios, capacidades, competências e valências parentais, funcionamento emocional, estrutura de personalidade, bem como no relacionamento mantido com a menor, a realizar pelo gabinete médico-legal do INML.

Esse despacho, notificado, não foi objeto de qualquer oposição.

* Em 20.07.2020 o ISS juntou relatório social em que sugeriu a aplicação da medida de acolhimento residencial.

No dia 21.07.2020 procedeu-se a inquirições. No final dessa diligência foi proferido douto despacho, que em parte se transcreve: «Conforme se constata da douta decisão de fls. 70 a 72, em especial a fls. 70 frente e verso, um dos fundamentos para a aplicação da medida cautelar vigente foi a de haver suspeita de que o avô materno (adotivo) da criança L..., fosse também ele próprio o pai desta.

Como a menor já foi registada no registo civil sem paternidade averbada, é assim muito importante para o prosseguimento deste processo determinar quem é efetivamente o pai da L...

No douto requerimento inicial o Ministério Público promoveu a fls. 9 al. f) "se determine a realização, pela Delegação de Coimbra do INMLCF, de perícia tendente à determinação da probabilidade de a L... ser filha de C...".

Relativamente a esta douta promoção ainda não recaiu qualquer despacho judicial, o que se faz de seguida.

Uma vez que a L... foi registada sem paternidade averbada, é obrigatório instaurar processo de Averiguação Oficiosa da Paternidade (AOP).

Segundo agora tive conhecimento, já se encontra instaurado nos serviços da Procuradoria de Família e Menores de ... a referida AOP, que tem o nº ...

Muito provavelmente, nessa AOP ir-se-á proceder à determinação da perícia para apurar a paternidade da L..., também requerida no presente processo de promoção e proteção.

Como a sede própria para a realização do referido exame final será a AOP, e não tanto o presente processo de promoção e proteção, antes de mais, oficie o referido processo solicitando que seja informado se já foi determinado ou se irá ser determinado em breve a realização do exame pericial também requerido nos presentes autos, e ainda que se informe o estado deste processo.

Obtidas as informações do processo de AOP com o n.º ..., decidir-se-á então se haverá necessidade de neste processo de promoção e proteção se realizar exame pericial tendente à determinação da probabilidade da menor L... ser filha do avô materno C...

Conforme se verifica da douta decisão de fls. 70 a 72, em especial a fls. 70 frente e verso, está aplicada e vigente a medida de promoção e proteção, cautelar e provisória, de acolhimento residencial urgente, pelo período de 3 meses.

Analisando a prova produzida depois dessa decisão, conjugando-a com tal decisão, o Tribunal não vê motivos, de momento, para alterar a medida cautelar vigente uma vez que da prova produzida posterior a essa decisão, nomeadamente a produzida no dia de hoje, não ficaram abalados os fundamentos de facto que estiveram na base da prolação da decisão cautelar.

Mantendo-se assim a execução da medida cautelar decretada, está inviabilizada a parte da mesma em que determinou permitir à mãe que acompanhasse a menor para a casa de acolhimento residencial (CAR) indicada pelo ISS, estando assim subjacente que a mãe poderia e deveria permanecer em tal CAR, para assim poder cuidar da menor, embora com a ajuda e supervisão do pessoal técnico da CAR.

Conforme resulta, nomeadamente de fls. 82, a mãe recusou-se a permanecer com a menor na primeira CAR, Centro de Apoio à Vida (CAV) " K ...", sito em ....

Decorre nomeadamente do depoimento da senhora técnica do ISS hoje ouvida que a citada CAV tem condições logísticas, materiais e humanas que permitiriam que a mãe aí vivesse com a menor L... e dela cuidasse.

O mesmo já não sucede na atual CAR, " W ...", sita em ..., para onde foi a menor conduzida pelo ISS na sequência da recusa da mãe em permanecer com a filha no citado CAV " K ...".

Decorre da decisão cautelar vigente que não há inconvenientes, antes pelo contrário, em que a mãe tenha contactos e prive com a filha L....

Segundo nomeadamente o hoje declarado pela avó materna, a mãe da L... tem disponibilidade para visitar a L... todos os dias.

Face a todo o exposto e sendo conveniente que a mãe G... prive com a filha bebé, inclusive amamentando-a com o leite materno, se ainda o tiver, devem permitir-e as visitas da mãe na casa de acolhimento, o mesmo ocorrendo com outros familiares, permitindo-se assim também as visitas à bebé de outros familiares da mesma que com ela têm, ou possam vir a ter, relação afetiva profunda.

Pelo exposto decide-se, nos termos do disposto no artigo 37. º, n.ºs 1 e 3 e 53.º, n.ºs 3 e 4, ambos da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo: 1. º Mantém-se vigente a medida cautelar de acolhimento residencial decretada a fls. 70 frente e verso, pelo período de 03 meses já consignado nessa decisão, devendo a menor permanecer acolhida na CAR onde já se encontra presentemente - Casa de Acolhimento Residencial " W ...", da Santa Casa da Misericórdia de ..., sita em ...; 2. ° Permitir visitas diárias, na referida CAR, à criança L... por parte da sua mãe, supervisionadas e acompanhadas pela equipa técnica da CAR, em horários e moldes concretos a combinar com a equipa técnica e a mãe, também em articulação com a avó materna da criança (M...) uma vez que será esta a transportar a filha (G...) à CAR; 3. ° Permitir visitas à criança L... na CAR por parte dos avós maternos e tio materno, em horários e termos a articular entre estes familiares e a equipa técnica dessa CAR; 4. ° Informe de imediato a CAR do atrás decidido em 2.° e 3.º, para que as visitas atrás determinadas, especialmente da mãe à L..., se iniciem o mais breve possível; 5. ° Solicite ainda à CAR que, no prazo de 30 dias, elabore e junte aos autos informação detalhada sobre as visitas atrás permitidas, especialmente no que se refere à mãe da L..., e abordando, designadamente, a interacção da mãe com a criança e a capacidade demonstrada pela mãe para tomar conta da filha; 6. ° Remeta cópia da presente acta ao ISS e à CAR, bem como à AOP atrás identificada (processo n...), remetendo ainda neste último caso cópia da gravação das declarações e depoimentos hoje prestados; 7. ° Informe ainda o ISS que este Tribunal, na sequência das audições hoje efectuadas, nomeadamente à mãe da L..., reafirma a necessidade premente de lhe ser prestado apoio psicológico, pelo que o ISS deverá tomar as providências necessárias para a implementação prática desse apoio, devendo para tanto articular-se, quer com a mãe da menor L..., quer com a avó materna da menor, uma vez que é esta ultima que presta apoio logístico à filha, nomeadamente o transporte».

Esse douto despacho também não foi questionado, tendo a progenitora, em 26.07.2020, declarado que "entende a importância da realização das perícias médicas e quer realizá-las", requerendo que não fossem feitas pelo Centro Hospitalar do Oeste.

* Por despacho de 24.09.2020, tendo sido constatado que, no seio do processo que corria termos no Ministério Público, não fora ordenada a prova pericial, e atendendo à situação que desencadeou a propositura destes autos, que reclamava esclarecimento urgente, determinou-se a realização de prova pericial, a qual teve por desiderato ou finalidade aferir se C... (pai adotivo da progenitora G...) era pai da menor L..., através de exames hematológicos ou de DNA.

Em 09.10.2020 o ISS juntou novo relatório social, sugerindo a aplicação da medida de acolhimento residencial.

Essa medida, aplicada a título cautelar, foi prorrogada em 15.10.2020, sob promoção do Ministério Público.

Dessa prorrogação, que por lapso foi feita sem que se notificassem antes as partes do teor do relatório para efeito de exercício do contraditório, recorreu a progenitora. Esse recurso, a que respeita o apenso A, foi julgado procedente em 06.01.2021, uma vez que se decidiu «anular o despacho recorrido, determinando que o tribunal a quo proceda previamente à audição da progenitora/mãe da menor - notificando-a para o efeito - (o mesmo sucedendo em relação ao patrono nomeado à menor, caso tal antes não tenha também sucedido), a fim de se pronunciar sobre a prorrogação da medida cautelar aplicada, sem prejuízo de tal diligência se vir a mostrar inútil ou ficar prejudicada por eventual decisão que venha a ser, entretanto, tomada pelo tribunal a quo».

* Entretanto, nestes autos principais foi junto o relatório do INML, que concluiu, quanto à paternidade da L... ser atribuída ao avô C..., por uma probabilidade apurada de W=99,999999999998%.

O Ministério Público sugeriu, além da sujeição da progenitora a perícias (já ordenadas em 03.07.2020), a realização de perícias psiquiátricas e de personalidade à avó materna e a C..., o que foi deferido por despacho de 08.01.2021.

Do despacho de 08.01.2021 recorreu a progenitora em 27.01.2021, sem cumprir o disposto no art° 2210 do CPC e sem pagar a multa do art° 139º do CPC. Esse recurso, entretanto admitido após o...

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