Acórdão nº 123/13.6TBFVN.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1.

B...

e B...

, residentes em Figueiró dos Vinhos, propuseram ação contra A...

e M...

e J...

e M...

, todos residentes em ...., pedindo que os mesmos sejam condenados a: a) Reconhecer que os autores são donos da água que brota e é captada, armazenada e condutada pela mina, que identificaram; b) Entulharem totalmente o poço que abriram, a cerca de 3/4 metros, por forma a reporem a água nascida e captada que brota no subsolo, para que a água continue a ser captada e condutada através da mina para os prédios dos autores; c) Removerem toda a terra e entulho que colocaram no interior da mina, por forma a que a água possa livremente escorrer e ser condutada pelo interior da mina, para os terrenos dos autores; d) Indemnizarem os autores pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados, a liquidar em execução de sentença, bem como nos juros moratórios e, após trânsito, juros compulsórios; e) Pagarem uma sanção compulsória de 50 € por cada acto de violação dos direitos e legítimos interesses dos autores.

Para tanto alegaram, em síntese, que: autores e réus são proprietários de prédios contíguos, que faziam parte da então chamada Quinta das ...; a cerca de 3 a 4 metros de profundidade, numa extensão de pelo menos 100 a 120 metros de comprimento, com cerca de 1,20 metros de altura e entre 50 a 80 cm de largura existe uma mina (onde se encontra um tubo) na qual é armazenada e condutada água, que se localiza no subsolo do prédio dos réus, escorrendo a água de norte para sul, pelo prédio dos réus até atingir o dos autores, sendo a boca da mina no prédio dos autores, local onde existe uma poça ou represa exterior que acumula e armazena a água proveniente da mina; a cerca de 15 a 20 metros para nascente existe, já há mais de 50 anos, uma “clarabóia”, com forma circular, com cerca de 1,5 metros de diâmetro e 3 a 4 metros de profundidade, por onde se procede à limpeza, manutenção e conservação da mina, para que a água possa ser condutada de nascente para poente; a água que provém da mina é utilizada pelos autores e seus antecessores para irrigar as culturas, fruteiras e abastecer a habitação, há mais de 100 a 200 anos consecutivos, à vista da generalidade das pessoas, sem oposição de ninguém, sem violência, com convicção de que lhes pertence; tendo realizado todas as obras necessárias à limpeza, manutenção e conservação, tanto no solo como as necessárias à captação e condutação; a cerca de 3 a 4 metros os réus abriram um poço que desvia e diminui a captação de água subterrânea e dos veios que sustentam a mina; na zona próxima da clarabóia, os réus introduziram quantidades de terra e saibro na mina, entulhando-a, entupindo-a e obstruindo-a, assim como ao tubo ali existente, impedindo a circulação da água para a represa, com a consequência de as culturas/fruteiras/vinha/olival não se desenvolverem, nem se produzirem, atenta a falta de água, em especial desde o período da Primavera até ao final do Outono; os autores tiveram de instalar um sistema de irrigação com custos de 1121,22 €; as culturas durante os anos de 2010, 2011 e 2012 não puderam ser irrigadas devidamente, tendo diminuído a produção; os autores ao verem as suas culturas definhadas e secas na sequência da privação da água, entraram em situação de verdadeira ansiedade, angústia, tristeza, andando psicologicamente abatidos, frustrados, desanimados, dem conseguir descansar.

Os réus contestaram, por impugnação, mais aduzindo, em suma, que: É falso que a água que provém da mina seja utilizada pelos autores e seus antecessores para irrigar as culturas, fruteiras e abastecer a habitação, há mais de 100 a 200 anos consecutivos, à vista da generalidade das pessoas, sem oposição de ninguém, sem violência, com convicção de que lhes pertence; inexiste qualquer “clarabóia”; os réus nunca violaram qualquer direito dos autores quanto à utilização da mina; os réus abriram um poço aquando da compra do terreno (1979) mas que dista a 300 metros da mina, não utilizando sequer a água desse poço, sendo certo que o mesmo não desvia ou capta a água da mina; os réus não obstruíram a mina com saibro nem retiraram o tubo da mina; a mina tem água, inclusive no Verão, devendo-se a diminuição de água ao facto de aquela não ser limpa; os autores têm mais dois furos de captação de água.

Mais deduziram reconvenção, pedindo a condenação dos autores numa indemnização no valor de 2500 €, que sofreram em consequência de aqueles terem colocado uma corrente num largo, de domínio público, dificultando o acesso ao seu terreno e gerando-lhes danos não patrimoniais. Por último, peticionaram a condenação dos autores como litigantes de má fé.

Os autores responderam, impugnaram a factualidade alegada pelos réus em sede de reconvenção, concluindo pela inadmissibilidade do pedido reconvencional, e responderam ao pedido de litigância de má fé, por seu turno tendo requerido a condenação dos réus como litigantes de má fé.

Os réus responderam ao pedido de litigância de má fé.

Foi realizada audiência prévia, aí tendo sido proferido despacho de não admissão da reconvenção.

* A final foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os RR de todos os pedidos formulados pelos AA.

* Os AA recorreram, pedindo a anulação do julgamento para produção de prova pericial, necessária à justa composição do litígio.

Os RR contra-alegaram, pugnando pela manutenção do decidido.

Na Relação foi proferido acórdão que anulou o julgamento e ordenou a realização de perícia.

A perícia foi realizada, tendo o perito prestado os esclarecimentos requeridos pelos AA.

Os AA requereram perícia adicional, sobre um ponto determinado, o que foi deferido. Foi realizada a perícia adicional, tendo a perita prestado os esclarecimentos requeridos pelos AA e RR.

Os AA, entretanto, requereram a junção aos autos de um parecer técnico. Foi proferida nova sentença que julgou a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os RR de todos os pedidos formulados pelos AA.

  1. Os AA recorreram, tendo formulado as seguintes conclusões: ...

  2. Os RR contra-alegaram, concluindo que: ...

    II – Factos Provados ...

    Factos não provados: ...

    III – Do Direito 1. Uma vez que o âmbito objetivo dos recursos é delimitado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes (arts. 635º, nº 4, e 639º, do NCPC), apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas.

    Nesta conformidade, as questões a resolver são as seguintes.

    - Alteração da matéria de facto.

    - Titularidade do direito de propriedade sobre a água que provém da mina.

    - Entulhamento do poço que os RR abriram, a cerca de 3/4 metros, por forma a reporem a água nascida e captada que brota no subsolo, para que a água continue a ser captada e condutada através da mina para os prédios dos AA.

    - Removerem da terra e entulho que os RR colocaram no interior da mina, por forma a que a água possa livremente escorrer e ser condutada pelo interior da mina para os terrenos dos AA.

    - Indemnização aos autores pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados, a liquidar em execução de sentença, bem como nos juros moratórios e, após trânsito, juros compulsórios.

    - Pagamento de sanção compulsória de 50€ por cada acto de violação dos direitos e legítimos interesses dos AA.

    - Custas da reconvenção.

  3. Os AA impugnam a decisão da matéria de facto relativamente aos factos provados 10., 14. e 41. e os não provados 1) a 5), 7) e 10) a 15), com base nos depoimentos testemunhais de ..., declarações de parte, bem como em prova documental que indicam, na inspeção judicial, nas 2 perícias efetuadas, e respetivos esclarecimentos, e dois pareceres técnicos, sugerindo as respostas a dar, designadamente modificação em parte da redação dos factos provados e passagem a provados de todos os factos não provados (cfr. conclusões de recurso 1ª a 8ª). Os RR pugnam pelo indeferimento, acrescentando, ainda, como meio de prova as declarações de parte do R. J... (cfr. a) a c) das conclusões das suas contra-alegações). A julgadora exarou a seguinte motivação para a sua decisão da matéria de facto (transcrição total): “O Tribunal formou a sua convicção com base na prova produzida em audiência, mormente da prova testemunhal, inspecção judicial, bem como da apreciação dos documentos juntos aos autos, tudo analisado de forma crítica e de acordo com as regras da experiência comum.

    No que concerne aos factos 2), 4), 6), 14), 15), 20), 23), os mesmos foram admitidos por acordo.

    Quanto aos factos vertidos em 3), 7), 8), 9), 12) e 13) os mesmos encontram-se provados através de prova documental, designadamente certidão da escritura de compra e venda junta como documento n.º 5 da petição inicial a fls. 27 a 30, documento n.º 13 da petição inicial, certidões do registo predial juntas pelos Autores a fls. 136 a 143, cadernetas prediais rústicas de fls. 42 e 45 (daí não resultando qualquer aquisição por via sucessória entre F... e as pessoas que venderam os prédios aos Autores) e certidão junta pelos Réus a fls. 98 a 102.

    Também o facto 41) – para além de ter resultado provado mercê da prova testemunhal – resultou dos documentos juntos pelos Réus a fls. 248 a 251.

    Os demais factos resultaram da prova testemunhal trazida aos autos, conjugada com a prova documental, designadamente as fotografias constantes a fls. 305 a 320.

    Analisemos, em concreto, os depoimentos das testemunhas. Assim: ...

    Mercê de toda esta prova, assim resultaram os factos dados como provados e não provados.

    Da prova não resultou que os anteriores proprietários do terreno dos Autores que se encontra junto à mina o tivessem cultivado e utilizado a água da mina em data posterior a 1980.

    Assim como não resultou a existência de uma clarabóia no terreno dos Réus, ou de qualquer estrutura que a ela se assemelhasse. Seja a 15, 20, 30 ou 40 metros da boca da mina.

    Com efeito, foram realizadas duas perícias que se debruçaram sobre a existência ou não de uma clarabóia no terreno dos Réus.

    A propósito do teor do relatório pericial...

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