Acórdão nº 1242/17.5T8CTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 11 de Janeiro de 2021

Data11 Janeiro 2021
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

Z (…), sita na Rua (…) Lisboa, sucursal da sociedade Z(…) COMPANY, registada na Irlanda, com sede em (…), Dublin, Irlanda, veio instaurar acção contra A (…), residente (…) Guarda, pedindo que este seja condenado a pagar-lhe a quantia de 76.781,03€ acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a citação e até integral e efectivo pagamento.

Para fundamentar essa pretensão, alegou, em resumo: que, no dia 28/05/2012 ocorreu um acidente em que foi interveniente o veículo (…)QO; que tal acidente foi imputável ao Réu – condutor desse veículo – sendo certo que, ao realizar uma manobra de ultrapassagem ao veículo de matrícula (…)TEV que seguia à sua frente, perdeu o controlo do veículo e foi embater neste veículo e no rail central; que desse acidente resultaram danos na via por onde circulavam os veículos, no veículo (…)TEV e nos respectivos ocupantes; que, no âmbito do contrato de seguro que havia celebrado e por força da responsabilidade que havia assumido emergente da circulação do veículo QO, regularizou os danos emergentes do acidente, pagando o valor de 5.298,22€ à S (…)S.A. e pagando – na sequência de acção judicial contra si intentada – a quantia de 71.482,81€ para regularização dos danos no veículo (…)TEV, despesas de transportes e despesas médicas do condutor e passageira desse veículo e que o acidente em questão ficou a dever-se ao facto de o Réu conduzir o veículo com uma taxa de alcoolemia de 1,25g/l, razão pela qual lhe assiste o direito de regresso nos termos da alínea c) do artigo 27º do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21/08.

O Réu contestou, contrariando a versão dos factos alegada pela Autora e imputando a culpa do acidente ao outro veículo que nele foi interveniente. Alega, para o efeito, que foi o condutor do veículo que se encontrava a ultrapassar que perdeu o controlo do mesmo e que foi embater com a sua lateral esquerda na lateral direita do veículo conduzido pelo Réu, o que provocou o despiste dos dois veículos, com capotamento do veículo (…)TEV.

Com esses fundamentos e impugnando – por desconhecimento – os pagamentos alegadamente efectuados pela Autora com vista ao ressarcimento dos danos, conclui pela improcedência da acção.

Foi proferido despacho saneador, foi fixado o objecto do litígio e foram delimitados os temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou o Réu a pagar à Autora a quantia de 76.781,03€ acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação até integral pagamento.

Inconformado com tal decisão, o Réu veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) A Autora apresentou contra-alegações, formulando as seguintes conclusões: (…) II.

Questões a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações do Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: ● Saber se deve ser alterada a decisão proferida sobre a matéria de facto nos termos pretendidos pelo Apelante; ● Saber se, em face da matéria de facto provada e das normas legais aplicáveis, estão (ou não) verificados os pressupostos de que depende o direito de regresso que a Autora vem exercer, apurando, designadamente, se foi (ou não) o Apelante quem deu causa ao acidente que está na origem desse direito de regresso e apurando se esse facto pode (ou não) ser julgado provado com recurso a presunções.

///// III.

Na 1.ª instância, julgou-se provada a seguinte matéria de facto: 1. A Autora dedica-se à actividade seguradora.

  1. Por contrato de seguro, celebrado entre a Autora e H (…), a 30 de Maio de 2010, titulado pela apólice n.º(…), referente ao veículo automóvel de marca BMW, modelo 525 D, com a matrícula (…)QO, este transferiu a responsabilidade civil pela circulação do veículo para a aqui Autora.

  2. No dia 28 de Maio de 2012, pelas 22h35m, o Réu conduzia veículo QO pela Autoestrada 23 (A23), sentido Sul/Norte.

  3. Ao chegar ao km 188,80 o Réu iniciou uma manobra de ultrapassagem ao veículo com a matrícula (…)TEV que seguia à sua frente e era conduzido por P (…) 5. Ao realizar a referida manobra, o Réu perdeu o controlo do veículo QO e foi embater na lateral esquerda do (…)TEV e no rail central, provocando o seu despiste que por três vezes embateu no rail central, acabando por capotar.

  4. A via onde se deu o acidente é composta por duas faixas de rodagem no mesmo sentido e descreve uma curva pouco pronunciada no sentido ascendente.

  5. Do acidente resultaram danos materiais em ambos os veículos, a saber: Relativamente ao veículo QO: a) Na lateral direita na parte da frente especificamente na porta e guarda-lamas e na frente e lateral traseira esquerda; Relativamente ao veículo (…)TEV: b) Danos na lateral esquerda estando a porta traseira esquerda mais danificada que a restante lateral e apresentava ainda os danos característicos de capotamento.

  6. Sobrevieram ainda danos em 19 guardas de segurança na berma direita, em 2 delineadores curtos na berma direita e teve de ser efectuada uma limpeza ao pavimento pela S(…) e colocação de new jerseys de plástico na berma direita.

  7. A data do acidente não chovia, não havia nevoeiro e o piso estava seco.

  8. Todos os condutores foram submetidos ao teste de pesquisa de álcool.

  9. O Réu por ter sido transferido ao Hospital foi submetido a análise de sangue para pesquisa de álcool, tendo acusado uma taxa de álcool no sangue correspondente a 1,25 g/l, tendo sido condenado por sentença criminal datada de 13 de Março de 2015 pela prática de um crime de condução com álcool.

  10. A Autora assumiu a responsabilidade pela regularização dos danos decorrentes do acidente.

  11. A Autora pagou à S(…), S.A. a quantia de € 5.298,22 a título de despesas com a reparação na via decorrentes do sinistro.

  12. Pagou também para regularização dos danos no veículo (…)TEV, despesas de transportes e despesas médicas do condutor e passageira do (…)TEV, o montante de € 71.482,81 15. O condutor do veículo (…)TEV accionou judicialmente a ora Autora em Inglaterra, pelo que foi a sua representante Z (…) que procedeu à regularização do sinistro, tendo a ora Autora procedido ao pagamento dos montantes da Regularização à sua representante.

    * * * E julgou-se não provado que o acidente tivesse ocorrido porque o condutor do veículo (…)TEV perdeu o controlo do mesmo, provocando o despiste de ambos e o capotamento deste.

    ///// IV.

    Apreciemos então o objecto do recurso.

  13. O Apelante começa por impugnar a decisão que julgou provado o facto constante do ponto 5, ou seja, a decisão que julgou provado que “ao realizar a referida manobra, o Réu perdeu o controlo do veículo QO e foi embater na lateral esquerda do (…)TEV e no rail central, provocando o seu despiste que por três vezes embateu no rail central, acabando por capotar”.

    Argumenta, para o efeito: que nenhuma prova foi produzida que permitisse julgar provado esse facto; que as testemunhas indicadas pela Autora não presenciaram o acidente e nada sabiam de relevante e que as testemunhas por si indicadas (…)presenciaram o acidente e contrariam aquele facto – confirmando a versão do Réu –, sendo que os seus depoimentos vão de encontro à análise feita pelo militar da GNR que foi ao local após o acidente segundo a qual o embate ocorreu entre o veículo conduzido pelo Réu e o reboque do veículo estrangeiro.

    Vejamos se assim é.

    As testemunhas indicadas pelo Réu ((…)) vieram declarar que, depois de terem jantado com o Réu, circulavam (ambos) num veículo que era conduzido pela testemunha (…). Declaram ter ultrapassado o veículo de matrícula inglesa que circulava com um reboque (dizendo que o reboque oscilava muito – ia aos ziguezagues – e que o veículo ia no meio da estrada) e que, quando se encontravam mais à frente (depois dessa ultrapassagem) viram atrás de si o embate ocorrido entre esse veículo e o veículo conduzido pelo Réu. A testemunha (…) não terá visto (…)(que ia a conduzir) que lhe chamou a atenção para o facto e foi na sequência desse facto que olhou para trás, declarando, apesar disso, que terá sido o reboque que bateu no veículo conduzido pelo Réu, determinando o seu despiste. A testemunha (…) é bem mais assertiva e declara que, a dada altura e pelo espelho do veículo que conduzia, viu que o reboque do veículo inglês bateu com a sua traseira na lateral direita do veículo do Réu que, nesse momento, estava a ultrapassar aquele veículo.

    Estes depoimentos não nos mereceram, contudo, qualquer credibilidade.

    Em primeiro lugar, porque não nos parece minimamente credível que as referidas testemunhas – que circulavam num veículo que já se encontraria a alguma distância, uma vez que...

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