Acórdão nº 5165/18.2T8VIS-C.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 25 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução25 de Maio de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra H…, divorciado, residente no …, em 12 de novembro de 2018 apresentou-se à insolvência e foi declarado insolvente por sentença proferida em 29 de novembro de 2018, transitada em julgado.

Na sentença de declaração de insolvência não foi declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência.

A credora F… alegou o carácter culposo da insolvência, indicou o insolvente como a pessoa que deve ser afetada pela qualificação e requereu a abertura do incidente de qualificação da insolvência. Alegou, em síntese, que, desde março de 2015, o insolvente tem conhecimento que lhe deve a quantia de €25.942,68, que no dia 3 de julho de 2017 foi celebrada escritura de partilha da herança aberta por óbito do pai do insolvente e que, apesar do seu quinhão hereditário não ser inferior a quinhentos mil euros, alegadamente, só recebeu o montante de quarenta mil euros a título de tornas.

Indicou como fundamento da qualificação as alíneas a), d) e f) do n.º 1, do artigo 186.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

Declarado aberto o incidente de qualificação da insolvência, o Administrador da Insolvência apresentou parecer no sentido da qualificação da insolvência como fortuita referindo, em síntese, que não dispõe de elementos que lhe permitam aferir parte da matéria alegada no requerimento inicial, manifestou a discordância em relação ao valor dos bens e indicou as explicações que obteve junto do insolvente ou de terceiros. Remetidos os autos ao Ministério Público para os termos do n.º 4 do artigo 188.º, este emitiu parecer a secundar a posição assumida pelo Administrador da Insolvência, concluindo pela qualificação da insolvência como fortuita.

Notificada do teor daqueles pareceres, a requerente do incidente pronunciou-se no sentido do prosseguimento dos autos.

Nos termos previstos no n.º 6 do artigo 188.º, procedeu-se à notificação do insolvente que deduziu oposição, alegando, em síntese que as áreas dos prédios não correspondem à realidade, que não aceita o valor dos prédios, que está a trabalhar para quem explora a propriedade dos seus familiares, que não se desfez dos bens, que vive com a mãe, que a sua ex-companheira e filho de ambos residem na casa da sua mãe em andares diferentes, que ao longo dos anos, por várias vezes, os seus pais, sempre que podiam, auxiliaram-no, fazendo empréstimos de dinheiro em mão e por transferência e pagaram diversas dívidas. Concluiu pelo indeferimento do pedido de qualificação da insolvência como culposa.

A requerente F… pronunciou-se sobre os documentos apresentados com a oposição.

Com dispensa de audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, que verificou a regularidade da instância e fixou o valor da causa.

Foi identificado o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova, que não foram objecto de reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, com recurso à gravação dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a sentença de fl.s 425 a 450 v.º, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e a final, se decidiu o seguinte: “Termos em que: 1.

Qualifico a insolvência de H…, divorciado, contribuinte fiscal n.º…, como culposa; 2. Declaro afetado pela qualificação o insolvente H… e, em consequência: a.

Decreto a sua inibição para administrar patrimónios de terceiros pelo período trinta meses; b.

Declaro-o inibido para o exercício do comércio durante o período de trinta meses, bem como para a ocupação de qualquer cargo de titular de órgão de sociedade comercial ou civil, associação ou fundação privada de atividade económica, empresa pública ou cooperativa; c.

Determino a perda de quaisquer créditos que detenha sobre a insolvência ou sobre a massa insolvente; d.

Condeno ainda H….

, até às forças do respetivo património, o que inclui todos os seus bens suscetíveis de penhora, a indemnizar os seus credores na totalidade dos créditos não satisfeitos.

  1. Custas do incidente de qualificação da insolvência a cargo do insolvente, sem prejuízo de não ser devida tributação.”.

    Inconformado com a sentença proferida, dela interpôs recurso o insolvente, H…, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo – (cf. despacho de fl.s 594), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: (…) Colhidos os vistos legais, há que decidir.

    Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a decidir: A. Se o incidente de qualificação da insolvência é intempestivo e, por isso, inadmissível; B. Incorrecta análise e apreciação da prova, relativamente aos factos constantes dos itens 13.º e 14.º dos factos provados, devendo acrescentar-se, quanto ao 13.º, “que a distribuição dos imóveis pelos herdeiros de SA…, contante da partilha, resulta do cumprimento dos legados, constantes do seu testamento” e, relativamente ao 14.º, não se pode dar como provado que os valores dos imóveis ali referidos se reportem às datas do óbito do pai do insolvente (Abril de 2017); à data da partilha (Julho de 2017) nem à data da insolvência (Novembro de 2018); C. Qualificação da insolvência: se a mesma é de qualificar como fortuita ou culposa; D. Se a sentença recorrida padece da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, c), do CPC e; E. Se o recorrente litiga de má fé.

    É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida: 1.Datado de 27 de novembro de 2001, entregue no dia seguinte, foi emitido pelo pai do agora insolvente, cheque sacado sobre uma conta bancária de que era titular no Banco …, agência de …, com o n.º…., no montante de €2.500,00 (dois mil e quinhentos euros), emitido à ordem de F..., destinado ao pagamento do sinal relativo à compra pelo insolvente de um apartamento na cidade da ….

  2. No período de 24-03-2002 a 19-11-2009 foi transferido da conta bancária da mãe do insolvente para a conta deste o montante total de €39.098,97, em regra destinado ao pagamento das prestações relativas ao empréstimo bancário contraído para aquisição daquele apartamento, nas datas e montantes seguintes: i. 24-03-2002 €350,00 ii. 26-04-2002 €350,00 iii. 22-05-2002 €350,00 iv. 26-06-2002 €350,00 v. 26-07-2002 €350,00 vi. 26-08-2002 €350,00 vii. 29-09-2002 €350,00 viii. 25-10-2002 €350,00 ix. 23-11-2002 €350,00 x. 24-01-2003 €350,00 xi. 25-02-2003 €350,00 xii. 26-03-2003 €250,00 xiii. 28-04-2003 €250,00 xiv. 26-05-2003 €250,00 xv. 25-06-2003 €250,00 xvi. 24-07-2003 €250,00 xvii. 12-08-2003 €300,00 xviii. 23-08-2003 €250,00 xix. 28-09-2003 €250,00 xx. 24-11-2003 €250,00 xxi. 27-12-2003 €250,00 xxii. 26-02-2004 €250,00 xxiii. 21-03-2004 €1.000,00 xxiv. 24-03-2004 €250,00 xxv. 23-04-2004 €250,00 xxvi. 25-05-2004 €250,00 xxvii. 25-06-2004 €250,00 xxviii. 23-07-2004 €500,00 xxix. 26-08-2004 €250,00 xxx. 25-09-2004 €250,00 xxxi. 26-10-2004 €400,00 xxxii. 26-11-2004 €400,00 xxxiii. 23-12-2004 €250,00 xxxiv. 28-01-2005 €250,00 xxxv. 26-02-2005 €250,00 xxxvi. 24-03-2005 €250,00 xxxvii. 25-04-2005 €250,00 xxxviii. 27-05-2005 €250,00 xxxix. 27-06-2005 €500,00 xl. 26-07-2005 €250,00 xli. 27-08-2005 €250,00 xlii. 02-09-2005 €500,00 xliii. 23-09-2005 €250,00 xliv. 26-11-2005 €500,00 xlv. 26-12-2005 €250,00 xlvi. 25-01-2006 €500,00 xlvii. 27-02-2006 €500,00 xlviii. 27-03-2006 €500,00 xlix. 26-04-2006 €500,00 l. 30-05-2006 €500,00 li. 25-06-2006 €500,00 lii. 30-07-2006 €500,00 liii. 25-08-2006 €500,00 liv. 29-09-2006 €500,00 lv. 26-10-2006 €500,00 lvi. 30-11-2006 €500,00 lvii. 23-12-2006 €500,00 lviii. 24-01-2007 €500,00 lix. 26-02-2007 €500,00 lx. 26-03-2007 €499,00 lxi. 26-04-2007 €499,99 lxii. 25-05-2007 €499,99 lxiii. 23-06-2007 €499,99 lxiv. 29-07-2007 €300,00 lxv. 26-08-2007 €300,00 lxvi. 25-09-2007 €300,00 lxvii. 25-10-2007 €300,00 lxviii. 25-11-2007 €300,00 lxix. 27-12-2007 €300,00 lxx. 05-01-2008 €1.000,00 lxxi. 25-01-2008 €300,00 lxxii. 23-02-2008 €350,00 lxxiii. 19-03-2008 €300,00 lxxiv. 09-04-2008 €2.000,00 lxxv. 21-04-2008 €300,00 lxxvi. 21-05-2008 €300,00 lxxvii. 19-06-2008 €300,00 lxxviii. 21-07-2008 €300,00 lxxix. 25-08-2008 €300,00 lxxx. 18-09-2008 €300,00 lxxxi. 22-10-2008 €300,00 lxxxii. 21-11-2008 €300,00 lxxxiii. 22-12-2008 €300,00 lxxxiv. 21-01-2009 €300,00 lxxxv. 19-02-2009 €300,00 lxxxvi. 20-03-2009 €300,00 lxxxvii. 10-04-2009 €300,00 lxxxviii. 19-04-2009 €300,00 lxxxix. 20-05-2009 €300,00 xc. 19-06-2009 €300,00 xci. 20-07-2009 €300,00 xcii. 20-08-2009 €300,00 xciii. 18-09-2009 €300,00 xciv. 19-10-2009 €300,00 xcv. 28-12-2009 €2.400,00 xcvi. 01-03-2010 €200,00 xcvii. 01-04-2010 €200,00 xcviii. 03-05-2010 €200,00 xcix. 01-07-2010 €200,00 c. 02-08-2010 €200,00 ci. 01-09-2010 €200,00 cii. 19-11-2009 €300,00 3.Em relação aos valores entregues ao insolvente, o seu pai referia que o agora insolvente tinha de fazer o ajuste e o encontro de contas com as irmãs, o que aquele aceitou.

  3. O insolvente trabalhou para os pais no âmbito da “S…, Lda.”, que foi dissolvida em 27 de março de 2009; 5.Na data da dissolução daquela sociedade a exploração agrícola e comercial que era levada a cabo por aquela foi transmitida para o insolvente.

  4. Datado de 20 de setembro de 2011, SA… e mulher M…, como primeiros outorgantes, e S…, solteira, professora, como segunda outorgante, subscreveram o documento junto à oposição, intitulado “contrato de comodato” nos termos do qual os primeiros, na qualidade de proprietários, dos “terrenos de cultura e pastagens sitos à …., freguesia de …., …., inscrito na respetiva matriz predial sob o artigo 1059”, declararam emprestar, gratuitamente, à segunda outorgante, aquele prédio, tendo esta declarado que aceitava o empréstimo e que se obrigava a entregá-lo livre e devoluto, findo o prazo do contrato, com início...

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