Acórdão nº 1274/19.9T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 17 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelALBERTO RUÇO
Data da Resolução17 de Novembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)
  1. Relatório a) O presente recurso vem interposto do despacho que a seguir se transcreve em parte, por se afigurar que o segmento aqui exarado é suficiente para enquadrar a problemática colocada pelo recurso: «A Autora A (…), Lda. recorreu aos presentes tendo em vista a condenação da Ré S (…), SA no pagamento, a seu favor, do montante global de 7.406,73 €, alicerçando a sua pretensão na ocorrência de um acidente de viação em que foram intervenientes uma viatura pertença da Autora e uma outra segurada da Ré, pretendendo, assim, fazer actuar os mecanismos da responsabilidade civil automóvel. (…).

    Sucede, porém e desde logo no que respeita à dinâmica do acidente, que a Autora se limita a uma constatação genérica da sua ocorrência, sem alegar um único facto concretizador do sucedido, como, por exemplo, a sua concreta localização geográfica, o sentido de marcha de cada uma das viaturas, a velocidade de circulação, a utilização ou não de sinalética, o local do embate (tendo em conta a dimensão do concelho de Pombal), etc., vindo, posteriormente, a concluir, nos termos do respectivo artigo 4º, que o acidente ocorreu por culpa exclusiva do condutor do veículo seguro da Ré sem, no entanto, indicar um único facto de onde uma tal conclusão possa emergir (artigos 2º a 4º da Petição Inicial). Do mesmo modo e no que em concreto respeita aos danos sofridos, limita-se a Autora à alegação genérica da sua verificação bem como do valor orçamentado para a sua reparação, omitindo, uma vez mais, a descrição da factualidade indicadora e conducente a tais conclusões (artigos 6º e 17º da Petição Inicial).

    Verifica-se, assim, uma total ausência de factos que preencham estes requisitos da responsabilidade civil extracontratual – circunstância determinante, até, da inviabilidade de se alcançar qualquer conclusão quanto à ilicitude, outro dos requisitos do dever de reparação – na medida em que os conceitos vagos e as genéricas afirmações feitas a propósito do sinistro e dos seus intervenientes, absolutamente carentes de efectiva tradução em factos concretos – os quais devem constar do articulado e não apenas dos documentos ao mesmo juntos, já que estes servem, apenas, para prova dos factos alegados – são insuficientes para o preenchimento da exigência legal de alegação dos factos essenciais que servem de fundamento à acção, redundando numa verdadeira e própria falta de objecto do processo.

    É certo, por outro lado, que, tal como a Autora salienta, a Ré aparenta ter conhecimento do acidente de viação invocado e reconhece a sua obrigação de indemnizar (artigo 4.º da Contestação). Todavia, tal reconhecimento limita-se à ocorrência do acontecimento (o acidente), não correspondendo ao reconhecimento da verificação de quaisquer factos que o traduzam (atinentes ao evento ou à culpa, desde logo), visto que foi completamente postergada a exigência da respectiva alegação. E se assim é, não obstante aquele reconhecimento, como pode o Tribunal apreciar se a conduta do segurado da Ré preencheu todos os sobreditos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, com vista à apreciação do pedido formulado? Deste modo, atenta a ausência absoluta da narração dos factos essenciais consubstanciadores da sua pretensão e integradores da causa de pedir, a Petição Inicial em apreço não alcança, sequer, o patamar da mera deficiência, pelo que, apesar do pela mesma pretendido, não se vislumbra como a Autora poderia, mesmo em resposta a um despacho de convite ao respectivo aperfeiçoamento – que, saliente-se, não lhe foi dirigido –, suprir uma tal omissão, já que este corresponderia a um convite para alegação da causa de pedir em falta, o que, como se aduziu já, se revela inadmissível face aos preceitos legais aplicáveis.

    Nestes termos e por todo o exposto, o Tribunal decide julgar verificada a excepção dilatória de nulidade de todo o processo, por ineptidão da Petição Inicial, abstendo-se do conhecimento do mérito da causa e absolvendo a Ré Seguradoras Unidas, SA da instância, nos termos dos art.ºs 278.º, n.º 1, alínea b) e 577.º al. b) do CPC….» b) É desta decisão que vem interposto recurso por parte da Autora, cujas conclusões são as seguintes: «(…) C) Entendeu o Tribunal a quo que, no que respeita à dinâmica do acidente, a Autora se limitou “a uma constatação genérica da sua ocorrência, sem alegar um único facto concretizador do sucedido (…)” D) Acrescenta que, no que concerne aos danos sofridos, a Autora se limitou “à alegação genérica da sua verificação, bem como do valor orçamentado para a sua reparação, omitindo...

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