Acórdão nº 718/18.1T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 20 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMOREIRA DO CARMO
Data da Resolução20 de Outubro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I – Relatório 1.

A (…), viúva, e seus filhos, P (…), solteiro, L (…), solteiro, todos residentes nas (...) , e H (…) casado, residente em (...) , intentaram acção declarativa contra “P (…) LDA”, com sede em (...) , peticionando que seja a R. condenada: a) a despejar o local arrendado, entregando-o aos autores devoluto de todos os entulhos e quaisquer bens que ainda lá possa ter; b) a pagar aos autores a quantia de 40.996,18 €, a título de indemnização pelos danos causados no local arrendado, e a quantia de 15.000 €, a título de rendas vencidas e não pagas nos últimos cinco anos, tudo no total de 55.996,18 €; c) a pagar aos autores, a título de indemnização pelo atraso na restituição do locado, o dobro do valor das rendas que se vencerem após citação e até entrega efectiva do local arrendado, tudo acrescido de juros à taxa legal.

Alegaram, em suma, serem donos de fracção urbana, que identificam, sendo a ré arrendatária do mesmo, onde estava instalado o estabelecimento comercial “Restaurante (…)”. Que sem qualquer autorização dos autores, sem licença da Câmara Municipal e sem autorização da actual DGPC (Direção Geral do Património Cultural), a ré fez obras no local, que provocaram vários danos, cuja reabilitação vai custar 40.996,18 € (a que acrescerá o IVA). Desde a data em que iniciou as obras, em Setembro de 2011, até hoje, a ré mantém encerrado o estabelecimento e nunca mais exerceu nele qualquer actividade. E desde a mesma data até hoje a R. deixou de pagar a renda mensal no valor de 250€.

A ré contestou, alegando, em síntese, que o prédio se encontrava há largas décadas em mau estado de conservação. Apenas pretendia substituir a parede de pladur que montou para revestir uma das paredes do locado, a fim de tentar reduzir a humidade nela preexistentes (e decorrentes da má conservação do imóvel). Porém verificou um abaulamento da referida parede, adentro do espaço de serviço e que colocava em risco o móvel (estante/louceiro/garrafeira) que se encontrava nela apoiado e o lavatório das mãos, para além do impacto estético. Uma vez que tal obra inicial tinha sido autorizada pelos senhorios na pessoa de A (…) e acordado o seu custo a expensas da ré, tratou de providenciar pela sua reparação. Todavia, quando retirado o pladur, constatou que a parede se encontrava impregnada de salitre, sendo, por isso, aconselhável e necessário para uma limpeza adequada e duradora do salitre, a limpeza da parede através da picagem e aplicação de anti-salitre e posterior reboco com adição de anti-salitre. Sucede, porém, que no processo de picagem da parede impregnada de salitre, a ré foi alertada pelo empreiteiro a quem contratou a realização da obra sobre o péssimo estado das abóbodas. Foi, por isso, aconselhada, por razões de segurança, com urgência, a picar as abóbodas de forma a poder verificar a verdadeira dimensão das fissuras e a suspeita de insegurança, tendo sido por esse motivo que foi retirado o reboco de uma das abóbadas, vindo a descobrir fendas enormes. Constatou ainda que outra das abóbadas se encontrava em estado ainda pior, pelo que contactou uma Engª Civil, que aconselhou uma demolição “controlada” da mesma, o que a R. fez. Que em virtude de ir ficar privada do uso do seu estabelecimento comercial até decisão de reconstrução da abóboda demolida e reabilitação da outra (e possivelmente das restantes), ficou acordado com os autores, na pessoa da referida A (...) , que até que se decidisse - de entre os proprietários e a Câmara – a quem e/ou em que medida era imputável tal custo não haveria lugar ao pagamento de rendas.

Deduziu, ainda, pedido reconvencional, no qual impetra que sejam os autores condenados a: a) Reconhecer que a substituição/reparação/reabilitação das quatro abóbodas é obra da sua responsabilidade enquanto proprietários e senhorios do locado identificado nos autos; b) Efetuar, a suas expensas, a reabilitação/substituição das quatro abóbodas existentes no locado onde se encontra instalado o estabelecimento comercial da Ré.

Os autores replicaram, afiançando que depois de ter tomado o trespasse do locado, a ré nunca solicitou quaisquer obras, sendo que nenhum dos relatórios ou vistorias efetuados antes de, no local a mesma ter feito obras, concluiu pelo mau estado de conservação do locado. Nunca deram autorização à ré para fazer quaisquer obras no locado, nem este pediu qualquer autorização para esse efeito. Concluiu que todos os danos causados no restaurante da ré foram causados pelo comportamento abusivo e negligente da mesma, pugnando pela improcedência do pedido reconvencional.

Foi admitido o pedido reconvencional formulado.

* A final foi proferida sentença que decidiu: a) Declarar resolvido o contrato de arrendamento entre AA e R., condenado a R. a entregar o locado aos AA, devoluto de todos os entulhos e quaisquer bens que ainda lá possa ter; b) Condenar a R. a pagar aos AA da quantia de 6.149,43 €, a título de indemnização pelos danos causados no local arrendado, valor a que acrescerão juros de mora à taxa legal para as operações civis, desde a citação até efectivo e integral pagamento; c) Condenar a R. a pagar aos AA, a título de indemnização pelo atraso na restituição do locado, o valor das rendas (250 €) que se vencerem desde a prolação da presente sentença até efectiva entrega do locado; d) Julgar improcedente o demais peticionado na p.i. e na reconvenção; e) Condenar os AA, enquanto litigantes de má fé, no pagamento de multa fixada em 6 UC’s.

* 2. A R. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões: (…) 3. A A. contra-alegou, concluindo que: (…) II – Factos Provados 1. Encontra-se registada a favor dos AA., a fracção “D” do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de (...) sob o n.º 1117, da freguesia de (...) , e inscrito na matriz da união de freguesias de (...) e (...) sob o artigo 891, antes artigo 1688, da freguesia de (...) , pela Ap. 2101 de 2018/01/24.

  1. Pelo menos desde 29/5/1987 que a referida fracção se encontrava “arrendada” à sociedade “M (…)Lda.”, que nela explorava o “Restaurante (…) 3. Em execução fiscal contra a referida “M (…), Lda.”, o “direito ao trespasse e arrendamento” do estabelecimento “Restaurante (…) foi adquirido, em 9/9/2005, por (…).

  2. Por escrito particular denominado “Contrato de Trespasse”, datado de 15 de Setembro de 2005, celebrado entre o referido R (…) e a sociedade “P (…)Lda”, aqui Ré, o primeiro declara vender à segunda, que declara comprar, “o direito ao trespasse de estabelecimento comercial” do estabelecimento comercial referido nos pontos anteriores.

  3. O prédio de que faz parte a fracção “D” é um prédio que se encontra dentro da Zona Especial de Protecção (ZEP) do Mosteiro de (...) .

  4. O tecto da parte do restaurante destinada a sala de refeições, com duplo pé direito, é constituído por quatro abóbadas em alvenaria de tijolo maciço.

  5. Sem qualquer autorização dos Autores, a Ré decidiu fazer obras na fracção referida em 1., em Setembro de 2011.

  6. A Ré iniciou as obras, que inicialmente passavam pela substituição de uma parede de pladur que montou para revestir uma das paredes do locado, a fim de tentar reduzir a humidade nela pré-existente.

  7. No processo de picagem da parede impregnada de salitre, a Ré foi alertada pelo empreiteiro a quem contratou sobre o péssimo estado das abóbadas.

  8. Tendo o empreiteiro alertado a Ré para as fissuras existentes nas abóbadas, que se notavam a olho nu no reboco, e que criavam a suspeita de se tratarem de fissuras graves.

  9. Sob ordens da R., o empreiteiro picou as abóbadas de forma a poder verificar a verdadeira dimensão das fissuras e a suspeita de insegurança.

  10. Assim procedendo e no decurso dessas obras, a Ré removeu o reboco das paredes e das abóbadas existentes no tecto da referida fracção.

  11. Detectando-se que uma das abóbadas se encontrava em risco iminente de ruir e na sequência de um parecer técnico, o legal representante da Ré (…)ordenou a respectiva demolição, o que veio a suceder (com a precisão de que a mesma ia cedendo à medida que o empreiteiro batia na mesma com um ferro).

  12. Com a referida demolição, o pavimento que constitui o chão do piso de cima, no local onde se encontrava a abóbada, cedeu.

  13. A construção do prédio onde se insere a fracção “D” data do século XVII/XVIII, tratando-se de um edifício com paredes estruturais em alvenaria de pedra, cobertura inclinada em madeira revestida a telha cerâmica, pavimentos e tectos em estrutura de madeira revestida a soalho ou forro de madeira.

  14. O referido prédio apresentava em Setembro de 2011 um mau estado de conservação, resultante da sua deterioração natural ao longo do tempo e ausência de manutenção.

  15. Em 4.01.2011 o proprietário do 2º andar direito do referido prédio apresentou uma reclamação na Câmara Municipal de (...) , associando as patologias verificadas na fachada do edifício à empreitada realizada na Praça exterior contígua cerca de 5 anos antes.

  16. Tal reclamação determinou a realização de uma vistoria que teve lugar no dia 28.01.2011 e determinou a elaboração de um auto de vistoria.

  17. No referido auto ficou registada a fissuração generalizada das fachadas, bem como das abóbadas exteriores.

  18. Mais ficaram registadas, entre outras, as seguintes deficiências verificadas na zona sobre as abóbadas no interior do 2º andar direito: - “assentamento do soalho, com deformação mais acentuada na zona central (corredor) e sala orientada a norte, sobre as abóbadas”.

  19. Aí consta indicada como causa para o supra referido que tal “ocorrência constitui uma situação antiga, como se pode comprovar pela reparação efectuada na sala norte, com intuito de repor a cota do pavimento. Esta intervenção foi anterior ao actual proprietário, desconhecendo-se como e quando terá ocorrido. Aparentemente, procedeu-se ao enchimento do pavimento existente com betonilha ou betão.” 22. Menciona ainda o referido auto que “O edifício foi sujeito ao longo do tempo a diversas intervenções que alteraram as suas...

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