Acórdão nº 1859/07.6TBPBL-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Janeiro de 2020

Data28 Janeiro 2020
ÓrgãoCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I. Nos autos de incumprimento das responsabilidades parentais em que é requerente M (…), em representação de suas filhas menores M (…) e B (…) sendo requerido P (…), pai das menores, notificada a decisão de 11.12.2018, que declarou cessada a intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos devidos a Menores (FGADM), quanto à menor M (…) (apenso D) e consequente extinção da instância por impossibilidade superveniente, a requerente, inconformada, apelou, terminando com as seguintes “conclusões”: 1ª - O Tribunal por decisão proferida no apenso D, relativa à menor M (…) e no seguimento de uma outra relativa à menor B (…) no apenso E, declarou a imediata cessão da intervenção do FGADM, e consequentemente declarou extinta a instância por impossibilidade superveniente, bem como, a comunicação ao FGSS-IP, para efeitos de reembolso das prestações entretanto pagas desde Janeiro de 2018.

  1. - Tal decisão, teve por base a interpretação feita pelo Tribunal a quo, de que, nos termos do art.º 3º, n.º 6 do DL 164/99 de 13/5, as menores, encontrando-se acolhidas desde Janeiro de 2018 em Casa Abrigo, tal situação integra, sem mais, a referida previsão, prejudicando liminarmente a continuação da intervenção do FGADM.

  2. - Estando para mais em causa o superior interesse de duas menores e, pela responsabilidade constitucional do próprio Estado, e moral da Sociedade em si, de protecção das crianças, principalmente as mais desprotegidas, e tendo em vista o seu crescimento integral e saudável, tal decisão vai contra todos os princípios e génese legal de protecção das crianças, aliás, também plasmados no próprio sumário do diploma que veio regular a garantia de alimentos devidos a menores.

  3. - Com base nestas premissas, o legislador não ia retirar e logo com as duas mãos, o que deu com uma, criando situações incompreensíveis, como fossem os casos como os dos autos, de, abranger, como fazendo parte do leque dos internados em Instituições, também as pessoas (umas vítimas, outras apenas ao seu encargo) acolhidas, ainda que por necessidade, mas sempre por sua vontade, e com autonomia própria, em casas abrigo.

    5ª - O Tribunal faz assim uma interpretação tremendamente extensiva, ademais injusta e deveras incompreensível, do referido art.º 3º, n.º 6 do invocado DL 164/99 de 13.5, estendendo a sua aplicabilidade aos casos de acolhimento, quando, até pela escolha literal da palavra “internamento” feita pelo legislador, parece claro e lógico, que o n.º do art.º em questão apenas se aplica a esses mesmos, de facto, casos de internamento.

  4. - Com tal interpretação inexplicável violou o Tribunal os referidos princípios constitucionais de obrigação e protecção do Estado às crianças, nomeadamente o art.º 69º da Constituição da República Portuguesa (CRP).

  5. - A menor M (…)e também a sua irmã menor B (…) não estão em situação de internamento, mas sim de abrigo ou acolhimento temporário, e por isso, sempre provisório, ou seja, sujeito a terem de o abandonar a qualquer momento, independentemente de qualquer decisão judicial no processo, que as levou a terem de, juntamente com a sua progenitora, solicitarem refúgio e protecção, para evitarem eventuais males maiores, acolhendo-se assim em Casa Abrigo.

  6. - As menores não estão internadas ou institucionalizadas em Estabelecimento de Apoio Social, por imposição legal e/ou judicial, a que pensamos o preceito se aplica.

  7. - Foi propositado que a referida disposição legal não tivesse previsto os casos, de acolhimento ou refúgio, ou outras formas de abrigo e protecção, que como as palavras indicam, e sendo a língua portuguesa tão rica, têm sempre subjacentes, uma componente de liberdade de escolha, no pedido de ajuda, de solidariedade, e hospitalidade humana, de alguém que precisa de auxílio, de refúgio, e abrigo, e que a ele resolve apelar temporária e transitoriamente, não porque, no caso das crianças isso seja o melhor para o seu são crescimento, mas apenas por questões de segurança para que esse crescimento não seja prejudicado, e pelo facto de, ainda que pudessem não ser elas próprias vitimas directas, têm, logicamente, de acompanhar o progenitor que tem a sua guarda.

  8. - Tendo ainda assim, as crianças de abdicar de tudo, principalmente da sua área de conforto, como são sempre o seu lar, a sua família, os seus amigos, a sua escola, os seus professores, a sua catequese, etc.

  9. - As menores não estão assim internadas nem institucionalizadas, nem têm de obedecer a nenhum programa especial que lhes promova a sua educação, o seu são crescimento e bem estar, em prol do seu superior interesse, que seja ou tenha de ser velado, zelado e suportado, a qualquer título, pela instituição de acolhimento, e em última análise pelo Estado ou Sociedade, que implique não poderem as menores receber o apoio do FGADM como até aqui, e que por isso, nada tem a ver com o presente acolhimento, por razões lógicas de segurança.

  10. - Aliás, nenhum proveito, podem as crianças retirar de tal acolhimento, ficando em pior situação da que estavam, e neste caso, com eventuais e sérios traumas de não conseguirem, não só, entender, como, suportar esse afastamento imprevisível (nem um recomeçar é, pois é provisório, e por isso transitório e acidental este acolhimento, podendo causar sérios transtornos no seu crescimento).

  11. - E tudo isto, não só, quanto ao modo e lugar, mas principalmente quanto ao tempo de duração, e com o risco de as crianças terem de sair a qualquer momento da casa de acolhimento, e da “nova” escola que ainda estavam a conhecer.

  12. - Bem basta, pois, a dupla “punição” das menores, pois o seu progenitor é simultaneamente o incumpridor dos seus deveres parentais nos presentes autos, como o suposto causador dos seus afastamentos das suas rotinas, da sua família, dos seus amigos, da sua terra natal, que tanto as podiam ajudar no seu são crescimento.

  13. - Se a mãe e as suas filhas menores, já se encontravam em situação precária, por aquela estar desempregada, pelo menos, em sua casa, na sua terra, sempre podiam contar com a ajuda de familiares, amigos, e até simples conhecidos (em géneros alimentares, roupas e até medicamentos, mas até em encontrar trabalho).

  14. - Tal precariedade ainda mais se agudizou, porque, logicamente, em território estranho, acolhida em local provisório com regras até de recolhimento/entrada, mais difícil é aí conseguir encontrar actividade remunerada, (não pode por exemplo a mãe das menores trabalhar em horário nocturno).

  15. - Sendo que por outro lado, e até...

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