Acórdão nº 3888/18.5T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 04 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução04 de Maio de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 3888/18.5T8LRA.C1 – Apelação Comarca de Leiria, Leiria, Juízo Central Cível Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra A (…) e mulher B (…), intentaram a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra o Banco B (…), S.A.

, já todos identificados nos autos, pedindo que se:

  1. Declare que a aquisição do produto financeiro traduzido na compra das obrigações SLN Rendimento Mais 2004 ao B(…) (actual Banco (…)), na agência de P (...) foi levada a efeito no pressuposto de que o produto financeiro em causa se mostrava a coberto da garantia dada pelo Banco R., de reembolso do capital de 100%.

  2. Declare que é da responsabilidade do Banco (…) SA o reembolso do capital reportado à aquisição por parte dos AA. da obrigação SLN Rendimento Mais 2004, no valor de € 50.000,00, porquanto com a transmissão do nacionalizado banco B(…) para a esfera jurídica do banco B(…) transmitiram-se de igual modo na sua totalidade todas as obrigações emergentes dos contratos que obrigavam o B(…), independentemente de todo e qualquer acordo que o banco B(…) tenha estabelecido com o Estado Português no acto de compra ou em momento anterior, o que só lhe concede o direito de regresso a discutir entre as partes em causa, sendo tal acordo marginal aos aqui AA..

  3. Condene o R. Banco (…) a proceder ao imediato reembolso do capital de € 50.000,00, acrescidos dos juros vencidos desde 07 de Maio de 2014 sobre a obrigação SLN 2004, à taxa legal, até integral reembolso do capital, condenando ainda o R. Banco (…) SA a pagar aos AA. quantia indemnizatória a fixar em liquidação de sentença, mas nunca inferior a € 10.000,00, por danos morais sofridos pelo A. e sua esposa, com o comportamento imputável ao R. Banco (…), traduzido na informação falsa prestada pelo gerente de conta na Agência de P (...) que conduziu à presente situação.

    E, no entendimento de que o contrato é nulo, se: d) Julgue nulo o contrato de intermediação financeira celebrado entre os AA. e o R. que deu origem à ordem de subscrição de 07-04-2004 da obrigação SLN Rendimento Mais 2004, no valor de € 50.000,00. E e) Condene o R. Banco (…) SA a restituir aos AA. o valor de € 50.000,00, acrescido de juros, à taxa legal, desde 07-05-2014 e até efectivo e intergral pagamento.

    Alegaram para tal, muito em síntese, que, em Abril de 2004, eram detentores duma conta, no montante de € 50.000,00 na Agência/Balcão B(…) de P (...); e nessa qualidade, dirigiram-se ao balcão do réu, em P (...), onde foram recebidos por C (…) gerente daquele balcão, que ao inteirar-se da intenção dos autores, lhe propôs que, em vez de fazerem o pretendido depósito a prazo, adquirissem uma obrigação SLN Rendimento Mais 2004, produto financeiro que, segundo o referido gerente de balcão, “tinha as mesmas garantias e segurança dum depósito a prazo”[1], podendo assim obter “um melhor rendimento, sendo que tinha os juros remuneratórios e o reembolso de capital 100% garantido pelo BANCO (...)” – como resulta do que alegam nos artigos 2.º, in fine a 4.º da p.i..

    Assim, perante o que lhes estava a ser proposto, os AA. anuíram e, em Abril de 2004, adquiriram uma obrigação do produto designado como SLN Rendimento Mais 2004, no valor de € 50.000,00, sendo certo que “apenas sabendo que estavam a comprar e que compraram um produto que lhe havia sido e foi apresentado como sendo tão seguro como um DP e que lhe dava mais juros, tendo a garantia do B(…) do reembolso integral do capital que estavam a investir” (artigos 8.º e 9.º); e sendo certo que o referido gerente de conta lhe disse “que tal aplicação seria feita pelo prazo de dez anos, mas que poderia eventualmente proceder ao seu resgate antecipado ao fim de cinco anos e que se porventura tivesse necessidade de levantar o dinheiro mais cedo, em qualquer altura o poderia fazer, bastando que a avisasse com dois ou três dias de antecedência”[2].

    Adquirido tal produto/obrigação (em Abril de 2004), sempre até Maio de 2014 lhe foram pagos os juros do capital investido, não mais tendo recebido após esta data e sendo-lhe dito pelo R. (…) – tendo entretanto, como é do domínio público, o Estado Português nacionalizado, em 11/11/2008, o B(…) e depois procedido, em 30/03/2012, à sua reprivatização/venda ao R. Banco B(…) (que, depois, em 07/12/2012, se fundiu, por incorporação, com o B(…), assumindo então o B(…) a personalidade jurídica do B(…)) – que, sendo a aplicação uma obrigação da SLN e estando esta insolvente (o que entretanto foi declarado), o reembolso do capital devia ser reclamado no processo de insolvência; isto, ainda segundo o que lhe foi dito pelo R. B(…), “por o B(…), ao vender a referida obrigação, apenas ter funcionado enquanto intermediário financeiro, não sendo tal obrigação do BANCO (...), mas apenas e só vendida ao balcão do B(…) por conta e risco da dita SLN”[3].

    Ora, segundo os AA., o R. B(…), ao adquirir o B(…) ao Estado Português, assumiu todas as responsabilidades emergentes da gestão do B(…) e nessas responsabilidades incluem-se as verbas devidas e reclamadas pelos clientes (sem prejuízo de, depois, o Banco B(…) poder pedir o seu reembolso ao Estado Português, nos termos do acordo entre ambos celebrado), como é o caso do reembolso do capital das obrigações SLN Rendimento Mais 2004, vendidas “com a informação de ter capital garantido, envolvendo tal garantia, não a da entidade dele emitente, mas sim ou também do intermediário financeiro” – cf. artigo 30.º.

    Razão pela qual o Banco B (…), segundo os AA., deve ser condenado a restituir-lhes os € 50.000,00 investidos, acrescidos de juros (sendo que, ainda segundo os AA., o contrato de intermediação financeira celebrado com o B(…) é nulo por não ter obedecido à exigida forma escrita, o que, mais uma vez segundo o A., é fundamento para, como efeito da nulidade declarada, lhe serem restituídos os € 50.000,00 investidos, acrescidos de juros).

    Ademais, confrontados com a ideia de perderem o dinheiro investido, passaram “noites e noites sem dormir, dias e dias sem conseguir gerir a sua vida pessoal”, factos que criaram desestabilização no seio do seu agregado familiar, razão pela qual, ainda hoje, ele e a esposa sofrem de depressão e angústia, o que, tudo junto, pela sua gravidade, justifica que sejam indemnizados os danos não patrimoniais por ambos sofridos.

    O R. contestou.

    Alegou, em súmula, que na intermediação financeira efectuada com os AA., a respeito da Obrigação SLN Rendimento Mais 2004, não houve qualquer violação do dever legal de informação, tendo sido prestada aos AA. informação completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita; que nunca o banco ou os seus colaboradores transmitiram aos AA. que o banco “garantia a emissão”; que, à época, “nada havia que desabonasse sobre o investimento efectuado”, sendo uma obrigação “um produto conservador”, com um risco reduzido, “indexado à solidez financeira da sociedade emitente”, sendo que a entidade emitente era a “mãe” do banco e um “componente da solvabilidade daquela, por ser um dos principais activos do seu património, pelo que, segundo o R., “dificilmente haveria um produto financeiro tão seguro como a subscrição daquelas obrigações; e que ao longo dos anos sempre os AA. foram recebendo toda a documentação respeitante ao investimento efectuado e recebendo os juros sem ter suscitado qualquer reclamação.

    Invocou que, se porventura fosse verdade (o que não concede) que não prestou a informação a que estava adstrito, o certo é que o A. sabe há muito o negócio/investimento que fez, pelo que, não tendo o R. agido com dolo ou culpa grave, já há muito estaria prescrito, nos termos do art. 324.º/2 do CVM; o direito indemnizatório do A..

    E concluiu pela total improcedência da acção e pela sua total absolvição do pedido.

    Os AA. replicaram, respondendo e opondo-se à excepção da prescrição e mantendo o antes alegado na PI.

    Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que foi declarada a total regularidade da instância, estado em que se mantém – relegando-se para final o conhecimento da prescrição invocada – tendo-se identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova.

    Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 103 a 114, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se decidiu o seguinte: “Julgo a presente acção parcialmente provada e, nessa medida, procedente, pelo que condeno o réu, Banco B (…) SA, no pagamento aos autores, (…)

  4. O capital de € 50.000,00; b) A quantia de € 5.000,00; c) Juros, à taxa de 4%, desde 7 de Maio de 2014, no respeitante à primeira das quantias, e desde a data da presente decisão, no respeitante à última, até integral pagamento.

    Custas proporcionais.”.

    Inconformado com a mesma, interpôs recurso, o réu, Banco B (…), SA, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida, imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 270), finalizando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: (…) Contra-alegando, os autores pugnam pela manutenção da decisão recorrida, valendo-se dos argumentos nesta expendidos, designadamente, que a prova foi bem apreciada, devendo permanecer inalterada a matéria de facto dada como provada e não provada em 1.ª instância e o enquadramento jurídico traduz a correcta aplicação das normas aplicáveis, designadamente, que o banco réu não cumpriu os deveres de informação que se lhe impunham aquando da subscrição do produto financeiro em causa, o que levou os autores a subscrevê-lo, bem como não ocorreu a prescrição do seu direito.

    Colhidos os vistos legais, há que decidir.

    Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, são as seguintes as questões a...

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