Acórdão nº 297/19.2T(FND.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 10 de Dezembro de 2020

Magistrado ResponsávelMARIA CATARINA GONÇALVES
Data da Resolução10 de Dezembro de 2020
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: I.

J (…), residente (…), concelho do (...) , veio instaurar acção, com processo comum, contra L (…), residente (…) (...) e contra P (…) e esposa J (…), residentes (…) em França, pedindo que seja decretada a ineficácia em relação ao Autor de uma doação, realizada no dia 20 de Outubro de 2017, por via da qual o 1.º Réu doou um imóvel ao 2.º Réu (seu filho) e que os Réus P (…) e esposa J (…) sejam condenados na restituição do sobredito prédio doado de modo a que o crédito do Autor, acrescido das custas e encargos da execução de sentença aludida no artigo 4º, possa realizar-se à custa desse mesmo prédio.

Alega, em resumo, para fundamentar essa pretensão: que, no âmbito de execução para prestação de facto que instaurou contra o 1.º Réu, o custo das obras destinadas à realização da prestação a que o Réu havia sido condenado por decisão transitada em julgado foi avaliado em 1.263,00€ acrescido de IVA, valor que foi notificado ao Réu em 10/07/2017; que, uns meses antes, haviam sido adjudicados ao 1.º Réu – no âmbito de partilha de bens comuns do casal – dois imóveis, 1/6 indiviso de outro imóvel e um veículo automóvel; que o 1.º Réu desfez-se de todo esse património, por via de vendas e doações, com o único propósito de prejudicar os seus credores, tendo doado ao 2.º Réu um dos referidos imóveis por escritura de doação celebrada em 20/10/2017; que, por força desses factos, não foram encontrados bens penhoráveis que respondessem pela quantia devida na execução supra mencionada e que ambos os Réus tinham perfeito conhecimento do prejuízo que tal doação causariam ao Autor na medida em que não são conhecidos outros bens do primeiro Réu que possam responder pelo crédito do Autor. Contestando, os Réus, além de invocarem a ilegitimidade da Ré J (…), alegam: que o crédito do Autor é posterior à data em que foi celebrada a doação, uma vez que esse crédito apenas se formou em 21 de Março de 2018 com a notificação do despacho que validou a peritagem que havia sido efectuada; que a referida doação não determinou a impossibilidade de satisfazer integralmente o crédito do Autor nem determinou o agravamento dessa impossibilidade, sendo certo que, na sequência da indicação à penhora pelo Autor em 26/11/2018, foi penhorado na referida execução – em 21/03/2019 – um imóvel ao qual foi atribuído o valor de 50.000,00€ e cuja venda já foi requerida pelo Autor; que a presente acção foi instaurada depois de o Autor ter sido notificado dessa penhora, não podendo o Autor requerer em processo executivo a venda dum prédio urbano penhorado, cujo valor garante a totalidade do seu crédito e ao mesmo tempo impugnar uma doação anterior invocando que da mesma resulta a impossibilidade ou o agravamento da impossibilidade da satisfação do seu crédito e que, à data da escritura, os 2.ºs Réus desconheciam que o 1.º Réu tivesse alguma obrigação para com o Autor e que, como tal, estavam a prejudicá-lo com a doação.

Com estes fundamentos, concluem pedindo: a procedência da excepção da ilegitimidade, a improcedência da acção e a condenação do Autor por litigância de má-fé.

O Autor respondeu, sustentando a improcedência da matéria de excepção deduzida pelos Réus e negando a existência de qualquer litigância de má-fé da sua parte.

Foi realizada a audiência prévia e proferido despacho saneador onde se julgou improcedente a excepção de ilegitimidade da Ré J (...) .

Foi fixado o objecto do litígio e foram delimitados os temas da prova.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença que, julgando a acção improcedente, decidiu absolver os Réus do pedido e absolver o Autor do pedido de litigância de má-fé formulado pelos Réus.

Inconformado com tal decisão, o Autor veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) Os Réus apresentaram contra-alegações, sustentando a improcedência do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

///// II.

Questão a apreciar: Atendendo às conclusões das alegações do Apelante – pelas quais se define o objecto e delimita o âmbito do recurso – são as seguintes as questões a apreciar e decidir: ● Saber se os Réus lograram ou não fazer a prova – que a lei coloca a seu cargo (art. 611.º do CC) – de que o 1.º Réu continua a possuir bens penhoráveis suficientes para satisfazer o crédito do Autor, o que, no caso, se reconduz a saber se a mera alegação e prova da existência de uma penhora sobre determinado imóvel (penhora efectuada no âmbito de uma execução instaurada pelo Autor contra o 1.º Réu) é bastante para que considere feita aquela prova; ● Saber, em função da resposta dada à questão anterior, se devemos ter como verificado o requisito previsto na alínea b) do art. 610.º do CC e se, como tal, a impugnação pauliana está em condições de proceder.

///// III.

Na 1.ª instância, julgou-se provada a seguinte matéria de facto: 1. Resulta da sentença, datada de 15 de Janeiro de 2014, transitada em julgado em 17 de Novembro de 2014, proferida nos autos de processo comum singular, com o n.º 67/12.9TAFND, que correu termos, pelo designado na altura, 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca do Fundão, que o primeiro Réu L (…) foi condenado a: “reconstruir imediatamente o muro de blocos de cimento com a extensão, localização e características físicas aludidas na acusação particular”.

  1. Na referida acusação particular, deduzida nos aludidos autos, o aqui Autor identifica esse muro como: “um muro de blocos de cimento com um metro de altura sensivelmente, construído pelo denunciante (aqui autor) e a ele pertencente, muro esse situado na estrema sul da Tapada ou Rua da Escola, da (então) freguesia do (...) , deste concelho do (...) , e inscrito na respectiva matriz rústica sob o artigo 1191 (…) numa extensão de dezanove metros”.

  2. Em 20 de Janeiro de 2015, o Autor intentou contra o primeiro Réu L (…) uma execução da sentença, mencionada no ponto 1, da materialidade dada como provada, para prestação do facto, com o n.º 67/12.9TAFND.1.

  3. Em 14 de Março de 2017, o primeiro Réu L (…) divorciou-se de M (…), por decisão proferida nos autos de divórcio por mútuo consentimento com o n.º 227 de 2017, que correu termos na Conservatória do Registo Civil do (...) .

  4. Nesses mesmos autos, o primeiro Réu L (…) e M (…) procederam à partilha do património comum do casal.

  5. Foram adjudicados ao primeiro Réu L (…) todos os bens imóveis e o bem móvel sujeito a registo nesses autos relacionados como património comum: i. Verba n.º 1: Prédio rústico, no sítio da Tapada do y (...) , da freguesia aludida dos x (...) s, inscrito na respectiva matriz sob o artigo 194 e...

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