Acórdão nº 936/08.0TBAVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Novembro de 2011

Magistrado ResponsávelCARLOS QUERIDO
Data da Resolução15 de Novembro de 2011
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra I. Relatório L (…) Seguros, S.A.” intentou a presente acção com processo sumário contra S (…), pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de € 8.245,88, acrescida de juros mora, à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento.

Alegou em síntese: celebrou com o ora R. um contrato de seguro do ramo automóvel, titulado pela apólice nº (...) , o qual garantia a responsabilidade civil inerente à circulação do veículo com a matrícula GQ- (...) ; no dia 27/11/2005, pelas 15,30 horas, na E.N. nº 335, em Quintães, ocorreu um acidente de viação no qual foi interveniente este veículo, conduzido pelo R., que circulava no sentido Aveiro - Palhaça, e o veículo de matrícula (...)-ZO , que circulava em sentido contrário; o local onde ocorreu o acidente caracteriza-se por ser uma recta, com dois sentidos de trânsito, separados por uma linha longitudinal descontínua; o acidente ocorreu por o R., fortemente influenciado pelo álcool, ter perdido o controlo do veículo que conduzia, ter transposto a linha longitudinal contínua, e ter ido embater na parte lateral esquerda do (...)-ZO , que circulava pela sua mão de trânsito.

Citado, veio o réu contestar, alegando em síntese que circulava a 60 km/hora quando embateu no vidro dianteiro do veículo que conduzia, do lado do condutor, uma pedra de dimensões médias e pesada, o que fez com que deixasse de ver e perdesse o controlo do GQ- (...) .

Foi proferido despacho saneador tabelar e procedeu-se à condensação da factualidade considerada relevante para a boa decisão da causa, discriminando-se os factos assentes dos controvertidos, sem reclamações.

Procedeu-se a julgamento, após o que foi proferida decisão sobre a matéria de facto, sem reclamações.

Foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, julgo a presente acção procedente, por provada, e, em consequência, condeno o R. (…) a pagar à A. L (...) Seguros, S.A., a quantia de € 8.245,88, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa de 4%, a partir da citação e até integral pagamento.» Não se conformando, o réu interpôs o presente recurso de apelação, apresentando alegações, onde formula as seguintes conclusões: 1.O R. conduzia sob influência do álcool tendo acusado uma TAS de 1,88g/l.

  1. Ora o Tribunal, a quo, entende que o “R. perdeu o controlo do GQ- (...) por a sua capacidade se encontrar diminuída em consequência da taxa de álcool que apresentava no sangue.

  2. Entendeu o tribunal como provado “a taxa de alcoolemia de 1,88 g/l de álcool no sangue provocou diminuição das capacidades de visão, percepção e reacção do R influenciando a condução praticada por este” 4. Porém não existe qualquer prova que exista nexo de causalidade entre a ingerência de bebidas alcoólicas e o acidente assim como não foi feita prova do valor da reparação.

  3. O ónus da prova incumbe à A. que não fez qualquer prova da relação causal entre a ingerência de bebidas por parte do R. e o acidente de viação.

  4. O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2002, de 28 de Maio de 2002, que decidiu que a “alínea c), o art. 19, do D.L. n .º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool, o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob efeito do álcool e o acidente.” 7. Salvo o devido respeito e melhor opinião, nem o tribunal na fundamentação da douta decisão, em momento algum estabelece nexo de causalidade entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente provocado pelo R.; 8. Ora, “a livre apreciação da prova não se confunde de modo algum com a apreciação arbitrária da prova nem com a mera impressão gerada no espírito do julgador. O julgador, ao apreciar livremente a prova, ao procurar através dela atingir a verdade material, deve observância a regras da experiência comum utilizando como método de avaliação a aquisição do conhecimento critérios objectivos, genericamente susceptíveis de motivação e controlo.”, em que se pronunciou o Tribunal Constitucional, no douto acórdão nº 1165/96, de 19 de Novembro 9. “A livre ou íntima convicção do juiz não poderá ser nunca puramente subjectiva ou emotiva e, por isso, há-de ser fundamentada, racionalmente objectivada e logicamente motivada, de forma a susceptibilizar controlo.” Sentido em que se pronunciou o STJ, no douto acórdão de 21 de Janeiro de 1999.

  5. Assim, «sendo a valoração um juízo de aceitabilidade dos enunciados fácticos em que consistem os resultados probatórios, e tendo em conta que estes são aceitáveis quando o seu grau de probabilidade é suficiente, os critérios (positivos) de valoração hão-de indicar o momento a partir do qual um enunciado fáctico alcança um grau de probabilidade suficiente e maior que qualquer outro enunciado alternativo dos mesmos factos.” (ABELLÁN, Marina Gascón in «Los hechos en el derecho – Bases argumentales de la prueba», Marcial Pons, Madrid, 199, ).

  6. Há pois, em nosso entender, uma interpretação incorrecta da ausência de prova e do ónus a que estava a A. incumbida.

  7. Ora, atendendo à prova produzida deve o R. deve ser absolvido.

    A autora apresentou contra-alegações, nas quais preconiza a manutenção do julgado, formulando as seguintes conclusões: 1. Para que a Seguradora possa exercer o direito de regresso, em primeira instância, terão que estar verificados os requisitos da responsabilidade civil extra-contratual previstos nos artigos 483° e seguintes.

  8. Após se ter concluído pela responsabilidade do condutor alcoolizado, cabe averiguar se existe nexo de causalidade entre a TAS e a ocorrência do acidente.

  9. A dinâmica do acidente foi dada como assente, não sendo objecto do presente recurso, pelo que, ficou demonstrada a responsabilidade do ora Recorrente pela produção do acidente.

  10. O Tribunal a quo concluiu que a TAS acusada pelo Recorrente influenciou as suas capacidades sensoriais, de atenção e de reacção, o que o levou a não conseguir controlar o seu veículo, invadindo assim a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário.

  11. O Mmo Juiz do Tribunal a quo efectuou uma avaliação criteriosa, adequada, realista e concreta da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.

  12. O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2002 veio preconizar a doutrina de que só assistirá direito de regresso à Seguradora, se esta provar que o acidente foi causado pela taxa de alcoolemia de que o condutor era portador.

  13. O que se afasta no Acórdão Uniformizador é a “presunção automática” do nexo de causalidade, exigindo, ao invés aprova da existência de nexo de causalidade entre o álcool e o acidente.

  14. Não fica excluída a hipótese do julgador, através de presunção judicial, concluir por esse nexo de causalidade atendendo aos factos dados como provados.

  15. O julgador pode basear-se em presunções naturais, baseadas nas regras da experiência comum e em juízos de probabilidade para concluir pelo nexo de causalidade entre a TAS acusada pelo condutor e o acidente.

  16. Face às regras de experiência comum e científica, a influência de uma TAS de 1,88 g/l no ora Recorrente, em abstracto, era idónea para levar à diminuição dos seus reflexos, e das suas capacidades de atenção, percepção e reacção.

  17. Atenta a forma como ocorreu o acidente, torna-se evidente que face a uma TAS...

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